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A Direcção Geral de Educação Física, Desportos e Saúde Escolar: disciplinar o desporto

No Decreto-Lei nº 32 241, de 5 de Setembro de 1942, que institui a Direcção Geral de Educação Física, Desportos e Saúde Escolar e a encarrega de “dirigir a educação física no País, fora das escolas, da Organização da Mocidade Portuguesa e da Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho”, identificavam-se as principais tarefas deste novo organismo do Estado Novo. Para além da promoção da educação física, um dos objectivos primordiais da Direcção Geral era “introduzir a disciplina nos desportos.” O legislador esclarece: “não se pretende substituir a organização existente que se formou espontaneamente ou sem a intervenção directa do Estado; pretende-se assistir àquela organização, orientar-lhe a actividade e completá-la quando se mostre insuficiente nos elementos que a constituem. Nada se tira ao que existe; sobrepõe-se-lhe alguma coisa de que se espera muito.”436 No ano seguinte, o Decreto nº 32 946, de 3 de Agosto, fixou o regulamento da Direcção Geral esclarecendo alguns dos pressupostos da sua intervenção. No preâmbulo definiram- se as prioridades da política desportiva pública: “o problema que em primeiro lugar interessa ao Estado é o da educação física do povo português. Esta há-de fazer-se, antes de tudo, através de métodos de ginástica adequados, que, por serem executados em escola, facilitam uma vigilância contínua sobre as condições físicas dos alunos e tornam possível a graduação dos exercícios, de modo a que só de harmonia com

435 Como salientou Pires Cardoso, «Se quisermos sintetizar em meia dúzia de palavras o

pensamento determinante desta iniciativa, podemos dizer que ela se alicerça na aspiração bela de ‘dar a conhecer Portugal a Portugal’. Isto porque embora do Minho ao Algarve vivam portugueses em absoluto integrados na Nação – pelo espírito de unidade e independência e pela comunhão de tradições e aspirações – a verdade é que cada província tem os seus traços próprios, os seus tipos marcados, a sua índole definida. E ninguém ignora que um dos aspectos mais salientes por que se revelam as características duma região – o seus ‘facies’ típico – é sem dúvida a música: - o cantar do povo, o folclore regional». «O 3.º espectáculo regional organizado pela E.N. - Província do Douro», Boletim da Emissora Nacional, n.º 5, 1935, 45.

aquelas condições eles serem admitidos a praticá-los.” Os parágrafos seguintes clarificam algumas das ideias do governo sobre a prática desportiva e elaboram um diagnóstico da situação dessa mesma prática no país. Considerava-se que “fora dos estabelecimentos de ensino é muito difícil criar cursos de ginástica com a garantia de que seriam frequentados.” Seria, contudo, possível, na óptica do legislador, mobilizar, para os fins julgados convenientes, a extensa rede de organizações desportivas que já se projectava “bastante profundamente por todo o país”, precisamente pelo efeito dos desportos que exerciam uma “sedução” de que a ginástica era desprovida. 437

A 29 de Janeiro de 1945, passados menos de três anos sobre a criação da Direcção Geral, publicava-se o primeiro número do periódico desportivo A Bola, fundado por Vicente de Melo, Artur Rebelo, Cândido de Oliveira e Ribeiro dos Reis. Estes dois últimos, antigos alunos da Casa Pia, eram homens plurifacetados, que já haviam desempenhado inúmeros papéis no campo desportivo português. No primeiro número do jornal, que contava entre os seus colaboradores diversos opositores ao regime, prometia-se “Liberdade integral ao redactor, ao colaborador, ao leitor, que acolhe nas suas colunas, de acordo, é claro com a índole desportiva deste jornal. A

