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EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA VEDAÇÃO A

4. Da dispensa discriminatória:

A Constituição Federal de 1988 é seguramente a representação jurídica do avanço democrático no Brasil. No seu texto consta um manancial de direitos e obrigações cujo objetivo é seguramente construir uma sociedade livre, justa e solidária. Já no art. 1º do texto constitucional o poder constituinte declarou que a República Federativa do Brasil tem como fundamentos a dignidade da pessoa humana (inciso III) e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (inciso IV).

Como efeito, a Carta Política de 5 de outubro de 1988 representa um novo paradigma valorativo a ser observado tanto nas relações públicas como privadas. Em outras palavras, a interpretação de qualquer instituto do direito público ou privado só pode ser feita à luz dos valores alçados à categoria de princípios fundamentais.

Por essa razão, o postulado da dignidade da pessoa humana fornece ao órgão julgador uma diretriz inafastável na aplicação e concretização de qualquer norma jurídica positivada.

Nesse sentido é o magistério de Ricardo Sayeg1: “A dignidade da pessoa humana é um direito indisponível e, em decorrência, seu titular não tem como perdê-la, comissiva ou omissivamente, ainda que por ato voluntário. Habita no homem todo e em todos os homens um núcleo essencial, que lhe atribui valor por si e se expressa, juridicamente, no feixe indissociável, interdependente e multidimensional dos direitos humanos que, a rigor, há de ser observado, considerado, respeitado e concretizado pelo juiz. Agir com fraternidade e, se houver miséria, com misericórdia, é justamente reconhecer esse valor que todo homem carrega consigo.”

Nesse aspecto o valor “trabalho” e “livre iniciativa” foram acolhidos pela nova ordem jurídica democrática como elementos fundamentais para a formatação jurídica do estado e para a promoção social do homem.

Fiel a esses princípios o constituinte elegeu certos direitos como direitos fundantes de uma sociedade, denominando-os como direitos fundamentais.

José Joaquim Gomes Canotilho define os direitos fundamentais como aqueles direitos do ser humano jurídico-institucionalizados, ou seja, àqueles direitos humanos positivados na esfera do direito constitucional de determinado Estado.2

A posição topográfica no texto constitucional e a extensa lista de direitos consagrados com o status jurídico diferenciado de direitos fundamentais revelam a importância dos mesmos para a existência do Estado e da segurança da sociedade.

Colhe-se nesse sentido a indispensável lição do Ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Ferreira Mendes3:

“A Constituição brasileira de 1988 atribuiu significado ímpar aos direitos individuais. Já a colocação do catálogo dos direitos fundamentais no início do texto constitucional denota a intenção do constituinte de emprestar-lhes significado especial. A amplitude conferida ao texto, que se desdobra em setenta e sete incisos e dois parágrafos (art. 5º), reforça a impressão sobre a posição de destaque que o constituinte quis outorgar a esses direitos. A idéia de que os direitos individuais devem ter eficácia imediata ressalta a vinculação direta dos órgãos estatais a esses direitos e o seu dever de guardar- lhes estrita observância.”

Na mesma direção e em igual importância cita-se a preciosa lição do Professor Ingo Wolfgang Sarlet4:

“Dentre as inovações, assume destaque a situação topográfica dos direitos fundamentais, positivados no início da Constituição, logo após o preâmbulo e os princípios fundamentais, o que, além de traduzir maior rigor lógico, na medida em que os direitos fundamentais constituem parâmetro hermenêutico e valores superiores de toda a ordem constitucional e jurídica, também vai ao encontro da melhor tradição do constitucionalismo na esfera dos direitos fundamentais.”

2 Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª Ed. Coimbra: Almedina, 2003. p. 393. 3 Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de direito constitucional. 3ª

Ed. rev. E ampl. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 1.

4 A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na

perspectiva constitucional. 10ª ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2011. p. 66.

A importância desses direitos ainda pode ser medida pela inclusão dos mesmos no rol das cláusulas pétreas (inciso IV do § 4º do art. 60 da CF) o que impede o desaparecimento dos mesmos em razão da ação do poder derivado.

