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DESENVOLVIMENTO DAS VINHETAS CLÍNICAS

No documento Literacia em saúde mental em adolescentes (páginas 107-111)

PARTE II PERCURSO METODOLÓGICO E EMPÍRICO

CAPÍTULO 3 DESENVOLVIMENTO DAS VINHETAS CLÍNICAS

Nesta etapa do trabalho foram construídas e validadas três vinhetas clínicas das perturbações psiquiátricas pré-definidos (depressão, ansiedade e abuso de álcool), tendo por base os critérios DSM IV-TR (APA, 2002) e CID-10 (WHO, 1992).

Vinhetas são descrições, geralmente narrativas, curtas e compactas de uma situação (real ou fictícia), concebidas de modo a avaliar as perceções, opiniões ou conhecimentos dos respondentes sobre um fenómeno que se pretende estudar; para isso, solicita-se aos respondentes para se posicionarem perante a situação apresentada (Galante, Aranha, Beraldo & Pelá, 2003). As vinhetas construídas para este estudo descrevem as histórias do José e da Inês (depressão); do Tiago e da Susana (ansiedade); e do Pedro e da Francisca (abuso de álcool).

1. Construção e validação do conteúdo das vinhetas clínicas

As vinhetas do José e da Inês (depressão) e do Pedro e da Francisca (abuso de álcool) foram adaptadas a partir da versão original do Survey of Mental Health Literacy in Young

People – Interview Version (Jorm, 2000; Jorm et al., 1997) e do QuALiSMental (Loureiro,

2015; Loureiro et al., 2012a). A vinheta da Susana e do Tiago (ansiedade) foi construída de raiz para este estudo.

As vinhetas foram posteriormente sujeitas a um processo de validação de conteúdo visando avaliar o grau com que representam os problemas em causa (Wynd, Schmidt & Schaefer, 2003). Optámos pelo método Delphi, cujo objetivo é chegar a consenso, através de um processo grupal e interativo, acerca de um assunto complexo (Sousa, Lima Basto & Mendonça, 2005).

Esta técnica de investigação qualitativa tem um conjunto de premissas que devem ser cumpridas durante todo o processo: o anonimato entre os respondentes; o envio do questionário (ou instrumento de avaliação) para cada um dos peritos, sem que haja interação entre si; o feedback (os resultados de cada ronda são devolvidos ao grupo para validação das respostas e preparação da ronda seguinte); a representação estatística da distribuição dos resultados dados pelo grupo; a interação (comunicação entre o investigador e grupo de peritos, tendo por base as respostas dadas e a expertise de cada

um; e a seleção das pessoas a integrar o grupo como um aspeto fundamental para o sucesso da técnica (Silva, Rodrigues, Silva & Witt, 2009; Sousa et al., 2005).

Como refere Justo (2005), em áreas de investigação com uma forte componente social como a saúde, a heterogeneidade é preferível à homogeneidade, na composição do painel. A multidisciplinaridade permite obter consensos preditivos mais válidos do que aqueles que seriam obtidos se o painel fosse constituído por peritos da mesma especialidade.

A seleção dos peritos, pela heterogeneidade das diferentes áreas de ação profissional a envolver no estudo, constituiu a justificação principal da escolha desta técnica.

Recorreu-se, então, a um painel constituído por sete peritos sendo dois médicos psiquiatras, dois enfermeiros especialistas de psiquiatria, um psicólogo e dois professores do ensino secundário. Tratou-se de uma amostra intencional (Turato, 2003), acedida na lógica de casos ricos em informação e composta por especialistas reconhecidos pela sua atuação nas áreas da Psiquiatria/Saúde Mental (Medicina; Enfermagem; e Psicologia), mas também na área da educação (atendendo à população-alvo do instrumento) e, portanto, capazes de contribuírem criticamente para a validação do conteúdo das vinhetas clínicas. Salvaguardou-se o anonimato dos participantes durante todo o processo.

Foi enviado por correio eletrónico um instrumento de avaliação a ser utilizado pelos especialistas durante a validação (Anexo I), contendo as três vinhetas na sua versão inicial, bem como os critérios e as definições a serem consideradas para a sua avaliação. Cada vinheta foi avaliada de acordo com três critérios: clareza do conteúdo (ortografia, coesão e coerência do texto e qualidades formais); adequação à amostra (adequação do conteúdo do texto à população alvo); adequação ao domínio (especificidade e adequação da descrição contida na vinheta relativamente à perturbação retratada).

As pontuações geradas pelo painel de peritos foram avaliadas segundo a taxa de concordância, um score que descreve a pontuação média recebida por cada conteúdo avaliado pelos especialistas (Wynd et al., 2003). No nosso estudo utilizámos uma escala de cinco pontos e considerámos aceitáveis os conteúdos pontuados com “3”, “4” e “5”. Realizaram-se duas rondas sucessivas até obtenção de consenso, considerando-se para tal, uma pontuação igual ou superior a 28 pontos em cada critério, o que corresponde a uma pontuação média de quatro pontos. Após a primeira ronda realizou-se o feedback ao grupo para validação das respostas e preparação da ronda seguinte. Foram também solicitados comentários e sugestões, sendo as vinhetas refinadas de acordo com as alterações propostas.

Amorim Gabriel Santos Rosa

De seguida apresentamos a versão final das três vinhetas clínicas.

Depressão: José e Inês

“O/A José/Inês tem 17 anos e há algum tempo que anda um pouco “abatido/a”. Nas últimas semanas tem-se sentido excecionalmente triste. Sente-se sempre muito cansado/a, mas, mesmo assim, tem dificuldades em adormecer e manter o sono. Perdeu o apetite e ultimamente tem vindo a perder peso.

Ele/Ela não consegue concentrar-se nos estudos e as suas notas têm vindo a piorar progressivamente. Tem dificuldades em tomar decisões e até as pequenas tarefas diárias parecem-lhe difíceis de realizar. A situação chamou a atenção de pais e amigos que estão muito preocupados com ele/ela”.

Ansiedade: Tiago e Susana

“O/A Tiago/Susana tem 15 anos e iniciou recentemente o secundário pelo que teve de mudar de Escola e de colegas.

Nas manhãs dos dias de escola fica ansioso/a e queixa-se de dores abdominais e dores de cabeça que desaparecem quando consegue convencer a mãe a deixá-lo/la ficar em casa. Durante o fim de semana as queixas desaparecem.

O/A Tiago/Susana tem uma longa história de dificuldades em situações sociais, sentindo- se desconfortável a conversar com novos colegas e a falar com os adultos. Quando os professores o/a questionam durante as aulas fica muito ansioso/a com medo de dar uma resposta errada e que os outros se riam dele/dela”.

Abuso de álcool: Pedro e Francisca

“O/A Pedro/Francisca é um/uma jovem de 17 anos que frequenta o 11º ano de escolaridade. No último ano começou a beber bebidas alcoólicas e embriagou-se em todas as festas ou convívios a que foi. Os pais andam muito preocupados porque o rendimento escolar do Pedro/da Francisca tem vindo a diminuir e tem faltado às aulas devido às “ressacas”. Um destes dias os pais foram chamados à escola porque o Pedro/a Francisca apareceu embriagado/a numa aula. Na última festa a que foi, os amigos tiveram que chamar o 112 pois ele/ela estava inconsciente”.

Amorim Gabriel Santos Rosa

CAPÍTULO 4

No documento Literacia em saúde mental em adolescentes (páginas 107-111)