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Os sentidos das atividades realizadas pelos alunos nas aulas de Arte:

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Academic year: 2018

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(1)

Carlos Fuser

Os sentidos das atividades

realizadas pelos alunos nas aulas de Arte:

um estudo fenomenológico em uma escola

da periferia de São Paulo.

Mestrado em Educação: Psicologia da Educação

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC – SP

(2)

Carlos Fuser

Os sentidos das atividades

realizadas pelos alunos nas aulas de Arte:

um

estudo fenomenológico em uma escola

da periferia de São Paulo.

Dissertação

apresentada

à

Banca

Examinadora da Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo, como exigência

parcial para obtenção do título de

MESTRE em Educação: Psicologia da

Educação, sob a orientação da Profa. Dra.

Heloísa Szymanski.

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC – SP

(3)

Banca Examinadora

____________________________________

____________________________________

(4)

Dedico este trabalho à memória de meus avós, Carlos, Lola, Sergio e Yvette;

à Márcia, esposa e amiga, e sua filha Cecília, enteada predileta;

(5)

AGRADECIMENTOS

À Professora Doutora Heloísa Szymanski, pela orientação competente e pela confiança que em mim depositou.

Às Professoras Doutoras Maria Heloísa Corrêa de Toledo Ferraz e Laurinda Ramalho de Almeida, pelas valiosas contribuições, comentários e sugestões por ocasião da qualificação. Às Professoras Marina Marcondes Machado e Regina Célia Almeida Rego Prandini, pelas valiosas sugestões e comentários, no início da pesquisa.

Aos Professores Mestre Nilson Salvetti e Doutor Marcos Antonio Lorieri, pela confiança e apoio.

Aos participantes do programa de iniciação científica da PUC, Igor e Teresa, que me auxiliaram na entrevista coletiva com os alunos da 6a. série D.

À CAPES, que financiou essa pesquisa.

À Marlene, pelo apoio permanente de mãe, sempre indispensável, e ao Dario (in memoriam).

Ao Igor, irmão mais velho, pela importante ajuda no período que antecedeu o início deste trabalho.

(6)

RESUMO

Esta dissertação apresenta uma pesquisa sobre os sentidos que têm, para os alunos, as atividades de desenho realizadas nas aulas de Arte. Foram realizadas observações de aulas de Arte em classes do Ensino Fundamental, em uma escola municipal na periferia de São Paulo. A pesquisa incluiu conversas com alunos e uma entrevista coletiva com uma turma da 6a. série, em que os alunos produziram pequenos textos, além de entrevistas com a professora de Arte, a coordenadora pedagógica, o diretor e a vice-diretora, e, também, a observação de atividades e obras de alunos no pátio da escola.

O levantamento de dados e a análise seguiram os parâmetros da pesquisa qualitativa fenomenológica e, para a interpretação, a principal referência teórica foi a fenomenologia da existência, de Merleau-Ponty.

Concluiu-se com a verificação de que os sentidos vividos pelos alunos nas suas atividades nas aulas de Arte dizem respeito ao contexto escolar, às atitudes da professora e à criação artística como fenômeno que se configura no mundo social. Revelaram-se sentidos “antiarte”, como o sentido burocrático de desenhar para obter notas, o sentido de desenhar para evitar repreensões, além de atividades dirigidas no sentido de agredir a professora. Mas predominaram, nas atividades das crianças, diferentes sentidos identificados com a arte, tais como a busca de uma criação artística expressiva e a intenção de mostrar a obra a outras pessoas. Desvelou-se também o sentido de obter a aprovação e o acolhimento por parte da professora e de familiares. E emergiram os sentidos de aulas de arte como atividade lúdica, como preparação para uma atividade profissional, como exercício da liberdade e da revolta e, também, da atividade artística como libertação e cura de limitações e sofrimentos existenciais.

(7)

ABSTRACT

This dissertation presents a research about the meaning that have, for the students, the activities of drawing carried through in the lessons of Art. Observations of lessons of Art in Basic Education classrooms had been carried through in a municipal school in the periphery of São Paulo. The research included colloquies with students and a press conference of the researcher with a group of sixth series where the students had produced small texts, beyond interviews with the teacher of Art, the pedagogical coordinator, the director and the vice-director, and, also, the observation of activities and workmanships of students in the common area of the school.

The data-collecting and the analysis had followed the parameters of the Phenomenological qualitative research and, for the interpretation, the main theoretical reference were the phenomenology of the existence of Merleau-Ponty.

It was concluded with the verification of that the meaning lived for the students in its activities in the lessons of Art say respect to the pertaining to school context, to the attitudes of the teacher and to the considered artistic creation as a phenomenon that is configured in the social world. "Anti-art" meaning had been shown, as the bureaucratic meaning to draw to get notes, the meaning to draw to prevent rebukes, beyond activities directed in the direction attacking the teacher. But they had predominated, in the activities of the children, different felt identified with the art, such as the search of an expressive artistic creation and the intention to show the workmanship for other people. It had shown either the sense of get the approval and the shelter on the part of the teacher and familiar. And had emerged the directions of art lessons as playful activity, as preparation for a professional activity, as exercise of the freedom and the revolt and, also, the artistic activity as freedom and cure of limitations and existencial sufferings.

(8)

SUMÁRIO:

PARTE I – INTRODUÇÃO ... 1

Capítulo 1 - As aulas de Arte e a questão do sentido ... 2

1.1) O pesquisador e o ensino de Arte ... 2

1.2) Algumas dificuldades ... 3

1.3) O sentido das atividades dos alunos ... 5

1.4) A escola e o sentido vivido ... 6

1.5) Aulas de Arte, atividades de desenho ... 10

PARTE II – FUNDAMENTAÇÃO ... 12

Capítulo 2 – A história do ensino de Artes Visuais no Brasil ... 13

2.1) Desenho geométrico e neoclassicismo ... 13

2.2) A Escola Nova e a influência de Dewey ... 17

2.3) Arte como expressão na Escolinha de Arte do Brasil ... 21

2.4) O tecnicismo no ensino de Artes Visuais ... 27

Capítulo 3 – Os sentidos do ensino de Arte ... 30

3.1) Os Parâmetros Curriculares Nacionais – Arte ... 31

(9)

3.3) Fusari & Ferraz e a expressão artística na sociedade... 36

3.4) Duarte Junior e a arte na formação plena do indivíduo ... 38

3.5) Os professores de Arte ... 39

3.6) A pesquisa em ensino de Arte ... 41

3.7) Diversidade de sentidos ... 43

Capítulo 4 – Desenvolvimento e arte em Merleau-Ponty ... 47

4.1) A criança e o desenvolvimento ... 47

4.1.1- Noção de desenvolvimento ... 48

4.1.2 - A Psicologia da Criança, segundo Merleau-Ponty ... 57

4.1.3 – Merleau-Ponty e o desenho da criança ... 61

4.2) Pintura, corpo e Ser ... 63

4.2.1 – Arte, vivência e aprendizado ... 68

PARTE III – A PESQUISA ... 72

Capítulo 5 – Método ... 73

5.1) A pesquisa qualitativa fenomenológica ... 73

5.2) Procedimentos e instrumentos de coleta de dados ... 75

5.3) Análise dos dados ... 78

(10)

Capítulo 7 – A professora e a escola ... 85

7.1) O ambiente escolar ... 85

7.1.1 – Síntese dos registros de observação ... 85

7.1.2 - Tematização ... 89

7.2) Sônia, a professora de Arte ... 90

7.2.1 – Síntese das entrevistas ... 90

7.2.2 - Tematização ... 92

Capítulo 8 – As aulas de Arte e as atividades dos alunos ... 94

8.1) Mônica e o vampiro ... 94

8.1.1 – Registros de Observação ... 94

8.1.2 - Tematização ... 96

8.2) A gravura de Aldemir Martins ... 99

8.2.1 – Registro de Observação ... 99

8.2.2 - Tematização ... 101

8.3) Aldemir Martins na 7a. série ... 103

8.3.1 – Registro de Observação ... 103

8.3.2 - Tematização ... 105

8.4) O círculo cromático ... 106

8.4.1 – Registro de Observação ... 106

8.4.2 - Tematização ... 107

8.5) A classe de Educação de Jovens e Adultos ... 108

8.5.1 – Registro de Observação ... 108

8.5.2 - Tematização ... 109

8.6) O Coelho Pernalonga ... 109

8.6.1 – Registro de Observação ... 109

(11)