Dentre os direitos fundamentais há o da não- discriminação previsto no caput e inciso I do art. 5º da CF. É bem verdade que o parâmetro antidiscriminatório é encontrado em diversos dispositivos do texto constitucional como no inciso XXX e XXXI do art. 7º; inciso XLII do art. 5º; inciso IV do art. 3º, todos da CF.

Pode-se, por isso, falar em princípio da não- dicriminação assim definido por Maurico Godinho Delgado: “(...) a diretriz geral vedatória de tratamento diferenciado à pessoa em virtude de fator injustamente desqualificante.”5

Pois bem. Outra questão que se coloca é a efetividade dos direitos até porque é inócua a extensa enumeração de direitos fundamentais sem concretização ou tutela jurídica.

É incontroversa a eficácia dos direitos fundamentais na relação entre o particular e o Estado – mais conhecida como eficácia vertical dos direitos fundamentais – já que os direitos fundamentais originariamente surgiram como forma de limitação da ação estatal na esfera de direitos do indivíduo, ou seja, para a defesa das liberdades individuais.

No entanto, a ofensa aos direitos fundamentais não é uma exclusividade do Estado. Nas relações privadas também se verifica a agressão a direitos fundamentais por uma das partes.

A Constituição Federal de 1988 não é expressa acerca da horizontalização dos direitos fundamentais, ou seja, não menciona a aplicação direta ou indireta dos direitos fundamentais nas relações privadas.

Ocorre que a doutrina e a jurisprudência nacional adotaram o entendimento segundo o qual os direitos fundamentais surtem efeitos nas relações privadas. Esse entendimento tem supedâneo na doutrina e jurisprudência alemãs que a partir do caso Luth (de 15 de janeiro de 1958) trataram pioneiramente da eficácia dos direitos fundamentais nas relações horizontais, conforme magnífico artigo de Simone B. Martins Mello.6

Ingo Wolfgang Sarlet7 em obra de fôlego justifica a eficácia imediata dos direitos fundamentais nas relações privadas a partir de uma interpretação do § 1º do art. 5º da CF:

5 Curso de Direito do Trabalho. 8ª Ed. São Paulo: LTr, 2009. p. 719.

6 A eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações de trabalho. Revista LTr Vol. 75,

nº 06, junho de 2011. pp. 690-691.

“Diversamente do que enuncia o art. 18/1 da Constituição Portuguesa, que expressamente prevê a vinculação das entidades públicas e privadas aos direitos fundamentais, a nossa Lei Fundamental, neste particular, quedou silente na formulação do seu art. 5º, § 1º, limitando-se a proclamar a imediata aplicabilidade das normas de direitos fundamentais. A omissão do Constituinte não significa, todavia, que os poderes públicos (assim como os particulares) não estejam vinculados pelos direitos fundamentais. Tal se justifica pelo fato de que, em nosso direito constitucional, o postulado da aplicabilidade imediata das normas de direitos fundamentais (art. 5º, § 1º, da CF) pode ser compreendido como um mandado de otimização de sua eficácia, pelo menos no sentido de impor aos poderes públicos a aplicação imediata dos direitos fundamentais, outorgando-lhes, nos termos desta aplicabilidade, a maior eficácia possível. Assim, por exemplo, mesmo em se tratando de norma de eficácia inequivocamente limitada, o legislador, além de obrigado a atuar no sentido da concretização do direito fundamental, encontra-se proibido (e nesta medida também está vinculado) de editar normas que atentem contra o sentido e a finalidade da norma de direito fundamental. Também no direito lusitano se parte do pressuposto de que o art. 18/1 da CRP assume a função de reforçar o caráter vinculante das normas de direitos fundamentais, que ressalta o dever específico dos poderes públicos de respeitar e promover os direitos fundamentais.”

