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O desenvolvimento tecnológico do veículo elétrico: uma análise a partir de dados

CAPÍTULO 2 A TRAJETÓRIA TECNOLÓGICA E COMERCIAL DO VEÍCULO

2.3. O desenvolvimento tecnológico do veículo elétrico: uma análise a partir de dados

Esta seção avança nas questões relacionadas ao desenvolvimento tecnológico do veículo elétrico. Isto é feito a partir da análise de dados de patentes como indicadores de desenvolvimento tecnológico. Justifica-se olhar para a dimensão das patentes uma vez que o uso de informações relacionadas aos direitos de propriedade intelectual tem se tornado relevante para o campo de estudos da Ciência e Tecnologia (C&T) (PILKINGTON, DYERSON E TISSIER, 2002). As patentes consistem em importantes indicadores de possíveis rotas tecnológicas em curso, bem como trazem informações sobre a localização de depósito e identificação de atores envolvidos, tais como empresas, universidades, Institutos de Ciência & Tecnologia (ICTs), entre outros29.

Por definição, as patentes são títulos de propriedade intelectual30sendo outorgadas pelo Estado via sua força de lei (INPI, 2008). As patentes conferem ao seu detentor a

29 As informações de patentes possuem certas limitações. Com base nos argumentos de Dosi (1988) as

patentes não são o único meio para conseguir a apropriabilidade das inovações e seus direitos exclusivos, pois existem outras formas como segredos industriais, know-how, tempo e custo requeridos para duplicação e curva de aprendizado (DOSI, 1988). Além disso, Pavitt (1984) destaca que os meios para conseguir o direito de propriedade das inovações variam de acordo com os setores envolvidos uma vez que nem todos os setores produtivos utilizam a patente como forma de proteção das inovações.

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A Propriedade Intelectual trata da propriedade dos bens imateriais ou incorpóreos resultantes da manifestação intelectual do ser humano e engloba o campo de Propriedade Industrial, os Direitos Autorais e

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possibilidade de: (1) exploração econômica de caráter exclusivo para uma invenção e (2) possibilidade de impedir a exploração de terceiros sobre o objeto da patente já adquirida (INPI, 2008). Sua concessão se dá por meio de agências governamentais autorizadas responsáveis por uma região específica, a qual é dotada de regras e procedimentos próprios (GRILICHES, 1990). A patente é uma propriedade limitada temporalmente, uma vez que após o transcurso do período de exclusividade de exploração, a patente entra em domínio público podendo ser usada por toda a sociedade. O interesse público fica preservado na divulgação da informação, ou seja, permite que a sociedade tenha o acesso ao conhecimento do objeto de uma patente por meio de sua publicação (INPI, 2008).

Por meio das informações de patentes, buscou-se identificar e analisar quatro pontos: 1) a evolução dos depósitos de patentes no período de 1994 a 2013; 2) os maiores patenteadores; 3) a distribuição dos depósitos por países; e 4) as tecnologias mais patenteadas.

Primeiramente, nota-se que as publicações de patentes relacionadas às tecnologias do veículo elétrico têm passado por um crescimento expressivo. Isto é comprovado ao olhar para o Gráfico 1, que revela o comportamento das publicações ao longo do período analisado.

outros Direitos sobre bens imateriais de vários gêneros, tais como os Direitos Conexos e as Proteções Sui Generis (INPI, 2008).

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Gráfico 1 - Evolução das publicações de famílias de patentes de tecnologias relacionadas

aos veículos elétricos (1994-2013)

Fonte: Elaboração própria.

O número de publicações de famílias de patentes entre 1994 e 2004 revela um período de pequenas oscilações, com picos pontuais e poucos significativos, porém, a partir de 2005, apresenta-se uma nova dinâmica pautada pelo crescimento gradual das publicações de patentes que se estende até 2013. Este comportamento evolutivo das publicações possui correspondência direta com a curva de vendas dos automóveis elétricos híbridos, caracterizadas pelo Gráfico 5 analisado adiante.

