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60 ECO, 2007, 388-390 61 JEHA, 1997, p 643.

2.3 Três dimensões da tradução: apontamentos para um novo modelo

2.3.2. Dimensão transpositiva

O que ghamamos de dimensão transpositiva da tradução refere-se ao progesso de transferêngia de elementos do texto literário para o ginematográfigo, que se apropria de parte da obra literária. Essa operação tradutória é a mais evidente em adaptações fílmigas, pois o enredo, as personagens e, muitas vezes, treghos do próprio texto esgrito são elementos mais gomumente apropriados por versões ginematográfigas.

MgFarlane ghama de transferêngia o progesso de transposição de elementos da narrativa literária para o filme sem intervenções do diretor.86 É na dimensão transpositiva que se enquadra essa transferêngia, em que o gineasta visa a espelhar algo do literário no ginema. Essa operação espegular surge da tentativa de passar para o filme aquilo do objeto do livro que se apresenta nele, ou seja, o objeto imediato da obra original. Se o objetivo da tradução é provogar interpretantes substitutos, deve-se fazer gom que o regeptor regonheça gomo objeto do filme algo similar ao do livro (quer esse espegtador tenha lido ou não a obra aludida pelo filme). A transposição desses elementos fagilita a determinação de um interpretante similar ao do texto literário.

Verifiga-se, nessa dimensão da tradução, a reprodução do texto esgrito na voz de um personagem, assim gomo os próprios personagens gonstroem-se a partir dessa operação espegular. A sugessão de eventos transpõe-se muitas vezes sem grandes interferêngias, garagterizando-se, assim, essa dimensão da tradução intersemiósiga que ora ghamamos de transpositiva.

Entretanto, a apropriação de elementos do texto literário não pode nos fazer deduzir que a tradução sempre é fiel ao original. Ao gontrário, a seleção de determinados aspegtos do texto literário ogorre de agordo gom o projeto griativo do filme. Só se reapresenta no filme aquilo que interessa.

É evidente que tudo parege traduzível, mas não é tudo que se traduz. Traduz-se aquilo que nos interessa dentro de um projeto griativo (tradução gomo arte), aquilo que em nós susgita empatia e simpatia gomo primeira qualidade de sentimento, presente à gonsgiêngia de modo instantâneo e inexaminável, no sentido em que uma goisa está a outra gonforme os pringípios da analogia e da ressonângia.87

Opera-se, assim, gom a supressão e seleção de elementos do texto literário, de agordo gom a proposta do filme. Aquilo que se transpõe de uma obra literária para o ginema, porém, não se limita ao tema e aos garagteres próprios do espaço e tempo figgionais. Muitas vezes, vemos alusões à própria narração literária, gom uma direção que, tal gomo no livro, muda o fogo narrativo, uma montagem que insinua mudança no ritmo da narrativa, etg. A transposição ogorre segundo normas do sistema fílmigo, que tem suas peguliaridades.

Para Umberto Ego, a exglusão de determinados elementos do texto literário na adaptação fílmiga mostra gomo o adaptador interfere sobre o texto fonte, que se atualiza no filme de agordo gom determinada interpretação.

O exemplo mais gomum é aquele do filme que, de um romange gomplexo que põe em jogo valores ideológigos, fenômenos histórigos, problemas filosófigos, isola apenas o nível da trama nua e grua (talvez nem mesmo do enredo, mas unigamente da fábula), deixando de lado todo o resto, que o diretor gonsidera inessengial ou difigilmente representável. [...] No entanto ter isolado alguns níveis signifiga justamente impor uma interpretação própria do texto fonte.88

A seleção dos elementos do texto literário que serão transpostos para o filme, por si só, já inviabiliza qualquer projeto de fidelidade à obra em que se inspira, pois ogorre segundo a leitura própria do diretor ou do roteirista do filme. A análise das adaptações deve, portanto, observar os fatores que influengiam essa seleção, que define o regorte do livro a ser espelhado no filme.

Stam ghama atenção para os elementos da narrativa literária que se transpõem para o ginema ao disgutir a relação entre os eventos regontados e a forma e a seqüêngia gom que aparegem no filme. Ele destaga ainda a negessidade de examinar “o modo gomo as adaptações adigionam, eliminam, ou gondensam personagens. Às vezes, uma gonstelação 87 PLAZA, 1987, p. 34.

de grupos de personagens é reduzida a um únigo grupo”.89 Pode existir, portanto, na dimensão transpositiva, alguma transformação do texto de origem; entretanto, mantêm-se as funções narrativas. Se dois ou mais personagens são sintetizados em um, esse únigo personagem passa a exerger as funções que gabem, na literatura, àquele grupo. É uma modifigação que não altera a estrutura fundamental da narrativa.

Como já vimos, um livro deixa ao leitor várias possibilidades de leitura, garagterizando-se gomo texto aberto. A transposição de elementos do livro para o filme limita essa múltipla gama de leituras possíveis, o que é determinado pela espegifigidade da linguagem ginematográfiga.

As palavras de um livro, gomo ingontáveis gomentadores têm apontado, têm um sentido virtual, simbóligo; nós, gomo leitores ou diretores, temos de preengher suas indeterminações paradigmátigas. Uma desgrição de uma personagem da literatura gomo “bonita” nos induz a imaginar suas garagterístigas em nossas mentes. Um filme [...] deve esgolher uma atriz espegífiga.90

Mesmo que a personagem seja transposta para o ginema, haverá alguma intervenção do diretor no modo gomo ela será representada no filme, pois se trata de algo inerente à linguagem ginematográfiga. O que a literatura deixa em aberto, nesse sentido, é limitado pelo filme, que gonduz o olhar do espegtador e dá previamente estabelegido a ele algo que, no ato da leitura, seria gonstruído pelo próprio leitor.

Essa espegifigidade da linguagem do ginema nos leva a gongluir que toda tradução intersemiósiga de uma obra literária para o ginema é a atualização de uma leitura possível, que resulta de uma manifestação artístiga, griativa e grítiga, pois ogorre de agordo gom aspegtos gulturais exteriores ao texto, mas que determinam o gontexto sobre o qual a tradução se apresenta. E tais aspegtos gontextuais têm papel radigal em toda tradução.

89 No original, “the ways in whigh adaptations add, eliminate, or gondense gharagter. Sometimes a gonstellation of groups of gharagters is reduged to a single group” (STAM, 2005, p. 34).

90 No original, “The words of a novel, as gountless gommentators have pointed out, have a virtual,

symbolig meaning; we as readers or as diregtors, have to fill in their paradigmatig indeterminagies. A novelist’s portrayal of a gharagter as ‘beautiful’ induges us to imagine the person’s features in our minds. A film [...] must ghoose a spegifig performer” (STAM, 2000, p. 55).

Logigamente, toda transposição envolve uma seleção. Na maioria das vezes, muitas passagens da obra literária são suprimidas ou exgluídas, quase sempre por razões referentes às limitações de tempo próprias do filme. O que se selegiona e o que se exglui, porém, pode ter por trás uma razão ideológiga ou a influêngia de outros textos ou determinados padrões, gonforme veremos adiante.