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Derivam pois da CEDH limites no que toca aos fins da detenção A detenção de imigrantes apenas pode ter lugar em vista de dois fins taxativos: impedir a entrada ilegal de

A. Sofia Pinto Oliveira

II. Afastamento coercivo e expulsão de imigrantes

1. A Detenção de imigrantes à luz dos instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos

1.2. A Detenção de Imigrantes à luz da jurisprudência dos órgãos de controlo da Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais

1.2.4. Derivam pois da CEDH limites no que toca aos fins da detenção A detenção de imigrantes apenas pode ter lugar em vista de dois fins taxativos: impedir a entrada ilegal de

imigrantes no território ou promover a expulsão ou extradição de pessoas cujos respetivos processos estejam em curso. O TEDH controla se a detenção em causa visou efetivamente esses fins. No caso Bozano, o Tribunal censurou o facto de as autoridades francesas terem usado a detenção para um fim diferente do formalmente invocado (ao invés de expulsão, extradição do visado)33. Por seu turno, no caso Conka c. Bélgica, o TEDH censurou a conduta das autoridades belgas, que conduziram requerentes de asilo a um posto de polícia com o objetivo de os deter e subsequentemente expulsar os mesmos, mas induzindo-os em erro quanto aos propósitos da condução ao posto de autoridade34.

Inicialmente, o TEDH bastava-se com a prossecução de um dos fins enumerados no artigo 5.º para considerar a detenção legítima, não requerendo condições adicionais como, por exemplo, risco de fuga35. Não obstante, em alguns casos mais recentes, o TEDH começou a imiscuir-se no juízo de necessidade de detenção, mesmo estando em causa um dos fins

30 Caso Wilde, Ooms e Versyp, cit. 31 Caso Sanchez Reisse c. Suíça, cit. 32 Caso Chahal, cit.

33 Ac. de 18/12/1986, Bozano c. França, queixa n.º 9990/82.

34 Conka c. Bélgica, Ac. de 5 de fevereiro de 2002, queixa n.º 51564/99.

35 HÉLÈNE LAMBERT, The Position of Aliens in relation to the European Convention on Human Rights, Council of Europe Publishing, 3rd Edition, 2006, p. 20.

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expressamente mencionados. Assim, nos casos Mikolenko c. Estónia36, Popov c. França37 e

Yoh-Ekale Mwanje c. Bélgica38, o TEDH afirmou que a detenção pode não ser legítima se as

autoridades tiverem ao seu alcance medidas menos gravosas. Esta nova abordagem é de aplaudir, já que a permanência em liberdade permite aos estrangeiros terem uma posição muito mais ativa nos procedimentos referentes à sua expulsão ou entrada ilegal, e podendo ter um contacto mais próximo com familiares, reunir provas, recorrer ao apoio de ONGs, etc.

Analisemos agora com algum detalhe as detenções justificadas à luz de processos de expulsão em curso.

Os órgãos de controlo da Convenção têm interpretado de forma flexível a exigência de um “procedimento de expulsão ou extradição em curso”.

A ComEDH havia já afirmado que não era necessária a emissão prévia de uma ordem ou decisão formal de expulsão para a detenção ser legítima39. No mesmo sentido, o TEDH considerou que a al. f), do art. 5.º, da CEDH, apenas exigia que estivesse já a ser tomada ação no sentido de se proceder a expulsão do estrangeiro40. Assim, a detenção será justificada mesmo que ainda não exista uma ordem formal de expulsão eficaz. No entanto, ela deixará de ser justificada se os procedimentos tendentes à expulsão ou extradição do estrangeiro não forem conduzidos com a necessária diligência. Assim, se o procedimento de expulsão não for levado a cabo com a requerida diligência, a detenção pode deixar de ser justificada à luz do art. 5.º, al. f)41.

O TEDH tem, assim, firmado o entendimento de que a detenção pode ser ilegal se não existir qualquer perspetiva razoável de expulsão e as autoridades não realizarem o processo com a devida diligência42. Neste contexto, os Estados devem fornecer provas dos esforços

36 Ac. de 08/10/2009, Mikolenko c. Estónia, queixa n.º 10664/05, Ac. de 19/01/2012.

37 Ac. de 19/01/2012, Popov c. França, queixa n.º 39472/07 e 39474/07, em que se discutiu da legitimidade de detenção de estrangeiros com os filhos, de cinco meses e três anos de idade. O TEDH considerou que, embora os recorrentes tenham sido instalados com os pais numa ala reservada às famílias, a sua situação específica não tinha sido tida em conta e as autoridades não procuraram determinar se era possível prever uma solução alternativa à detenção administrativa.

38 Ac. de 20/12/2011, Yoh-Ekale Mwanje c. Bélgica, queixa n.º 10486/10. No caso, o TEDH considerou não se ter demonstrado a necessidade de detenção de uma cidadã camaronesa, em estado avançado de infeção por HIV.

39 Ac. de 06/10/1976, Lynas c. Suíça, queixa n.º 6871/75.

40 CasoConka c. Bélgica, cit. e caso Saadi c. Reino Unido, cit. Sobre este ponto, v. ainda H

ÉLÈNE

LAMBERT, op. cit.

41 Nesse sentido, várias decisões da Comissão, como a decisão no caso Lynas c. Suíça, de 06/10/1976, queixa n.º 7317/75, a decisão no caso Whitehead c. Itália, de 11 de março de 1989, queixa n.º 13930/88.

42 Ac. de 08/10/2009, Mikolenko c. Estónia, queixa n.º 10664/05. V., no mesmo sentido, a Ac. de 26/07/2011, M. e outros c. Bulgária, queixa n.º 41416/08.

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envidados para assegurar a admissão das pessoas expulsas, por exemplo nos casos em que as autoridades do Estado recetor sejam particularmente morosas na identificação dos cidadãos43. Esta jurisprudência está, aliás, em consonância com o entendimento de que as várias tentativas de expulsão de estrangeiros podem constituir, em si, tratamentos desumanos e degradantes. Não podendo ser expulso, o estrangeiro deve ser reposto em liberdade.

Por outro lado, a dependência da detenção em relação ao procedimento de expulsão ou de extradição não vai ao ponto de o TEDH considerar que, se a medida de expulsão ou de extradição vierem posteriormente a ser declaradas ilegais, ou revogadas, isso tem influência retroativa sobre a legalidade da detenção44. A solução já será diferente, porém, se as autoridades tinham a consciência desde início que se encontravam a transgredir a legislação em vigor e, em particular, se a sua decisão inicial se encontrava viciada de desvio de poder. Nesse caso, viciado o procedimento de expulsão / extradição, a detenção será também considerada ilegítima.

Por fim, a detenção pode ainda visar impedir a entrada irregular de um estrangeiro no território. No caso Saadi, o TEDH debruçou-se pela primeira vez sobre a interpretação da primeira parte da alínea f), do n.º 1, do art. 5.º, da CEDH, entendendo que a entrada de um estrangeiro deve ser considerada ilegal se o Estado não tiver autorizado a mesma45. Esta medida de detenção deve também ser aplicada com especial cuidado, uma vez que os estrangeiros em causa, apesar de deterem um estatuto ilegal, podem ser pessoas carecidas de proteção internacional. Nesse caso, o acompanhamento da medida de detenção revestir-se-á da maior importância.

1.2.5. As condições da detenção em si também estão sujeitas a escrutínio por parte dos

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