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Exemplos de políticas públicas adotadas a partir da década de 1970 em prol

CAPÍTULO 1 OS CAMINHOS DA TECNOLOGIA AUTOMOBILÍSTICA: UMA

1.5. O questionamento do motor a combustão interna e a retomada do projeto do

1.5.4. Exemplos de políticas públicas adotadas a partir da década de 1970 em prol

A partir da década de 1970, um grupo de países desenvolvidos representados por Estados Unidos, Japão e por alguns países pertencentes ao continente europeu, passaram a

16 World Health Organization.

17 Como outras possibilidades, temos os veículos movidos a partir de combustíveis renováveis, tais como o

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formular e implementar um conjunto de ações e iniciativas em prol da retomada da produção e comercialização dos veículos elétricos, principalmente os automóveis (COWAN & HÚLTEN, 1996; HOYER, 2008; ANDERSON & ANDERSON, 2010).

Iniciaremos analisando o caso japonês. Ahman (2006) argumenta que o Japão procurou desenvolver o segmento dos veículos elétricos devido à possibilidade de quebra do lock-in dos combustíveis fósseis. O país também foi o pioneiro em formular e implementar ações e políticas sistemáticas para os automóveis elétricos a partir do início da década de 1970. A estratégia adotada pelo governo japonês, principalmente por meio de seu Ministério de Indústria e Comércio Exterior (MICE, ou em inglês MITI18) consistiu no financiamento público a P&D de novos modelos, programas de demonstração de protótipos e formulação de políticas de demanda19 que se traduziram em quotas de mercado para os veículos elétricos que viriam a ser comercializados.

O Estado japonês, nesse sentido, assumiu função de condutor do processo de desenvolvimento do veículo elétrico como um todo, atuando tanto do lado da oferta por meio do suporte à P&D, quanto do lado da demanda, criando nichos de mercado para os veículos elétricos. Outra função que o governo assumiu, foi de articulador entre os diversos atores do segmento que estiveram envolvidos neste processo, tais como a indústria automobilística japonesa, representadas pelas montadoras e fornecedoras, bem como as universidades e demais Institutos de Ciência e Tecnologia (ICT) (AHMAN, 2006).

O objetivo era a difusão do veículo elétrico a bateria no Japão, e ao contrário das metas estabelecidas, os veículos elétricos não tiveram o desempenho de mercado esperado. Porém, o sucesso tecnológico e de mercado na primeira década do século XXI dos veículos embarcados com a tecnologia híbrida em parte podem ser atribuídas ao programa japonês de suporte aos veículos elétricos a bateria. Isto é observado ao tomar como exemplo a tecnologia de transmissão dos veículos híbridos, que é uma adaptação vinda de um dos programas de P&D executados pelo MITI para os veículos elétricos a bateria (AHMAN, 2006).

18 Ministry of International Trade and Industry- MITI.

19 Tratam-se das políticas direcionadas ao desenvolvimento de mercado de uma determinada tecnologia. A

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A trajetória dos veículos elétricos a bateria no Japão é um exemplo da dificuldade em quebrar o lock-in dos motores a combustão interna. Por mais que seu objetivo principal não tenha sido alcançado, a experiência japonesa adquirida pelos programas de P&D e pelo suporte ao mercado foram relevantes. O pioneirismo em trabalhar com as tecnologias relacionadas ao veículo elétrico fez com que as principais empresas japonesas desfrutassem de uma vanguarda tecnológica que se estende até a metade da segunda década do século XXI20.

Também merecem destaque as medidas adotadas pelo Estado da Califórnia, nos Estados Unidos, na década de 1990. Visando diminuir os problemas de saúde pública gerados pela poluição advinda dos automóveis, os legisladores da Califórnia, por meio da California Air Resource Board (CARB), formularam e aprovaram a lei da “Ordem de Veículo com Emissão Zero”, em 1990. Esta Lei consistiu na obrigatoriedade das montadoras fornecerem até 1998 uma taxa de 2% de veículos com emissão zero em relação a todos os veículos comercializados naquele Estado. Se alguma montadora desacatasse essa Lei, teriam suas operações canceladas na Califórnia (HOYER, 2008). A legislação do Estado da Califórnia atraiu interesse por parte de outros Estados dos Estados Unidos como Connecticut, D.C., Maine, Maryland, Massachusetts, New Jersey, New Mexico, New York, Oregon, Rhode Island and Vermon, os quais aplicaram medidas similares (O'DELL, 2012). Por fim, destaca-se no âmbito europeu o programa francês de políticas públicas para o desenvolvimento de tecnologias de propulsão elétrica. Suportado pelo Governo Federal Francês, diversas empresas francesas dos setores automobilístico e elétrico criaram uma rede de desenvolvimento de tecnologias visando a concretização de um protótipo de automóvel elétrico - este programa é descrito e analisado sistematicamente por Michel Callon (1980)21. Outro programa similar foi realizado nos Estados Unidos em 1976, voltado principalmente ao desenvolvimento de baterias de níquel-ferro e níquel-zinco para aplicação em automóveis elétricos.

