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CAPÍTULO IV – ASPECTOS IMPORTANTES PARA A INTERPRETAÇÃO DAS

5.1 Pontos controvertidos do direito societário

5.1.8 Deveres dos administradores

O administrador de uma sociedade, seja ela anônima, seja de responsabilidade

limitada, deve atuar com diligência, lealdade e sem desvio de finalidade e, especificamente,

quando atuante em sociedade anônima aberta, prestando informações aos acionistas e ao

mercado.

Devem, também, os administradores respeitar a lei e o estatuto/contrato social. O

desrespeito a esses postulados gera a sua responsabilização civil.

Confiram-se os ensinamentos de Coelho sobre a responsabilidade civil, o dever de

diligência, a lealdade e o dever de informação do administrador:

Responsabilidade civil:

As duas hipóteses elencadas pelo art. 158 da LSA na definição da responsabilidade dos administradores são interdefensíveis. Com efeito, a ação culposa ou dolosa é, forçosamente, ilícita, violadora da lei. Se, por exemplo, o administrador deixa de aplicar disponibilidades financeiras da sociedade, age com negligência ou até imperícia. A natureza culposa de sua omissão é, assim, clara e indiscutível. Contudo, esse mesmo comportamento também caracteriza a inobservância dos deveres de diligência e de lealdade estabelecidos em lei (arts. 153 e 155 da LSA). [...] Em outros termos, o fundamento para atribuir ao administrador a obrigação de ressarcir danos originados de ação ou deliberação sua, no exercício de cargo da sociedade anônima, será sempre o descumprimento de um dever prescrito em lei. Presente esse pressuposto, deve-se seguir a imposição da sanção civil. Isto é, resultando da ação judicial que o administrador demandado não observou qualquer dever legalmente estabelecido, caberá sua condenação pelos danos daí derivados (salvo, na hipótese de demanda promovida pela própria companhia ou por acionista substituto processual, se ao juiz ficar claro que o administrador agiu de boa-fé e visando aos interesses sociais, conforme estabelece o art. 159, §6º, da LSA). O descumprimento do estatuto deve ser tratado do mesmo modo que o dever legal. Embora não exista norma expressa, no direito brasileiro, determinando que os administradores

344 O mesmo vale para outras operações de subscrição de ação, debêntures ou mesmo bônus de subscrição, já se

advertindo que não é permitido à sociedade comportamentos contraditórios que criem expectativas ilegítimas aos acionistas: “Superior Tribunal de Justiça. Empresarial. Sociedade Anônima – Bônus de Subscrição. - A Corte Estadual, ao examinar a controvérsia, lastrou-se nas seguintes teses, a saber: 1) distinção entre bônus de subscrição, destinado ao mercado em geral, e opção de compra, restrita a administradores e empregados da companhia; [...]; 3) os investidores titulares de bônus de subscrição, ao adquiri-los tinham inteiro conhecimento de anterior oportunidade de subscrição de ações por empregados a preços inferiores; 4) inexistência de comportamento da sociedade a gerar justas expectativas aos investidores”. (grifo nosso). Agravo Regimental no Recurso Especial nº: 1325151 SP 2012/0103371-2. Recorrente: Economus Instituto de Seguridade Social. Recorrido: Companhia de Bebidas das Américas. Relator: Ministro Raul Araújo. Data de Julgamento: 25/11/2014, Quarta Turma. Data de Publicação: DJe 10/03/2015.

obedeçam ao estatuto, é claro que esse dever lhes é imposto, pela natureza do cargo345.

Dever de diligência:

O administrador diligente é aquele que emprega na condução dos negócios sociais as cautelas, métodos, recomendações, postulados e diretivas da “ciência” da administração de empresas. O dever de diligência, portanto, corresponde a obrigações de meio e não de resultado (cf. Galgano, 1988:294; Franzoni, 1994:11)346.

Dever de lealdade:

O dever de lealdade traduz-se, em termos concretos, também por uma lista de condutas proibidas (art. 155). Será desleal com a companhia o administrador que: não guardar reserva sobre os negócios sociais; usar em seu benefício, ou de outrem, oportunidades negociais a que teve acesso em função do cargo que exerce: negligenciar no exercício ou na proteção de direitos da sociedade; deixar de aproveitar oportunidade negocial, em nome da companhia, com o objetivo de obter vantagem para si ou para outra pessoa; comprar, para revender à companhia com lucro, um bem de que ela necessite, ou no qual tenha interesse. Muitas vezes, o descumprimento do dever de lealdade se caracteriza, também, como falta de diligência, revelando-se, nessa hipótese, mais fácil fundamentar a responsabilidade do administrador em função da inobservância deste último (Clark, 1986:126)347.

Dever de informar ao mercado:

O aspecto mais importante do direito de informar, contudo, diz respeito às comunicações ao mercado. [...] O regular funcionamento do mercado de capitais depende da transparência no acesso às informações sobre as companhias abertas emissoras dos valores mobiliários nele negociados348.

