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PARTE I PANORAMA ATUAL DA REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA

2. Direito ao planejamento familiar como direito fundamental

2.1. Direito à reprodução ou direitos reprodutivos

2.1.1. Direito à filiação

O reconhecimento de um estado de filiação decorre da mudança que o próprio conceito de família sofreu com o decorrer do tempo50. Ao considerar-se que o direito à experiência familiar é um direito fundamental, consequemente, o estado de filiação ganhou uma nova perspectiva, sendo algo essencial para que o indivíduo estruture-se biopsiquicamente.

Asseveram Maria de Fátima Freire de Sá e Ana Carolina Brochado Teixeira que o estado de filiação é diferente do direito de personalidade ao conhecimento da origem genética, que se refere à origem biológica, que se referem aos traços genéticos que o acompanham. “O estado filiação diz da experiência de ser filho, sem que esta esteja atrelada a laços consanguíneos, à similitude do DNA ou a um título civil, que se traduz juridicamente em uma certidão de nascimento.”51

Em seu artigo “Desbiologização da Paternidade”, João Baptista Villela questiona qual é o quid específico que faz de alguém um pai, independentemente da geração biológica: “Se se prestar atenta escuta às pulsações mais profundas da longa tradição cultural da humanidade, não será difícil identificar uma persistente intuição que associa a paternidade antes com o serviço que com a procriação52.”

E é sob a ótica de se ter um direito de viver a experiência de ser cuidado e ser objeto de afeto é que as autoras encaixam o direito à filiação, como um direito de personalidade. Ou seja, de estar inserido dentro de uma família, de ter sido querido, planejado, independentemente dos vínculos biológicos. Na visão das mencionadas autoras, é de grande valia desmistificar o estado de filiação como um vínculo exteriorizado através de uma certidão de nascimento.

Apesar quando estiverem sedimentados os contornos do que significa ser filho para o Direito é que será possível a verdadeira incorporação deste como um direito de personalidade, porque eta experiência é essencial para a concretização da dignidade humana, para a construção da personalidade, ato jurídico dialético, dialógico, que tem suas bases

50 Sobre o tema, ver: GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação: o biodireito e as relações

parentais: o estabelecimento da parentalidade-filiação e os efeitos jurídicos da reprodução assistida heteróloga. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, capítulo III, pp. 337-488.

51 SÁ, Maria de Fátima Freire de.; TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Filiação e biotecnologia. Belo

Horizonte: Mandamentos, 2005, p. 39.

52 VILLELA, João Baptista. DESBIOLOGIZAÇÃO DA PATERNIDADE. REVISTA DA FACULDADE DE

DIREITO DA UFMG, [S.l.], n. 21, p. 400-418, fev. 2014. ISSN 1984-1841. Disponível em: <https://www.direito.ufmg.br/revista/index.php/revista/article/view/1156>. Acesso em: 28 ago. 2020.

fincadas na alteridade e na percepção da própria importância do outro53.

Nas palavras de Eduardo de Oliveira Leite, o desejo de ter filhos está vinculado também à intenção de fundar uma família. “O projeto parental encontra sua vocação mais legítima no momento em que surgem os filhos. São eles que garantem o desenvolvimento familiar e a mútua vantagem que se estabelece entre os membros de uma família”54.

Mais do que o desejo de se ter um filho, importante é ter consciência da responsabilidade de se trazer uma criança ao mundo. Segundo Débora Gozzo e Wilson Ricardo Ligiera, a procriação deve ser um ato de profunda reflexão e não de mero impulso sexual ou instinto direcionado à preservação da espécie humana, devendo ser garantidos os direitos fundamentais da criança, “de modo a lhe proporcionar uma existência digna — do que decorre a responsabilidade dos pais pelas relações jurídicas pessoais e patrimoniais relacionadas ao filho”55.

A respeito da filiação, Guilherme Calmon Nogueira da Gama recorda que a antiga classificação do Código Civil de 1916, que dividia os filhos em legítimos, legitimados, ilegítimos e quanto a estes, naturais e espúrios (adulterinos e incestuosos), não foi recepcionado pela Constituição de 1988, diante da carga de preconceito semântico56, corroborando com o afirmado acima sobre a mudança na percepção do que é a família e sobre a dignidade humana do próprio direito de ser filho.

