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3. A Prática Pedagógica do PROEJA

4.6. Análise dos Dados das Entrevistas

4.6.2. Descrição e Interpretação dos Dados

4.6.2.9. Descrição e Interpretação dos Dados da Nona Entrevista

A última entrevista, que durou onze minutos e trinta e nove segundos, foi realizada, numa sexta-feira2, com D9, 43 anos, solteira, com três filhos. Ela é auxiliar de escritório,

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Às sextas-feiras à noite, geralmente, há menos alunos nas salas e as aulas encerram mais cedo quando falta algum professor. Neste dia foi o que ocorreu; mesmo assim, a discente se dispôs a participar da entrevista sem pressa.

trabalha das sete às dezoito horas e cursa o quarto período de Mecânica. Concluiu o Ensino Médio em 1987; portanto, passou mais de vinte anos fora da escola.

D9 diz que se sente muito feliz em participar do PROEJA pela oportunidade de ter sido aprovada no vestibular. Relata que o seu filho a inscreveu, e a incentiva, porque ele fez o curso sequencial e gostou. Surpreendeu-se consigo mesma porque não achou que seria aprovada, e não só o foi como ficou na sétima colocação.

Questionamos sobre quais as situações que D9 considera mais significativas na sua atuação como aluna do PROEJA, e ela responde que é a força de vontade de estudar depois de tanto tempo e descobrir que a sua ―mente não apagou, que continua firme‖. Dessa forma, tem se dedicado ao máximo ao aprendizado e quer aprender mais.

Sobre os novos conhecimentos aprendidos, perguntamos-lhe quais ganham maior destaque na vida dela e por quê. Disse-nos, então, que ainda não havia começado a cursar as disciplinas técnicas, somente Desenho Técnico, Modelagem, mas que já aprendera muita coisa nova, como medidas e aparelhos, na aula de Micrologia. Destaca que o mecânico trabalha com milímetros e não com centímetros, como costumamos usar no dia a dia, e que já estava se adaptando à nova forma de trabalhar. Não considera, pois, haver um confronto de conhecimentos, mas aprendizado de outra forma de trabalhar.

Questionamo-la sobre o que sentia diante desse aprendizado, e ela assim nos respondeu: ―muito feliz pela oportunidade de aprender‖, é de se ―sentir viva‖, o que a faz ter vontade de querer mais, ―como fazer outros cursos, não só um superior, mas cursos técnicos‖. Conta-nos que já está inscrita no curso de uma semana de hidráulica e que não tem perdido oportunidade alguma. Também nos diz que está inscrita no PROMINP e que será montadora, se for aprovada na seleção.

Ao indagarmos sobre o que D9 considera positivo no que passou a fazer e/ou a sentir que está ligado diretamente à sua participação no curso, ela confessou que passara a estudar mais e a ter mais vontade de buscar mais conhecimentos, pois passara muito tempo, embora estudasse em casa, preparando-se para concurso.

Quanto ao que considera negativo, D9 faz referência ao cansaço que, segundo ela, havia dobrado, pois exerce uma função ―agitada‖ e tem um dia muito cansativo. Como trabalha com números, o cansaço, diz ela, é físico e mental, agravado pela questão de transporte, que a deixa exausta para aprender. Também lamenta o fato de ter se afastado da sua família e o pouco lazer que tem tido.

Em relação ao que mais lhe inspira confiança no curso, D9 declarou que são ―os bons professores‖, pois eles são bastante preparados, e a maioria deles está disposta a ensinar. ―Eles

ensinam com vontade de que o aluno realmente aprenda‖, avalia. Considera que, em relação ao conhecimento, todos os professores são bons, mas que faltam muito às aulas e deixam as turmas sem atividades, o que considera prejudicial, ―pois fica uma lacuna aberta‖, queixa-se ela.

Perguntada sobre o que modificaria no curso, D9 ponderou que, até aquele momento, nada tinha de que se queixar. Sobre o início do estágio, disse-nos que seria a partir do quinto período. Então se lembrou de que há problemas quanto à oferta do estágio para as mulheres, pois, na sua sala, os homens estavam estagiando, mesmo sabendo que esse estágio não comporá a agrade curricular. Acredita que essa dificuldade não é devida ao IFPE, mas às empresas. Observando o que dissera, lembra, então, que, se existe parceria do Instituto com as empresas, ele poderia intervir a fim de resolver esse problema. Perguntamos-lhe se realmente existe essa parceria, e ela explicou que as empresas solicitam os estagiários e o quadro de estágio é feito no Instituto.

A discente planeja cursar o nível superior, aprimorar-se a cada dia em relação aos estudos, para dar uma condição melhor de vida aos seus filhos. Ela considera-se bastante feliz e atribui parte dessa felicidade ao fato de ser aluna do PROEJA. Não quis falar mais além do que lhe foi perguntado e declarou ter-se sentido bem e espontânea em participar da entrevista.

Apesar de estar no quarto período, D9 mostra-se a par de situações, como a do estágio, que passam a fazer parte das preocupações dos discentes do quinto período. D9 consegue, ao ser indagada sobre suas atitudes e emoções, analisar que começou a estudar mais depois que passou a cursar o PROEJA e considera isso bom porque a faz se sentir viva, capaz.

Quanto aos novos conhecimentos, entende que eles podem substituir os antigos pela necessidade de aprender uma forma diferente de trabalhar, ou seja, entende que, quando os conhecimentos anteriores já não dão conta do que se faz, é necessário acionar os novos.

D9 mostra-se ciente das dificuldades que existem no curso quanto ao estágio e à postura de alguns professores, mas isso não a desamina, e ela aproveita a oportunidade buscando aprender mais.

Sua postura nos remete à de D7 e à de D2, que se referem ao PROEJA como uma oportunidade para que o discente dê continuidade aos estudos.

Conforme podemos observar, de uma forma geral, os participantes mobilizaram o ser em busca da escola. Desejaram fazer determinado curso e empreenderam esforços para atingir o nível exigido para ―passar no vestibular‖, que lhes permite a entrada. Tal mobilização já denota uma capacidade de ressocialização, pois percebemos em todos os discentes o empenho cognitivo em saber mais sobre o mundo; a ação interventiva de tentar uma mudança de

condição intelectual e social não só deles, mas também da família; além de uma compreensão de que são responsáveis por si mesmos, pelo próprio sustento e desenvolvimento. Durante o curso, conciliar aspectos, nem sempre convergentes, de ordem pessoal, familiar, profissional e até escolares, para não desistir de estudar, demonstra mais ainda essa possibilidade.

Contudo, buscamos as mudanças de atitudes e de emoções mais especificamente ligadas aos conhecimentos adquiridos no curso, transformações que possam revelar aspectos enriquecedores na vida desses discentes. Em outras palavras, procuramos a recognição que propicia a reinvenção, à qual Souza (2007) chama de ressocialização, processo que a todo momento podemos vivenciar, desde que mobilizemos nosso pensamento de forma adequada, para sentirmos e agirmos também de forma adequada. A forma adequada de pensarmos, agirmos e sentirmos é a humana.

Apesar de a escola não ter como proposta ensinar a ―pensar bem‖, há possibilidade, por conta das próprias estruturas pessoais internas e das possibilidades externas oferecidas, de que a ressocialização ocorra, quando o ser começa a mostrar a sua autonomia no sentido de agir, sentir e perceber as implicações decorrentes dessas mudanças (QUINTÁS, 2004, p. 35). Quando o ser começa a investigar e a querer entender o seu próprio mundo, as suas capacidades e limites para uma intervenção consciente, certamente se pode dizer que ocorre ressocialização.