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PARTE III | ECONOMIA SOLIDÁRIA, PLANEAMENTO TERRITORIAL E DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL E SOLIDÁRIO

DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL E SOLIDÁRIO

CAPÍTULO 5

DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL E SOLIDÁRIO

5.1. “Estilo” alternativo de Política Municipal

Qualquer conclusão visa demonstrar o interesse da investigação empreendida, fazendo aparecer as informações mais úteis (Quivy e Campenhoudt 1992). Neste sentido, o presente capítulo centra-se numa reflexão a dois níveis: retrospectiva das grandes linhas do procedimento seguido ao longo da Dissertação, apresentando os novos contributos para o conhecimento originados pela sua realização.

O trabalho em consideração tomou como problemática de estudo a do ‘desenvolvimento local’ e respectivas dimensões privilegiadas na acção política protagonizada pelos Municípios portugueses, a par da perspectiva de se avançar com os contornos de uma proposta “alternativa” de desenvolvimento (portanto, contrária aos paradigmas dominantes). Por conseguinte, entendeu-se o incentivo à economia solidária como a melhor estratégia para o alcançar de “territórios com projecto”, uma vez entendidos os territórios como espaços activos onde se realizam medidas e investimentos visando atingir um desenvolvimento mais solidário entre os homens e respeitador do meio ambiente, instando a que a iniciativa económica plural esteja ao serviço da realização de objectivos, mais do que individuais, da comunidade humana, segundo uma abordagem centrada na materialização de três princípios centrais: “endógeno”; “integrado”; “sistémico”.

Assim, no processo de investigação empírica levado a efeito, optámos pelo método (central) de estudo de caso, por permitir ao investigador a possibilidade de se concentrar num caso (território) específico, consubstanciando-o noutros dois métodos e técnicas, como a análise de conteúdo e a entrevista a informador(es) privilegiado(s), tendo a análise recaído no concelho do Fundão, suportada a partir do quadro teórico pré-estabelecido, na óptica da estruturação prévia de um sistema de categorias composto por 6 dimensões centrais de observação31.

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“Ambiente”; “Económica”; “Património”; “Política”; “Redes de Infra-Estruturas e de Equipamentos e Serviços Colectivos/ Públicos”; “Sócio-Comunitária”.

Com o estudo de caso realizado foi então possível concluir que a “concepção do desenvolvimento local” assumida pelo Município do Fundão (explicitamente inscrita no projecto do Plano Director Municipal) se estabelece na base de uma visão que:

i) não é integralmente endógeno, porquanto a identidade territorial e consequentemente da auto-estima da população, apenas é valorizada pela via do incremento do “património turístico” e da requalificação do “património construído”; não existe portanto uma aposta clara na activação dos “recursos não convencionais” e no acesso a “fontes de financiamento” como a mobilização integrada de poupanças, capital de risco e mecenato social, para além de ser necessário evidenciar uma atitude mais aberta e transparente face à participação das comunidades locais no processo de desenvolvimento - “empowerment comunitário”; “accountability”;

ii) é relativamente integrado, já que abrange as seis dimensões principais do desenvolvimento (ver 4.3.), mas sem possuir um cariz inovador e criativo, pois é realizado de forma hierárquica (entre aquelas dimensões e, correlativamente, sub- dimensões);

iii) é sistémico, ao conseguir contemplar as acções de desenvolvimento segundo uma inter-relação a vários níveis geográficos (nacional, regional e local).

Os resultados aferidos, a partir da análise de conteúdo realizada (ver 4.3.), permitem-nos igualmente clarificar que o Município do Fundão irá orientar a execução do seu plano director municipal, tendo em consideração cumprir com a “atribuição e competência” da promoção do desenvolvimento, a partir, sobretudo:

i) das “redes de infra-estruturas e de equipamentos e serviços colectivos/ públicos”; ii) da resolução das necessidades e aspirações individuais e colectivas dos munícipes num sentido “sócio-comunitário”, quer pela via da solvência dos “problemas sociais básicos”, quer dos de “segunda e terceira gerações”;

iii) eliminando algumas “disfunções ambientais” do território;

iv) “valorizando a natureza” através da construção de espaços públicos para lazer e usufruto da comunidade;

v) impulsionando a iniciativa privada, por via do apoio ao “sector formal da economia local”.

Interligando o contexto empírico de análise abordado neste trabalho com a hipótese de partida inicialmente lançada “os Municípios devem garantir no desenho do projecto dos Planos Directores Municipais que a promoção local do desenvolvimento se processe a partir de objectivos estratégicos coincidentes com as características estruturantes da economia solidária” e respectivo desafio - pensar os parâmetros de referência de uma filosofia de intervenção municipal capaz de ir ao encontro de um modelo de desenvolvimento local sustentável e solidário - é mister considerar que as opções estratégicas efectivamente configuradas pelo Município do Fundão no seu PDM ainda se encontram aquém (se bem que, a meio caminho) da adopção de um paradigma de desenvolvimento local não mainstream, já que: por um lado, o território concelhio necessita de possuir mais algumas pré-condições, como, p. ex., uma “cultura empresarial local com capacidade de gestão e planeamento estratégico bem definido” e a existência de “instituições públicas nacionais desconcentradas receptíveis a novas experiências”, bem como de potenciar a melhoria/ aumento do grau de apropriação local (“local ownership”) de outras, tais como as “novas formas de governança local” e o “apoio directo na promoção de emprego local”; por outro, o Município, na sua acção de política pública, pugna pelo incentivo:

i) ao “planeamento estratégico”;

ii) à “articulação das diversas dimensões do desenvolvimento” (ainda que tenha de ser feito de uma forma não hierárquica);

iii) com base numa “simbiose a vários níveis geográficos”;

iv) resolvendo os “problemas sociais básicos” dos munícipes e os de “segunda e terceira gerações”;

v) privilegiando uma abordagem inspirada no “modelo bottom-up da governança local”.