Bola é – e procurará ser sempre – tribuna livre para todos quantos se interessam,

lutam e consagram ao desporto.”438

A promessa de autonomia editorial espelhava o percurso dos fundadores, nomeadamente de Cândido de Oliveira, o qual havia sido libertado do campo do Tarrafal em Janeiro de 1944, onde cumpriu uma pena de cerca de um ano e meio por colaboração com as forças inglesas durante a guerra.439 A Bola tornou-se rapidamente um dos periódicos mais lidos em território português e um dos principais espaços de divulgação, debate, análise e crítica do fenómeno desportivo. Jornal dedicado a “todos os desportos” tal como constava no cabeçalho, desenhado a letras vermelhas, a grande razão de ser do então bissemanário era o futebol. Fundado por homens que consagraram praticamente toda a sua vida a esse desporto, enquanto jogadores, treinadores, jornalistas e dirigentes, era, de facto, no futebol que assentava tanto a cobertura mais detalhada como as análises mais profundas nas páginas do jornal. A cobertura noticiosa de A Bola apresentava-se, contudo, eclética e diversa. O ciclismo

437 Decreto-Lei n.º 32 946 de 3 de Agosto de 1943. 438 «Bola de Saída», A Bola, 29 de Janeiro, 1945, 1. 439 Serpa, Cândido de...

e, em menor escala, o boxe eram as modalidades mais populares depois do futebol. Num terceiro plano encontravam-se o atletismo, o hóquei em patins, o basquetebol e o andebol.

Nos anos seguintes, o desenvolvimento do futebol em Portugal foi marcado pelo confronto entre duas lógicas, mais antagónicas do que convergentes, corporizadas por estas duas instituições. O jornal A Bola procurou, com o seu projecto editorial, aprofundar no pós-guerra as raízes de uma autonomia do campo desportivo, lutando por um desenvolvimento do futebol em Portugal, a partir de uma racionalidade específica. A Direcção-Geral dos Desportos, ambicionou, por sua vez, subordinar esse mesmo terreno a um conjunto de lógicas que tomavam aquela modalidade como um meio para diversos fins, donde se destacavam o projecto de nacionalização do desporto e a sua utilização como instrumento de higiene individual e disciplina social. De um lado, tentava-se, aceitando e alimentando o processo de espectadorização, construir um público informado, generalizando os instrumentos de percepção da prática e democratizando um conjunto de esquemas de avaliação e classificação, que permitissem às multidões que acorriam aos estádios um conhecimento mais aprofundado dos diferentes factores que condicionavam o espectáculo. Do outro, procurou-se, essencialmente, garantir o controlo político das administrações dos clubes e organizações desportivas, e reenquadrar o sentido da competição, e portanto da produção e do consumo do espectáculo desportivo.

A criação da Direcção-Geral de Educação Física, Desportos e Saúde Escolar respondeu a um conjunto de anseios que se manifestavam há já algum tempo na Assembleia Nacional, no contexto dos debates que enquadraram a produção legislativa do Estado Novo sobre o fenómeno da educação física e dos desportos. Em Fevereiro de 1935, quando o projecto de reorganização da educação física no ensino secundário, apresentado pelo Capitão Henrique Galvão, o primeiro director da Emissora Nacional e à época um fervoroso salazarista,440 foi chumbado, um outro elemento da ala direita do regime, o deputado Francisco Nobre Guedes, que considerou aquela proposta bastante limitada perante o que era necessário fazer,

440 Sobre Henrique Galvão, veja-se por exemplo, Nélson Moreira Antão e Célia Gonçalves

Tavares, «Henrique Galvão e o assalto ao Santa Maria. Percurso de uma dissidência no Estado Novo e suas repercussões internacionais», Revista Sapiens, n.º 0 (2008). Salvo referência em contrário, as notas biográficas dos deputados da Assembleia Nacional e dos procurares à Câmara Corporativa foram construídas a partir de Manuel Braga da Cruz e António Costa Pinto, dir., Dicionário Biográfico Parlamentar (Lisboa: Assembleia da República e Imprensa de Ciências Sociais, 2004).

reconheceu então que “o Estado não tem tido qualquer interferência na organização e disciplina dos desportos particulares e, no entanto, eles têm um volume apreciável. Ainda há dias os jornais vinham cheios de notícias de determinados actos de indisciplina praticados em campos de foot-ball”, considerando, um pouco mais à frente, “que a disciplina deve entrar forçosamente nos desportos particulares.”.441