Note-se que, para responsabilizar o administrador, é necessária a demonstração da

culpa ou do dolo, ou seja, da responsabilidade subjetiva.

Um dos pontos que certamente influirão para se aferir a culpa é o respeito ao

princípio da segurança negocial, que tem como alicerce o dever de lealdade

349

. Isso porque o

345 COELHO, 2014c, p. 288-289. 346 Ibid., p. 274.

347 Ibid., p. 275 - 276. 348 Ibid., p. 277-278.

349 Nesse caminho, realçando o dever de diligência: “Superior Tribunal de Justiça. Civil. Ação de

Responsabilidade Civil ajuizada contra ex-administrador de Sociedade Anônima de Capital Fechado, visando ressarcimento por quantia paga à título de prejuízo patrimonial resultante de multa aplicada pela CVM (Operações de Day - Trade) - Nos termos da Lei nº 6.404/76 (que dispõe sobre as sociedades por ações), em regra, „o administrador não é pessoalmente responsável pelas obrigações que contrair em nome da sociedade e em virtude de ato regular de gestão‟, porém, responde civilmente pelos prejuízos que causar, quando proceder dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo (art. 158, I), ou com violação à lei ou ao estatuto/contrato social (art. 158, II)”. (grifo nosso). Recurso Especial nº: 1475706 SP 2013/0029904-5. Recorrente: Álvaro de Souza Barros. Recorrido: Corretora Souza Barros Câmbio e Títulos S.A. Relator: Ministro Marco Buzzi. Data de Julgamento: 06/11/2014. Quarta Turma. Data de Publicação: DJe 27/02/2015.

correto tráfego de informação bem como o dever de cooperação e a perseguição do objeto

social da sociedade serão determinantes para a caracterização da responsabilidade civil.

Um administrador diligente não faz com que a sociedade se manifeste de forma

contraditória ou mesmo não tenha um trato leal com os acionistas, possuindo grande

relevância a forma correta e íntegra para a condução dos negócios, visando à preservação da

empresa.

5.1.9 Poder de controle e seu abuso

Como visto no capítulo III, o controle de uma sociedade é exercido por quem elege a

maioria dos administradores, bem como tem a prevalência na maioria das assembleias gerais.

Como visto também, nada há de errado em deter o controle, devendo, entretanto, o acionista

(quotista) ou grupo de acionistas (quotistas) utilizarem esse poder para guiar a sociedade em

direção à consecução de seu objeto social, isto é, a preservação da empresa em moldes

benéficos aos acionistas e à sociedade, visando, também, ao lucro. Não é possível, portanto,

utilizar o controle para fins diversos, prejudicando a sociedade ou outros acionistas

minoritários.

Confira-se no ensinamento de Coelho:

A lei, contudo, reconhecendo a importância de acionistas dos mais variados perfis para o pleno desenvolvimento da empresa, e preocupada com o equilíbrio das relações de poder no interior da companhia, imputa ao controlador responsabilidade por danos causados com abuso de poder (art.117)350.

Assim, a correta interpretação do controle é que o acionista sempre deve buscar ser

leal com sociedade, minoritários e administradores. Deve, portanto, cooperar e informar os

caminhos que pretende seguir, com zelo, pois algumas informações são sensíveis ao futuro da

sociedade e, por isso, confidenciais, agindo conforme a expectativa e de forma correta,

mantendo-se sempre fiel as suas manifestações para que não haja qualquer vício na

manifestação de vontade dos minoritários.

350 COELHO, 2014c, p. 313.

5.1.10 Governança corporativa

Inicialmente, cabe destacar a definição de Coelho

351

sobre governança corporativa

como um movimento, cujo objetivo é:

Identificar e sistematizar as melhores práticas de gestão da empresa e relacionamento com os acionistas. E complementa: O acesso ao crédito bancário, por exemplo, atualmente é mais facilitado a empresas que adotam governança, isto é, em que estão separados com clareza, de um lado, os bens e interesses dos sócios e, de outro, os indispensáveis ao regular desenvolvimento da atividade econômica (que alguns poderiam chamar de “bens e interesses da sociedade”)352.

Observe-se que a governança corporativa se une perfeitamente ao princípio da

segurança negocial no direito societário, na medida em que prega a transparência na condução

da empresa, bem como a distinção clara e precisa dos bens e interesses dos sócios na

consecução da atividade econômica.

Seguindo essas diretrizes, já estudadas no capítulo IV, com a refinada distinção entre

poder de controle e administração, certamente haverá mais lealdade e confiança entre sócios

(empreendedores, rendeiros e capitalistas) e administradores, visando à consecução do objeto

social.

Se o princípio da segurança negocial exige como deveres essenciais que haja

cooperação, proteção ao know how e sigilo, certamente toda e qualquer sociedade deve

instituir regras de governança para suas situações específicas, é o que se espera até dos usos e

costumes ligados ao regime jurídico comercial.