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O documento emanado do Ministério da Educação e do Desporto – Secretaria de Educação Especial, intitulado Diretrizes Gerais para Atendimento Educacional aos Alunos Portadores de Altas Habilidades/Superdotação e Talentos, datado de 1995, foi elaborado partindo-se do pressuposto de que o salto qualitativo do progresso de um país não se dá se não houver determinação do governo em assumir uma política educacional clara, inserida no conjunto das políticas sociais, relativa ao desenvolvimento das potencialidades de seu povo. Além disso, tal documento foi elaborado com vistas à dinamização da implementação do atendimento educacional específico para os alunos das redes pública e privada que apresentassem altas habilidades/superdotação ou talentos, fornecendo subsídios aos educadores no planejamento e na execução de suas atividades com essa clientela.

Os alunos identificados como superdotados têm assegurado o direito a um atendimento específico, amparados na própria Constituição Federal e, de acordo com a Política Nacional de Educação Especial (1994), são dignos de respeito e merecedores de uma educação de melhor qualidade. A filosofia dessa educação, segundo tais Diretrizes (1995), está pautada no desenvolvimento integral do homem e na sua preparação para uma vida produtiva, fundada no equilíbrio entre os interesses individuais e as regras sociais estabelecidas.

O documento sugere ainda a incorporação de novas soluções técnicas e de alternativas metodológicas para avaliação e diagnóstico do superdotado, incentivando uma maior participação sociocultural desse educando e estimulando a oferta de programas sistemáticos de informação à família e à comunidade em geral.

As Diretrizes Gerais para o Atendimento Educacional aos alunos portadores de altas habilidades/superdotação e talentos toma por base alguns documentos de suma importância, alusivos aos direitos humanos e à segurança educacional. Dentre eles, podemos citar:

a) A Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), que preconiza que todo ser humano é elemento valioso qualquer que seja o sexo, a idade física, a idade mental, as condições emocionais, os antecedentes culturais, o grupo étnico e o nível

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social a que pertença e o credo que possua, sendo o seu valor inerente à sua própria natureza, bem como às potencialidades que traz em si.

b) A Convenção sobre os Direitos da Criança (adotada pela Assembléia Geral das Nações Unidas – 20/11/89) em seu art. 2º, que afirma: “Os Estados Partes respeitarão os direitos enunciados na presente Convenção e assegurarão sua aplicação a cada criança sujeita à sua jurisdição, em distinção alguma, independentemente de “raça”, “cor”, sexo, idioma, crença, opinião política ou de outra índole, origem nacional, étnica ou social, posição econômica, deficiências físicas, nascimento ou qualquer outra condição da criança, de seus pais ou de seus representantes legais” (Diretrizes Gerais para o Ensino Especial – MEC, 1995, p. 8).

c) A Constituição da República Federativa do Brasil (datada de outubro/1988), nos seguintes artigos:

Artigo 205. “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”

Artigo 208. “O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:

(...) V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um.”

Artigo 218. “O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica.

§5º É facultado aos Estados e ao Distrito Federal vincular parcela de sua receita orçamentária a entidades públicas de fomento ao ensino e à pesquisa científica e tecnológica.”

d) A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 5.692/71), em seu artigo 9º: “Os alunos que apresentem deficiências físicas ou mentais, os que se encontram em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados

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deverão receber tratamento especial, de acordo com as normas fixadas pelos competentes Conselhos de Educação.”

e) O Estatuto da Criança e do Adolescente, 2002, em seus artigos 53 – “A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho” – e 54 “É dever ao Estado assegurar à criança e ao adolescente: (...) V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um”.

f) Os Pareceres do Conselho Federal de Educação, a saber:

(i) Parecer nº 255/72 de 09/03/72 (Documenta 136, março de 1972): afirma que o progresso do estudante deve atender a ritmo próprio de aprendizagem e a diversos interesses e aptidões. A freqüência, segundo o parecer, é “dispensável ante a evidência de aproveitamento excepcional” em algum componente curricular. O documento reconhece também a existência de alguns “alunos que revelam especial talento” e defende a não existência de barreiras entre séries, ou seja, ano letivo independente do ano civil, para que o progresso do estudante superdotado possa ser mais veloz, eliminando qualquer perda de tempo. (ii) Parecer n.º 436/72 de 09/05/72 (Documenta 138, maio 1972): admite a

matrícula condicional de aluno superdotado em curso superior, com prazo de até dois anos para apresentação de prova conclusão do Ensino Médio, desde que reconhecida sua superdotação, formalmente, antes da inscrição no vestibular.