Quando visualiza-se e percebe-se esta evolução de publicações, uma questão emerge: Quais são os agentes por trás do patenteamento das tecnologias de veículos elétricos? Esta questão é respondida por meio do Gráfico 02, que identifica as empresas, instituições e demais tipos de organizações que patentearam tecnologias dos veículos elétricos, no período analisado.

Destaque ocorre para a liderança da empresa Toyota com 1.900 famílias de patentes publicadas, praticamente o dobro de publicações da segunda empresa, a Hyundai, com 1062. As pistas que justificam a posição de destaque da Toyota são analisadas brevemente

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na seção 1.5.4 do primeiro capítulo, pois, conforme foi visto, o Japão foi o pioneiro31 em dispensar esforços para a P&D de componentes de veículos elétricos e possui mais de 30 anos de experiência e aprendizado tecnológico adquirido, a contar de 1970.

Ahman (2006) argumenta que a supremacia tecnológica dos veículos elétricos é japonesa e encontra respaldo em seu precoce processo de desenvolvimento. A liderança da Toyota e das demais japonesas presentes entre as principais patenteadoras de tecnologias como a Honda e a Nissan validam a argumentação de Ahman (2006). Outro argumento que explica a supremacia da Toyota relaciona-se ao êxito mercadológico de seus automóveis elétricos comercializados, como apontado nesta dissertação.

As montadoras tradicionais mantêm o seu destaque também no segmento dos veículos elétricos, tais como as japonesas Toyota, Honda, Nissan e Mitsubishi e as norte- americanas General Motors e Ford. É importante sublinhar a ascensão de novas montadoras tomando lugar de destaque no segmento. A Hyundai Motors, segunda colocada, ultrapassou empresas tradicionais como General Motors e Honda. A presença de duas montadoras chinesas, a Chery Automobile, fundada em 1997, e a Build Your Dreams (BYD), criada em 2003, também merecem destaque haja vista que até há pouco tempo não possuíam qualquer participação na indústria automobilística global.

31 Claramente, o termo pioneirismo refere-se ao período de ressurgimento do veículo elétrico no mundo, já na

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Gráfico 2 - Empresas e instituições com patentes de tecnologias dos veículos elétricos (1994- 2013)

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É interessante identificar o aparecimento de empresas do setor elétrico e eletrônico entre as maiores patenteadoras de tecnologias relacionadas ao setor automobilístico. Este dado corrobora o argumento exposto por Chan (2007) de que o veículo elétrico é fruto de um casamento entre os setores elétricos e mecânico. Como exemplos, estão empresas como Panasonic, Samsung, LG, Hitachi e Toshiba. A maioria das empresas do setor elétrico e eletrônico são de origem asiática. Esta constatação a respeito dos novos entrantes do segmento fornece pistas de uma nova configuração da cadeia automobilística global direcionada ao segmento do veículo elétrico, em que os novos entrantes terão papel fundamental no fornecimento de componentes.

Ainda a respeito dos novos entrantes, estão presentes nesta relação de maiores patenteadores empresas cujo segmento de atuação de mercado não está relacionado diretamente ao setor produtivo, como instituições financeiras como o JP Morgan Chase Bank, o que demonstra uma aposta no investimento em novas tecnologias.

As montadoras tradicionais europeias e principalmente as alemãs não estão entre as que mais possuem publicações de patentes perante as demais e se localizam ao fim do Gráfico 2, porém não devem ser negligenciadas uma vez que o cenário apresentado destacou as empresas e institutos que foram os mais representativos do segmento. Como exemplos das montadoras europeias, destacam-se as francesas Renault e o grupo Peugeot- Citroen, seguidas pelas alemãs Audi, Volkswagen e BMW.