Cerca de quatro anos depois, no decurso dos debates que precederam a aprovação da proposta de lei que criou o INEF, reconheceu-se novamente através do parecer da Câmara Corporativa que “a dispersa legislação existente, que bem pode classificar-se de abundante, demonstra as tentativas, apenas ensinadas, para dar uma platónica satisfação à opinião pública, que de há muito sentia que os problemas de educação física, de tam alto interêsse nacional, deviam merecer ao Estado a maior atenção.”442 A necessidade de um corpo de técnicos aptos a enquadrar racional e cientificamente as práticas atléticas era urgente perante, tal como era expresso na proposta legislativa, o “fenómeno geral e alarmante de depressão moral e de degenerescência física” para o qual contribuíam também “as práticas desportivas, nascidas de um instinto de movimento e de luta” que “muitas vezes têm levado também, pela ausência de preparação gimnástica, pela arbitrária especialização e por excessos atléticos, ao desequilíbrio funcional e morfológico.”443

Esta crítica aos excessos atléticos do desporto competitivo surgia, porém, parcialmente mitigada pela necessidade de reconhecer o “esforço das entidades particulares”. Entre estas organizações, sobretudo aquelas afastadas do mundo do desporto mediático, encontravam-se o Ginásio Clube Português, cujo papel como precursor da educação física em Portugal era sublinhado. Com efeito, lê-se no parecer da Câmara “não podem deixar de ter-se como valiosos os subsídios dados pelas associações particulares a causa de tanta monta.” Mesmo que face aos “exageros da competição e, à face do critério científico, se reconheçam riscos de prejuízos devidos à prática de alguns por indivíduos imperfeitamente dotados fisicamente, devemos reconhecer quo o valor social desta actividade excede as desvantagens que possam ser-lhe atribuídas. É caso para poder dizer-se que emquanto se distraíram na prática dos desportos - mesmo em mal escolhidos

441 Diário das Sessões, n.º 10S, 13 de Fevereiro, 1935, 1-6. 442 Diário das Sessões, n.º 45S, 8 de Março, 1939, 23-28. 443 Diário das Sessões, n.º 42, 27 de Fevereiro, 1939, 377-392.

desportos - estavam desviados da taberna, do jôgo, do lupanar, da alfurja revolucionária, etc.”444

Para além da problemática relação entre futebol e outro tipo de lazeres, como foi possível verificar pelo caso de Olhão, onde o jogo, o lupanar e a taberna integravam uma mesma constelação de práticas, este ponto de vista sobre a utilidade social dos desportos, mesmo em “mal escolhidos desportos”, estava longe de ser consensual, ou até maioritário, na Assembleia Nacional. O deputado Ângelo César, presidente do Futebol Clube do Porto entre 1938 e 1939, antigo membro do Centro Católico, e apesar da sua inscrição clubista, foi um dos que de forma mais ardente reivindicou uma intervenção musculada no Estado “para evitar que a anarquia organizada continue a ser o espectáculo de todos os dias na vida dos desportos”. O Estado não deveria “confinar-se na sua acção a remédios de repressão policial” e muito menos poderia “consentir que esse problema seja autonomamente resolvido e definido por organizações que são filhas legítimas do liberalismo”. Opondo-se àquilo que considerava ser um “programa mínimo” reduzido “a cumprimentos de reverência ou acatamento simbólico, a fotografias mais ou menos decorativas e a saudações olímpicas em que já se espalmam algumas das mãos que ainda há bem pouco tempo se mostravam fechadas” Ângelo César, com aclamação da Assembleia, exigiu mais. O deputado recordou os valores monetários mobilizados pelo futebol, e que não poderiam deixar de ser fiscalizados; criticou a forma como “analfabetos” representavam o país em competições internacionais, reclamando que o Estado verificasse “se quem representa o País tem a suficiente preparação ou devoção nacionalista que o torne digno de lá fora falar conscientemente como cidadão do Estado Novo português”; e, acima de tudo, voltou a sublinhar a indisciplina que se manifestava nas competições que interessavam às multidões, “entusiasmando-as ou deprimindo-as”.445

No mesmo sentido, também Luiz de Pina, um médico, que há longos anos vinha também clamando “contra a má prática dos desportos, em certos campos e da parte de muitas entidades interessadas”, não deixou de realçar a incompletude da obra do Estado Novo e a necessidade do seu aprofundamento, por via da regulamentação da actividade desportiva fora do meio escolar. O presidente do Instituto de Criminologia do Porto fundamentava os seus argumentos numa obra