(iii) Parecer n.º 711/87 de 02/09/87 (Documenta 321, setembro 1987): detalha um pouco mais os aspectos relacionados à superdotação, estabelecendo ações de atendimento, enunciando os princípios norteadores da Educação Especial – participação, integração, normalização, interiorização e simplificação – e propondo:

A. Conceito e formas de apurar a superdotação;

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C. Procedimentos de identificação; D. Modalidades de atendimento; E. Formação de recursos humanos; F. Estudos e pesquisas;

G. Constituição da Coordenadoria Nacional;

H. Envolvimento das Secretarias e dos Conselhos de Educação, e I. Participação da família, da escola, da empresa e da comunidade. g) A declaração mundial “Educação para Todos” (da qual o Brasil é signatário),

resultante da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizado em Jomtien, na Tailândia, em 1990 – Artigo 1º, item I – “cada pessoa, criança, jovem ou adulto deve estar em condições de aproveitar as oportunidades educativas voltadas para satisfazer suas necessidades básicas de aprendizagem”. (...) “A amplitude das necessidades básicas de aprendizagem e a maneira de satisfazê-las variam segundo cada país e cada cultura e, inevitavelmente, mudam com o decorrer do tempo”.

h) A Declaração da Nova Delhi, de 1993, que evidencia em todas as ações a mais alta prioridade ao desenvolvimento humano, assegurando que uma parcela crescente dos recursos nacionais e comunitários seja canalizada à educação básica e que seja aprimorado o gerenciamento dos recursos educacionais disponíveis.

Apesar da grande quantidade de documentos e menções alusivas ao superdotado, observamos que ainda hoje, ao descrevermos um aluno portador de altas habilidades/superdotado ou talentoso, nos deparamos com alguns aspectos cruciais que merecem ser discutidos, tais como a própria nomenclatura na língua portuguesa, as inúmeras conceituações do que venha a ser um superdotado, seus diferentes e possíveis processos de identificação, as várias formas e possibilidades de atendimento no Ensino Regular, público ou privado, enfim, ainda há muito a ser mais bem compreendido e sistematizado.

A nomenclatura, ao longo dos anos, tem-se constituído fonte de polêmica, dada a diversidade de pontos de vista de diferentes especialistas na área. No documento das Diretrizes Gerais para o Atendimento Educacional aos alunos portadores de altas

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habilidades/superdotação e talentos, considerou-se oportuna a utilização dos termos “altas habilidades” (Conselho europeu); “superdotação” ou “talentos” (Conselho Mundial).

Nesse sentido, vale esclarecer que o termo “altas habilidades” refere-se aos comportamentos observados e/ou relatados que confirmam a expressão de “traços consistentemente superiores” em relação a uma média (por exemplo: idade, produção ou série escolar) em qualquer campo do saber ou do fazer. Além disso, há que se considerar que a identificação de um superdotado é um processo dinâmico que engloba avaliação e acompanhamento abrangentes e contínuos. Assim, a identificação do portador de altas habilidades não decorre somente do acompanhamento de seu rendimento escolar nem dos resultados nos testes de inteligência que possa ter feito. É consensual que uma única fonte de informação jamais será suficiente nem satisfatória para se identificar um superdotado, sobretudo levando-se em consideração a diversidade existente em nosso país, bem como os diferentes contextos socioeconômicos e culturais, além de outras variáveis.

