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5 AS PRÁTICAS QUE DERAM ENTUSIASMO AO MEU EU REFLEXIVO

5.3 DESENVOLVENDO O SENTIDO NUMÉRICO ATRAVÉS DE SITUAÇÕES DO

Sendo assim, a tarefa de registrar, além de se ser um recurso em que as crianças põem em prática a sua linguagem matemática, de modo a refletirem sobre tal aspecto, é também um meio em que eu posso avaliar os conceitos que elas já dominam e como estão fazendo uso dessa linguagem, como também posso identificar as suas dificuldades para que, em um trabalho conjunto e mediado, possam se apropriar dessas aprendizagens.

5.3 DESENVOLVENDO O SENTIDO NUMÉRICO ATRAVÉS DE SITUAÇÕES DO COTIDIANO: A FEIRA LIVRE

Assim como precisamos ser letrados, pois vivemos no mundo em que tudo ao nosso redor necessita da escrita, logo estamos engajados em diversas práticas sociais, necessitamos também de sermos numeralizados, pois o tempo todo estamos resolvendo situações em que envolvem a Matemática. Ainda conforme o material do PNAIC (BRASIL, 2014), ser numeralizado significa

[...] ter familiaridade com o mundo dos números, empregar diferentes instrumentos e formas de representação, compreender as regras que regem os conceitos matemáticos imbricados nessas situações. Em última instância, ser numeralizado significa ser capaz de pensar matematicamente nas mais diferentes situações do cotidiano, estando associado tanto às experiências escolares como a experiências extraescolares que ocorrem antes mesmo da formalização da

matemática através de situações de ensino (BRASIL, 2014, p.

21).

Ainda trabalhando com a construção do conceito de número, busquei desenvolver uma prática na qual os alunos pudessem ter contato com uma situação do cotidiano, a fim de construir a noção de sentido numérico que, segundo definição no material PNAIC (BRASIL, 2014, p. 21), é uma habilidade na qual o indivíduo consegue lidar com sucesso os vários recursos e as situações do cotidiano que lhe são apresentadas. E como tal atividade foi pensada?

Os alunos das minhas turmas possuem livros didáticos e parte do meu planejamento deve estar organizado conforme as atividades que o material propõe. E este estava trabalhando uma das atividades econômicas extremamente comuns em nosso contexto social: a feira livre. Claro que tinha todo um contexto de porque o livro estava dispondo sobre este assunto, mas essa explicação não se aplica ao objetivo deste trabalho, que neste momento tem como foco como se deu a prática e a sua relação com a Matemática.

Pois bem, ao tratar do assunto sobre a feira livre, eu logo tive a ideia de produzir uma feira, na qual as crianças pudessem vivenciar a experiência de saber, principalmente para aquelas que nunca foram a uma, como ela é organizada, o que se vende lá, como as pessoas vendem e como e com o que as pessoas compram. Assim, produzi algumas frutas e, com as crianças, organizamos a mesa que aquelas seriam vendidas. Em seguida, perguntei às crianças com o quê que as pessoas compram as coisas em geral, e elas logo me responderam: com dinheiro. Partindo do que elas me responderam, propus para elas que criassem o seu próprio dinheirinho, assim disponibilizei alguns recortes de folha de ofício, cada criança tinha nas mãos dez recortes, no formato de dinheiro, e cada uma produziu a sua nota. Levei uns carimbos com as letras do alfabeto e cada uma quis que eu carimbasse a(as) letra(s) inicial(ais) do seu nome, como exposto na figura 8.

Figura 8 – Nota do dinheirinho elaborado pela turma

Fonte: acervo pessoal da pesquisadora.

Como observado na figura 8, a criança apenas pintou a sua notinha, porém outras que fizeram desenhos e até imitaram a nota de dinheiro original.

Deixei bem livre para que criassem como quisessem. Assim que acabaram as confecções, eu expliquei para as crianças que cada notinha teria um valor e que esse valor seria de dez reais, mas também juntamente com as notinhas eu as entreguei dez tampinhas, nas quais teriam o valor de um real cada.

Figura 9 – Tampinhas para ser utilizadas como moedas

Fonte: acervo pessoal da pesquisadora.

Com a mesinha da feira arrumada com as frutas (figura 10), coloquei os preços de cada produto e informei às crianças quanto cada uma valia.

Elas estavam bem ansiosas para brincar e usar o seu dinheirinho, foi muito motivador. Escolhemos conjuntamente um vendedor – este ficando responsável por vender as frutas e por administrar o restante do dinheirinho que seria usado para as trocas, caso precisasse. Em fila, as crianças

começaram a se organizar para comprar as frutas de sua predileção.

