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Desenvolvimento e arte em Merleau-Ponty

PARTE II – FUNDAMENTAÇÃO

Capítulo 4 Desenvolvimento e arte em Merleau-Ponty

4.1) A criança e o desenvolvimento.

Questões como desenvolvimento, aprendizagem, conhecimento, sociabilidade e afetividade fazem parte da prática educativa e devem integrar uma compreensão ampla do processo de ensino e aprendizagem. Educadores recorrem, de diferentes formas, à psicologia. Mesmo quando não mencionam explicitamente teorias da psicologia da educação, os educadores incorporam muitas de suas noções. Nesse caso, essas noções aparecem separadas do referencial teórico em que foram elaboradas e surgem na forma de pressupostos apenas referenciados, na abordagem genérica do senso comum ou como preconceitos que norteiam as propostas pedagógicas.

O mesmo se dá no ensino de arte. Piaget é citado como referência importante em muitos estudos sobre arte e educação. Vygotsky e Wallon, entre outros autores, também são citados. Mas, muitas vezes, os estudos sobre ensino de arte, assim como as propostas pedagógicas, não explicitam as concepções de desenvolvimento e aprendizagem incorporadas, ou suas referências na psicologia da criança.

A educação que pretende uma aprendizagem efetiva considera a criança em seu próprio mundo e dialoga com a criança no universo de sua vida e de sua compreensão. O ensino de Arte, em especial, que envolve um forte componente prático e vivencial, talvez precise ainda mais dessa compreensão do mundo da criança e do adolescente, sob risco de buscar implementar um certo sentido ao processo de ensino e aprendizagem e, no entanto, o sentido vivenciado pelos alunos ser muito diferente, distanciando o processo de ensino-aprendizagem dos objetivos e dos sentidos propostos pelos educadores.

Não se pretende aqui fazer uma análise das concepções psicológicas presentes nos estudos e pesquisas em arte e educação, mas apenas explicitar as referências e noções de psicologia que norteiam esse estudo.

Serão apresentadas algumas considerações, referenciadas em Merleau- Ponty. Tais considerações buscam explicitar alguns princípios gerais para uma

psicologia em que a compreensão da criança e seu desenvolvimento possam partir do mundo e da vivência da criança, escapando à tentação de interpretar a experiência da criança com base em referências próprias dos adultos.

4.1.1 - Noção de desenvolvimento.

A questão de como as crianças tornam-se adultos é um problema central para a educação e envolve a noção de desenvolvimento. Desenvolvimento implica na coexistência de duas situações aparentemente contraditórias: movimento e permanência. A simples noção de mudança não significa necessariamente desenvolvimento. Podem acontecer mudanças superficiais e quantitativas que não configuram uma nova situação. Para que haja desenvolvimento é preciso que ocorra a dissolução da situação anterior e a constituição de uma nova situação (MERLEAU-PONTY, 1990, p.7-9).

Mas isso não basta para compreender a noção de desenvolvimento: não dizemos que uma tribo de índios que se incorporou à nossa civilização desenvolveu-se! A mudança pode ser caótica ou destrutiva e, nesse caso, não pertinente à noção de desenvolvimento. Desenvolvimento envolve a mudança de uma situação para outra em uma dinâmica de relação entre a situação antecedente e a seguinte. Envolve uma relação entre a situação anterior e a nova situação. Essa conexão entre a situação anterior e a nova situação estabelece um elemento de permanência ou continuidade, não referenciada na dinâmica e nas questões próprias da nova situação, que devem ser diferentes da situação anterior, mas no fato de que a nova situação tem uma história, isto é, constituiu-se a partir e através da situação anterior. Seu passado existe como passado constituinte do presente.

O desenvolvimento incorpora esse aspecto de continuidade, pois a situação anterior, embora dissolvida pela nova situação, não se torna inexistente. Transforma-se no passado da situação nova. Não lhe é totalmente estranha. Da mesma forma, a situação nova, que ainda deverá ser constituída, não é totalmente estranha à situação atual, pois a situação atual, através da sua dinâmica de transformação, projeta, antecipa ou prefigura a situação futura.

É essa característica de um presente que contém seu passado e projeta o futuro que permite compreender a noção de transição como elemento do desenvolvimento.