Gama classifica a filiação como a (i) matrimonial e extramatrimonial, (ii) resultante de procriação carnal e procriação assistida, (iii) natural e civil, (iv) legal (jurídica), biológica e afetiva. Sendo que a oriunda de vínculo matrimonial possui três fundamentos: jurídico (presunção legal de paternidade do filho de sua esposa), biológico (marido é o genitor do filho de sua esposa, pois normalmente somente ele deve manter contato sexual com ela) e socioafetivo (o marido se comporta como pai do filho de sua esposa, e recebe reciprocamente tratamento afetivo).

53 SÁ, Maria de Fátima Freire de.; TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Filiação e biotecnologia. Belo

Horizonte: Mandamentos, 2005, p. 40.

54 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos,

éticos e jurídicos. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995, p. 146.

55 GOZZO, Débora; LIGIERA, Wilson Ricardo. Maternidade de substituição e a lacuna legal: questionamentos. Civilistica.com. Rio de Janeiro, a. 5, n. 1, 2016. Disponível em: <http://civilistica.com/maternidade-de-

substituicao-e-a-lacuna-legal-questionamentos/>. Acesso em: 03.Set.2020.

56 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação: o biodireito e as relações parentais: o

estabelecimento da parentalidade-filiação e os efeitos jurídicos da reprodução assistida heteróloga. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 466.

Para fins desta pesquisa, ater-nos-emos à filiação oriunda de procriação assistida, a qual não decorre da relação sexual entre o homem e a mulher para que resulte a concepção do embrião. Este desenvolver-se-á por meio de técnica de reprodução medicamente assistida, que permitirá a fertilização do óvulo pelo espermatozóide.

A grande distinção entre a procriação carnal e a medicamente assistida é a possibilidade de reprodução heteróloga - que tenha material genético de terceiro, estranho ao casal. Será reprodução heteróloga unilateral a pater, quando a doação de espermatozóide for de terceiro, e a mater, quando for doação de óvulo de terceira. Ressalvando-se, sempre, que há impossibilidade de os doadores de gametas tornarem-se pais jurídicos da criança, diferentemente, do que ocorreria se houvesse relação sexual57.

Há, de certo modo, uma assimilação às fontes da filiação adotiva naquilo em que ambas as filiações têm em comum - a origem não sangüínea - em uma das linhas - paterna ou materna - ou em ambas, em que o fator biológico é totalmente irrelevante e, nem por isso, a parentalidade-filiação deixa de ser estabelecida de maneira irrevogável na estrutura do direito brasileiro. Nesse sentido, é válido o recurso de indagação analógica da norma contida no art. 1.626, parágrafo único, do novo Código Civil, em relação à reprodução heteróloga unilateral, porquanto em se recorrendo à técnica reprodutiva consistente na inseminação artificial com a utilização de sêmen de doador, o que juridicamente ocorrerá será a vontade do marido - ou companheiro - de se tornar pai do filho de sua esposa, não lhe retirando o vínculo de maternidade-filiação que fica, portanto, preservado, bem como o parentesco existente com todos os parentes de sua mãe58.

Isso significa que o filho do casal que utiliza a técnica de reprodução assistida heteróloga, assim como ocorre com a adoção, não terá o mesmo material genético de seus pais, mas não deixa de ser considerado como filho deles, inclusive, por dispositivo legal, inscrita no artigo 1.597 do Código Civil de 2002, que prevê que na constância do casamento presumem-se filhos do marido aqueles concebidos por inseminação artificial heteróloga desde que haja prévia autorização deste.

Cabe ressaltar, contudo, o consentimento do marido ou companheiro no Brasil é essencial, sendo que sua ausência poderá ser motivo de separação do casal por adultério casto

57 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação: o biodireito e as relações parentais: o

estabelecimento da parentalidade-filiação e os efeitos jurídicos da reprodução assistida heteróloga. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 473.

58 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação: o biodireito e as relações parentais: o

estabelecimento da parentalidade-filiação e os efeitos jurídicos da reprodução assistida heteróloga. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 474.

ou da seringa, conforme pontua Maria Helena Diniz, por afetar a solidez do casamento, configurando-se a injúria grave, geradora de ação de responsabilidade civil por dano moral59. Do mesmo modo, a presunção de paternidade só poderá ser excepcionalmente desconstituída por iniciativa do marido (artigos 1.600 e 1.602 do Código Civil) até o momento da inseminação. Esta ocorrida, não poderá desconhecer a paternidade do filho60.

