• Nenhum resultado encontrado

Desenvolvimento e linguagem na perspectiva histórico-cultural

No documento Elizângela Sponholz - Dissertação final (páginas 33-36)

2 Revisão de Literatura

2 REVISÃO DE LITERATURA

2.1 ABORDAGEM HISTÓRICO-CULTURAL

2.1.4 Desenvolvimento e linguagem na perspectiva histórico-cultural

O sujeito tem contato com o universo da linguagem no momento do seu nascimento, através da mediação de integrantes do grupo social ao qual pertence. Gradativamente, o mundo que cerca a criança vai sendo nomeado, ele conhece as cores, as formas, os objetos,

pessoas, seus nomes e afazeres. Aos poucos, o mundo infantil desse sujeito vai sendo preenchido por expressões, frases e verbos (VYGOTSKY, 2000).

Vygotsky considera que a linguagem representa o sistema de signos mais complexo já produzido pelo homem. De acordo com De Oliveira (1992), os signos representam formas de mediação entre o sujeito, o outro e o mundo à sua volta, criando, para este sujeito, representações mentais para objetos reais que permeiam o cotidiano e esses signos, as imagens mentais, em cada sujeito, formam-se de acordo com suas experiências sociais.

Vygotsky (2000b) acredita que a linguagem do sujeito, por utilizar-se constantemente de signos, destaca-se como uma característica humana típica, visto que os demais animais não dispõem da habilidade de processar estímulos mentais sem que estejam em sua presença e, para o homem, a linguagem dá essa possibilidade. O autor destaca, ainda, que a evolução do pensamento da criança não pode ser separada do desenvolvimento da linguagem infantil. O que significa que o desenvolvimento da linguagem faz, necessariamente, parte do processo de constituição do sujeito.

Dessa maneira, linguagem não é somente uma aquisição durante o percurso do desenvolvimento do sujeito e não está subordinada ao desenvolvimento e nem fora dele. A linguagem constitui e transforma o sujeito, mediando todo o movimento de conceitualização de mundo e de si mesmo, objetivando esse movimento, integrando e dirigindo as funções mentais nele desenvolvidas (FONTANA; CRUZ, 1997). Fontana e Cruz (1997) afirmam ainda que nessa relação dinâmica linguagem e pensamento unem-se, sendo que uma não existe sem o outro, pois uma palavra sem significado algum é apenas um som, do mesmo modo, um pensamento que não se concretiza em palavras, consome-se.

A linguagem e o desenvolvimento do pensamento são processos que estão ligados diretamente, no entanto, o percurso de ambas não é paralelo, nem uniforme, modificando-se dialeticamente durante o percurso de humanização. Destaca-se, assim, a ligação estreita estabelecida entre a linguagem e as demais funções psicológicas superiores. De modo que limitações e dificuldade ao adquirir e desenvolver a linguagem favorecem comprometimento também, no desenvolvimento do raciocínio, da atenção, da memória (VIGOTSKI, 1998):

[...]o desenvolvimento da fala segue o mesmo curso e obedece às mesmas leis que o desenvolvimento de todas as outras operações mentais que envolvem os signos, tais como o ato de contar ou a memorização mnemônica (VIGOTSKI, 1998, p. 57).

É importante destacar que, para Vygotsky (2000b), a linguagem não se restringe somente à língua falada, ao som oralizado, sendo que os surdos desenvolvem um sistema de

linguagem visual, que em nada compromete sua comunicação e seu desenvolvimento linguístico-cognitivo. A fala representa um dos modos de demonstrar a linguagem, que compreende um comportamento humano de comunicação e organização das informações em categorias, conceitos e utilização.

Nesse movimento, linguagem e pensamento unem-se, o que faz com que uma palavra não represente somente a expressão do pensamento, mas sim, um “ato de pensamento”. É através das palavras que o pensamento existe e encontra sua forma real, articulando-se de maneira ágil na prática social. O que remete ao fato de que as palavras não são formas isoladas e imutáveis, por serem produzidas em um contexto social dinâmico que reelabora os conceitos, conforme as mudanças sofridas historicamente (FONTANA; CRUZ, 1997).

A linguagem origina-se em primeiro lugar como meio de comunicação entre a criança e as pessoas que a rodeiam. Só depois, convertido em linguagem interna, transforma-se em função mental interna que fornece os meios fundamentais ao pensamento da criança (VYGOTSKY, 1984, p. 114).

Segundo Vygotsky (1998), a linguagem da criança se desenvolve em quatro fases, com características bem delimitadas.

A primeira fase diz respeito ao que o autor qualifica como “fala pré-intelectual”, caracterizada, primeiramente, por verbalizações pré-linguísticas como balbucio, risos e resmungos, que são fundamentais para o desenvolvimento mental do sujeito. Durante essa fase pré-verbal do pensamento, é a ação do outro que irá mediar a relação do sujeito com o meio, estabelecendo significações para práticas comunicativas.

A segunda fase, nomeada como “psicologia ingênua”, refere-se aos primeiros sinais de operações práticas de inteligência do sujeito. Marcada pelo uso correto da gramática na frase, essa fase é tida como um divisor de águas no pensamento lógico (VYGOTSKY, 1998).

Com a acumulação gradual da experiência psicológica ingênua, a criança passa para o terceiro estágio, que se caracteriza por signos exteriores, operações externas que são usadas como auxiliares na solução de problemas internos. É o estágio em que as crianças contam nos dedos, recorre a auxiliares mnemônicos etc. No desenvolvimento da fala esse estágio se caracteriza pela fala egocêntrica (VYGOTSKY, 1998, p. 57).

Em seguida, é possível observar a fase que Vygotsky (1998) denominou de “fala egocêntrica”. Nesta fase, o sujeito tem a capacidade de solucionar tarefas, organizar e direcionar seu comportamento com o auxílio dos signos da linguagem. Apesar do ato de falar consigo mesmo ser visto com desconfiança pelos adultos, para o sujeito é apenas a

representação do processo de internalização gradual da linguagem e uma maneira de organizar o pensamento (VYGOTSKY, 1998).

A quarta e mais elaborada fase do desenvolvimento da linguagem, foi intitulada pelo autor como “crescimento interior”. Nessa fase os processos externos são internalizados. O sujeito apresenta habilidades mentais mais desenvolvidas, usa a memória lógica e efetua ligações complexas com o uso de signos (VYGOTSKY, 1998).

Vygotsky (1984) considera que o desenvolvimento da linguagem e do pensamento se cruzam em determinados momentos da história do sujeito, seja ele adulto ou criança. Esse cruzamento produz o que o autor chamou de pensamento verbal.

Frente a tais apontamentos, fica evidente a importância de considerar que o desenvolvimento e a aprendizagem (com tudo o que isso carrega) estão em um processo constante de transformação, fazendo-se e refazendo-se a cada interação social. Esse intercâmbio possibilita o desenvolvimento intelectual.

No documento Elizângela Sponholz - Dissertação final (páginas 33-36)