Há movimento, mudança efetiva, com o estabelecimento de nova situação que institui uma nova dinâmica de relações. Para se considerar que houve desenvolvimento não basta uma mudança apenas quantitativa, é necessário que se apresente uma nova forma, com novas relações. É preciso que exista uma nova situação e uma nova conduta, que são instituídos em um processo de transição.

Desenvolvimento é uma “noção paradoxal, pois ela não supõe nem continuidade absoluta, nem descontinuidade absoluta, ou seja, que o desenvolvimento não é nem uma adição de elementos homogêneos, nem uma seqüência de etapas sem transição” (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 7).

As transformações que caracterizam o desenvolvimento não estão subordinadas aos aspectos fisiológicos ou à aquisição de conhecimentos. É a própria vivência que configura as possibilidades de mudança:

Não é nem o corpo, nem a consciência que produz o desenvolvimento, mas é a existência entendida como o conjunto das configurações das condutas possíveis para um indivíduo num dado momento. ( MERLEAU-PONTY, 1990, p. 50)

Com isso, coloca-se a questão da ordem do desenvolvimento, isto é, o que permite que se manifeste uma certa ordem no desenvolvimento, com o aparecimento de situações semelhantes em sujeitos diferentes?

Essas situações, que se apresentam tantas vezes de forma semelhante que chegam a configurar uma normalidade ou uma fase, são assim semelhantes na medida em que ocorrem em um mundo de relações também semelhantes, um mundo que se apresenta para muitas crianças tão mais semelhante quanto mais elas vivem em um mesmo ambiente cultural, que é social e histórico.

As pessoas, os pais ou outros adultos que convivem com a criança vivem em uma cultura e através deles essa cultura chega à criança pelas das situações vividas. O papel de pai e de mãe em sua relação com os filhos é compartilhado culturalmente e institui semelhanças que estabelecem situações semelhantes no cotidiano e na história de vida das crianças.

Dessa maneira, mesmo sem ser determinado fisiologicamente, o desenvolvimento das crianças pode apresentar tantas semelhanças. E, ao mesmo tempo, tantas diferenças, pois a situação que vive a criança, mesmo num quadro geral de semelhanças culturais, nunca é idêntica. Podem ou não ocorrer certas fases ou etapas, as quais podem ou não apresentar características consideradas típicas.

A resposta à questão colocada acima, relativa ao aspecto de ordem no desenvolvimento, com isso relaciona-se com a cultura ambiente, que constitui o mundo em que a criança está imersa. A criança não se desenvolve conforme determinações fisiológicas.

Também não se trata de mero condicionamento externo. O seu meio de desenvolvimento está nos pais a sua volta – ou outros adultos – e na cultura que chega a ela através deles. Mais do que um condicionamento, esse é um processo dinâmico, em que a criança “cria seu desenvolvimento sob a direção da cultura ambiente. É pelo exercício da vida, a criação de si para si, que a criança torna-se adulto” (MERLEAU- PONTY, 1990, p. 43).

Há uma intenção, como um motivo interno, dado em uma busca, em uma projeção de uma nova situação. A criança desenvolve-se nesse assumir um comportamento cujo sucesso nem sempre está assegurado em seu organismo e que não está elaborado pelo pensamento. Ela busca, procura, interroga o mundo e identifica outros modelos para sua conduta. O desenvolvimento está nessa busca, nesse projetar-se para novas condutas que, realizadas, permitem distinguir uma nova situação e novos significados.

O meio do desenvolvimento não é pois nem o corpo – porque não poderíamos estimar o elemento interior da conduta - nem a consciência, pois não compreenderíamos como ela se integra cada vez mais. É um terceiro elemento: a estrutura total da conduta”. (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 49)

Esse terceiro elemento inclui, também, a atividade, o contexto e a situação, e a intencionalidade. A compreensão dos fenômenos de regressão, de retorno a condutas anteriores ou da falta de uma conduta nova podem dispensar o recurso a fatores externos ao próprio desenvolvimento, pois a nova conduta não precisa ocorrer em todos os aspectos do comportamento ao mesmo tempo.