8.7) As frisas e as Olimpíadas ... 113

8.7.1 – Registro de Observação ... 113

8.7.2 - Tematização ... 114

Capítulo 9 – A palavra dos alunos ... 116

9.1) Uma conversa com duas meninas ... 116

9.1.1 – Registro da Entrevista ... 116

9.1.2 - Tematização ... 119

9.2) Entrevista coletiva ... 121

9.2.1 – Resumo do Registro de Observação ... 121

9.2.2 – Os textos dos grupos ... 122

9.2.3 – Tematização ... 123

9.3) As redações ... 124

9.3.1 – Para quem eu gosto de mostrar os meus desenhos ... 124

9.3.2 – O que eu penso e sinto quando estou desenhando ... 126

9.3.3 – Do que eu não gosto nas aulas de Arte ... 128

9.3.4 – Como eu participo das aulas de Arte ... 130

Capítulo 10 – Síntese dos dados ... 132

10.1) A arte na EMEF ... 132

10.2) A professora e as aulas de Arte ... 133

10.3) O sentido das aulas para os alunos ... 139

Capítulo 11 – Discussão e algumas conclusões ... 148

11.1) Arte, escola e aulas de Arte ... 148

(12)

11.2.1 – O sentido burocrático ... 151

11.2.2 – Desenhar para evitar repreensões ... 153

11.2.3 – Agredir a professora ... 154

11.3) Os sentidos para a arte ... 155

11.3.1 – Ser aceito pela professora ... 155

11.3.2 – Mostrar a obra ... 155

11.3.3 – Criação artística ... 158

11.3.4 – Criação como expressão ... 161

11.3.5 – Acolhimento, cuidado e pertencimento ... 162

11.3.6 – Arte como atividade ... 163

11.3.7 – Arte como diversão e como profissão ... 165

11.3.8 – Aula de Arte como liberdade e rebeldia ... 166

11.3.9 – Arte como libertação e cura ... 167

PARTE IV – CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 168

Capítulo 12 – Arte na aula de Arte ... 169

(13)
(14)

CAPÍTULO 1 – As aulas de Arte e a questão do sentido.

1.1) O pesquisador e o ensino de Arte.

A ligação entre o pesquisador e a arte nasceu com os figurinos de teatro e os desenhos expressionistas que habitaram seu lar, desde a primeira infância. A experiência escolar entrou em contradição com essa vivência logo na sexta série, quando a professora de Educação Artística exigiu que o sombreado dos desenhos fosse feito conforme os manuais de desenho clássico. Outro estranhamento ocorreu no Segundo Grau, quando a professora apresentou um ateliê em que diversos materiais encontravam-se espalhados um tanto caoticamente e simplesmente comunicou que cada aluno deveria fazer o que quisesse.

Na faculdade, cursando Licenciatura em Educação Artística, o pesquisador teve acesso aos primeiros livros de Ana Mae Barbosa e pôde descobrir novos significados nessas duas experiências com aulas de Arte na escola. A primeira professora, que exigia que o sombreado dos desenhos fosse realizado exatamente da mesma forma por todos os alunos, foi percebida como uma professora que seguia o método tradicional no ensino de Arte. Visando a cópia de modelos preestabelecidos, ela seguia tendências que vinham do neoclassicismo, presentes na escola brasileira desde o século XIX. A segunda professora passou a ser vista como praticante de uma combinação entre as tendências de ensino de Arte conhecidas como laissez-faire e tecnicista.

Por ocasião dos primeiros estágios em classes de educação infantil, como professor de Pintura e Modelagem de crianças de quatro, cinco e seis anos de idade, o pesquisador pôde redescobrir o ensino escolar de Arte. Nesse momento, colocou-se o desafio de descobrir caminhos adequados para o ensino de Arte na escola, desafio vivido até os dias de hoje, passados 25 anos.

(15)

semanas culturais, mostras de arte e diversas publicações alternativas faziam parte de atividades cotidianas ao lado de quem lutava por melhores condições de vida.

No início dos anos 90, incentivado pela presença de Paulo Freire à frente da Secretaria Municipal de Educação, o pesquisador volta à sala de aula e assume a disciplina Educação Artística na Escola Municipal de Primeiro Grau Prof. Linneu Prestes, no bairro de Santo Amaro, zona Sul de São Paulo, com classes de quinta a oitava séries do ensino fundamental, além de classes de jovens e adultos no ensino supletivo. Ali, renovou-se a ligação com a arte-educação e aprofundou-se o compromisso com a educação, que apontou para o curso de Pedagogia, realizado na Faculdade de Educação da USP. Nessa época, o pesquisador aproximou-se das propostas da artista plástica Fayga Ostrower (1983).

Em 2002, amplia-se a experiência em arte-educação, dessa vez na Escola Municipal de Ensino Fundamental Célia Regina Lekevicius, uma das famosas escolas “de latinha”, localizada em um conjunto habitacional de moradores de baixa renda, junto a uma favela. E, logo a seguir, também em uma escola particular de classe média alta no município de Santo André.

Nessa experiência como professor de Arte, em salas de aula com crianças de diferentes idades, em diferentes ambientes e classes sociais, foi possível identificar muitas diferenças e, também, muitos problemas semelhantes.

São apresentados, a seguir, alguns desses problemas, observados na experiência docente do pesquisador.

1.2) Algumas dificuldades.

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cartazes, compreendendo o professor de Arte como seu auxiliar. A comunidade escolar - incluindo diretores, coordenadores e funcionários - pressiona o professor de Arte para exercer o papel de decorador da escola e, muitas vezes, organizador de festas, em datas comemorativas como Dia da Árvore, Dia das Mães, entre outras.

Em uma classe de adultos, no ensino supletivo, na qual havia se estabelecido uma relação madura, enriquecida com amizade e colaboração, um aluno, elogiando o professor, complementou os elogios com a observação de que era “uma pena que (o professor) não lecionasse outra disciplina, como matemática ou português”.

Alguns alunos expressam a visão de que a aula de Arte é uma espécie de diversão sem maior importância. Muitas vezes o pesquisador encontrou alunos que mostravam displicência nas aulas de Arte justificando que “Educação Artística não reprova”. Mesmo depois da implantação do sistema de ciclos na rede municipal de São Paulo, visto como um sistema em que não existe reprovação em nenhuma disciplina, a aula de Arte prosseguiu relegada pelos alunos à condição de disciplina de segunda categoria.

As exigências de freqüência e de realização regular das atividades propostas foram recebidas com estranheza, pois a aula de arte era compreendida, especialmente por adolescentes de sétima e oitava séries, como uma aula apenas “para relaxar”, em que não havia compromisso com nada.

Um colega, também professor de Arte, mostrou ao pesquisador as pinturas realizadas pelos alunos no ano anterior e comentou que os alunos não valorizavam os trabalhos, pois nem ao menos haviam ido buscá-los no final das aulas.

Na pré-escola mencionada, uma mãe de aluno, que parava seu carro em frente à escola para buscar seu filho, ordenou que o menino jogasse fora o objeto modelado em argila que ele, orgulhoso, lhe mostrava, “para não sujar o estofamento”.

(17)

algumas vezes, os pais mostraram-se preocupados com o fato de seu filho estar “gostando demais” de desenhar e pintar, pois essa profissão “não dá dinheiro”.

Essas reflexões levaram à consideração da questão do sentido do ensino de Arte na escola. Arte na escola para quê? Qual o sentido de insistir em uma prática que parece ser apenas tolerada e, muitas vezes, rejeitada?