Lembro-me que, na maioria das vezes, as crianças conseguiram pagar apenas usando as notinhas de R$ 10, porém em algumas situações eu tive que ajudar as crianças fazendo algumas problematizações, pois para realizar o pagamento era necessário que estas pensassem um pouco em como fazer para comprar o produto desejado.

Um desses casos aconteceu com uma criança que comprou algumas frutas, dando um total de R$ 43. Como a compra era de um valor quebrado (40+3), eu resolvi perguntá-la como é que ela faria para se organizar, sabendo que estava com dez notas de R$ 10 e dez moedas de R$ 1, e pagar ao vendedor? Assim, para ajudá-la, eu registrei no quadro que uma nota era igual a R$ 10. Fui escrevendo e concomitantemente somando outros números 10, juntamente com ela, até formar R$ 40, em um processo de decomposição. Em seguida, perguntei quantas notas dessas seriam necessárias para formar os R$ 40 e foi então que ela me respondeu: "preciso dar quatro notas de R$ 10" e foi aí que eu continuei com os questionamentos:

só em dar os R$ 40 já paga tudo o que você comprou? e ela me respondeu:

“Não paga. Fica faltando R$ 3”. E eu seguir: e como você pagará os R$ 3? E ela disse: “Com as tampinhas” e eu continuei indagando: quantas tampinhas você deverá dar para pagar suas compras? E ela me respondeu: “Com três tampinhas, porque cada tampinha vale R$1”.

Figura 10 – Mesinha com as frutas da feira livre

Fonte: acervo pessoal da pesquisadora.

A exploração dessa situação-problema deixa bem claro o quão foi significativo desenvolver essa atividade, e afirmo isso não somente em relação aos alunos, como também para mim mesma, já que foi minha primeira experiência com essa atividade. Embora eu tenha planejado toda a prática, as problematizações foram surgindo à medida em que as situações também foram surgindo. Assim, do mesmo modo que esse meu aluno aprendeu a desenvolver um sentido numérico por meio de uma atividade, envolvendo o dinheirinho, eu, como professora, também aprendi com as possíveis respostas que ele me deu ou poderia me dar, e aprendi a como tornar a explicação sobre esse assunto mais clara.

Ainda sobre o sentido numérico e sobre essa atividade, eu pude analisar, através de todo o processo e, mais especificamente com essa situação-problema descrita acima, que o que eu e o meu aluno desenvolvemos foi nada mais do que a realização do cálculo mental, que o material do PNAIC se caracteriza pelo fato

[...] de se operar sobre os números e não sobre os algarismos, o que favorece que o aluno não perca o significado das operações que realiza, associando sempre os números a algum referente (quantidade de dinheiro, de pessoas, de objetos, do comprimento ou altura de um objeto etc.). Através do cálculo mental são estabelecidas relações numéricas importantes que se relacionam às propriedades das operações (distributividade, comutatividade, associatividade, etc.) (BRASIL, 2014, p. 23).

Apesar de os meus alunos serem ainda da pré-escola, isso não foi um empecilho para que pudéssemos resolver algumas situações-problema que nos anos posteriores eles deverão se aprofundar. Como já havia falado em outro momento, neste trabalho, o meu objetivo com os anos finais da educação infantil é dar base para que os meus alunos saibam sobre o conceito de número e, para além disso, saibam em que contextos utilizar.

Acredito que essa atividade foi muito bem-sucedida, pois alcançamos para além dos objetivos esperados.

5.6 NOVOS DESAFIOS SURGEM: COMO LIDAR COM O ENSINO REMOTO SEM DESCARACTERIZAR O CENÁRIO EM QUE SE ENCONTRAVAM AS MINHAS TURMAS?

Ao assumir duas turmas, em uma delas já sabia que ia ser muito desafiante, pois os meus alunos estão em etapas diferentes, posso dizer que é uma turma bastante heterogênea; principalmente quando se trata de aspectos como escrita e leitura. E ainda no início do ano de 2021, no mês de março, ainda ministrando aulas presenciais, descobri que testei positivo para covid-19. Comecei com poucos sintomas, mas já foi o suficiente para eu ter que me afastar da turma e da escola, até porque tinha que proteger os meus alunos e as minhas colegas de trabalho, caso eu realmente estivesse contaminada pelo vírus. E foi com o teste realizado em laboratório que descobri que estava contaminada, permanecendo afastada por quinze dias da sala de aula.