2.1.2. Os savior sibling ou bebê-medicamento e o dever de nascer

Vimos, no item anterior, que o Direito à filiação refere-se ao estado de ser filho, sob a ótica de se ter um direito de viver a experiência de ser cuidado e do afeto. Nesse sentido, fazemos uma breve observação sobre os filhos que são programados para nascer, não pela vontade inicial de um projeto parental, mas, com o objetivo de salvar o irmão, os chamados “bebês-medicamento”, “bebê-salvadores” ou savior sibling.

Tendo como base o princípio da dignidade humana, que é valor fundante na cultura ocidental e epicentro dos demais direitos do ser humano, cabe questionar a dignidade desta criança por nascer. Nunca é demais recordar que são tutelados, pela Constituição da República, não só a vida propriamente dita, mas a vida digna. Desse modo, se a vida digna é pressuposto essencial da condição humana, não se pode deixar de considerar a grande carga emocional que deve ser para uma criança ser responsável pela sobrevida do irmão.61

59 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 691. A autora, que se

mostra contrária ao uso desta técnica, elenca em sua obra, diversas situações em que a reprodução humana assistida heteróloga pode trazer problemas para o casal e para a própria criança oriunda por este modo de reprodução.

60 “Esta solução parece ser mais razoável e justa ante o princípio Diez-Picazo, que se baseia no princípio geral

do direito fundado na boa-fé e da lealdade do comportamento. Se se impugnar fecundação heteróloga consentida, estar-se-á agindo deslealmente, uma vez que houve deliberação comum dos consortes, decidindo que o filho deveria nascer. Tal comportamento, apesar de eticamente repugnante, não é juridicamente ilícito, porque nenhum ato voluntário poderá sê-lo se não for expressamente proibido por lei; deverá prevalecer como princípios e segurança das relações jurídicas, incorporando compromisso vinculante entre cônjuges de assumir paternidade e maternidade, mesmo com componente genético estranho, dando-se prevalência ao elemento institucional e não ao biológico.” DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 693.

61 FARIA, Alexandra Gomes de. CABRERA, Heidy de Ávila. O dever de nascer e o direito à vida digna. In:

GOZZO, Débora (coord). Informação e direitos fundamentais: a eficácia horizontal das normas constitucionais. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 129-130. A autora cita o caso de Doreen Flynn. Sua segunda filha, Jordan nasceu com uma doença rara, chamada "anemia Facomi”, caracterizada pela produção inadequada das células sanguíneas que ataca a medula óssea. Sua melhor chance de sobrevivência seria por meio do recebimento das células sanguíneas de um parente próximo. Não sendo compatíveis nem os pais, nem o irmão mais velho, o casal optou por gerar um filho que nascesse sem o gene responsável pela doença. Apesar de os médicos afirmarem que havia embriões com características propícias para alcançar o fim desejado, Doreen deu à luz a gêmeas também portadoras de anemia.

O filme My sister’s Keeper (no Brasil, traduzido como Uma Prova de Amor)62, baseada no romance da norte-americana Jodi Picoult, traz a história de Anna, uma menina que foi geneticamente concebida para salvar sua irmã mais velha, Kate, que tem leucemia promielocítica aguda, um tipo raro de câncer. Aos 15 anos, Kate é internada e sua irmã Anna deverá doar-lhe um rim, a fim que Kate possa sobreviver. Anna, então, processa seus pais para obter sua emancipação médica. Ainda que na ficção haja a imposição de doação de órgão, na prática, o que ocorre é a doação de medula ou sangue do cordão umbilical do bebê recém-nascido, o que não gera uma lesão física irreversível, como é a retirada de um órgão.