20 Isto é comprovado ao olhar para os dados sobre patentes no Gráfico 2 desse trabalho. 21

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O que é preciso assinalar é que não obstante estas várias iniciativas22 de políticas públicas para a promoção do veículo elétrico, nenhuma destas ações colocadas em curso resultou na produção em massa deste tipo de veículo no século XX. Constata-se que o veículo elétrico ainda não era competitivo frente ao motor a combustão interna. Porém este panorama sinalizará pistas de uma possível mudança no início do século XXI, conforme demonstrado no Capítulo 2.

As tecnologias envolvidas em um veículo elétrico passaram por um forte processo de desenvolvimento nas duas últimas décadas do século XX (CHAN, 2007; HOYER, 2008). Este desenvolvimento foi expressivo uma vez que houve um fluxo de tecnologia vindo do setor elétrico para o setor automobilístico. Tratou-se de uma relação fundamental, pois, ao passo que a produção de automóveis com sistema de propulsão elétrico ficou estagnada na segunda metade do século XX, a indústria elétrica desenvolveu-se e utilizou amplamente de motores elétricos, baterias e demais componentes em outras aplicações, como máquinas e equipamentos industriais (CHAN, 2007). Estas adaptações contribuíram para o rápido processo de desenvolvimento de alguns modelos de veículos elétricos, que já no início do século XXI entraram em comercialização.

Considerações Finais

Este primeiro capítulo se propôs a apresentar e analisar as três possíveis rotas tecnológicas de motores aplicadas na indústria automobilística: o motor a vapor, o motor a combustão interna e o motor elétrico.

Estes três tipos de motores resultaram de invenções advindas de experimentos realizadas ao longo do século XIX, com exceção do motor a vapor, que data do século XVIII, mas que teve sua adaptação no automóvel apenas no século XIX.

22 Outras iniciativas de políticas públicas e incentivos governamentais em prol do veículo elétrico foram

formuladas e implantadas em outros países. Ler, a esse respeito, Cowan e Húlten (1996); Ahman (2006); Hoyer (2008); Waltz, Schleich e Ragwitz (2008) e Anderson e Anderson (2010).

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Notou-se ainda que o palco da competição entre o tipo de tecnologia dominante deu-se nos Estados Unidos que tinha um parque industrial instalado bastante avançado em relação aos demais países, além do expressivo mercado consumidor em potencial no país.

Conforme destacado, foram vários fatores que influenciaram o fechamento tecnológico do motor a combustão interna como paradigma dominante. Tais condicionantes transcenderam a esfera técnica e envolveram também um sistema de articulação de atores da indústria automobilística e petrolífera em prol da disseminação do motor a combustão interna.

Os anos que se seguiram a partir desta afirmação do motor a combustão interna, isto é, a partir da década de 1920, foram fundamentais para a consolidação deste tipo de tecnologia e de seus subsistemas. Redes foram formadas e deram suporte a esta tecnologia. O motor a combustão interna experimentou um processo de desenvolvimento contínuo e de expansão de seu mercado.

O questionamento do uso dos motores a combustão interna só viria a acontecer de maneira mais incisiva a partir da década de 1970. A pressão exercida pela agenda ambiental, a qual tinha em sua pauta a diminuição dos gases do efeito estufa e seus diversos efeitos negativos ao meio ambiente, estava estritamente relacionada aos motores a combustão interna como padrão de propulsão no mundo todo.

O conjunto de fatores, acima assinalados, fizeram com que o projeto do veículo elétrico fosse posteriormente retomado, dado que o veículo elétrico contempla a resolução dos problemas demonstrados e enumerados. Isto foi feito por um conjunto de políticas adotadas por um grupo restrito de países, mas que de alguma forma refletem em outros países e em suas políticas.

Conclui-se ainda que tais políticas e ações adotadas para o veículo elétrico não engendraram os mecanismos necessários e não resultaram em uma participação expressiva das vendas de veículos elétricos frente aos veículos tradicionais no século XX. Adiantando que, conforme analisado no Segundo Capítulo, o cenário compreendido entre os primeiros 13 anos do século XXI fornecem pistas de um novo quadro em que o veículo elétrico possui maior expressão e relevância.

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