444 Diário das Sessões, n.º 45S, 08 de Março, 1939.

intitulada La criminalità negli sports, de 1927, na qual o autor, Giuseppe del Vecchio, “analisa a frio, seca e duramente a psicologia dos desportistas, chegando-se ao termo do livro com a impressão de que o estádio, o palco de luta e a estrada de corrida mais não são do que óptimos ninhos de anormais e degenerados”.446 Em função destes argumentos pediu, ainda em 1935, num artigo publicado no Comércio do Porto, a instituição de uma Academia Nacional de Educação Física e Desporto, inspirada justamente na Academia Fascista de Educação Física. A esta organização caberia velar “por toda a actividade desportiva nacional, procurando lançar os novos nos exercícios físicos, afastando- os do campo do desporto que mereça condenação, pelos gravíssimos prejuízos que causa. O exemplo de Itália merece imitação!". O desporto, quando distanciado dos princípios de mens sana in corpore sano, pode ler-se no artigo de 1935, “não é disciplina, é luta contra um elemento e um adversário, luta que faz perder a fiscalização moderadora dos outros e de si mesmo, tornando-se brutal”. Mas não era apenas no campo de jogos que o desporto pervertia. Para Luís de Pina afigurava-se “por demais danosa, para a paz social da Nação, a rija batalha entre partidos ou jogadores. Transformado em puro jogo, o Desporto cria delirosos amigos e inimigos em redor de homens e agremiações, arrastando estólidas bulhas entre aldeias, vilas e cidades, facto de tanta gravidade, que nem de comentários precisa! Longe de se tornar meio de união entre os Portugueses, como devia ser, o Desporto desachega, esparralha as multidões”.447

Com a criação do INEF, o deputado considerou que se encontravam reunidas as condições para a resolução do problema, depois de em 1936, no decreto que reformava a Junta Nacional de Educação, se terem verificado avanços significativos no âmbito da regulação das práticas desportivas no país. Aliás,

446 Diário das Sessões, n.º 74, 13 de Fevereiro, 1940, 265-274.

447 Luís de Pina, «Crónica Científica, Educação Física e Desporto», Comércio do Porto, 15 de

Fevereiro, 1935, 2. Não se tratava, porém, de caso isolado. No dia anterior, o mesmo periódico recordava, no quadro de um apelo à disciplina e à educação cívica e moral no quadro de uma sucessão de escândalos de adulteração de azeite por óleo de amendoim que se observavam em todo o país, que tem «feito por vezes algumas sensatas e oportunissímas considerações sobre o péssimo costume que caracteriza o rapazio das ruas mas que, não contente em fazer de qualquer ponto da cidade improvisados campos de futebol, com manifesto desdém pelo sossego e integridade física de quem passa, se entretém ainda a rabiscar pelas paredes garatujas ofensivas do pudor e da moral. E tendo apelado para as autoridades policiais, no sentido de por cobro a tais desmandos, que fazem rebaixar a nossa mentalidade educativa pode o Comércio do Porto orgulhar-se jubilosamente por ter concorrido para uma grande obra de saneamento moral». «Saúde Pública, Higiene do Corpo e do Espírito - Necessidade de defender uma e outra», Comércio do Porto, 14 de Fevereiro, 1934, 1-2.

havia sido em função dessa mesma reforma que havia abdicado de instituir na cidade do Porto um Conselho Municipal de Educação Física e Desportos, cuja constituição tinha sido aprovada no ano anterior, por proposta sua, na Assembleia Nacional. Para Luiz de Pina, essa sua proposta, justificada “pela urgente necessidade de organizar a complexa educação física e espiritual da infância e da adolescência, no sentido do tradicionalismo histórico, fortalecendo-a para os altos destinos desta nossa gloriosa e grande Pátria” já que “a má orientação da educação física e dos desportos é grave causa de transtornos orgânicos, por vezes irremediáveis, transtornos que beneficiam o depauperamento da raça”, encontrara resposta nas renovadas atribuições da Junta Nacional de Educação.

