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DIMENSÃO SOCIALIZADORA E REFLEXIVA DO ESTÁGIO PEDAGÓGICO

PARTE I – REVISÃO DA LITERATURA

1. O ESTÁGIO PEDAGÓGICO NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES

1.6. DIMENSÃO SOCIALIZADORA E REFLEXIVA DO ESTÁGIO PEDAGÓGICO

A formação de professores é um campo complexo em inovação permanente, como todo o desenvolvimento e conhecimento humano. Desta forma exige, necessaria- mente, um conhecimento aprofundado das várias dimensões: pessoal, social e institu- cional, onde as práticas pedagógicas/estágios adquirem todo o sentido da problematiza- ção de cada uma dessas componentes. O professor desenvolve-se, assim, numa dupla condição de pessoa e profissional, num contínuo composto por sucessivas evoluções, que configuram as diferentes fases/etapas do seu processo de desenvolvimento, de características próprias e necessidades específicas (Abraham, 1984; Huberman, 1992; Nóvoa, 1992).

Aprender a ensinar / tornar-se professor, define-se como o momento essencial de aprendizagem e interiorização das normas, condutas, crenças e valores que caracterizam a cultura escolar que integram. Neste sentido, “mais que um lugar de aquisição de técni- cas e de conhecimentos, a formação de professores é o momento chave da socialização” (Nóvoa, 1992: 18), entendida aqui como foi definida por Van Maanen e Schein (1979, citados por Garcia, 1999: 115), “o processo através do qual um indivíduo adquire o conhecimento e as competências sociais necessárias para assumir um papel na organiza- ção”. Desta forma, o estágio assume como objectivo, transmitir a cultura docente que lhe é inerente (conhecimentos, valores, modelos, etc.) ao futuro professor, para assim se integrar como membro funcional da comunidade.

Ao concedermos um papel socializador ao estágio, estamos a familiarizar o futu- ro professor com as crenças, costumes e valores do sistema educativo e das instituições que moldam/ajustam a sua actuação, informando-o antecipadamente sobre as particula- ridades do “ser professor”, dos modelos de referência, num dado momento, contexto geográfico e social (Canário, 2001). Poderá, assim, o professor adaptar-se com mais facilidade ao meio onde vai exercer a sua função, de entender as necessidades que este apresenta e poder responder com eficácia, assegurando-lhe as condições de sucesso, às diversas exigências do mesmo.

Esta socialização educacional a que o estagiário vai estar sujeito, de algum modo forçado, vai ser aceite, na medida em que o formando “age mais em função de uma determinada avaliação que vai ser feita” (Alarcão e Tavares, 1987: 132) que é essencial para os objectivos da sua carreira, dependendo dela para entrar no mercado de trabalho. Por isso, têm que executar modelos próximos das pessoas que os vão avaliar, para que quem os avalia fique com uma imagem o mais positiva possível, tanto dos conhecimen- tos teóricos, como da sua ligação à prática.

Além da função socializadora, as práticas pedagógicas/estágios, constituem um momento decisivo no processo de formação de professores, funcionando como um fac- tor de desenvolvimento do indivíduo em formação, pelo menos em termos profissionais. Este período revela-se como fundamental porque é a fase inicial da prática profissional e onde as experiências profissionais são mais marcantes, na medida em que vão condi- cionar toda a vida futura do futuro professor. Assim, o estágio pedagógico “deve pro- porcionar ao professor estagiário uma experiência gratificante e enriquecedora, quer a nível pessoal, quer a nível profissional, possibilitando uma interligação entre a acção e a reflexão (Santos, 2004: 20). É fundamental para o estagiário, nesta fase, que a sua práti- ca pedagógica se rodeie de condições para que seja uma experiência benéfica, pois, “é neste período que eu profissional começa a delinear-se e a afirmar-se e prospectivamen- te, levando o sujeito – professor a idealizar o eu em que aspira tornar-se” (Kelchter- mans, 1993, citado por Gonçalves e Silva, 1999: 198). É também o momento em que os estagiários sentem a maior necessidade de aprendizagem profissional, estão mais aber- tos e disponíveis a sugestões e a aceitar recomendações. É o único período, do percurso profissional, em que está previsto o acompanhamento e orientação, que têm por função

apoiar, ajudar e facilitar, no terreno onde se faz a aplicação prática dos conhecimentos, a aprendizagem profissional (Jesus, 2000).