O episódio relatado a seguir ajudou a direcionar ainda mais a busca de sentido, focando essa busca de sentido na atividade do aluno. O sentido percebido pelos estudantes nas atividades das aulas de arte pode mudar muito, influenciando de formas diferentes seu comportamento e seu aprendizado.

1.3) O sentido das atividades dos alunos.

Uma experiência em sala de aula provocou a reflexão sobre o sentido das aulas de Arte na prática dos alunos. O plano de aula previamente elaborado foi modificado em função de uma solicitação dos alunos que instituía um novo sentido para suas atividades.

O planejamento previsto pelo professor/pesquisador, para nove classes do ensino fundamental, baseava-se no estudo dos elementos visuais, além de pintura em guache. Depois de algumas semanas e após uma primeira exposição das pinturas dos alunos, eles fizeram uma solicitação. Queriam fazer pintura em tela, acrescentando que

gostariam de “pintar pra valer”. Essa solicitação apareceu associada à intenção de

fazer dessas pinturas um presente para o Dia dos Pais e, também, à solicitação de que

o trabalho deveria ser com tema livre, isto é, que suas atividades não fossem limitadas

por prescrições do professor.

(18)

A grande maioria dos alunos aderiu a essa atividade, em que se mostraram muito comprometidos com suas obras, cobrando insistentemente o momento de levar as pinturas para casa - o que foi feito após a documentação fotográfica dos trabalhos realizados.

Não há, evidentemente, novidade na produção de um presente para o Dia dos Pais nas aulas de Arte. O que chamou a atenção foi que a mudança no sentido da atividade apareceu acompanhada de mudanças na atitude geral dos alunos. O entusiasmo, o comprometimento, a exigência de liberdade para criar, a solicitação do uso de um material de melhor qualidade (além da tela, foi utilizada tinta acrílica).

E a sutil indicação, na expressão “pra valer”, de que o que havia sido realizado até agora não era considerado, ainda, arte, em seu sentido pleno: haviam sido realizadas atividades orientadas pelo professor, exercícios voltados para a aplicação expressiva e criativa dos elementos visuais. Para os alunos, eram atividades com sentido de exercício escolar; talvez interessantes, mas, ainda, exercícios escolares.

A arte “pra valer”, ao contrário, era compreendida como uma atividade livre, em que cada um poderia fazer o que quisesse. E, ao mesmo tempo, deveria estar ligada à vida e à relação com o outro, no caso, à convivência familiar.

Nesse episódio evidenciou-se que o sentido, para o aluno, da atividade que ele realiza distingue-se dos sentidos projetados pelo professor. Na medida em que é o aluno que realiza sua atividade, é o sentido que ele vivencia que permite a compreensão da atividade. É ali, no sentido vivido pelo aluno, que o ensino de Arte, em grande medida, se realiza. A compreensão desses sentidos integra a compreensão das relações que, nas aulas de Arte, estão sendo estabelecidas entre a criança e a arte.

1.4) A escola e o sentido vivido.

(19)

E, considerando que toda atividade existe em um contexto, como o contexto da aula é percebido pelo aluno e integra o sentido de sua atividade?

Os professores de Arte, assim como os pesquisadores, concebem diferentes objetivos para as aulas de Arte. A cada época, em diferentes contextos sociais e sob influência de diferentes concepções didáticas, psicológicas ou filosóficas, as atividades de Arte na escola são desenvolvidas pela instituição escolar como um meio para atingir um determinado fim. Esse fim é concebido como algo posterior à realização das atividades e externo aos seus resultados práticos imediatos. Essa finalidade do ensino de Arte é concebida como um conjunto de objetivos que serão atingidos após anos de atividades. As aulas são concebidas como instrumentos para chegar a esses objetivos.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais – Arte, indicam, entre os objetivos do ensino de arte, que, “ao final do ensino fundamental” os alunos devem ser capazes “expressar e saber comunicar-se em artes, mantendo uma atitude de busca pessoal e/ou coletiva, articulando a percepção, a imaginação, a emoção, a sensibilidade e a reflexão, ao realizar e fruir produções artísticas” (BRASIL, 2000, p. 53). Por sua vez, os professores, em sua atuação nas escolas, definem seus objetivos e esperam, de alguma forma, que as atividades que propõem nas aulas proporcionem uma certa aproximação dos alunos com esses objetivos.

Com sua atenção voltada para os objetivos educacionais, as autoridades escolares e os professores podem perder de vista a vivência do aluno.

Ao buscar o sentido da conduta dos alunos nas aulas de Arte, não perguntamos pelo objetivo educacional estabelecido pelo professor, pela autoridade escolar ou pelos pesquisadores. O sentido da atividade dos alunos deve ser buscado no próprio aluno, na criança ou jovem, que participa da aula e das atividades desenvolvidas em sala de aula. O sentido está na intencionalidade dos estudantes na realização dessas atividades e proporciona uma visão da compreensão que a criança tem de sua atividade.

(20)

Para buscar o sentido das aulas de Arte deve-se considerar o contexto em que elas se realizam: como é a aula, o que é proposto ao estudante, como ele compreende o conjunto da situação que ele está vivendo e como ele realiza a atividade. A importância dessa questão relaciona-se, evidentemente, com a questão dos objetivos, mas não se reduz a ela. A questão dos objetivos é, de certa forma, exterior aos estudantes, na medida em que eles não participam de sua determinação. Os professores e as autoridades de ensino não podem determinar tudo o que irá acontecer nas aulas. Os alunos articulam seus próprios sentidos, na sua atividade. Os professores configuram as linhas gerais de uma situação, mas o sentido desta situação para os alunos não está sob seu controle.

Um professor pode, por exemplo, determinar que vai apresentar aos alunos as características do impressionismo e mostrar aos seus alunos algumas reproduções de obras de Monet. Ele pode, por exemplo, ter como objetivo a “articulação entre percepção e reflexão na fruição das obras de arte” (BRASIL, 2000, pág. 53). Mas, se essa atividade aparecer para os alunos com o sentido de uma espécie de tarefa escolar desinteressante e eles realizarem essa atividade com má-vontade, dispersão, desatenção ou incômodo, em uma atitude desleixada ou debochada, esse objetivo, pretendido pelo professor e pela autoridade educacional, possivelmente não será atingido. Talvez, nesse caso, o resultado seja oposto ao objetivo, com o desenvolvimento de uma rejeição às pinturas, ao impressionismo ou até mesmo à obra de Monet. Essa situação hipotética pode parecer extrema, mas não é estranha à realidade da escola. É claro que, em uma situação como essa, há nuances, e não parece que todos os alunos tenham, nesse tipo de atividade, o mesmo comportamento. Daí a importância de estudar o quê, do ponto de vista dos alunos, acontece nas aulas de Arte.

Os objetivos estabelecidos pela autoridade educacional e pelos professores remetem ao sentido do planejamento escolar, mas não determinam o sentido das aulas para os alunos. O sentido das atividades do aluno só pode ser

(21)

Na investigação do sentido das aulas de Arte na atividade dos alunos, a aula de arte deve ser entendida como um fenômeno, como algo que se manifesta para o olhar do pesquisador. Nessa manifestação estão presentes os estudantes e, também, os professores e a metodologia que adotam, além da totalidade do contexto escolar: aulas de Arte na escola não são o mesmo que aulas de Arte no museu, no ateliê de um pintor, na faculdade, em um curso particular ou em casa. Na escola, as aulas de Arte entram em relação com esse contexto escolar, sua disciplina, suas regras, seus valores e todo o ambiente da escola.

E as aulas de Arte, por sua vez, não são o mesmo que as outras aulas, das outras disciplinas ou matérias: elas têm a sua história própria, suas referências sociais e culturais, seu espaço e seu horário próprios, seus professores, que não são iguais a um modelo de professor, mas que são professores de Arte e não de outras matérias, com seu próprio perfil e sua intencionalidade própria de professor de Arte. O contexto social também está presente: os valores e preconceitos relativos à arte, que se manifestam na sociedade, fazem parte, também, do contexto em que os estudantes estão imersos quando realizam as atividades de arte, na escola.