Para Merleau-Ponty, as fases ou estádios de desenvolvimento não são determinantes do próprio desenvolvimento, mas ordens de grandeza, pois, mesmo sendo aproximativamente previsíveis em sua relação com fatores fisiológicos e a cultura, não têm valor para compreender o desenvolvimento da criança, referindo-se a uma visão geral da infância e não tendo utilidade para discernir o dinamismo individual do desenvolvimento.

O desenvolvimento está sempre em causa pelo projetar-se da criança no futuro. Mesmo nas paradas momentâneas em um determinado estádio atuam “mudanças quantitativas no sentido de mudanças qualitativas”, pois há uma apropriação da nova conduta. Na conduta há um aspecto de estabilização ou parada aparente que é próprio de uma certa estabilização, que envolve a busca de uma apropriação plena e da resolução de uma situação em um determinado sentido. Esse momento é, ao mesmo tempo, um momento de “latência e incubação”, pois “todo equilíbrio de pensamento contém em si mesmo um fermento de evolução” (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 11, 50 e 20, respectivamente).

Para compreender o fenômeno do desenvolvimento e as diferenças entre crianças e adultos é importante considerar o fenômeno da percepção. Não há uma compreensão que se faça isolada do mundo. A percepção de estímulos do meio não é passiva e o raciocínio lógico não é única forma de organizar a relação com o mundo. Há um campo perceptivo, no qual nada do que é percebido pode ser percebido isoladamente. Dessa forma, com ajuda da psicologia da Gestalt e apoiado na sua fenomenologia da percepção, Merleau-Ponty destaca que na própria percepção das coisas há um fenômeno de organização, um “pôr em relação” os diferentes objetos percebidos. A diferença entre perceber dois ou cinco objetos é qualitativa, pois institui- se um “[...] um fenômeno de nível, onde a impressão e a distância dos objetos são mais bem determinadas” (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 10). A percepção relaciona, transforma as propriedades do conjunto de objetos e institui diferentes níveis perceptivos. É, portanto, uma percepção ativa e dinâmica, que configura o âmbito do vivido, no qual o mundo é percebido e vivenciado com uma compreensão anterior ao raciocínio.

Há, também, no desenvolvimento das crianças, um outro aspecto, relacionado com a percepção e o conhecimento: a afetividade, que não está subordinada ao conhecimento e interfere na própria percepção. Estudos realizados em sujeitos que apresentam rigidez psicológica (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 64-67) indicaram que a sua percepção pode ser marcadamente afetada por suas características emocionais, apresentando-se, em muitos casos, dificuldades em perceber fenômenos de transição. A forma rígida e pouco afeita a perceber ambigüidades e matizes na sociedade e no relacionamento interpessoal relaciona-se com o campo perceptivo e a capacidade de perceber nuances, transições e ambigüidades visuais. Há uma relação entre o modo de viver socialmente e a maneira de perceber as coisas do mundo. Não se trata de estabelecer uma causalidade, pois não se podem separar os dois fenômenos, percepção e modo de vida, que se manifestam simultaneamente no indivíduo que se desenvolve. São fenômenos correlatos, próprios do ser em situação no mundo.

Também o desenvolvimento do conhecimento e a aquisição da linguagem estão ligados à afetividade. Estudo de casos (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 67-68) de ciúme no nascimento de irmão mostrou a aquisição simultânea de vários tempos verbais em um único dia. O nascimento de um irmãozinho, e a própria expectativa desse nascimento, obriga a criança a uma reestruturação da sua relação com o mundo. A compreensão dos tempos verbais aparece de repente, mas não do nada, nem do amadurecimento fisiológico, nem do acúmulo de informações lingüísticas, nem do desenvolvimento do raciocínio: aparece nas contingências da vida, na reestruturação do meio humano. Os tempos verbais, ouvidos nas conversas dos pais e cujas diferenças em relação aos outros tempos não eram percebidas, são agora veículos de compreensão de novas relações interpessoais. Adquirem sentido, percepção específica e uso ao mesmo tempo. Não são explicados. São, ao mesmo tempo, compreendidos e instrumentos de compreensão. São vividos. Há um aprendizado, mas não é, primeiramente, um aprendizado intelectual, mas sim uma reestruturação das relações com o outro. O desenvolvimento intelectual, nesse caso, foi impulsionado pela reestruturação das relações com o outro. Há um fenômeno de descentração, mas uma descentração vivida em uma relação com o outro e não intelectual. A inteligência aparece na relação com o mundo como um tipo de intersubjetividade. Não se trata, também aqui, de um fenômeno

de causalidade entre inteligência e intersubjetividade. Trata-se de dois aspectos do fenômeno de desenvolvimento da criança que vive a sua vida (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 68).