A mais alta Corte do país já se pronunciou sobre o tema:

EMENTA: SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. UNIÃO BRASILEIRA DE COMPOSITORES. EXCLUSÃO DE SÓCIO SEM GARANTIA DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. RECURSO DESPROVIDO. I. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. As violações a direitos fundamentais não ocorrem somente no âmbito das relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado. Assim, os direitos fundamentais assegurados pela Constituição vinculam diretamente não apenas os poderes públicos,

estando direcionados também à proteção dos particulares em face dos poderes privados. II. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS COMO LIMITES À AUTONOMIA PRIVADA DAS ASSOCIAÇÕES. A ordem jurídico-constitucional brasileira não conferiu a qualquer associação civil a possibilidade de agir à revelia dos princípios inscritos nas leis e, em especial, dos postulados que têm por fundamento direto o próprio texto da Constituição da República, notadamente em tema de proteção às liberdades e garantias fundamentais. O espaço de autonomia privada garantido pela Constituição às associações não está imune à incidência dos princípios constitucionais que asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus associados. A autonomia privada, que encontra claras limitações de ordem jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade não confere aos particulares, no domínio de sua incidência e atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as restrições postas e definidas pela própria Constituição, cuja eficácia e força normativa também se impõem, aos particulares, no âmbito de suas relações privadas, em tema de liberdades fundamentais. III. SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. ENTIDADE QUE INTEGRA ESPAÇO PÚBLICO, AINDA QUE NÃO-ESTATAL. ATIVIDADE DE CARÁTER PÚBLICO. EXCLUSÃO DE SÓCIO SEM GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL.APLICAÇÃO DIRETA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS À AMPLA DEFESA E AO CONTRADITÓRIO. As associações privadas que exercem função predominante em determinado âmbito econômico e/ou social, mantendo seus associados em relações de dependência econômica e/ou social, integram o que se pode denominar de espaço público, ainda que não-estatal. A União Brasileira de Compositores - UBC, sociedade civil sem fins lucrativos, integra a estrutura do ECAD e, portanto, assume posição privilegiada para determinar a extensão do gozo e fruição dos direitos autorais de seus associados. A exclusão de sócio do quadro social da UBC, sem qualquer garantia de ampla defesa, do contraditório, ou do devido processo constitucional, onera consideravelmente o recorrido, o qual fica impossibilitado de perceber os direitos autorais relativos à execução de suas obras.

A vedação das garantias constitucionais do devido processo legal acaba por restringir a própria liberdade de exercício profissional do sócio. O caráter público da atividade exercida pela sociedade e a dependência do vínculo associativo para o exercício profissional de seus sócios legitimam, no caso concreto, a aplicação direta dos direitos fundamentais concernentes ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, CF/88). IV. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO.

(Ac. 2ª Turma do C.STF. RE 201819/RJ. Min. Redator. Designado Gilmar Mendes. DJ 27/10/2006)

O C.TST também já enfrentou a questão:

EMENTA: RECURSO DE REVISTA. REINTEGRAÇÃO NO EMPREGO. DISPENSA ARBITRÁRIA. TRABALHADOR PORTADOR DE ESQUIZOFRENIA. 1. O sistema jurídico pátrio consagra a despedida sem justa causa como direito potestativo do empregador, o qual, todavia, não é absoluto, encontrando limites, dentre outros, no princípio da não discriminação, com assento constitucional. A motivação discriminatória na voluntas que precede a dispensa implica a ilicitude desta, pelo abuso que traduz, a viciar o ato, eivando-o de nulidade. 2. A proteção do empregado contra discriminação, independente de qual seja sua causa, emana dos pilares insculpidos na Constituição da República Federativa do Brasil, notadamente os arts. 1º, III e IV, 3º, IV, 5º, caput e XLI, e 7º, XXX. 3. Acerca da dignidade da pessoa humana, destaca Ingo Wolfgang Sarlet, em sua obra - Eficácia dos Direitos Fundamentais- (São Paulo: Ed. Livraria do Advogado, 2001, pp. 110-1), que -constitui pressuposto essencial para o respeito da dignidade da pessoa humana a garantia da isonomia de todos os seres humanos, que não podem ser submetidos a tratamento discriminatório e arbitrário, razão pela qual são intoleráveis a escravidão, a discriminação racial, perseguição em virtude de motivos religiosos, etc. (...). O que se percebe, em última análise, é que onde não houver respeito pela vida e pela integridade física do ser humano, onde as condições mínimas para uma existência digna não forem asseguradas, onde a intimidade e identidade do indivíduo forem objeto de ingerências indevidas, onde sua igualdade relativamente aos demais não for garantida, bem como onde não houver limitação do poder, não haverá espaço para a dignidade da pessoa humana, e esta não passará de mero objeto de arbítrio e injustiças-. 4. O exercício do direito potestativo de denúncia vazia do contrato de trabalho sofre limites, igualmente, pelo princípio da proteção da relação de emprego contra despedida arbitrária, erigido no art. 7º, I, da Constituição - embora