A questão do sentido da atividade do aluno em sala de aula tem, com certeza, importância para todas as disciplinas e não apenas no ensino de Arte, pois pode contribuir para uma compreensão mais ampla das dificuldades com que se debatem os professores para verem atingidos seus objetivos e realizadas suas expectativas de educadores.

No ensino de Arte essa importância é mais direta e de mais fácil compreensão. Afinal, a Arte diferencia-se das demais disciplinas por seu forte componente prático, de tal modo que não pode ser compreendida apenas pelo domínio de informações ou conhecimentos. No desenvolvimento da articulação entre percepção, imaginação, emoção, sensibilidade e reflexão para realizar e fruir produções artísticas (BRASIL, 2000, p.53), não basta informar ao estudante sobre as características, por exemplo, do cubismo: se ele não vivenciar, de algum modo, a

criação ou a fruição de obras cubistas, esses objetivos não serão atingidos.

(22)

compreender de que forma essa aula se realiza. Na descoberta do como e do para quê

o estudante conduz sua atividade na aula de Arte, na busca da compreensão que ele tem dessa atividade, na revelação da intencionalidade que ele imprime às suas atividades nas aulas de Arte - poderemos descobrir qual o sentido que a aula tem para os alunos e assim, perceber o que, para eles, são essas aulas.

1.5) Aulas de Arte, atividades de desenho.

Considerando que são muitas as modalidades artísticas e que podem ser diferentes os sentidos nas diferentes atividades artísticas realizadas na escola - música, teatro, dança, fotografia, modelagem, desenho e pintura, entre outras – destacamos que esse estudo é focado no ensino de Artes Visuais, especialmente artes plásticas, área de atuação do pesquisador. Desse modo, foi buscado um contexto escolar em que essa modalidade artística fosse abordada pelo professor, resultando em uma pesquisa em que todas as atividades observadas estavam mais próximas ao desenho e, de certo modo, à pintura, do que a outras linguagens artísticas.

Utilizaremos, muitas vezes, as expressões “ensino de Arte” e “aulas de Arte”. O leitor, pelo contexto, poderá perceber facilmente se é feita referência à arte em geral ou às artes visuais, especialmente ao desenho e à pintura. Todas as vezes que nos referirmos a este estudo, à pesquisa realizada e às aulas observadas, estaremos nos referindo às artes visuais, especialmente ao desenho.

O leitor poderá, eventualmente, ampliar o sentido das discussões apresentadas para outras linguagens artísticas. Mas não temos a pretensão de indicar quais comentários, conclusões ou sentidos desvelados pela pesquisa podem referir-se ou adequar-se de algum modo também a outras atividades artísticas. Uma pretensão como essa extrapolaria os limites desse estudo. O foco da pesquisa e as discussões apresentadas limitam-se, portanto, às atividades de artes visuais, especialmente ao desenho e à pintura, no contexto observado.

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CAPÍTULO 2 – A história do ensino de Artes Visuais no Brasil.

Esse capítulo aborda a história do ensino de Artes Visuais no Brasil, especialmente do Desenho e da Pintura, mostrando brevemente as diferentes propostas que marcaram sua presença na escola brasileira. Seu estudo é importante porque indica os sentidos do ensino de Arte que chegam, pela tradição, aos professores, à escola e à sociedade, integrando o contexto em que as atividades dos alunos se realizam.

2.1) Desenho geométrico e neoclassicismo.

Havia, no Brasil, até a chegada da Missão Francesa em 1816, uma arte inspirada em modelos europeus que se diferenciou em um estilo próprio. Marcada, inicialmente, pela influência dos modelos renascentistas e, logo a seguir, pelo barroco e rococó, constitui-se um barroco brasileiro, emocional, sensual e rústico. Nessas manifestações artísticas havia a marcante presença das camadas populares, com mestiços e mulatos iniciando-se na prática artística através das missões jesuíticas (BARBOSA, 1995).

A educação, controlada pelos jesuítas até sua expulsão em 1759, estava focada na gramática, na retórica e nas humanidades. As atividades manuais não eram consideradas dignas de homens livres e, portanto, destinavam-se apenas a escravos e índios. As escolas dos jesuítas estavam voltadas para as classes dirigentes e filhos dos colonos, excluindo os mulatos e pardos. Sua atuação catequética junto aos índios propiciou que a música, o canto e as artes plásticas européias formassem aqui seus artistas e seu público. As esculturas e pinturas eram inspiradas principalmente em artistas renascentistas, com a presença, posterior, da influência do barroco. Também figuras relacionadas à cultura indígena eventualmente faziam-se presentes (FERRAZ, 1983, p. 34-38).

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Com as reformas pombalinas, introduziu-se o ensino de Geometria e de Desenho Artístico nas escolas brasileiras. O Seminário Episcopal de Olinda, fundado em 1800 em substituição ao Colégio Real dos Jesuítas, incluía o Desenho em seu currículo. Praticava-se o desenho com modelo vivo, mas o modelo servia apenas como referência visual, pois a representação gráfica deveria seguir a idealização de perfeição dos padrões neoclássicos.

Com a chegada da Missão Francesa, os ideais, regras e padrões rígidos do neoclassicismo consolidaram sua presença na arte brasileira e no ensino de Arte nas escolas. Mas esse processo deixou seqüelas: havia uma certa animosidade contra os artistas franceses, identificados que eram com o bonapartismo. A pesquisadora Ana Mae Barbosa percebe no choque dos padrões neoclássicos com a tradição mais popular do barroco brasileiro uma das origens do preconceito vigente no Brasil em relação à arte, identificada como um mero adorno, próprio de gente afetada:

Afastando-se a arte do contacto popular, reservando-a para the happy few e os

talentosos, concorria-se, assim, para alimentar um dos preconceitos contra a arte até hoje acentuado em nossa sociedade, a idéia de arte como uma atividade supérflua, um babado, um acessório de cultura. (BARBOSA, 1995, p. 20)

No século XIX e primeiras décadas do século XX o ensino de Arte na escola primária e secundária brasileira limitava-se ao ensino de Desenho. A influência do neoclassicismo, além do desenho da figura humana idealizada, trouxe também o desenho de ornatos, inspirados principalmente na arquitetura.

No final do século XIX, época do surgimento da indústria nacional, o grande crescimento industrial dos EUA causou admiração no país, de tal modo que muitos políticos e educadores defenderam que o Brasil ampliasse o ensino de Desenho nas escolas e incorporasse, como americanos, ingleses, austríacos e franceses, o desenho industrial. O desenho artístico e o desenho industrial foram propostos como complementares e necessários ao desenvolvimento do gosto e da técnica, de forma a criar condições para o aperfeiçoamento da indústria nacional.

(27)

artístico e técnico para o desenvolvimento industrial do país. Os liberais viam no ensino de Desenho uma importância muito grande na formação para o trabalho, que incluía os aspectos técnicos e artísticos implicados na indústria e, também, o desenvolvimento da inventividade, que deveria objetivar-se com o desenho.

Rui Barbosa, inspirando-se na metodologia adotada na Áustria e na Inglaterra, formulou uma série de recomendações para o ensino de Desenho na escola primária brasileira, algumas delas com grande influência nas duas primeiras décadas do século XX: nunca fazer correções no próprio desenho do aluno; iniciar pelo desenho à mão livre de formas geométricas; orientar o desenho para a estilização das formas; reduzir as formas naturais a elementos geométricos; utilizar a rede estigmográfica para fazer reproduções; iniciar o desenho de modelos por estudos comparativos de suas partes e do todo; utilizar o desenho com tempo pré-determinado; utilizar o Desenho como auxiliar a outras disciplinas. Rui Barbosa priorizava o desenho à mão livre e opunha-se, no ensino primário, ao desenho geométrico com régua e compasso. O aluno deveria copiar à mão livre os desenhos executados à sua frente pelo professor (BARBOSA, 1995, p. 58-60).

