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Nesta dissertação, demos especial importância aos comportamentos evidenciados por cinco crianças que foram institucionalizadas, por terem sido vítimas de maus-tratos.

Pensamos ter utilizado a metodologia adequada, uma vez que foi possível alcançar os objectivos previamente estabelecidos e ter dado uma resposta à pergunta de partida:

- De que forma é que os maus-tratos sofridos na família, afectam os comportamentos e as atitudes das crianças que residem no Centro de Emergência Social de Alverca?

Nas cinco crianças do estudo de caso, apesar de numas ser mais evidente do que noutras, constatámos a existência de comportamentos agressivos, uma predisposição para desportos, brincadeiras e filmes violentos, problemas comportamentais, sentimentos de revolta e insucesso escolar. Estas crianças apresentam uma grande sensibilidade e, na maioria das vezes apresentam um olhar triste.

Actualmente, a criança 1 manifesta atitudes decorrentes do seu percurso de vida. O facto de a criança comer muito rapidamente, ser sempre a primeira a acabar, pedir para repetir e comer com mostras de grande satisfação está directamente relacionada com as vivências traumáticas por que passou, tais como a punição física quando se dirigia ao frigorífico e ter passado longos períodos sem comer.

A circunstância de a criança 2 ter sido abandonada pelo pai pode ser apontada como resposta às suas atitudes desagradáveis (como a revolta e o choro incontrolável), aos pedidos de carinho e às chamadas de atenção, embora pela negativa.

As vivências traumáticas – abuso sexual, violência física e negligência - por que passou a criança 3 levam-nos a pensar que esta desencadeou como resposta a estes acontecimentos o facto de mentir aos adultos, fantasiar, pedir e dar-lhes carinho.

Presentemente, a criança 4 apresenta variações de comportamento no CES e na escola. No CES faz constantes chamadas de atenção pela negativa, demonstrando a sua revolta e o seu desagrado. Na escola, é uma criança apática e desinteressada. Apresenta baixa tolerância à frustração, é muito sensível e possui como resposta emocional uma grande revolta, podendo este modo de estar relacionar-se com vivências traumáticas (mau-trato negligencial) experienciadas no passado.

A criança 5 foi vítima de maus-tratos negligenciais e físicos severos. Nos dias que correm, os comportamentos advenientes dessas vivências traumáticas passam por oscilações de comportamento, que variam entre a docilidade e a agressividade, a par da ansiedade em ter uma família.

A predisposição das crianças 1, 2, 4 e 5 para desportos agressivos, filmes e jogos violentos, com batalhas e lutas, pode advir da sua vivência num seio familiar negligente, instável e violento.

Os dias das crianças do CES são passados como os das outras crianças que vivem em famílias, com a variante que a sua família é muito numerosa e diversificada culturalmente.

Diariamente, as crianças do CES vão à escola, têm hobbies e quando chegam a casa desempenham tarefas domésticas (por exemplo: colocar a mesa, tirar a mesa, arrumar a casa-de-banho, …) tal como as crianças que têm uma família.

Na pesquisa de campo, recorremos à observação das crianças no CES, na escola, e em actividades lúdicas, e à entrevista, que teve como objectivo obter informações importantes no sentido de alcançar os objectivos inicialmente definidos.

As causas que levaram à institucionalização das crianças em estudo foram o facto de se encontrarem em situação de risco, ou de sofrerem maus-tratos físicos, negligências ou serem vítimas de abuso sexual. Nas crianças institucionalizadas que sofreram vários tipos de maus-tratos, é possível encontrar mazelas desenvolvimentais a nível físico ou psicológico e segundo Bentovin e Skuse (1994) existe uma grande possibilidade de coexistência destes tipos de sequelas.

O nível de vida de crianças maltratadas e negligenciadas melhora quando são institucionalizadas. Uma vez que lhes é possibilitada a oportunidade de estudar e brincar, já não sofrem privações a nível alimentar, económico, cultural e social, e são protegidas de ambientes familiares violentos e degradados. No CES tenta-se proporcionar às crianças a integração num ambiente familiar saudável, através do contacto com as famílias amigas. O contacto destas crianças com um ambiente familiar saudável é muito importante e enriquecedor tanto a nível pessoal como social.