ainda não regulamentado, mas dotado de eficácia normativa -, e pelo princípio da função social da propriedade, conforme art. 170, III, da Lei Maior. 5. Na espécie, é de se sopesar, igualmente, o art. 196 da Carta Magna, que consagra a saúde como -direito de todos e dever do Estado-, impondo a adoção de políticas sociais que visem à redução de agravos ao doente. 6. Nesse quadro, e à luz do art. 8º, caput, da CLT, justifica-se hermenêutica ampliativa da Lei 9.029/95, cujo conteúdo pretende concretizar o preceito constitucional da não- discriminação no tocante ao estabelecimento e continuidade do pacto laboral. O art. 1º do diploma legal proíbe a adoção de qualquer prática discriminatória para efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção. Não obstante enumere certas modalidades de práticas discriminatórias, em razão de sexo, origem, raça, cor, estado-civil, situação familiar ou idade, o rol não pode ser considerado numerus clausus, cabendo a integração pelo intérprete, ao se defrontar com a emergência de novas formas de discriminação. 7. De se observar que aos padrões tradicionais de discriminação, como os baseados no sexo, na raça ou na religião, práticas ainda disseminadas apesar de há muito conhecidas e combatidas, vieram a se somar novas formas de discriminação, fruto das profundas transformações das relações sociais ocorridas nos últimos anos, e que se voltam contra portadores de determinadas moléstias, dependentes químicos, homossexuais e, até mesmo, indivíduos que adotam estilos de vida considerados pouco saudáveis. Essas formas de tratamento diferenciado começam a ser identificadas à medida que se alastram, e representam desafios emergentes a demandar esforços com vistas à sua contenção. 8. A edição da Lei 9.029/95 é decorrência não apenas dos princípios embasadores da Constituição Cidadã, mas também de importantes tratados internacionais sobre a matéria, como as Convenções 111 e 117 e a Declaração sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, de 1998, todas da OIT. 9. O arcabouço jurídico sedimentado em torno da matéria deve ser considerado, outrossim, sob a ótica da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, como limitação negativa da autonomia privada, sob pena de ter esvaziado seu conteúdo deontológico. 10. A distribuição do ônus da prova, em tais casos, acaba por sofrer matizações, à luz dos arts. 818 da CLT e 333 do CPC, tendo em vista a aptidão para a produção probatória, a possibilidade de inversão do encargo e de aplicação de presunção relativa. 11. In casu, restou consignado na decisão regional que a reclamada tinha ciência da doença de que era acometido o autor - esquizofrenia - e dispensou-o pouco tempo depois de um período de licença médica para tratamento de desintoxicação de substâncias psicoativas, embora, no momento da dispensa, não fossem evidentes os sintomas da