O romantismo também influenciou o ensino de Arte no Brasil desde o século XIX, trazendo as práticas do desenho de expressão, desenho de invenção e desenho de modelos naturais. As idéias românticas da arte como educação do sentimento e formação moral influenciaram liberais brasileiros como André Rebouças. A identificação da beleza natural com elevados sentimentos morais embasava a prática de desenhar frente à natureza, introduzida no Brasil ainda no século XIX.

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O positivismo de Augusto Comte também influenciou a educação brasileira e teve em Benjamim Constant sua maior expressão. Benjamim empreendeu reforma educacional que prestigiou a formação científica. À Arte era atribuído o papel de contribuir com o estudo das ciências. As aulas de Desenho, conforme os educadores positivistas, deveriam propiciar um melhor entendimento das idéias e dos conceitos. Predomina o desenho geométrico com instrumentos e a expressão estética passa a ser baseada na cópia de estampas, prática amplamente difundida durante muitos anos. Do ponto de vista estético, o positivismo toma a forma de uma estética realista, segundo a qual a concepção de evolução mental do homem para a ciência corresponde, na arte, à tendência evolucionista para o realismo. A arte, para os positivistas, também deve colaborar para a coesão social, expressando valores gerais da coletividade que propiciem a superação do individualismo.

Essas influências não retiraram do currículo escolar o desenho de ornatos, trazido pela Missão Francesa, que permanece sendo amplamente praticado na escola secundária. O desenho industrial propriamente dito, “baseado na expressão direta dos objetos fabricados pela máquina” (BARBOSA, 1995, p. 71) não chega a difundir-se amplamente, predominando a prática do desenho de ornamentos de influência neoclássica, presente fortemente na arquitetura e, também, nos padrões para a indústria.

A Reforma Carlos Maximiliano, de 1915, buscou disciplinar e padronizar a educação brasileira, ampliando a fiscalização e o rigor nos exames de admissão e vestibulares. Quanto ao ensino de Desenho, implantou uma prática citada até hoje como responsável pela desvalorização do ensino de Arte na escola: dispensou a exigência de nota mínima nos exames de Desenho, no mesmo momento em que aumentou a exigência de notas e exames para as demais disciplinas. Acelerou-se, então, o processo de aproximar o estudo de Desenho à Geometria, na tentativa de valorizar a disciplina. Muitos daqueles que defendiam que se priorizasse o valor estético do Desenho acabaram se submetendo a uma estética geometrizante.

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A partir de 1914, o professor Ugo Pizzoli, de Modena, Itália, convidado para assumir a cadeira de Psicologia Aplicada à Educação criada na Escola Normal de São Paulo, ministrou vários cursos e instalou o laboratório de Psicologia. Pizzoli desenvolveu, juntamente com professores brasileiros, pesquisas sistemáticas em Psicologia da Criança que contribuíram para a importante influência da psicologia moderna sobre a prática pedagógica no Brasil, inclusive no ensino de Arte. Desses trabalhos destacam-se o de Adalgiso Pereira e de Carlos Gomes Cardim, que estudaram o grafismo infantil. As pesquisas de Ugo Pizzoli e os estudos realizados sob sua orientação contribuíram para a superação dos métodos tradicionais baseados quase que exclusivamente na cópia e para a disseminação de uma postura de respeito ao desenho da criança:

Podemos concluir que a aproximação inicial do Desenho com a Psicologia no Brasil resultou principalmente na configuração de uma atitude de respeito para com o grafismo da criança, na idéia do desenho infantil como um produto interno refletindo a organização mental da criança, a estruturação de seus diversos aspectos e seu desenvolvimento. (BARBOSA, 1995, p. 111 e 112)

O ensino de Arte em São Paulo, a partir da década de 20 do século passado, passou a considerar aspectos como a coordenação motora e o desenvolvimento da criança, a valorizar a busca de modelos mentais ou internos, a imaginação, os temas do cotidiano e as preferências da criança. A Semana de Arte Moderna de 1922, e as influências do expressionismo e das correntes da arte contemporânea, contribuíram para introduzir os “métodos de ensino de Arte baseados no deixar fazer que valorizava o expressionismo e espontaneísmo da criança” (BARBOSA, 1995, p. 112). Mas as mudanças modernizantes no ensino de Arte na escola brasileira só aparecem com maior impulso e de forma mais ampla com o Movimento da Escola Nova.

2.2) A Escola Nova e a influência de Dewey.

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acompanha, a seu modo, a tendência de renovação educacional amplamente difundida no mundo, a partir da Europa e Estados Unidos. Inspirado principalmente em Dewey, Claparède e Decroly, teve em Anísio Teixeira sua maior expressão (BARBOSA, 2001).

No Rio de Janeiro, o Movimento Escola Nova empreendeu mudanças no ensino de Arte fundamentadas em proposições de Nereu Sampaio e tiveram ampla influência em todo o país.

Nereu Sampaio parte de pesquisas sobre o desenho espontâneo da criança, como as de Luquet, para encontrar em Dewey o reconhecimento do real “valor educativo da linguagem gráfica das crianças” (SAMPAIO apud BARBOSA, 2001, p. 78). A concepção de auto-expressão em Dewey está distante das concepções de ensino da Arte como livre expressão das emoções e como preservação de uma espontaneidade individual. Para Dewey, o aluno deve fazer um trabalho de observação da natureza, enquanto o professor, ao mesmo tempo em que trabalha para manter o interesse e respeita a espontaneidade, deve fazer sugestões e avaliar o trabalho do aluno. Mas, enquanto Dewey valoriza a imaginação como superação da experiência comum, Sampaio adota um viés positivista, subordinando a imaginação à observação e concebendo um ensino de Arte que incorpora a espontaneidade, mas subordina-a à busca da representação realista. A importância da observação e o respeito à espontaneidade integram, em Nereu Sampaio, um contexto em que a manutenção do interesse deve impulsionar o desenvolvimento em direção à inteligência reflexiva.

Sampaio introduz diversos procedimentos, alguns inspirados em Dewey, como o de propor um desenho de uma árvore e, em seguida, indicar para o aluno a observação detalhada de árvores, comparando-as com o seu desenho para, finalmente, desenhar árvores novamente, realizando um trabalho mais rico em detalhes. Segundo Sampaio, o desenho direto da observação só deveria iniciar-se aos 10 anos de idade. O processo que integra observação com livre expressão, espontâneo-reflexivo, proposto por Nereu Sampaio e implantado no Rio de Janeiro na reforma comandada por Fernando de Azevedo entre 1927 e 1929, teve ampla difusão no país e até hoje é utilizado em escolas brasileiras.

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Brasil, juntamente com equipe de grande prestígio contratada na Europa, M. Artus Perrelet, que orientou o ensino de Arte, nessa Reforma. Perrelet trabalhava no Instituto Jean-Jacques Rousseau, em Genebra, que se tornou famoso pelas pesquisas em epistemologia genética empreendidas por J. Piaget e que adotava, à época, uma postura eclética com relação aos métodos pedagógicos (BARBOSA, 2001, p. 104 e 105).

Na concepção de conhecimento de M. Artus é atribuída grande importância ao movimento, que deve referenciar também o desenho. O desenho é concebido como uma expressão simbólica da própria vida em movimento, uma expressão intelectual da experiência. Sua abordagem caminha entre a epistemologia pragmática deweyiana e um certo recorte fenomenológico. A experiência integra o conhecimento com a vida, pois o conhecimento simbólico “tem que tornar-se parte de seu organismo” (PERRELET apud BARBOSA, 2001, p.110). Além disso, para Artus Perrelet, o desenho resulta “da comunhão do indivíduo com o mundo e, mais especificamente, com o objeto para o qual dirige sua atenção” (BARBOSA, 2001, p. 111).

