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7. Reflexões para além de freqüência e prototipicidade verbais

7.2 Análise qualitativa do uso do verbo go em construções VL

7.2.5 Discussão sobre o desenvolvimento da construção VL

Como vimos acima, ao fazermos uma análise utilizando gráficos em rede das sessões dos quatro sujeitos investigados para a construção VL com o verbo go, é possível perceber que o padrão de desenvolvimento construcional constitui-se num gradual acúmulo de algumas colocações altamente freqüentes. Este alicerce construcional

emergente parece ser guiado por alguns princípios de estruturação da interlíngua

baseados, inicialmente, em recursos pragmáticos, seguidos pelo emprego de fórmulas, expressões lexicalizadas e expansão gradual de verbos, atingindo, finalmente, o nível mais complexo de enunciados estruturados em torno de verbos prototípicos e uma interlíngua sintaticamente estruturada (i.e., guiada por padrões sintáticos abstraídos do insumo).

Na análise qualitativa que fizemos, observamos claramente um padrão de desenvolvimento interlingual gradual e altamente irregular, que vai do concreto ao mais abstrato, mas não é possível detectar facilmente a natureza das colocações no entorno dos verbos. Estas co-ocorrências de palavras emergentes tornam-se saliente apenas quando analisamos os dados de forma quantitativa e probabilística (i.e., em forma de redes de associação e de co-ocorrência de certas colocações de palavras).

Klein (1993:74), após análise sobre o desenvolvimento/aquisição da expressão temporal na interlíngua dos sujeitos do projeto ESF, destaca que em cada um destes aparentes ‘estágios’ de desenvolvimento71 há um princípio organizacional inerente ao sistema interlingual, ou, nas palavras do próprio Klein

Em cada estágio, a língua do aprendiz não é apenas um acúmulo aleatório de formas específicas mas um sistema autônomo – uma variedade do aprendiz que é regida por um número de princípios organizacionais distintos. Esta é a primeira sistematicidade. O processo de aquisição é uma seqüência de variedades do aprendiz, o qual, por sua vez, segue certas regularidades. Esta é a segunda sistematicidade. A forma de expressão concreta destes dois tipos de sistematicidade depende de um número de fatores causais – princípios cognitivos gerais, natureza das

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É sempre importante lembrar que tais ‘estágios’ são altamente irregulares (no tocante às formas da interlíngua exbidas) e seu desenvolvimento caracteriza-se pela não linearidade.

línguas fonte e alvo, condições individuais e sociais de aprendizagem, dentre outros (grifo no original)72

Nosso foco aqui é a construção VL, por isto ilustraremos as colocações mais freqüentes no entorno do verbo prototípico go. Como relatado no início deste capítulo, Ke (2007) fez uma análise em rede das construções VL utilizando informações resultantes de um cálculo probabilístico de co-ocorrência de palavras, adicionando algumas restrições à rede de forma a excluir as colocações estatisticamente não significantes (ou seja, abaixo do valor ≥ 5 de freqüência de ocorrência). Assim, o Gráfico 23 exibe uma rede gerada para o verbo prototípico go levando-se em conta tais restrições estatísticas de freqüência de co-ocorrência de palavras

Gráfico 23

Rede de colocações mais freqüentes em torno do verbo go na construção VL para o grupo de aprendizes (reproduzido de Ke, 2007)

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Minha tradução de: At each point, the learner’s language is not just a random accumulation of

individual forms but a system in its own right – a learner variety which is governed by a number of distinct organizational principles. This is the first systematicity. The acquisitional process is a sequence of leaner varieties, which in turn follows certain regularities. This is the second systematicity. What these two types of systematicity concretely look like depends on a number of causal factors – general cognitive principles, nature of source language and of target language, individual and social learning conditions, and others.

Como vemos, o resultado obtido é um gráfico em rede que nos permite verificar que há, inicialmente, uma padrão observado na construção VL ancorado no verbo prototípico go (uma ‘ilha verbal’ tomaselliana), que se traduz no uso de um esquema agente-ação- locativo (refletido nas categorias sujeito-verbo-preposição), no qual se observa a co- ocorrência muito freqüente dos pronomes I, you, he e they no slot agente e das preposições to, in , on, out e down no slot do locativo. Como vimos na discussão de Tomasello (2003, 2000), estes esquemas pivô e ilhas verbais seriam a gênese de construções envolvendo categorias abastratas, como observado na estrutura argumental de uma língua.

Finalmente, encerrando esta ilustração dos nossos dados em forma de redes, veremos abaixo o Gráfico 24, reproduzido da análise de Ke (2007), que possibilita uma excelente comparação das redes de colocações (pares adjacentes) na construção VL no entorno do verbo go para os dois grupos pesquisados: aprendizes e entrevistadores

Gráfico 24

Comparação das redes de colocações mais freqüentes em torno do verbo go na construção VL para os grupos de aprendizes e entrevistadores. In: Ke (2007)

Na comparação entre as redes de colocações dos aprendizes e dos entrevistadores (falantes nativos da língua inglesa), podemos ver claramente como as redes são semelhantes, embora a ilha dos entrevistadores seja visivelmente mais rica e diversificada. A rede dos entrevistadores exibe colocações ligeiramente mais distribuídas. Isto pode ser constatado pela espessura dos links entre as palavras, ou seja, quanto mais espessa menos distribuída e centrada em alguns pronomes. Entretanto, há inegavelmente uma superposição de pronomes e preposições; destas últimas, dos vinte tipos de preposições verificados nos dados dos entrevistadores, treze estão também presentes nos dados dos aprendizes.

7.3 Análise qualitativa do uso do verbo put em construções VOL

Neste ítem será feita uma análise qualitativa das sessões nas quais o verbo put na construção VOL foi mais freqüentemente encontrado (sessões que envolvem as atividades do tipo E, que consistia em dar instruções). É neste tipo de atividade que a maior parte das construções VOL ocorrem (o equivalente a 52% dos 18 tipos de atividades realizadas no projeto ESF).

7.3.1 Andrea

Foi verificada a ocorrência de construções VOL em dez sessões de Andrea. Além da tarefa E, as outras tarefas de Andrea em que ocorre o uso de tal construção são as tarefas k, l, a, g, i, d & q. Analisaremos detalhadamente cinco sessões ao longo dos meses com o objetivo de capturar o desenvolvimento de construções VOL. Veja Quadro 11 com o código do arquivo transcrito, a data de realização da sessão, o mês do sujeito no estudo quando da sessão e verbos usados na construção com sua freqüência (em tokens) entre parênteses73

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Os exemplos aqui fornecidos são trechos inalterados das sessões transcritas nos aquivos em formato .cha. Como destacado anteriormente, o leitor encontrará TODAS as sessões em CD-ROM anexo a esta tese. O leitor também encontrará no CD o programa CLAN, que deverá ser instalado para a correta leitura dos arquivos.