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PARTE II PERCURSO METODOLÓGICO E EMPÍRICO

CAPÍTULO 1 DESENHO DO ESTUDO

1. Introdução

Iniciamos a segunda parte da investigação com a concretização do desenho do estudo e sua operacionalização, tendo em conta a problemática em questão e a multiplicidade de dimensões relacionadas.

Os objetivos e os métodos associados às diversas etapas implementadas para a construção da Mental Health Literacy Scale serão apresentados de seguida. Contudo, antes de nos debruçarmos sobre o desenvolvimento do estudo, será importante clarificar melhor a motivação para a sua realização.

Se considerarmos que é na adolescência que a prevalência as perturbações mentais atinge um dos seus picos mais significativos e que os adolescentes são o grupo que menos uso faz dos serviços de saúde, mesmo em situações graves de doença mental que necessitem de apoio e ajuda especializada, a utilização de instrumentos de medida fidedignos e eficazes para avaliar a LSM nos seus diversos componentes, pode contribuir para que se alcance uma melhor compreensão dos fatores envolvidos, sobretudo ao nível da capacidade de reconhecimento dos problemas e dos comportamentos de procura e oferta de ajuda, permitindo definir e implementar estratégias específicas de promoção da LSM e, assim, contribuir para a deteção precoce e intervenção atempada.

Partindo deste pressuposto, a motivação para a realização deste estudo resulta da conjugação de diversos fatores: (i) em Portugal não existem instrumentos específicos para avaliar a LSM em adolescentes, criados de raiz com esse objetivo, e adaptados à nossa especificidade cultural; (ii) os instrumentos que existem a nível internacional e que têm sido utilizados nos escassos estudos realizados em Portugal, após serem sujeitos a processos de adaptação e validação para a nossa população (e.g. QuALiSMental, Loureiro, 2015; Loureiro et al., 2012a), não são específicos para adolescentes; (iii) pela sua dimensão, estes instrumentos são difíceis de utilizar, dificultando a adesão aos estudos e comprometendo a sua validade; e (iv) muitos dos atributos avaliados não têm uma relevância significativa para o foco principal da intervenção de enfermagem, ou seja, a promoção dos comportamentos adequados de procura e oferta de ajuda e da capacidade de reconhecimento das perturbações.

Assim, pelo exposto, consideramos importante a construção de um instrumento robusto, fiável, de utilização fácil, e que avalie os componentes mais importantes da LSM, incidindo sobre as perturbações mais frequentemente observadas em adolescentes, permitindo ao enfermeiro avaliar necessidades em cuidados de saúde e delinear intervenções dirigidas à promoção da saúde mental dos adolescentes.

2. Delineamento do estudo

Trata-se de um estudo metodológico, no qual as técnicas de investigação e análise do fenómeno podem ser definidas como de natureza qualitativa e quantitativa. Este tipo de pesquisa investiga os métodos de obtenção, organização e análise de dados, encarregando-se da elaboração, validação e avaliação dos instrumentos e técnicas de pesquisa (Polit & Hungler, 1995).

Utilizou-se uma abordagem mista com metodologias qualitativas (focus group e painéis de peritos) para desenvolvimento do instrumento e metodologias quantitativas para avaliação das suas propriedades psicométricas. Os dois métodos de análise são úteis porque se dirigem para diferentes tipos de questões. Tashakkori e Teddlie (1998) referem que as técnicas quantitativas e qualitativas poderão ser usadas sequencialmente ou paralelamente, assumindo um estatuto igual ou diferente em função dos objetivos e questões de investigação, sendo usadas na mesma fase ou em fases distintas de um mesmo estudo.

Dada a necessidade de obtermos respostas a indicadores precisos que sustentem as intervenções de enfermagem, sobretudo ao nível da promoção da LSM e do investimento em competências no domínio da saúde mental, decidimos considerar unicamente alguns dos componentes do conceito: ‘reconhecimento das perturbações’; ‘comportamentos de procura de ajuda, recursos, barreiras e facilitadores’; ‘crenças e intenções para prestar a primeira ajuda’, e associámos uma subescala que avalia um componente fundamental, relacionado com a ‘importância dos estilos de vida e comportamentos de saúde’ como fator determinante de saúde mental, também ele associado ao conceito de LSM, na sua definição mais recente: “public's knowledge of how to prevent mental disorders” (Jorm, 2012).