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preocupação central de seu estudo” (BARBOSA, 2001, p. 125). Perrelet combateu veementemente a geometrização no ensino de desenho. O método de M. Artus alcançou, à época, prestígio significativo, ampliado com publicação de seu livro (O desenho a serviço da educação. Rio de janeiro, Editora Vilas Boas & Cia, s/d) e de diversos artigos

e entrevistas na imprensa. A atuação das professoras que estudaram com Perrelet em Minas Gerais estendeu a influência de suas propostas.

A proposta de simplificação expressiva do desenho através da vivência e da imaginação, foi substituída, na Reforma de 1931, pelo procedimento de cópia com base em formas simplificadas e padronizadas, desenhadas pelo professor. Era o desenho pedagógico, uma contrafação da proposta de Perrelet, que obteve ampla penetração nas

escolas brasileiras, especialmente entre as professoras dos quatro primeiros anos do ensino fundamental, através das orientações que recebiam no chamado Curso Normal.

Conforme ressaltado por Ana Mae Barbosa, o Movimento da Escola Nova referenciou-se em Dewey, mas adotou uma interpretação redutora de suas concepções. Assim aconteceu também nas reformas empreendidas em Pernambuco e em São Paulo. A concepção de instrumentalidade da arte, que Dewey fundamentou na estética e seu caráter necessariamente educativo ligado à educação da percepção, foi dirigida pelo Movimento Escola Nova para a instrumentalidade educacional no apoio às lições das diferentes matérias. A idéia de arte como significado foi reduzida à idéia de arte como conhecimento, que colocou a arte como forma de elaboração de conhecimento

discursivo, como complemento e apoio ao conceito - desconsiderando-se a concepção

deweyiana de arte como experiência que contém significados para além do

conhecimento.

O aspecto estético, nas concepções filosóficas de Dewey, permeia toda a experiência, de modo que toda experiência assume um aspecto formal, como uma estrutura (BARBOSA, 2001, p. 156-158). Mas, na Escola Nova, assim como na Escola

Progressiva nos EUA, a concepção de Dewey de arte como experiência consumatória foi entendida como arte como experiência final.

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principal referência da experiência empreendida, fornecendo os conceitos centrais. Procurava-se, também, ampliar a compreensão da experiência com o estudo da incidência das demais matérias na experiência, geralmente na parte final das atividades. A arte aparece sempre entre essas matérias complementares, no final do projeto, e nunca como eixo central da experiência, no qual alternam-se as demais disciplinas escolares:

A arte está sempre entre as “outras disciplinas”, enquanto aritmética, geografia, história e história natural se revezam como sede da experiência central. São disciplinas propositoras de experiência, enquanto a arte é meramente responsiva. (BARBOSA, 2001, p. 150)

Havia, também, a aula de Desenho, com seu próprio horário. Para essas aulas, a metodologia adotada pelas reformas da Escola Nova orientava os professores a respeitar a capacidade técnica e a interpretação da criança. As orientações do professor deveriam ser feitas tendo por referência o desenho realista, sendo que as correções deveriam guiar a observação do aluno para que nos próximos trabalhos apresentasse uma representação mais fiel da realidade. Praticava-se o desenho espontâneo orientado pelo tema e, também, o desenho de observação. Havia, também, o desenho de imaginação, o desenho com tema livre, o desenho de interpretação de histórias, o desenho de ilustração de trabalhos escritos e o desenho de apoio a outras disciplinas. Todos essas práticas permanecem presentes nas escolas brasileiras até os dias atuais.

2.3) Arte como expressão na Escolinha de Arte do Brasil.

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Na minha ótica, é um movimento de organização não-formal, alternativo, saído do ventre da Escolinha de Arte do Brasil, refletindo, por isso mesmo, o que tem de inconcluso e criativo o projeto de educação criadora desenvolvido por essa Escolinha. E, nesse sentido, a partir de 1948, posso dizer que o Movimento Escolinhas de Arte – MEA atravessa a própria arte-educação que vem sendo construída, no afã visionário de se fazer inovadora, de chegar a um agir e um saber desejosos e possíveis de recriação, no âmago do processo educativo brasileiro. (VARELA apud AZEVEDO, 2000, p.27)

O Movimento Escolinhas de Arte chegou a cerca de “140 escolinhas espalhadas ao longo do território nacional” (AZEVEDO, 2000, p. 25) e constituiu-se como um movimento não oficial e, portanto, não integrado ao sistema escolar brasileiro. Mas teve uma grande influência em toda a arte-educação do país: pelas diferentes Escolinhas de Arte passaram, participando dos ateliês e cursos, além de milhares de crianças e adolescentes, muitas professoras e futuras professoras que levaram as práticas e propostas do MEA para escolas de todo o país. Desse modo, podemos considerar que, de 1948 até o início da década de 1970, com a criação das licenciaturas em Educação Artística, o MEA constitui-se na principal nova influência sobre o ensino de Arte no Brasil.

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Brasil e participantes do MEA de todo o país, que se apropriaram, assim, de concepções inspiradas em Dewey, Claparède e Decroly, conformando, no Movimento Escolinhas de Arte, a tendência de uma educação ativa, democrática, centrada no aluno e no seu interesse, propiciadora da expressão do aluno e voltada para o desenvolvimento pleno da individualidade. É o próprio Anísio Teixeira quem esclarece os objetivos da Escolinha de Arte:

a) a vivência e a alegria de criar, de realizar, por si só, sem auxílio alheio, algo de concreto e que é valorizado pelo adulto (que o expõe);

b) a possibilidade de exprimir desejos, preocupações, alegrias, conflitos, inquietudes [...];

c) adaptação ao real – a suas limitações exigidas pela necessidade de lidar com instrumento e material fixados que importam em dificuldades a vencer [...]; d) a capacidade de melhor compreender a si próprio e aos demais, pela penetração

no mundo subjetivo que a arte permite;

e) o espírito de disciplina, adquirido na situação real mais favorável, pois que a disciplina estética do ritmo, da proporção, do equilíbrio é uma disciplina natural [...];

f) o desenvolvimento de aspectos da personalidade que na educação tradicional são inteiramente abandonados, relativos à sensibilidade, ao sentimento, à emoção. (TEIXEIRA apud BRASIL, 1980, p. 63)

O Movimento Escolinhas de Arte, recebeu sua maior influência de Herbert Read (AZEVEDO, 2000, p. 53). Herbert Read visa, em sua proposta de educação pela arte, a reconstituição da unidade psicológica primordial do homem, destruída pela nossa civilização. Tal unidade, que se estabelece em um outro modo de pensar, seria a “fonte de harmonia social e de felicidade individual”. Read, diante de

[...] uma consciência dividida, um mundo feito de forças discordantes, um mundo de imagens divorciadas da realidade, de conceitos divorciados da sensação, da lógica divorciada da vida [...] [em que] mesmo a nossa arte foi invadida por atitudes intelectuais que destroem a sua vitalidade orgânica [...] [sugere] em oposição a toda a tradição lógico-racionalista [...] um processo mental que atinge a sua mais elevada eficácia na criação da obra de arte[...] que defende a unidade primária da percepção e do sentimento [...] [e que] se desenvolve na unidade de sensibilidade e razão. (1982, p. 90)

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sentimento, da sensibilidade e da percepção que, juntamente com a razão, deveriam constituir o próprio núcleo do pensamento humano.

O caminho para isso é a educação através da arte. Sua proposta pretende alcançar a harmonia social através da obtenção de uma “superioridade moral e intelectual” que dispense as formas mais autoritárias de educação, pois, para ele, a educação autoritária produz um comportamento instável, baseado no medo e “a verdadeira disciplina é um modelo espontâneo de comportamento” que encontra na educação estética o seu melhor caminho. Na proposta de Read, o professor deve “criar a atmosfera de espontaneidade duma feliz indústria infantil”, em que a única exigência é uma relação adequada entre professor e aluno. Nessa relação, o professor deve adotar, ao mesmo tempo, o seu próprio ponto de vista e o ponto de vista do aluno, de modo a levar a relação para a compreensão e para a reciprocidade, evitando a mera amizade, pela qual o aluno é levado a adotar o ponto de vista do professor (READ, 1982, p. 349-350 e 354).