Um traço de personalidade comum a todas as crianças estudadas é o facto de serem carentes. Existem algumas inseguras e facilmente influenciáveis e com baixa auto-estima e tolerância à frustração. Na maioria dos casos, as crianças possuem com os adultos atitudes de confronto e de desobediência. Com os seus pares, existem muitos conflitos. Todas as crianças possuem atitudes violentas, que normalmente surgem

quando são confrontadas ou contrariadas. A forma como a pessoa se vê a si própria vai determinar não só o seu comportamento pessoal como também as suas relações com os outros. (Azevedo, 2006:99)

Foram lidos vários estudos e foram referidos ao longo da dissertação, mas só alguns chegam a conclusões idênticas, ou a constatações parecidas, as quais serão seguidamente descritas.

O tipo de negligência ou mau-trato, a duração das mesmas, a idade da criança e o tempo durante o qual a criança viveu essas situações são factores determinantes dos problemas comportamentais das crianças. Uma constatação idêntica é possível encontrar na obra de Azevedo, 2006:102 quando refere que: A observação da utilização de comportamentos agressivos vai fazer com que estas crianças aprendam a responder às situações de frustração, raiva ou medo de maneira também agressiva, o que dificulta a possibilidade de estabelecerem com os seus pares ou adultos relações sociais positivas.

Através da pesquisa bibliográfica verificou-se que a história da criança se divide em várias etapas, e foi com o passar dos anos que os adultos foram tomando consciência das necessidades desta. É no século XX que se desenvolveram decisões políticas, como a Convenção das Nações Unidas e a Convenção dos Direitos da Criança, importantes na afirmação dos direitos da criança.

Só quando se esgotam todas as medidas de prevenção é que se recorre à institucionalização de crianças em situação de risco. Normalmente a maneira possível, mas não ideal de ajudar crianças vítimas de maus-tratos é a sua retirada da família. Face a estas situações, a grande maioria destas crianças apresenta uma grande dependência de um meio familiar patológico.

As crianças institucionalizadas são afectivamente carentes e muito instáveis emocionalmente. Esta falta de afectos leva a que muitas crianças desenvolvam comportamentos destrutivos, sendo o furto um deles, o qual foi possível observar em duas das crianças. Relativamente a este comportamento destrutivo – o furto; Azevedo refere que o furto, à semelhança de outros comportamentos destrutivos infantis, é uma perturbação do comportamento resultante de perturbações psíquicas, causadas, muitas vezes, por carências afectivas graves. (Azevedo, 2006:103)

Gaspar (1998) entendeu que a institucionalização pode trazer malefícios e inconvenientes, mas para estes alunos foi o ponto-chave para a sua sobrevivência. A autora refere a necessidade em se criarem medidas e politicas reais compensatórias para as pessoas que socialmente se encontram desfavorecidas. Mas não devem existir

desculpas para aqueles adultos que voluntária ou involuntariamente maltratam as suas crianças.

Gaspar (1998) verificou que a sensibilidade das crianças é muito aguda e viva. Quando não conseguem dominar a situação, envolvem-se em estratégias sonhadoras, desenvolvem um esforço voluntário para melhorar ou buscar compensações, apesar do sofrimento. Dependem daqueles que as rodeiam. Vivem entre oscilações sucessivas de comportamento. Provocam respostas emocionais desagradáveis como revolta, apatia ou choro incontrolável, imergem em sonhos e fantasias, pedem e dão carinho.

Na nossa dissertação obtivemos resultados idênticos. Também verificámos que as crianças que observámos e entrevistámos dependem daqueles que estão ao seu redor, muitas vezes as suas respostas a determinadas situações vivenciadas são agressivas e violentas. Observámos ainda que, face a determinadas situações, as “nossas” crianças respondem com um choro incontrolável, ou ficam apáticas. São crianças que precisam de muita atenção, carinho e são meiguice.

Assim como o Manual Core refere a frequência da violência sexual em meio familiar (A Fundação CEBI, em parceria com Instituto Superior de Polícia Judiciária e Ciências Criminais, com a National Society for the Prevention of Cruelty to Children (NSPCC), de Inglaterra, com a Defense for Children Internacional, com sede nos Países Baixos e com a ManComunidad del Norte del Tenerife, de Espanha formaram a equipa Core, juntamente com a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima) também nós constatámos que as duas crianças do estudo de caso que foram vítimas de violência sexual, o foram no contexto familiar. Ambas foram abusadas sexualmente pelos tios, num ambiente doméstico.

PARTE III