Por outro lado, observa-se que as empresas e instituições analisadas acima estão depositando suas patentes predominantemente em seus países de origem e locais onde o mercado para o segmento se mostra como mais desenvolvido e promissor. Isto é verificado ao olhar para o Gráfico 3, que identifica os locais de publicação das patentes analisadas.

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Gráfico 3 - Distribuição de publicações de famílias de patentes por escritórios locais

(países) e regionais32 (1994 – 2014)

Fonte: Elaboração própria.

A partir do Gráfico 3, nota-se a concentração de publicações nos países que compõem a tríade Estados Unidos, União Europeia e Japão. Este comportamento é justificado pelo fato destas localidades abrigarem as mais importantes montadoras e empresas de autopeças globais, sendo que a maioria destas empresas originárias dos países mencionados. Ademais, os países destacados revelam um ambiente em que a indústria automobilística se mostra amplamente consolidada (BARASSA & CONSONI, 2014).

Reforça-se o argumento de que as localizações das publicações de famílias de patentes de tecnologias de veículos elétricos estão estritamente relacionadas aos locais onde o mercado de veículos elétricos está mais desenvolvido. Percebe-se também a ascensão da Coréia do Sul, que está relacionada ao Gráfico 2, por empresa/ instituição.

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Sobre a publicação de família de patentes por países, cabe acentuar que a somatória de publicações dos escritórios regionais e dos países excede substancialmente o número de famílias de patentes que a presente análise contemplou (10.804 famílias). Isto é possível uma vez que há a possibilidade da mesma patente ser depositada e posteriormente ser publicada em diversos escritórios, resultando na ambiguidade que se nota a partir do Gráfico 3.

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Ao olhar pela perspectiva dos componentes que abarcam um veículo elétrico, confirma-se o cenário apontado de que ainda não há uma rota tecnológica definida como também não há uma configuração ótima. Este argumento é validado ao olhar para o Gráfico 4, o qual refere-se as publicações de famílias de patentes por tecnologia.

Gráfico 4 - Publicações de famílias de patentes por tecnologia (1999 – 2013)

Fonte: Elaboração própria.

Constata-se que as publicações de famílias de patentes estão concentradas nas tecnologias referentes aos motores elétricos, representados com a sigla IPC B60L, as quais representam aproximadamente 25% do total de publicações cobertas pela pesquisa. Também com aproximadamente 25% do total de publicações, as tecnologias relacionadas à armazenagem de energia elétrica e afim; baterias neste caso, também apresentam volume acentuado de publicações. A terceira tecnologia mais patenteada, com cerca de 22%, refere- se aos controladores eletrônicos, destinados principalmente aos veículos híbridos.

Verifica-se que o empenho das empresas e institutos concentra-se de fato nas tecnologias fundamentais para o veículo elétrico, que são os motores elétricos e baterias. Verificou-se também que as tecnologias destinadas aos veículos elétricos híbridos também estão entre as mais relevantes e confirma a escolha das empresas em apostar em um cenário

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de transição e adaptação em detrimento de um cenário de ruptura de veículo movidos a motores a combustão interna para veículo elétricos puros (BARASSA & CONSONI, 2014). Ademais, o fato de haver mais classificações de uma mesma tecnologia em famílias de patentes diversas e ter sido necessário o agrupamento de várias tecnologias em um grande subgrupo, que foi o caso da análise, denota que existe uma relativa ausência de rota tecnológica definida uma vez que não é clara a tecnologia predominante que oriente as empresas e institutos que estão empenhados em desenvolver tecnologias para o veículo elétrico. Reforça-se assim a possibilidade de, ao menos no que concerne às trajetórias que trazem alternativas à mobilidade tradicional, apoiada no motor a combustão interna, possuir uma janela de oportunidade em aberto para atores que almejam entrar neste segmento (BARASSA & CONSONI, 2014).

2.4. O mercado para os veículos elétricos: uma análise a partir de dados sobre