Paralelamente às técnicas de fertilização artificial, foram desenvolvidas técnicas chamadas de diagnóstico genético pré-implantatório (DGPI)63 que auxiliam na identificação de anomalias genéticas em embriões obtidos por FIV antes de serem implantados no útero, para, então, selecionar os que possuem determinadas características ou eliminar aqueles que não são livres de algum defeito congênito64. Juliano Ralo Monteiro alerta que de um lado, o DGPI possibilita a melhora na qualidade de vida, mas, de outro, há o enorme risco de voltar aos sonhos nazistas de eugenia:

De fato, o desenvolvimento do DGPI tem sido utilizado em pleno século XXI para outros fins, como a criação dos chamados bebês- projetados (designer babies). Essa técnica é a mesma utilizada em Anna, no filme mencionado, e em inúmeros casos de Savior Siblings. Chama atenção, entretanto, que, por meio da mesma técnica de DGPI pode-se silenciosamente progredir para, v.g., a seleção das características físicas dos bebês, de maneira a criar crianças sob medida, ao arbítrio e vontade dos pais65.

Esse é um ponto crucial que merece reflexão: se, de um lado, os pais têm o direito fundamental do planejamento familiar, teriam também, de outro lado, direito à encomenda de características genéticas dos filhos, ainda que seja com o objetivo nobre de salvar o filho

62 Disponível em: https://www.imdb.com/title/tt1078588/. Acesso em 24.Ago.2020.

63 “O diagnóstico genético de pré-implantação torna possível submeter o embrião que se encontra num estágio

de oito células a um exame genético de precaução. Inicialmente, esse processo é colocado à disposição de pais que querem evitar o risco de transmissão de doenças hereditárias. Caso se confirme alguma doença, o embrião analisado na proveta não é reimplantado na mãe; desse modo, ela é poupada de uma interrupção da gravidez que, do contrário, seria efetuada após o diagnóstico pré-natal. A pesquisa sobre células-tronco totipotentes também se move na perspectiva médica da prevenção de doenças.” HABERMAS, Jürgen. O Futuro da Natureza Humana. São Paulo: Martins Fontes, 2004, p. 26.

64 MONTEIRO, Juliano Ralo. Savior Sibling: limites ao poder familiar? pp. 180-202. In: GOZZO, Débora

(coord). Informação e direitos fundamentais: a eficácia horizontal das normas constitucionais. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 183.

65 MONTEIRO, Juliano Ralo. Savior Sibling: limites ao poder familiar? pp. 180-202. In: GOZZO, Débora

(coord). Informação e direitos fundamentais: a eficácia horizontal das normas constitucionais. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 184.

doente? O planejamento familiar aqui não esbarraria na dignidade do filho que foi, literalmente, desenhado? Jürgen Habermas vai além: “É compatível com a dignidade humana ser gerado mediante ressalva e, somente após um exame genético, ser considerado digno de uma existência e de um desenvolvimento? Podemos dispor livremente da vida humana para fins de seleção?”66.

Juliano Ralo Monteiro destaca que apesar de complexa a questão e a ausência de legislação, há no Direito brasileiro efetivo amparo aos direitos eventualmente ameaçados: trata-se do sistema de proteção dos direitos da personalidade67. Ainda que nos casos de Savior

Siblings haja uma colisão de direitos fundamentais (do irmão mais velho, acometido por doença, à saúde; e do irmão mais novo à sua integridade corporal e sua dignidade), é preciso ponderar que não há direito fundamental absoluto, devendo acatar-se o critério de proporcionalidade, de Robert Alexy68.

O método de DGPI permite criar um irmão salvador que será livre da doença hereditária, mas também, proporcionará um doador idôneo capaz de possibilitar totalmente a cura. A técnica, que não é isenta de falhas, tem sido comemorada por médicos e famílias do mundo inteiro69.

O primeiro Savior Sibling nasceu em 28 de Agosto de 2000, nos Estados Unidos. Adam Nash foi um bebê geneticamente selecionado para salvar a vida de sua irmã, Molly, de 6 anos,

66 HABERMAS, Jürgen. O Futuro da Natureza Humana. São Paulo: Martins Fontes, 2004, pp. 28-30. O autor

ainda provoca: “Com o diagnóstico genético de pré-implantação, hoje já é difícil respeitar a fronteira entre a seleção de fatores hereditários indesejáveis e a otimização de fatores desejáveis. Quando existe a possibilidade de escolher mais de um único ‘composto multicelular’ potencialmente ‘excedente’, não se trata mais de uma decisão binária entre sim e não. O limite conceituar entre a prevenção do nascimento de uma criança gravemente doente e o aperfeiçoamento do patrimônio hereditário, ou seja, de uma decisão eugênia, não é mais demarcado.”