Entre as competências da Junta Nacional de Educação, no campo dos desportos e da educação física, o deputado destacou sete pontos que lhe pareciam fundamentais para a intervenção do Estado no âmbito do movimento associativo e da prática desportiva. Às autoridades públicas cabia, antes de mais, a tarefa, de foro prescritivo de emitir pareceres sobre os “métodos de ginástica de formação do indivíduo tendentes ao seu maior valor físico útil para ele e para a colectividade”, incluindo os métodos de educação física pré-militar a adoptar pela Mocidade Portuguesa. Estas atribuições eram também extensíveis à necessidade de “orientação e coordenação dos desportos e dos jogos desportivos, no sentido da boa ordem anátomo-fisiológica, do espírito de fraternidade e da leal competição, bem como a cooperação das respectivas organizações na obra educativa do Estado”. Numa outra ordem de funções, ao Estado, por via da Junta Nacional de Educação, caberia a responsabilidade do “levantamento da carta desportiva do país” e a organização e sistematização “de todos os relatórios e dados estatísticos sobre a acção da escola e das organizações desportivas portuguesas no que respeita à cultura física e preparação para o dever cívico e militar”. Dois aspectos que se encontravam intimamente relacionados com o dever de “promover o desenvolvimento de todas as espécies de desporto, particularmente o exercício ao ar livre, bem como estimular a criação de uma ampla rede de gimnásios, piscinas naturais ou artificiais e campos de jogos em todo o País.” Finalmente, e como estipulava ainda uma das alíneas do regulamento da Junta Nacional de Educação, era fundamental uma atenção às representações oficiais portuguesas nas competições desportivas internacionais, devendo emitir um parecer “em cada caso, sobre a sua petição, bem como a cooperação das representantes que hão-se

saber e poder servir o brio da Nação, ainda quando não se classifiquem nos primeiros lugares”.448

Apesar de já se encontrar legislada há alguns anos, e como se pôde verificar pelos debates na Assembleia Nacional, mais de uma década depois do golpe militar de 28 de Maio de 1926, a intervenção do Estado Novo no campo dos desportos encontrava-se, no final da década de trinta, ainda por estruturar de forma julgada conveniente pelo poder político. O campo desportivo ainda não havia sido nacionalizado e submetido à intervenção normalizadora do Estado. Foi precisamente a partir de 1942, três anos depois dos debates que enquadraram a criação do INEF, e com a criação da Direcção-Geral de Educação Física, Desportos e Saúde Escolar, que o conjunto de competência atribuídas à Junta Nacional de Educação naquele domínio se operacionalizaram de modo mais preciso.

Mais do que a afirmação de um projecto, o dispositivo legal que regulamenta o funcionamento da Direcção-Geral de Educação Física, Desportos e Saúde Escolar, pode, em primeiro lugar, ser interpretado como uma admissão das dificuldades sentidas pelos programas de enquadramento dos lazeres e tempos livres de organizações do Estado Novo perante a concorrência dos clubes desportivos. No início da década de trinta a Mocidade Portuguesa, a FNAT ou, ainda mais relevante, a instituição escolar encontravam-se longe de garantir a massificação da prática desportiva, como tivemos oportunidade de verificar. Não se tratava somente do resultado da incapacidade financeira do Estado, ou até da sua indisponibilidade, para criar uma extensa rede de cursos de educação física. Reconhecia-se no decreto a fraca “sedução” que os cursos de ginástica e os programas desportivos oficiais exerciam sobre a população portuguesa, mais interessada nos desportos e, em especial, no futebol. A dimensão da rede federativa e das associações particulares dedicadas aos desportos assim o comprovava.

No sentido de mitigar esse problema, à Direcção-Geral coube, por conseguinte, a missão de “dirigir” e “orientar” a esfera desportiva, “no sentido de sobreporem aos interesses clubistas o interesse geral, de substituírem a política da vitória do clube seja como for por uma política desportiva de sabor

verdadeiramente nacional”. Coube-lhe também a tarefa de regular a actividade dos “elementos da organização desportiva existentes”, que cresceram à margem das instituições e das intenções estatais. Entre os 13 pontos ao longo dos quais se

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