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O direito eventual

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2 A ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA NO BRASIL

2.6 O direito eventual

O CC, arts. 130 e 1.365, parágrafo único, e também a Lei nº 9.514/97, art. 26, § 8º, utilizam a denominação de direito eventual no lugar daquela cunhada por Pontes de Miranda e, também, utilizada por Lima (2010, p. 167), direito expectativo, no sentido de evitar relacionar o mesmo com as expectativas de direito.

Segundo Venosa,

O direito eventual é direito incompleto, que pode ter vários aspectos. O direito eventual é direito futuro, pois depende de um acontecimento para completar-se, mas já apresenta características embrionárias, isto é, em alguns de seus elementos. Trata- se de relação jurídica ainda incompleta(VENOSA, 2003, I, p. 378).

E prossegue o doutrinador: ³a expectativa de direito é mera possibilidade ou simples

esperança de se adquirir um direito´.

Diante dessas definições, é possível identificar nos contratos que estabeleçam a alienação fiduciária em garantia, que o devedor fiduciante tem um direito, eventual ou expectativo, de receber em sua propriedade, de forma plena e ilimitada, o bem que servia de garantia, no momento em que cumprir a sua parte na avença.

O direito eventual do devedor nasce no momento em que firma o contrato, transferindo a propriedade fiduciária ao credor, sendo estabelecido o modo e a forma que lhe será transmitida a propriedade, uma vez configurado o adimplemento contratual. Não há necessidade, como ocorre na expectativa de direito, de qualquer manifestação do credor para

que a propriedade lhe seja transferida, basta o cumprimento da obrigação e, pronto, a propriedade retornará ao patrimônio do fiduciante sem qualquer ônus.

Assim, se ocorrer o adimplemento contratual, ou seja, verificada a condição, não terá o credor fiduciário qualquer outro direito sobre a coisa alienada e nem como se opor quanto ao retorno da propriedade plena ao patrimônio do devedor fiduciante, que, naquele momento, não será mais devedor, conforme previsto, por exemplo, no art. 25 da Lei nº 9.514/97.

Tratando do direito expectativo na alienação fiduciária em garantia de coisa imóvel, Terra leciona que:

Este direito expectativo do devedor (fiduciante) tem natureza de direito subjetivo, na categoria de direito real à aquisição, dispensada qualquer outra manifestação de vontade do atual proprietário, o credor (fiduciário); preenchidos os requisitos legais pelo devedor (fiduciante), nada impede que se torne pleno proprietário. [...]

É direito real de garantia, pois se vincula a uma coisa, o imóvel, opondo-se a terceiros e conferindo ao devedor (fiduciante) o direito de seqüela [sic], tudo com objetivo de assegurar o cumprimento de uma obrigação; é direito real de aquisição, na exata dimensão que objetiva a aquisição de um diverso direito real, este de propriedade (TERRA, 1998, p. 39).

Tais premissas são aplicáveis também, sem qualquer ressalva, à alienação fiduciária em garantia de bens móveis.

Por tais razões, não detém o devedor fiduciante direito sobre a propriedade, que foi transferida em caráter resolúvel ao credor fiduciário, mas tem direito real expectativo de garantia e direito real expectativo de aquisição e, em relação aos mesmos, poderá dispor da melhor forma que lhe convier, inclusive com a dação em pagamento, em favor do próprio credor fiduciário, ou a transferência a terceiros. Além de dispor, como melhor entenda, do seu

direito expectativo, ³ao titular do direito eventual, nos casos de condição suspensiva ou

resolutiva, é permitido praticar os atos destinados a conservá-lo´ (CC, art. 130), podendo defender a posse direta contra quem a turbar, inclusive contra o credor fiduciário.

Se o devedor fiduciante optar por transferir o direito expectativo, o que deverá ser objeto de registro, de acordo com a natureza da garantia, de anuência pelo credor fiduciário e de recolhimento de imposto de transmissão inter ivos, se for imóvel, as obrigações resultantes da avença principal serão transmitidas ao cessionário, que passará a figurar como novo devedor fiduciante. Também poderá buscar o direito de receber a propriedade plena em seu patrimônio, junto a qualquer pessoa que o credor fiduciário tenha transferido o crédito e a propriedade resolúvel, o que ocorrerá, com maior frequência, nos contratos com alienação fiduciária em garantia de coisas imóveis, sendo que a cessão de crédito, que obrigatoriamente

acompanhará a garantia, poderá ser realizada sem a anuência do devedor fiduciante (Lei nº 9.514/97, art. 35).

Viegas de Lima menciona os ensinamentos de Pontes de Miranda, e sintetiza:

Para Pontes de Miranda, enquanto pendente da condição resolutiva, o devedor fiduciante é titular de um direito expectativo a adquirir, de imediato, a propriedade, uma vez verificada a condição. Sendo assim, desde o momento em que há o adimplemento da obrigação principal, o devedor fiduciante tem o direito a novamente ver a propriedade fiduciária transmitida a seu favor, sob a característica de propriedade plena. Isto decorre do próprio delineamento que a doutrina faz sobre o direito expectativo, encarando-o como um direito integrante do patrimônio do expectante, que uma vez cumprida a condição se consolida na sua plenitude. É direito que possui conteúdo patrimonial ± embora pendente de maior ou menor probabilidade de sua realização ±, sendo, portanto, transmissível entre vivos ou causa de morte, da mesma forma que dos direitos plenos em geral (LIMA, 2010, p. 168).

Embora não seja possível constituir uma alienação fiduciária em garantia em segundo grau, como acontece com a hipoteca, é possível ao devedor fiduciante contratar uma nova dívida, oferecendo como garantia a propriedade superveniente que terá no momento em

que adimplir o contrato anterior (CC, art. 1361, §3º)19, ou seja, cumprida a condição

suspensiva da transmissão da propriedade definitiva.

Aqui, ressalva-se que a nova garantia terá eficácia somente com o registro da nova propriedade fiduciária que, obrigatoriamente, deverá ser precedida da averbação de quitação

da primeira dívida, conforme art. 1.420, § 1º, do CC20.

Ao se ter um valor patrimonial, é possível realizar, em relação ao direito eventual, qualquer operação que se faça com os direitos plenos, de forma que é possível, inclusive, a constrição de tais direitos para pagamento de débitos do devedor fiduciante perante terceiro exequente, conforme será demonstrado a seguir.

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