Para Merleau-Ponty, não é o raciocínio que determina a assimilação da língua. A criança não pensa a língua. Merleau-Ponty compreende o uso da língua pela criança como um instrumento lingüístico para relacionar-se com o mundo, para conduzir suas relações com o outro. Nesse processo, “ [...] conhecimento é efeito mais que causa” (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 64). Utilizando a língua, a criança apropria-se de uma conduta. “Aprender a falar é aprender a representar um certo número de papéis, a assumir condutas das quais se é inicialmente espectador” (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 67).

O outro tem, na psicologia de Merleau-Ponty, um papel fundamental. É na relação com o outro que a criança descobre seu próprio corpo. Ela percebe as ações do outro em seu sentido (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 71). O bebê, cuja consciência de si e do próprio corpo é ainda fragmentada, percebe muito cedo, por exemplo, o sentido do sorriso e sorri. Isso não acontece através de uma tomada de consciência do que significa o sorriso. Ela sorri por imitação e vive o sentido do sorriso como benevolência (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 70).

A rapidez e a facilidade com que isso acontece não é passível de compreensão com a utilização da noção clássica de psiquismo e sinestesia, em que as sensações são exclusivas e individuais e o corpo é apreendido exclusivamente a partir das suas próprias sensações. O outro, desse modo, só pode ser entendido com base em um complexo sistema de quatro termos em que a criança estabelece uma analogia entre o seu corpo percebido como objeto e as sensações que ela tem de seu próprio corpo, de um lado, e, de outro, o corpo do outro que ela percebe e as sensações que o outro tem de si. Por essa noção clássica, a experiência do outro e das sensações que o outro tem, só podem ser deduzidas a partir das próprias sensações (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 70). Esse entendimento é próprio do logicismo que supõe que o desenvolvimento está submetido ao pensamento e entende o indivíduo como um em si totalmente separado do outro.

Para Merleau-Ponty, a experiência do outro é, desde cedo e de forma muito mais imediata, familiar à criança que percebe a si mesma na relação com a experiência do outro. Encontra-se o outro na conduta e no sentido que é descoberto. Há um esquema de postura pelo qual a criança conhece seu corpo na relação com o outro e com o meio. Os atos dos outros podem ser interpretados imediatamente pelo próprio corpo. A imitação é expressão dessa interpretação, um apropriar-se do ato na descoberta de seu sentido.

Pela reforma da noção de psiquismo, substituída pela de conduta, e da noção de sinestesia, substituída pela de esquema de postura, o problema do conhecimento do outro pode ser resolvido; tem-se, então, um sistema de dois termos – meu comportamento, o comportamento do outro – que constituem um todo. (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 71)

A percepção do mundo e do outro permite que a criança se perceba no mundo e com o outro, um mundo em que a cultura chega até ela pelos atos do outro.

Nessa relação com o outro se destacam as relações parentais:

As relações da criança com seus pais constituem a matriz de suas relações com os adultos. Os pais são os sustentáculos, os pontos cardeais da vida infantil. Os demais adultos são eles próprios considerados como personagens parentais[...]. As relações com os pais são mais do que relações com duas personagens apenas, elas são relações com o mundo. Os pais são os mediadores das relações com o mundo. (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 132. Grifo do autor)

É na relação com os pais que se manifestam as relações sociais. As relações com os pais, que realizam o papel parental conforme ele aparece em dada sociedade, estruturam as relações da criança com o outro, tanto nas características pessoais de seus pais como nos elementos culturais. A cultura realiza a mediação entre os fatos psicológicos e os fatos sociais. Ela se expressa nas relações interpsicológicas e, na educação das crianças, em primeiro lugar nas relações parentais. As relações parentais

não são de modo algum naturais, mas relacionadas aos elementos sociais e históricos

expressos na cultura. Em cada sociedade as relações assumem formas características, imbricadas com a cultura. Isso não impede a existência de uma questão universal: os pais são, para seus filhos, a imagem de seu futuro e as crianças trazem para os pais as

imagens de sua infância. As relações entre criança e adulto são marcadas por um fenômeno de identificação.