Os autores são unanimes em considerar que são os professores mais velhos aqueles que mais valorizam e referem a importância do estágio, como factor de aperfei- çoamento e desenvolvimento. E é convicção geral que se não é uma experiência benéfi- ca também não faz mal. O estágio deve ser considerado como uma parte do desenvol- vimento profissional do professor, que tem que ser contínuo, sistemático, organizado e que vai desenvolver-se ao longo da vida, em função do qual os estagiários aprendem a ensinar, desenvolvendo, quotidianamente, a sua competência profissional (Vonk, 1993; Simões, 1996; Garcia, 1999). Desta forma, o desenvolvimento pessoal e profissional é um fazer constante, no dia-a-dia, que se faz constantemente na acção (Paulo Freire, 1972).

Esta perspectiva de desenvolvimento pressupõe a configuração de modelos ade- quados de práticas (estágios) que possibilitem que os alunos estagiários, para além da observação e entendimento do que fazem os professores, o possam questionar no que fazem, como o fazem e porque o fazem. Surge assim, uma nova perspectiva de análise da acção do professor – a praxis reflexiva. Assim, é fundamental incentivar, os futuros professores, à reflexão na acção, à reflexão sobre a acção e à reflexão sobre a reflexão na acção (Alarcão, 1996), não só, para alcançar conhecimento e experiência, como tam- bém, para evitar “significados equívocos que o podem conduzir a crenças deseducati- vas” (Ralha Simões, 1995: 91), bem como “ajudar os futuros professores a identificar os motivos das suas futuras acções profissionais fundadas e internacionalizadas” (idem, 1995: 92). Como refere Erdman (1983, citado por Ralha Simões, 1995: 92), “a reflexão sobre a acção ajuda a construir significados sobre a própria experiência que se vão repercutir também a nível pessoal, pois que é a partir daí que vão ser fornecidas as pri- meiras imagens de si próprio como professor, que se irão consubstanciar na elaboração da identidade profissional”.

O ensino reflexivo é o processo mediante o qual os professores aprendem a par- tir da análise e interpretação das estratégias implementadas na acção, ou seja, da sua própria actividade, numa atitude permanente de reflexão, análise e avaliação dos dados, visando a superação das dificuldades encontradas no processo de ensino/aprendizagem. A este propósito, importa referir que os objectivos do ensino reflexivo passam por

melhorar a compreensão das práticas educativas, modificar qualitativamente a interven- ção pedagógica dos professores, melhorar o contexto em que as práticas educativas ocorrem e, finalmente, produzir conhecimento.

O estágio, revela-se muitas vezes, como a primeira experiência e o primeiro con- tacto com a realidade profissional. É um momento de transição, uma situação nova, em que muitas vezes, os alunos estagiários ficam surpreendidos pela vivacidade, energia e dinamismo que os alunos demonstram, sentido dificuldades em os dominar, pelo menos disciplinarmente. É um momento de crucial importância no processo de desenvolvimen- to e formação porque se joga aí muito do profissional que vai ser no futuro. E, enquanto momento de formação, deve permitir ao futuro professor, desenvolver atitudes que o tornem senhor do seu próprio processo de desenvolvimento pessoal e profissional, o que pressupõe uma contínua reflexão sobre o tipo de professor que se é e o que se gostaria de ser. “Olhar o estágio como um espaço entre a teoria e a prática é olhá-lo enquanto espaço integrador, que permite criar a distância reflexiva em relação às nossas próprias teorias implícitas, levando à descoberta de novos possíveis” (Machado, 1999: 52). Con- figura-se assim, o estágio, como construção de um conhecimento, pessoal e criativo, situado na acção, em que a competência do futuro profissional se traduzirá sobretudo na capacidade de avaliar o valor das suas próprias decisões e das consequências que daí resultarão (Alarcão, 1996).

Pelo atrás exposto, é compreensível que se tenham desencadeado numerosos estudos objectivando identificar e estudar os comportamentos que se verificam na aula, a fim de, na preparação dos futuros professores, se procurar desenvolver estilos de ensi- no e estratégias de actuação potencialmente eficazes para responderem, adequadamente, às circunstâncias com que se confrontam diariamente.

1.7. O estágio como meio de aprendizagem e desenvolvimento de estraté-