Nesse processo, o aluno deve ter condições para realizar a atividade de

livre expressão, que é compreendida por Read como uma expressão “relativamente

indireta e aparentemente não destinada a assegurar a satisfação de uma necessidade imediata”, que ocorre na espontaneidade, ou seja, sem constrangimento. Essa ausência

de constrangimento não é absoluta, pois o autor considera que há um certo constrangimento no próprio ato de comunicação (READ, 1982, p. 136 e 138).

A livre expressão, para Read, não é o mesmo que ‘auto-expressão’,

considerado por ele um termo “confuso”, porque a “auto-expressão é sempre expressão social”. Para Read, “a expressão não é uma expansão por si só, ou o correlativo necessário da percepção: é essencialmente uma abertura que exige resposta de outros”. As crianças não usam seus desenhos “como a expressão de suas imagens perceptuais, nem dos seus sentimentos reprimidos, mas antes como um ‘sensor’, uma extensão espontânea para o mundo exterior, à primeira tentativa, mas capaz de se tornar no fator dominante no ajustamento do indivíduo à sociedade”. Pela livre expressão, a arte

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Outro importante pesquisador em arte-educação que influenciou o Movimento Escolinhas de Arte foi Viktor Lowenfeld. Para ele, a educação artística é essencial na educação e pode significar “a diferença entre um indivíduo criador e flexível e um outro que não tenha capacidade de aplicar o que aprendeu, carente de recursos íntimos e com dificuldades no estabelecimento de relações com seu meio”. Os autores não querem “dar a impressão de que a humanidade é salva pelo mero desenvolvimento de um bom programa de criação artística” (LOWENFELD e BRITTAIN, 1977, p. 18).

Mas acreditam que “os indivíduos perderam, em grande parte, sua capacidade de identificação com o que fazem [...]. É muito difícil alguém identificar-se com seu trabalho, quando este nada mais é do que um meio para ganhar dinheiro. Atualmente, é raro encontrar alguém que sinta prazer no trabalho em si”. Há uma grave perda de identidade, pois os indivíduos perdem sua capacidade de saber o que pensam e dizer o que sentem. Desse modo, tornam-se incapazes para “ajudar a reconstruir o mundo”, com graves incidências sobre o próprio sistema democrático (LOWENFELD e BRITTAIN, 1977, p. 26-27). O sistema educacional deveria viabilizar a constituição da identidade, mas não consegue por estar voltado apenas para a evolução intelectual:

A função do sistema escolar parece consistir em criar pessoas que possam armazenar fragmentos de informação e depois possam repeti-los a um sinal dado [...] Nossa tendência para a concentração no desenvolvimento da capacidade de regurgitar fragmentos de informação pode estar enfatizando, indevidamente, um só fator no progresso humano [...] As aptidões de interrogar, de procurar respostas, de descobrir forma e ordem, de repensar, de reestruturar e encontrar novas relações, são qualidades que não são, de um modo geral, ensinadas [...]. (LOWENFELD e BRITTAIN, 1977, p. 15)

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imitação e a cópia são totalmente desaconselhadas, pois levariam a criança à dependência e à subordinação, inviabilizando a expressão. Ao mesmo tempo, a auto-expressão não deve ser confundida com “um conjunto de emoções não-estruturadas ou incontroladas” (LOWENFELD e BRITTAIN, 1977, p. 27 a 30). O desenho é uma “oportunidade de desenvolvimento emocional”, mas o grau desse desenvolvimento está relacionado diretamente com a intensidade com que a criança se identifica com sua obra. As repetições, cópias e os desenhos estereotipados “expressam um tipo inferior de estado emocional”. A criança deve ser encorajada a superar essa prática, pois, quando os desenhos começam a ser significativos para a criança, há, concomitantemente, um desenvolvimento emocional no rumo da flexibilidade do pensamento, da imaginação e da ação, ampliando as possibilidades de ajustamento da própria criança ao seu meio. O ajustamento não é mera adaptação, no sentido de subordinação, mas capacidade criadora com a criança sentindo-se “emocionalmente livre e desinibida” (LOWENFELD e BRITTAIN, 1977, p. 37-40).

A educação artística que proporciona a expressão criadora contribui,

também, para o desenvolvimento intelectual, físico, perceptual, social, estético e criador. Isso, no entanto, só é possível se a criança puder realizar “a seleção daqueles aspectos do seu meio, com que ela se identifica, e a organização desses aspectos em um novo e significativo todo” (LOWENFELD e BRITTAIN, 1977, p. 50).

Lowenfeld e Read foram as principais referências do Movimento Escolinhas de Arte e da tendência no ensino de Arte conhecida como “moderna”, “de livre expressão”, “de auto-expressão” ou “baseada na expressão”.

No processo de divulgação dessas idéias ocorreram distorções advindas de múltiplas influências culturais e de excessiva simplificação, que resultaram na tendência que ficou conhecida como laissez faire, em que as noções de espontaneidade

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O sentido de ensino de Arte como expressão continua presente até os dias de hoje e aparece em diferentes propostas contemporâneas para o ensino de Arte, embora sem o caráter de centralidade que recebe no Movimento Escolinhas de Arte.

2.4) O tecnicismo no ensino de Artes Visuais.

Em 1o. de abril de 1964 um golpe militar depõe o presidente João Goulart e põe fim a 19 anos de experiência democrática no Brasil. Os educadores socialistas e muitos entre os democratas são intensamente perseguidos. Milhares são demitidos e impedidos de lecionar e outros são expulsos do país. Paulo Freire e Anísio Teixeira estão entre eles. O intenso debate que havia sobre os rumos para a educação brasileira foi interrompido. A ditadura militar centraliza as decisões e reprime duramente aqueles que se opõem. A educação brasileira é enquadrada no projeto político da ditadura que se instalou e permaneceu no poder político por mais de 20 anos, ficando sob a égide da Doutrina da Segurança Nacional, desenvolvida na Escola Superior de Guerra, fundamentada no binômio segurança e desenvolvimento.

Havia, nesse binômio, um certo grau de iniciativa mudancista no nível institucional. Mas eram mudanças pré-determinadas pelo governo, sem nenhuma participação organizada dos profissionais de educação ou da sociedade. As mudanças eram implementadas de cima para baixo, de forma centralizada, sem debate político, sem participação popular, aumentando a exploração econômica das camadas populares, ampliando a concentração de renda, empobrecendo amplos setores de classe média e aprofundando os laços de dependência geopolítica e econômica em relação aos EUA.

Na educação, a implementação do modelo de segurança e desenvolvimento trouxe uma série de mudanças, destacando-se as abaixo mencionadas:

- Ampliação do acesso a todos os níveis de ensino, como forma de atender às necessidades de contratação de mão-de-obra pelas empresas.

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- Redução dos padrões salariais do professorado, especialmente no ensino público.

- Sucateamento das escolas públicas nos níveis fundamental e médio, com redução da qualidade de ensino.

- Crescimento do ensino privado nos níveis fundamental e médio, garantindo uma educação diferenciada às elites dominantes.

- Vinculação maior e mais direta da educação com os interesses econômicos e empresariais.

- Combate à organização estudantil e à atuação sindical independentes, com o fechamento de entidades como a UNE (União Nacional dos Estudantes) e proibição de sindicatos de funcionários públicos.

- Assessoria da USAID (Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional), que participou, através de convênios com o MEC, da reforma educacional brasileira, não só no âmbito federal, mas também dos sistemas estaduais.

Entre essas medidas, destaca-se a ênfase no ensino tecnicista, em oposição ao tradicional ensino humanista que predominava na escola pública brasileira.

