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O desdobramento da posse

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2 A ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA NO BRASIL

2.5 O desdobramento da posse

Pelo demonstrado anteriormente, a propriedade do bem alienado fiduciariamente em garantia ficará com o credor fiduciário, em caráter resolúvel e limitado aos termos da avença firmada, porém, em relação à posse, haverá o seu desdobramento em direta e indireta.

Apenas para demonstrar com mais clareza o que representa o desdobramento da posse, cita-se o exemplo da locação, em que o locatário, que não é proprietário do imóvel, passa a exercer a posse direta, podendo usar, gozar e fruir do mesmo, e, o locador, proprietário pleno do imóvel, a posse indireta.

Segundo o CC, art. 1.196, ³considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o

exercício, pleno ou não de algum dos poderes inerentes à propriedade´. Na alienação

fiduciária em garantia tanto o credor quanto o devedor exercem estes poderes, sendo atribuído ao primeiro a posse indireta e, ao segundo, a posse direta da coisa.

É o que estabelece expressamente o art. 1.361, § 2º, do CC, o caput do art. 66 do Decreto-Lei nº 911/69 e do art. 23, da Lei nº 9.514/97.

Assim, admite-se na alienação fiduciária em garantia o conceito de graduação vertical da posse, assumida pelo direito civil brasileiro, já que não há anulação de uma posse em detrimento da outra17.

16 Art. 7º Os bens e direitos integrantes do patrimônio do Fundo de Investimento Imobiliário, em especial os

bens imóveis mantidos sob a propriedade fiduciária da instituição administradora, bem como seus frutos e rendimentos, não se comunicam com o patrimônio desta, observadas, quanto a tais bens e direitos, as seguintes restrições: I - não integrem o ativo da administradora; II - não respondam direta ou indiretamente por qualquer obrigação da instituição administradora; III - não componham a lista de bens e direitos da administradora, para efeito de liquidação judicial ou extrajudicial; IV - não possam ser dados em garantia de débito de operação da instituição administradora; V - não sejam passíveis de execução por quaisquer credores da administradora, por mais privilegiados que possam ser; VI - não possam ser constituídos quaisquer ônus reais sobre os imóveis.

17 Art. 1.197 A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito

pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto.

Também não há que se admitir o fiduciante como mero detentor, pois ³considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse

em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas´ (CC, art. 1.198). A posse do

fiduciante é exercida em seu nome e poderá, inclusive, se defender das investidas do próprio credor fiduciário à coisa alienada fiduciariamente.

Como a posse direta permanece com o devedor fiduciante, é ele quem responderá pelos custos necessários à sua manutenção, como impostos, taxas; de igual forma, responderá por danos que o mau uso do bem causar a terceiros.

A posse indireta assegura ao credor fiduciário o direito de fiscalizar a forma com que o devedor fiduciante usa o bem objeto da garantia, já que o uso indevido ou o mau uso lhe diminuirá o valor, razão pela qual o seu crédito poderá ficar sem a garantia correspondente.

Em se tratando de coisa imóvel, terá o credor fiduciário, como decorrência da posse indireta por ele exercida, o direito a ser nela reintegrado, quando restar configurado o

inadimplemento contratual do devedor fiduciante, conforme art. 30 da Lei nº 9.514/9718.

Orlando Gomes ensina que:

Tem o fiduciário, por conseguinte, posse e, na condição de possuidor, pode usar os remédios possessórios.

A posse direta do fiduciante se exerce enquanto pende a condição. Durante esse período, tem ele o exercício limitado de poderes inerentes à propriedade, mas sua posse não anula a do fiduciário (GOMES, 1975, p. 87).

Se o fiduciante cumprir integralmente o que foi ajustado, ele passará a deter não só a posse direta, mas, também, a propriedade plena do bem. Neste momento, o credor fiduciário deixará de exercer a posse indireta e perderá, também, a propriedade resolúvel, que se resolverá em decorrência do adimplemento contratual.

Como salienta Viegas Lima:

Caso haja o adimplemento da obrigação e o consequente retorno da propriedade fiduciária ao devedor fiduciante, o credor fiduciário, embora proprietário sob a forma limitada, nunca terá tido as faculdades de usar e perceber os frutos da mesma (LIMA, 2010, p. 88-89).

Por outro lado, se o devedor fiduciante deixar de cumprir a obrigação principal, o credor fiduciário terá o direito de exercer sobre o bem alienado fiduciariamente em garantia

18 Art. 30 É assegurada ao fiduciário, seu cessionário ou sucessores, inclusive o adquirente do imóvel por força

do público leilão de que tratam os §§ 1° e 2° do art. 27, a reintegração na posse do imóvel, que será concedida liminarmente, para desocupação em sessenta dias, desde que comprovada, na forma do disposto no art. 26, a consolidação da propriedade em seu nome.

não só a posse direta, mas, também, a propriedade, que não será plena, em razão da obrigatoriedade da sua venda.

O desdobramento da posse, presente na alienação fiduciária em garantia, faz com que tal forma de garantia afaste-se das outras modalidades de garantia real previstas no CC, penhor e hipoteca, já que nestas, a posse e a propriedade permanecem com o devedor que grava o bem com um ônus em favor do credor, e, naquela, ocorre a transferência da propriedade e o desdobramento da posse indireta da garantia em nome do fiduciário.

Assim, na hipoteca e no penhor, a garantia do credor se dá em relação à coisa alheia de propriedade do devedor, e, na alienação fiduciária, a garantia se dá sobre a coisa que lhe pertence, ainda que em caráter resolúvel e limitado.

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