Infelizmente, na semana que eu ia voltar para a sala de aula, o Governo do Estado do Rio Grande do Norte publicou um novo decreto emergencial e mais rígido, em combate à covid-19, devido à grande proliferação em que todo o estado se encontrava, causando um grande estado de calamidade nos hospitais públicos de saúde. O decreto determinava o fechamento dos espaços com atividades não essenciais e proibia as aulas presenciais nas escolas públicas e privadas, e nesse contexto, não retornei para a escola, não pelo ensino presencial, mas pelo remoto.

Ao acompanhar o meu trabalho, fica claro que a minha experiência em sala de aula não é de anos a fio, estou atuando somente há um ano e alguns meses e nesse curto período minha prática pedagógica se deu em um contexto presencial, ou seja, em sala de aula. Porém, devido a estes motivos expostos acima, tive contato com o novo modo de ensinar, o ensino remoto.

Vivenciei um momento contrastado por angústias e euforia. Angústias pelas várias dúvidas que passam pela minha cabeça com relação ao ensino em formato remoto e euforia por querer entender o desconhecido e tentar

fazer o melhor com esse formato. Ainda fazendo referência às angústias, minhas inquietações com relação à este ensino são: Como continuar de onde parei em sala de aula? Como trabalhar com a leitura e a escrita em um tempo bem mais curto? Como chamar atenção dos meus alunos, para que a aula não se torne enfadonha e estes não fiquem desmotivados? E principalmente como avaliar os meus alunos neste novo formato de ensino?

Neste período foram somente quinze dias, mas tentei dar o meu máximo para que os meus alunos não ficassem desestimulados, por isso procurei desenvolver atividades que fossem mais atrativas e menos enfadonhas. Durante estas duas semanas, trabalhei com dois projetos diferentes, o primeiro tinha como tema o respeito às diferenças, pois no mês de março, dia 21, comemoramos o dia internacional da Síndrome de Down, e o segundo projeto trabalhado foi a Páscoa, já que no domingo próximo seria comemorada essa data festiva. Para desenvolver esses dois projetos, eu levei várias histórias, mas com diversificação no modo de apresentá-las.

Assim, usei recursos do tipo fantoches, palitoches, teatro de objetos, além da leitura do livro por meio do livro virtual, tudo para que as crianças de familiarizassem com o assunto tratado.

Além disso, criei algumas atividades de cunho artístico que as crianças realizariam comigo durante as aulas virtuais. Para tanto, era necessário o envio de roteiros, nos quais eu informava quais seriam os materiais utilizados na aula e/ou se precisaria elaborar alguma coisa antes para apresentar na aula, já que o nosso tempo era bem curto (40 minutos de aula). Não apenas isso, como também não podia esquecer de encaixar as atividades do livro didático, pois era o material que os alunos tinham acesso por já serem os maiores da escola. Sobre esta última, uma das atividades propostas pelo livro era uma receita de bolo, na qual elas deveriam realizar no dia anterior e mostrar na aula seguinte.

O período foi curto, porém para mim foi um grande desafio.

Primeiramente, tive que aprender a mexer em recursos tecnológicos sobre os quais eu não tinha conhecimento. E, além das aulas terem que ser mais

atrativas, eu tive que lidar com a minha timidez, pois nunca gostei de ficar em frente às câmeras, mas foi uma necessidade que surgiu e eu não tinha outra opção a não ser me acostumar com elas. Esse contexto descrito acima não fazia parte da minha realidade até então, logo, para mim foi uma experiência nova.

Segundo Schön (2000), há situações, como a descrita acima, em que o profissional se depara com aquilo que “não está no manual”, devido ao fato de ser uma experiência única em sua vida, até aquele momento. Dessa forma, este se vê na obrigação de improvisar, pois o problema apresentado não pode ser resolvido pelos meios já expressos no conhecimento profissional.

“[...] Essas zonas indeterminadas da prática – a incerteza, a singularidade e os conflitos de valores – escapam aos cânones da racionalidade técnica”

(SCHÖN, 2000, p. 17).

E ainda afirma que

[...] são exatamente tais zonas indeterminadas da prática que os profissionais e os observadores críticos das profissões têm visto, com cada vez mais clareza nas últimas duas décadas, como sendo um aspecto central à prática profissional.

(SCHÖN, 2000, p. 18).

Tomando por base as minhas práticas descritas acima, na seção posterior irei contemplá-las hermeneuticamente, sendo eu a própria intérprete.

6 A ARTE DE DECIFRAR A SUBJETIVIDADE: TOMANDO PARA SI O LUGAR DE INTÉRPRETE DA PRÓPRIA PRÁTICA

6.1 IDENTIDADE DO SER PROFESSOR: EM BUSCA DA SUA COMPLEXIDADE