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3. Subj V Obj Obj2 e.g She faxed him a letter

4.8 Lei de Zipf e o papel das freqüências type e token

Como destacado por Goldberg (2006:76) e Crystal (2003:87), um dos primeiros pesquisadores a investigar a natureza estatística (probabilística) da linguagem foi o filólogo americano George Zipf, em 1935. Zipf sugeriu que palavras altamente freqüentes seriam responsáveis pela maior parte dos tokens em um dado texto. E como vimos nos estudos relatados acima, os resultados de freqüência verbal nas construções VL, VOL e VOO parecem confirmar o que passou a ser conhecido como Lei de Zipf (i.e., há uma preponderância de verbos altamente freqüentes em cada uma das construções investigadas). Este característica do insumo lingüístico ajuda muito o aprendiz durante a comunicação, pois, por serem mais freqüentes, estes verbos se tornam uma importante dica na busca e identificação de sentido no uso de uma língua, sentido (significado) este que é influenciado a todo instante por contextos altamente dinâmicos.

De acordo com Lieven & Tomasello (2008), alguns estudos em L1 mostram que a freqüência desempenha um papel crucial na aprendizagem de línguas. Por exemplo,

estudos feitos com ordem truncada de palavras (weird-word order experiments), nos quais ordenamentos não canônicos são apresentados, revelam que as crianças tendem a corrigir tais ordenamentos, colocando as palavras numa ordem canônica mais facilmente quando há verbos conhecidos do que com verbos novos (desconhecidos). Mas não é assim tão fácil quanto parece. Existem dois tipos diferentes de freqüência e cada uma produz efeitos diferentes em nosso sistema lingüístico. Um tipo, a freqüência de tokens, provoca o ‘entrincheiramento’ da compreensão e uso de pedaços concretos de língua – itens, fórmulas e expressões multi-palavras – como um chunk não analisável.

A freqüência de types, por outro lado, promove generalizações, i.e., tal freqüência possibilita a percepção, compreensão e aprendizagem da estrutura interna de um enunciado, ou seja, possibilita que o aprendiz perceba que itens diferentes podem exercer a mesma função no contexto de uma mesma construção (veja os exemplos dados anteriormente). A freqüência de types é condição necessária para que estruturas abstratas da língua (gramática) se desenvolvam, ou, como concluem Lieven & Tomasello (2008:174)

Portanto, a diferença entre a freqüência de tokens e a freqüência de types é entre entrincheirar palavras ou sentenças específicas e criar slots nos quais possam ocorrer uma gama maior de palavras e sentenças55

Finalmente, esta característica probabilística e os efeitos de freqüência observados na distribuição do insumo lingüístico facilita a aprendizagem das estruturas abstratas da linguagem (i.e., como dito anteriormente, este verbo/token altamente freqüente passa a ser um protótipo semântico por meio do qual outros verbos/types serão associados). O contato cada vez maior com um insumo lingüístico altamente variado (e a sua gradual percepção) faz com que o aprendiz perceba a existência de certos padrões na língua (esquemas semânticos) invariáveis, que auxiliam na realização de funções específicas, apesar dos itens que compõem estes esquemas semânticos serem altamente variáveis e cambiáveis.

55 Minha traduçao de: So the difference between token and type frequency is between entrenching specific

Por exemplo, todas as frases abaixo expressam a idéia de deslocamento ou movimento causado (caused motion) e são exemplos de construção VOL, ou seja, descrevem como alguém ou algo (A) provoca o movimento ou deslocamento de alguém ou algo (X) para um novo lugar ou em uma nova direção (Y), veja primeiro a ilustração abaixo:

A causa X Y

Os exemplos em a-f abaixo expressam o mesmo esquema sintático ilustrado acima (i.e., o mesmo sentido de movimento causado), por mais concretos ou abstratos que pareçam. Veja:

a) O menino colocou o dedo na boca

b) O rapaz atirou o gato para cima do telhado c) O professor arrotou teoria na cabeça dos alunos d) Esta tese joga meus neurônios pra lá e pra cá

e) O bibliotecário entulhou outra tese dentro de uma estante empoeirada f) Felizmente, o PosLin publicou a tese na Internet

O desenvolvimento de esquemas sintáticos ocorre em decorrência do fato de que alguns verbos possuem baixa validade de previsão do significado global de um enunciado. (Os diferentes contextos de uso tornam tais verbos, muitas vezes, bastante ambíguos). Portanto, os aprendizes desenvolverão construções mais confiáveis (embora mais complexas e abstratas) que os auxiliem na interpretação do significado lingüístico. Por exemplo, nas frases 1 e 2 abaixo fornecidas por Goldberg (2006:106), quando o verbo get é usado na construção VOL ele expressa o sentido de movimento causado, ao passo que quando é usado na construção VOO o sentido passa a ser o de transferência:

1) Pat got the ball over the fence (VOL → movimento causado) 2) Pat got Bob a cake (VOO → transferência)

Como vimos, as construções surgem diante da necessidade de resolvermos, ou pelo menos evitarmos, problemas durante a comunicação. Ellis (no prelo) destaca que “a aprendizagem de uma língua é uma estimativa baseada numa dada amostra” (language learning is estimation from sample). Ou seja, à medida que tal sistema cresce (dos tokens aos types aos padrões sintáticos abstratos) e vai se tornando, assim, mais e mais complexo, o aprendiz percebe (inconscientemente) a necessidade de evitar problemas de comunicação; há a necessidade de se perceber e entender o mundo que o cerca, bem como de se fazer entender de uma forma a mais eficiente, clara e rápida possível. Como destacado acima, os processos de chunking se constituem numa forma bastante eficaz de estruturação de sistemas complexos, sintetizando informações por meio da criação de estruturas recursivas que produzem, por sua vez, processos de subordinação (embedding processes), possibilitando, com isto, que recursos de memória e atenção sejam otimizados, liberando-os para que possam ‘captar’ outros aspectos e/ou coisas no/do mundo (ELLIS, no prelo).