enfermidade. É de se presumir, dessa maneira, discriminatório o despedimento do reclamante. Como consequência, o empregador é que haveria de demonstrar que a dispensa foi determinada por motivo outro que não a circunstância de ser o empregado portador de doença grave. A dispensa discriminatória, na linha da decisão regional, caracteriza abuso de direito, à luz do art. 187 do Código Civil, a teor do qual o exercício do direito potestativo à denúncia vazia do contrato de trabalho, como o de qualquer outro direito, não pode exceder os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. 12. Mais que isso, é de se ponderar que o exercício de uma atividade laboral é aspecto relevante no tratamento do paciente portador de doença grave e a manutenção do vínculo empregatício, por parte do empregador, deve ser entendida como expressão da função social da empresa e da propriedade, sendo, até mesmo, prescindível averiguar o animus discriminatório da dispensa. 13. Ilesos os arts. 5º, II - este inclusive não passível de violação direta e literal, na hipótese -, e 7º, I, da Constituição da República, 818 da CLT e 333, I, do CPC. 14. Precedentes desta Corte. Revista não conhecida, no tema. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ASSISTÊNCIA SINDICAL. AUSÊNCIA. NÃO-CABIMENTO. A teor da OJ 305/SDI-I/TST, -na Justiça do Trabalho, o deferimento de honorários advocatícios sujeita-se à constatação da ocorrência concomitante de dois requisitos: o benefício da justiça gratuita e a assistência por sindicato-, e, nos moldes da Súmula 219, I, do TST, -a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, nunca superiores a 15% (quinze por cento), não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte estar assistida por sindicato da categoria profissional e comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família-. Revista conhecida e provida, no tema.

(RR - 105500-32.2008.5.04.0101 , Redatora Ministra: Rosa Maria Weber, Data de Julgamento: 29/06/2011, 3ª Turma, Data de Publicação: 05/08/2011)

Desse modo, é inegável que a proibição à discriminação não se dirige apenas ao Estado mas também ao particular nas relações privadas.

Cabe acrescentar que na interpretação das regras constitucionais deve-se aplicar o princípio da máxima efetividade segundo o qual a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê.8

Infere-se, portanto, que, apesar do silêncio do poder constituinte originário, os direitos fundamentais aplicam-se às relações privadas em vista do princípio da máxima efetividade das normas constitucionais.

Ademais, negar a eficácia horizontal dos direitos fundamentais seria o mesmo que negar a força vinculante da Constituição Federal nas relações privadas e sua supremacia na pirâmide normativa.

Reconhece-se a autonomia privada da vontade nas relações privadas, porém, admite-se ao mesmo tempo que essa autonomia não torna os particulares imunes aos limites e restrições impostos como salvaguardas constitucionais.

É por isso que o direito de propriedade, o direito potestativo de rescisão contratual e a própria autonomia privada da vontade devem ser interpretados e aplicados no caso concreto à luz do princípio da dignidade da pessoa humana denominado como princípio-guia do sistema jurídico por José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva.9

Em atendimento ao manancial de direitos e princípios que resguardam a dignidade da pessoa humana, rejeitando a discriminação manifestados no inciso III e IV do art. 1º; incisos I, III e IV do art. 3º; caput e incisos I e XLI do art. 5º, todos da CF, além da função social da propriedade privada e da busca do pleno emprego expressos nos incisos III e VIII do art. 170 da CF, respectivamente, e da função social do contrato e da boa-fé contratual indicados nos artigos 421 e 422 do Código Civil, respectivamente e, finalmente, em obediência às Convenções 111 e 117 e à Declaração sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, de 1998, todas da OIT, o legislador infraconstitucional editou a Lei nº 9.029, de 13 de abril de 1995 na qual se veda expressamente a adoção de prática discriminatória para acesso ao emprego ou sua manutenção.

Com efeito, o legislador infraconstitucional albergou expressamente um direito fundamental a ser aplicado, inclusive, na relação privada.

No presente caso a reclamante foi admitida para a função de telefonista em 01/08/2008, tendo sido dispensada em 11/08/2009. Alega a reclamante que teria sido dispensada por discriminação já que seria portadora de perda auditiva tendo que utilizar aparelho auditivo.

Ficou comprovado que a dispensa decorre de prática discriminatória.

Os documentos de fls. 15/17 revelam que a reclamante tomou conhecimento damoléstia em junho de 2009.

9 A saúde do trabalhador como um direito humano: conteúdo essencial da dignidade humana.

A autora sustenta que somente foi dispensada após comunicar seu supervisor acerca da perda auditiva e da necessidade de ter que utilizar aparelho auditivo.

Ocorre que o preposto da reclamada não soube informar a data em que a reclamante comunicou o supervisor sobre a perda