Esse sentido de relação com o outro, que é dado na constituição psicológica da criança, indica o sentido social do desenvolvimento e uma relação entre o psicológico e o sociológico. É através dela que o cultural vai integrar a psicologia da criança (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 134-136).

A relação entre o psicológico e o sociológico no desenvolvimento da criança deve ser tratada com um cuidado especial. Os psicólogos, muitas vezes, tendem a reduzir o social ao aspecto interpsicológico, desconsiderando a presença da dimensão institucional. De outro lado, algumas análises sociológicas podem levar à considerar o homem como objeto inerte, mero joguete de relações parentais e sociais.

O fenômeno cultural constitui um fundo social e histórico que tem presença original nos fenômenos psicológicos, constituindo uma incidência anterior e posterior às relações parentais. Contém as relações parentais, sem reduzi-las a ser somente sua expressão. Essa incidência é mais do que um contexto passivo ou quadro delimitador de espaço e menos do que um poder determinante e manipulador. Presença permanente e cambiante, figura ou fundo, constituinte e constituído, as formas do fenômeno social projetam-se para as relações interpessoais e para a psicologia do indivíduo sem, contudo, determiná-las plenamente, pois também recebem, em cada contexto, a projeção dos sentidos das condutas dos indivíduos e das relações interpessoais.

Merleau-Ponty destaca que é preciso “levar em consideração os fenômenos psicológicos e os fenômenos sociais, sem todavia reduzir um ao outro” (MERLEAU- PONTY, 1990, p. 51). Destaca ainda a presença do social no psicológico:

Há invasão do social até no corporal: sinais, símbolos instituídos, lágrimas. Não se trata de reduzir o indivíduo ao coletivo, o indivíduo transforma as instituições, mas não podemos isolar numa vida individual um único fato que não seja igualmente da competência da sociologia. (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 55)

As fronteiras entre psicologia e sociologia são cambiantes e imprecisas. Mas há uma ambigüidade permanente, pois indivíduos e sociedade são fenômenos que se relacionam e se condicionam mutuamente, mas são fenômenos de totalidade que não

podem ser reduzidos um ao outro. O indivíduo é uma totalidade dentro de outra totalidade, a sociedade.

Algumas noções abordadas podem sugerir alguma semelhança, em certos aspectos, entre a concepção pontyana de desenvolvimento e outras abordagens psicológicas: o surgimento de formas novas motivadas pelas fases anteriores; a correlação indissolúvel entre maturação e aprendizagem e entre fatores fisiológicos e psicológicos; a ocorrência de fenômenos de patamares em que períodos de relativa estabilidade contêm fatores atuantes que irão produzir novas mudanças; a consideração do papel psicológico do meio cultural. Mas há uma psicologia da criança própria de Merleau-Ponty, referenciada na fenomenologia de Husserl e fundamentada na pontyana fenomenologia da percepção, que pode ser caracterizada por uma abordagem própria de três questões: da percepção, como elemento primordial da relação com o mundo e fundamental para a compreensão do conhecimento; de conduta, como elemento de integração dos fatores fisiológicos, psicológicos e sociais e que fundamentam o sentido do processo de desenvolvimento; e a importância da noção do âmbito do vivido que dispensa a noção de inconsciente e coloca inevitavelmente a conduta no mundo e na

relação com o outro. O mundo é o mundo das relações interpessoais e, também, o

mundo cultural, do social e do histórico. A conduta propriamente humana é compreendida através da noção fundamental do sentido, que estabelece uma conexão entre o passado e o futuro através da projeção, da antecipação, da finalidade. Configura- se, assim, um presente histórico, próprio e pleno de possibilidades.

Essas noções podem ajudar na compreensão da escola, da arte e das aulas de Arte e estarão presentes na pesquisa que empreendemos, manifestando-se na compreensão do pesquisador sobre os fenômenos observados. Aqui, cabe destacar que o

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