67 MONTEIRO, Juliano Ralo. Savior Sibling: limites ao poder familiar? pp. 180-202. In: GOZZO, Débora

(coord). Informação e direitos fundamentais: a eficácia horizontal das normas constitucionais. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 196.

68 “Princípios são mandamentos de otimização em face das possibilidades jurídicas e fáticas. A máxima da

proporcionalidade em sentido estrito, ou seja, exigência do sopesamento, decorre da relativização em face das possibilidades jurídicas. Quando uma norma de direito fundamental com caráter de princípio colide com um princípio antagônico, a possibilidade jurídica para a realização dessa norma depende do princípio antagônico. Para se chegar a uma decisão é necessário um sopesamento nos termos da lei de colisão. Visto que a aplicação de princípios válidos - caso sejam aplicáveis - é obrigatória, e visto que para essa aplicação, nos termos de colisão, é necessário um sopesamento, o caráter principiológico das normas de direito fundamental implica a necessidade de um sopesamento quando elas colidem com princípios antagônicos. Isso significa, por sua vez, que a máxima da proporcionalidade em sentido estrito é deduzirem do caráter principiológico das normas de direitos fundamentais.” ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 117-118.

69 Sobre o tema: First successful saviour sibling treatment for UK. Disponível em:

https://www.bbc.com/news/health-12055034. Case Study in Savior Siblings. Disponível em: https://www.nature.com/scitable/forums/genetics-generation/case-study-in-savior-siblings-104229158/.

Congresso deve legislar sobre “savior sibling”. https://www.conjur.com.br/2012-fev-20/savior-sibling-brasileiro- motivar-congresso-legislar-tema?utm_source=twitterfeed&utm_medium=twitter. Acesso em 24.Ago.2020.

que sofria com anemia de Fanconi. Após o nascimento, o sangue do seu cordão umbilical foi coletado e posteriormente transplantado para sua irmã. No Brasil, em fevereiro de 2012, Maria Clara70 foi o primeiro bebê savior sibling. O embrião que deu origem à criança foi selecionado para não conter os genes doentes iguais aos da sua irmã, Maria Vitória, para que o transplante pudesse ocorrer. Após o nascimento, foram coletadas as células do cordão umbilical de Maria Clara, mas como estas não foram suficientes, teve-se de esperar um ano, para que pudesse ser feito um transplante de medula.

No Brasil, a regulamentação da matéria está a cargo do Conselho Federal de Medicina, cuja norma técnica n° 5 da Resolução 2.168, de 2017, prevê que "as técnicas de reprodução assistida não podem ser aplicadas com a intenção de selecionar qualquer característica biológica do futuro filho, exceto para evitar doenças no possível descendente”71. No Congresso Nacional, tramita o Projeto de Lei 7.880 de 2017 que trata da permissão para implantação de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro com intuito de doação de células ou tecidos para utilização terapêutica em irmão. Nas audiências públicas realizadas, o grande questão, mais do que a utilização de um irmão para salvar o outro, foi o descarte de embriões não implantados. Alguns julgamentos no Brasil determinam que os planos de saúde sejam obrigados a custear a fertilização in vitro para a geração de irmãos-salvadores72.

70 Bebê geneticamente selecionado cura doença da irmã. Disponível em: https://veja.abril.com.br/saude/bebe-

geneticamente-selecionado-cura-doenca-da-irma/. Acesso em 24.Ago.2020.

71 Resolução CFM n. 2.168/2017. Disponível em:

https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2017/2168. Acesso em 25.Ago.2020.

72 TJ-DFT 07017108120198070000. Publicação 12/07/2019. A negativa pelos planos de saúde do custeio de

fertilização in vitro contraria o direito fundamental ao planejamento familiar. O plano de saúde interpôs recurso contra decisão que concedeu tutela de urgência para o custeio de fertilização in vitro requerida por um casal com filha portadora de anemia falciforme, cuja perspectiva única de cura seria o transplante de medula óssea proveniente de um familiar saudável e compatível, preferencialmente um irmão. O recorrente argumentou que o contrato não previu cobertura para o procedimento com seleção embrionária por intermédio do diagnóstico genético pré-implantacional (PGD). Ao examinar o agravo, a Turma ressaltou a “necessidade premente” de aplicação da técnica de reprodução assistida para potencializar as chances de nascimento de filho compatível