De referir, no entanto, a impossibilidade do Município do Fundão, no sentido de vir a protagonizar a operacionalização de um “outro desenvolvimento”, continuar a deixar de fora do seu PDM o conjunto dos seguintes princípios estruturantes da ‘economia solidária’:

vi) “actividade económica plural”; vii) “recursos não convencionais”;

viii) “respeito pela capacidade de carga do ambiente natural local”; ix) “coesão social;

x) “solidariedade cultural”;

A investigação empírica realizada permite enfatizar que os problemas que afectam o desenvolvimento das sociedades contemporâneas são multidimensionais, não bastando a criação de infra-estruturas ou de equipamentos para estancar o êxodo populacional e o envelhecimento local, ou para gerar emprego e atrair recursos humanos qualificados. Num sentido lato, o desenvolvimento pode ser visto como um processo complexo que tem como finalidade satisfazer as necessidades dos cidadãos desde as mais básicas às de ordem espiritual. Trata-se de um processo global de satisfação de necessidades e de realização de projectos que terá de se processar em várias dimensões, desde a cidadania, à economia e à saúde, passando pela cultura e pelos fenómenos sociais, até à habitação e ao ambiente.

As conclusões acima reforçam inclusivamente a importância de nos processos (políticas) de desenvolvimento local os Municípios avançarem com uma concepção “alternativa”32 capaz de contrariar os novos paradigmas do desenvolvimento económico (e social), que apesar de poderem produzir riqueza, geram crescentes situações de exclusão social, não resolvendo os principais problemas dos munícipes, como sejam, a título de exemplo, o desemprego e a precariedade no emprego, sendo a maioria das vezes realizados à custa da degradação ambiental e segundo uma lógica pensada e delineada num eixo colocado ao nível central (nacional).

De forma a possibilitar aos Municípios portugueses uma outra orientação no seu processo de planeamento territorial, no sentido da promoção do ‘desenvolvimento local (sustentável e solidário)’, importa salientar, como um dos primeiros aspectos a abordar pela política pública, a de que ela deve ser capaz de alcançar, antes de mais, a mudança das pré-condições internas aos territórios em que a mesma se realiza, indo para além da simples mudança na aplicação dos instrumentos de política existentes, modificando, inclusivé, os objectivos básicos da política local e as disposições dos actores nela envolvidos. Depois, deverão ser estabelecidas as metas mínimas a alcançar pelo conjunto dos projectos de intervenção, os quais terão de ser “desenhados” a partir de um recorte básico que permita uma difusão mais acelerada de um novo enfoque estratégico de desenvolvimento. Assim, os projectos a estabelecer, ao nível dos PDM’s, terão de ser: planeados; participados; inovadores; criativos; integrados; territorializados; solidários; sustentáveis.

32

Não se trata apenas de ajudar a configurar uma nova concepção de desenvolvimento, mas de contribuir para a construção de um novo “paradigma”, i.e., de uma mudança profunda no pensamento, percepções e valores que formam uma determinada visão da realidade, ajudando a compatibilizar, no mínimo, objectivos económicos e sociais ou pôr a economia ao serviço do desenvolvimento - pôr a eficiência económica ao serviço da eficácia

Neste desiderato, a perspectiva de que as características estruturantes da ‘economia solidária’ devem estar inscritas nos modelos de planeamento territorial a realizar pelos Municípios, nas dinâmicas próprias de promoção local do desenvolvimento, pressupõe: “paciência”; “preserverança”; “investimento”; “inovação”; “vontade política”. Esta última implica a aprendizagem, bem como a iniciativa cooperativa (conjunta), tendo em vista combinar as políticas públicas com as necessidades e potencialidades do território (espaço de partilha e de relações sociais identitárias).

No fundo, significa que os Municípios se abram a um novo caminho para conceberem e construírem endógenamente e solidáriamente o desenvolvimento, num contexto global em que a cultura e as práticas predominantes funcionam no sentido contrário, assentando-o em três ideias centrais - territorializado, sustentável e solidário (passagem de uma concepção mecanicista para uma visão holística e ecológica, rompendo com a visão antropocêntrica, proporcionando a reconciliação do homem com a natureza), uma vez entendidas numa lógica de interacção constante:

i) satisfazer simultâneamente as necessidades e aspirações das populações presentes (solidariedade sincrónica) sem comprometer o bem-estar das gerações futuras (solidariedade diacrónica);

ii) humanizar todas as relações sociais de integração orgânica do ser humano com a natureza, assente na formação de laços sociais de solidariedade;

iii) valorizar a tecnologia, vista como um dos factores chave do desenvolvimento, de forma a estar ao serviço de uma organização solidária de sociedade;

iv) territorializar o desenvolvimento (tornar o território o “lócus” do desenvolvimento).

CAPÍTULO 6

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