Considerando que um dos problemas principais da utilização de escalas de autopreenchimento diz respeito à desejabilidade social inerente aos dados recolhidos (Prieto-Úrsua, 2006), ou seja, a tendência para assinalar respostas de acordo com o que é mais aceitável ou socialmente expectável, sobretudo quando são abordadas questões sensíveis como a saúde/doença mental e o estigma, ou quando se usam populações com

Amorim Gabriel Santos Rosa

vulnerabilidades específicas, como é o caso dos adolescentes, neste estudo optou-se então pela utilização de vinhetas clínicas como estímulo para as questões relacionadas com três das cinco subescalas. Esta estratégia, ao retirar o foco do participante para o centrar noutra pessoa, permite que as respostas se aproximem mais do que seria o seu comportamento em situações reais, o que se torna muito vantajoso.

3. Objetivos

Este estudo tem os seguintes objetivos:

 Construir um instrumento de avaliação da LSM em adolescentes;  Verificar a sua estrutura interna por meio da análise fatorial;

 Realizar o estudo de precisão através da verificação da sua consistência interna;  Buscar evidência de poder discriminativo de grupos, relacionado com algumas

variáveis sociodemográficas.

Para operacionalizar a descrição dos procedimentos que foram executados de forma a atingir os objetivos definidos, a presente investigação desenvolve-se em três estudos que integram cinco etapas que passamos a explicitar de forma sumária, sendo cada uma delas explicada de forma mais pormenorizada à medida que forem sendo apresentados os diferentes estudos.

3.1. Delimitação dos objetivos específicos de cada etapa

Na primeira etapa foi feita uma revisão dos estudos realizados com amostras de adolescentes sobre reconhecimento das perturbações e procura de ajuda em saúde mental, visando sistematizar o conhecimento atual sobre LSM neste grupo específico. Com esta medida pretendemos recolher os contributos teóricos acerca do tema e conhecer as metodologias utilizadas para a sua avaliação, nomeadamente no que respeita às caraterísticas dos instrumentos utilizados, bem como os resultados produzidos, de modo a podermos avançar para as etapas seguintes.

Esta etapa corresponde ao ‘Estudo I’ cujos métodos e resultados apresentamos em capítulo subsequente deste relatório.

A segunda etapa teve como objetivo construir e validar o conteúdo das vinhetas clínicas utilizadas nas três escalas que compõem o instrumento. Nesta etapa, as vinhetas construídas foram sujeitas a um processo de validação, sendo submetidas à consulta de peritos através da realização de um painel Delphi.

A terceira etapa compreendeu o pré-teste das vinhetas e a exploração dos componentes da LSM em estudo, de forma a construir os itens integrantes do instrumento. Para o cumprimento desta etapa realizaram-se três focus group de adolescentes. Esta etapa corresponde ao ‘Estudo II’.

A quarta etapa consistiu na construção e pré-teste do instrumento. Tendo por base os resultados da exploração das dimensões da LSM realizada na etapa anterior; a síntese dos resultados do ‘Estudo I’, sobretudo no capítulo das competências para prestar a primeira ajuda; e uma revisão de literatura sobre estilos de vida e comportamentos de saúde, foram construídas as três escalas que, posteriormente, foram sujeitas ao processo de verificação das propriedades psicométricas. Para o pré-teste formaram-se dois painéis de adolescentes (N=15), estudantes do ensino secundário público, com frequência do 10º e 11º ano, que permitiram testar sequencialmente duas versões do instrumento.

A quinta e última etapa teve como objetivo a avaliação das propriedades psicométricas do instrumento em termos de validade e fidelidade. Após a identificação dos itens, a construção do instrumento e consequente aplicação, foi necessário realizar a sua análise técnica. Esta etapa corresponde ao ‘Estudo III’.

Na figura 2 podemos observar a representação esquemática das cinco etapas do estudo, explicitadas de acordo com uma estrutura organizadora que considera as diferentes abordagens metodológicas utilizadas e o facto de os resultados de cada etapa terem implicações para a etapa seguinte e para a análise final.

Figura 2. Representação esquemática das etapas do estudo

Interpretação conjunta para a análise final

Análise de

conteúdo estatística Análise Revisão dos estudos realizados com amostras de adolescentes Construção e validação do conteúdo das vinhetas Pré-teste das vinhetas e exploração dos componentes da LSM Construção e pré-teste do instrumento Avaliação das propriedades psicométricas do instrumento Qualitativo Qualitativo Painel Delphi Qualitativo

Focus group Questionário Quantitativo

Amorim Gabriel Santos Rosa

CAPÍTULO 2

No documento Literacia em saúde mental em adolescentes (páginas 89-93)