Nas Diretrizes Gerais para o Atendimento Educacional aos alunos portadores de altas habilidades/superdotação e talentos, fica evidente que as escolas regulares devem oferecer um atendimento especializado, para que se possa lidar convenientemente com algumas das características desses alunos, tais como energia e persistência em atividades de que gostam, curiosidade por tudo que os cerca e interesse por temas considerados mais abstratos. Seguindo-se o princípio da integração desses alunos, no sistema de ensino, é recomendado que seja oferecido, preferencialmente, em classes e escolas comuns, sempre que o professor tenha condições de trabalhar com atividades diferentes e disponha de orientação e de materiais pedagógicos adequados. Desta feita, não haveria necessidade de criar classes especiais ou Salas de Recursos, pois cada estabelecimento de ensino poderia determinar a opção dos programas viáveis a serem implementados, considerando seus limites institucionais, os recursos humanos disponíveis e as respectivas características locais e regionais. Vale salientar que a capacitação de recursos humanos para atuar com alunos superdotados deve compreender a formação básica e o constante aperfeiçoamento dos docentes e especialistas da área.

Além disso, esse documento salienta também que, numa fase inicial, considera-se que o aluno apresenta indicadores de superdotação e tais indicadores serão confirmados ou não, posteriormente, por meio de observações livres e dirigidas, realizadas em diferentes situações

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e oportunidades, preferencialmente nas atividades da vida cotidiana e nas da vida acadêmica do aluno. Deve, portanto, fazer parte de todo o processo de identificação, o maior número possível de dados, informações e pontos de vista tanto do diretor da escola, como dos professores, companheiros e familiares do aluno.

Além disso, ainda no processo de identificação do superdotado, recomendam-se outros procedimentos complementares, tais como entrevistas, técnicas de avaliação de habilidades e de interesses e os testes psicológicos específicos.

Um fato interessante a ser mencionado diz respeito ao relatório do Seminário Nacional sobre o Plano Decenal da Educação Especial, realizado em 1994, com a participação de instituições governamentais e não-governamentais atuantes nessa área, onde foram apontados quatro eixos temáticos que interferem diretamente na identificação e no atendimento ao superdotado: (i) a valorização dos recursos humanos; (ii) a qualidade do processo de ensino e aprendizagem; (iii) a gestão do sistema educacional e (iv) a questão de financiamentos e gastos em educação.

Esses eixos deveriam nortear as nações no sentido de assegurar uma implementação mais segura de programas especiais para superdotados, por exemplo. As ações deveriam incluir: articulação permanente entre Ensino Regular e Educação Especial; adaptação e reorientação de propostas curriculares, de modo a favorecer uma adequação à realidade do aluno e a permitir uma maior autonomia didática e pedagógica das escolas; incremento de parcerias e, finalmente, agilização do repasse de verbas, a fim de, implementar sua programação e desenvolver ações integradas, visando ao cumprimento das legislações federais, estaduais e municipais em vigor.

Tais alternativas deveriam ser sempre analisadas em termos de metodologia, material didático e pessoal especializado, adequando-se o ensino às necessidades, ao ritmo de aprendizagem e aos interesses e às características culturais e socioeconômicas dos alunos superdotados, com altas habilidades. Um aspecto mencionado nas Diretrizes e que nos últimos dias vem ganhando força nos recentes artigos publicados no Brasil refere-se ao fato de que o país poderia permitir que os portadores de altas habilidades/superdotados e/ou talentosos atuassem de forma efetiva no desenvolvimento técnico-científico, cultural e artístico do País. Dessa forma, contribuiriam para a solução de problemas e para a elevação do nível de vida dos

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cidadãos e deles próprios, agilizando algumas transformações sociais necessárias que já foram alcançadas por outros países que já se despertaram nessa direção.

Sabe-se que o potencial humano é considerado o maior e o melhor recurso natural de um país. Logo, todo investimento usado para atendimento educacional do aluno que apresenta altas habilidades/superdotação resultaria em alto retorno, trazendo benefícios tanto para o aluno quanto para a sociedade na qual está inserido, visto que tal aluno, devidamente atendido, deverá se sentir mais seguro, confiante em suas potencialidades, e entenderá seu papel social na construção coletiva da cidadania.