O ensino tecnicista promoveu, ao mesmo tempo, o enfraquecimento do papel do professor e da iniciativa do aluno. As metodologias de ensino implementadas buscavam enfatizar a técnica de ensino, apoiada no livro didático e no ensino

apostilado. Havia a preocupação com o controle da autoridade escolar sobre o professor e, ao mesmo tempo, buscava-se tolher a iniciativa do aluno, que deveria ser formado como um trabalhador disciplinado e obediente. As metodologias tecnicistas eram utilizadas, também, como uma forma de aumentar a eficiência do ensino, isto é,

de ensinar mais conteúdo em menos tempo e com menores gastos.

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deixam espaço para interpretação, para a descoberta e para a invenção. O aluno deve executar algumas tarefas prescritas pela professora, pelos livros didáticos ou por apostilas (FUSARI e FERRAZ, 1993, p. 37-39), sem margem de escolha e sem criatividade.

Mesmo o chamado desenho livre tem seu sentido distorcido, pois, muitas

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CAPÍTULO 3 – Os sentidos do ensino de Arte.

O estudo dos sentidos do ensino de Arte - tal como eles se expressam nas propostas e discursos dos pesquisadores, autores, autoridades do sistema escolar e educadores da área - é um modo de aproximação com a experiência da aula de Arte.

Essa experiência é vivida pelos alunos e pelo professor. O professor imprime o rumo geral da atividade, com seu discurso, com as proposições que faz aos alunos e com os comentários que faz em relação à atividade dos alunos. Mas ele não faz isso de forma isolada, pois carrega, em seu discurso e em sua prática, as propostas e o discurso dos educadores e autores em ensino de Arte com que teve contato.

Além do professor, toda a comunidade escolar carrega essas influências. Os professores de Arte anteriores, que já não estão na aula com aqueles alunos, deixaram sua marca, sua influência. Os professores das outras disciplinas também se manifestam sobre o ensino de Arte. Da mesma forma, familiares, direção e equipe técnica das escolas, funcionários operacionais, outros alunos, irmãos e outras crianças. Todos, em diferentes graus e sob diferentes interpretações, se manifestam sobre ensino de Arte e incorporam, em algum nível, discursos e propostas dos pesquisadores, autores, autoridades do sistema escolar e educadores da área. Esses discursos e essas propostas, carregados dos sentidos neles expressos, chegam aos alunos por todos esses caminhos e não exclusivamente pelo seu professor no momento da aula.

Por isso, seu estudo nos ajuda a compreender o discurso da criança e os sentidos em que ela realiza sua atividade. Esses sentidos não são uma vivência exclusivamente pessoal. A vivência combina a experiência vivida com uma multiplicidade de referências culturais apropriadas pelos sujeitos, cada um a seu modo. Desse modo, os sentidos vivenciados pelas crianças não estão desvinculados dos sentidos que existem na sociedade e que se relacionam com a realidade vivida em sala de aula.

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prever, ou rastrear, as diferentes influências que chegam às crianças. Mas podemos ter em conta os sentidos expressos na tradição e nos discursos contemporâneos.

Abaixo, apresentamos um breve percurso nos discursos contemporâneos, que incorporam elementos da tradição e os projetam em novos contextos, constituindo o contexto vivenciado pelos alunos, auxiliando na compreensão dos sentidos por eles vivenciados.

3.1) Os Parâmetros Curriculares Nacionais - Arte.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, lei 9.394, de 20/12/1996 (SAVIANI, 2001), no seu artigo 26, que trata da base nacional comum dos currículos do ensino fundamental e médio, estabelece, em seu parágrafo segundo, que o “ensino da arte constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos”. O MEC publicou orientações curriculares para todas disciplinas, entre elas os Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino de Arte (PCN-Arte), que se constituem na principal referência curricular oficial para o ensino de Arte, no Brasil.

Os PCN-Arte para o ensino fundamental foram elaborados pela Secretaria de Educação Fundamental do Ministério da Educação. São dois textos independentes, sendo o primeiro referente às séries iniciais, ou seja, primeira a quarta séries do Ensino Fundamental (BRASIL, Parâmetros Curriculares Nacionais: Volume 6 – Arte,

2000), e o segundo referente às quatro últimas séries (BRASIL, Parâmetros Curriculares Nacionais/Arte: quinta a oitava séries, 1998).

Os dois textos, em sua parte introdutória, apresentam algumas diferenças quanto ao sentido do ensino de Arte.

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compreender a “relatividade dos valores”, valorizando o que lhe é próprio e abrindo-se “à diversidade da imaginação humana”. Assim, será propiciada ao aluno uma compreensão do mundo na sua “dimensão poética”, incorporando a “dimensão do sonho” que, através da “sonoridade instigante da poesia, das criações musicais, das cores e formas, dos gestos e luzes”, faz parte do “sentido da vida”. Sem esses aspectos, a “aprendizagem será limitada” (BRASIL, 2000, p. 19-21). Há, aqui, a proposição do

ensino de Arte no sentido de propiciar a vivência da arte como experiência estética e poética. Ela é necessária para dar sentido à própria vida. Sem isso, a própria vida é

“limitada”. A aprendizagem de Arte proporciona a ampliação da própria vida, ou seja, uma vida mais plena.

Já os PCN focados nas séries quinta a oitava (BRASIL, 1998), embora reproduzam algumas frases do documento citado acima, destacam o ensino de Arte como “apropriação de conteúdos imprescindíveis para a cultura do cidadão contemporâneo”. Aqui, os sentidos do ensino de Arte, de um modo geral, remetem à relação do indivíduo com a sociedade. A arte, aqui, não aparece para dar novos sentidos à existência, mas para aproximar o indivíduo do contexto social em que vive. É o ensino de Arte no sentido de melhor integrar o indivíduo na sociedade. Nesse

documento a imaginação é mencionada apenas em geral, ela é “humana”, isto é, “da humanidade” e não mais do sujeito - e aparece para ser “entendida em sua

diversidade” e não mais para ser desenvolvida ou praticada. O desenvolvimento da

sensibilidade não aparece nesse texto, que dá ênfase aos aspectos cognitivos: “a realização de trabalhos pessoais [...] se dá mediante a elaboração de idéias, sensações, hipóteses e esquemas pessoais que o aluno vai estruturando e transformando, ao interagir com os diversos conteúdos [...]”. O aluno deverá desenvolver sua percepção no sentido de compreender as mudanças que ocorrem na sociedade e na natureza, adaptando-se a elas. Essa percepção deverá ser “crítica”. É nesse contexto que a dimensão poética aparece nessa publicação: compreender que há um movimento de transformação permanente, exigindo “flexibilidade” para que possa realizar-se a “inserção e participação na sociedade” (BRASIL, 1998, p. 20-21).

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ensino constantes dos dois documentos, mas, apenas, uma interpretação dos sentidos de ensino de arte expressos na parte a eles correspondente, ou seja, o capítulo de

“Introdução” dos dois textos. Como se trata de documentos publicados por instância política, é legítimo considerar os sentidos ali expressos como a intencionalidade oficialmente estabelecida por órgão político, isto é, o Ministério da Educação, quanto ao ensino de Arte no país.

3.2) Ana Mae Barbosa e a Proposta Triangular.

Ana Mae Barbosa é, sem dúvida, a mais influente autora e pesquisadora de ensino de Arte, no Brasil. A proposta de Ana Mae ficou conhecida como Metodologia Triangular. Atualmente é designada como Proposta Triangular, (BARBOSA, 1998, p. 33). A expressão Triangular refere-se aos três eixos do ensino

de arte: criação, contextualização e leitura da obra de arte. Esse terceiro aspecto é chamado, também, de apreciação ou de análise da obra de arte. No início, a Proposta

Triangular previa uma contextualização histórica da obra de arte. Ana Mae,

posteriormente, substitui a “história da arte” pela proposição de uma “contextualização” ampla e flexível, que pode ser histórica, mas também pode ser “social, psicológica, antropológica, geográfica, ecológica, biológica [...]” (BARBOSA, 1998, p. 37).

São muitos os sentidos do ensino de Arte expressos na extensa obra de Ana Mae Barbosa. De modo geral, a autora remete os sentidos à questões de ordem social e cultural.

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