• Nenhum resultado encontrado

O Direito do Trabalho, desde o seu surgimento positivado na Revolução Industrial, sempre buscou a harmonização do capital e do trabalho. Pode-se afirmar que o escopo sociológico do Direito do Trabalho corresponde justamente à pacificação social do conflito originado entre o capital e o trabalho.

44 PRADO JR., Caio. Op. cit. p. 264. 45 Ibid, p. 265.

A compreensão de sua evolução, culminando no estágio atual, exige o estudo da ascensão dos direitos humanos. Isso porque a consagração dos direitos sociais é reflexo da validação internacional dos direitos inerentes ao ser humano.

Não é fácil precisar um único momento como a origem dos direitos humanos, uma vez que não só os direitos humanos, mas também os demais ramos do direito são produto da convergência de diversos fatores políticos e sociais.

Alexandre de Moraes46 lembra que o Código de Hamurabi (1690 a.C.) talvez seja a primeira codificação a consagrar um conjunto de direitos comuns a todos os homens. As ideias de Buda acerca da igualdade entre os homens influenciaram a filosofia e a religião. Na Grécia, vários estudos sobre a necessidade de igualdade e liberdade do homem, a crença na existência de um direito natural anterior e superior às leis escritas também sinalizavam para a evolução do pensamento acerca dos direitos naturais. Em Roma, estabeleceu- se um sistema normativo com mecanismos de interditos, visando tutelar os direitos individuais em relação aos arbítrios estatais. A Lei das Doze Tábuas é considerada a origem dos textos escritos consagradores da liberdade, da propriedade e da proteção dos direitos do cidadão. Finalmente, as ideias do cristianismo com a mensagem de igualdade de todos os homens, independentemente de origem, raça, sexo ou credo influenciou pensadores, fornecendo os subsídios sobre as quais se assentariam mais tarde os postulados dos direitos humanos.

A expressão direitos humanos remonta à Idade Média. Veja que, em 1215, João Sem Terra outorgou a Magna Charta Libertatum que previa a liberdade da Igreja na Inglaterra; restrições tributárias; proporcionalidade entre delito e sanção; previsão do devido processo legal; livre acesso à Justiça; liberdade de locomoção. Posteriormente, a Petition of Right de 1628, o Habeas

46 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos Fundamentais e as Constituições Brasileiras. In:

Corpus Act de 1679 e o Bill of Rights de 1689 compreendiam uma série de restrições à ação estatal, o que, por certo, preservava o indivíduo. Na mesma linha de garantias ao indivíduo, pode-se citar a Revolução dos Estados Unidos da América: Declaração de Direitos de Virgínia, de 16 de junho de 1776; Declaração de Independência dos Estados Unidos da América, 4 de julho de 1776; Constituição dos Estados Unidos da América, de 17 de setembro de 1787. Mas é no Leviatã de Thomas Hobbes (1651) que, pela primeira vez, define-se direito do homem.47

A Revolução Francesa produziu a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, destacando-se as seguintes previsões: princípio da igualdade, liberdade, propriedade, segurança, resistência à opressão, associação política, princípio da legalidade, princípio da reserva legal e anterioridade em matéria penal, princípio da presunção da inocência; liberdade religiosa, livre manifestação do pensamento.

No entanto a consagração dos direitos humanos veio com a sua introdução pela Declaração Universal de 1948 e reiterada pela Declaração de Direitos Humanos de Viena de 1993. Essa concepção contemporânea dos direitos humanos é o resultado da internacionalização dos direitos humanos no pós-guerra. É, na verdade, uma resposta da comunidade internacional às atrocidades cometidas durante o regime nazista.48

Os horrores da Segunda Guerra Mundial significam um marco da história contemporânea em que houve a ruptura total de um sistema político com os predicados da condição humana.

A partir de então, desenvolveu-se a ideia de que a existência de um sistema de proteção internacional poderia prevenir eventuais violações a direitos básicos do homem. Tais direitos transcendem aos direitos puramente

Constitucionalismo Social: estudos em homenagem ao Ministro Marco Aurélio Mendes de Farias Mello. São Paulo: Ltr, 2003. p. 230.

47 ROMITA, Arion Sayão. Direitos Fundamentais nas Relações de Trabalho. São Paulo: LTr,

2005. p. 40.

48 PIOVESAN, Flávia. Direito ao Trabalho e a Proteção dos Direitos Sociais nos Planos

Internacional e Constitucional in PIOVESAN, Flávia. CARVALHO, Luciana Paula Vaz de. (coord.) Direitos Humanos e Direito do Trabalho. São Paulo: Atlas, 2010. p. 5.

estatais. A Unesco define os direitos humanos como uma proteção de maneira institucionalizada dos direitos da pessoa humana contra os excessos do poder cometidos pelos órgãos do Estado e, por outro, regras para se estabelecer condições humanas de vida e desenvolvimento da personalidade humana.49

Alexandre de Moraes50 sintetiza as teorias que esclareceram os fundamentos dos direitos humanos:

A teoria jusnaturalista fundamenta os direitos humanos em uma ordem superior universal, imutável e inderrogável. Assim, os direitos humanos não seriam uma criação dos legisladores e, por isso, não desapareceriam.

A teoria positivista fundamental apregoa a existência dos direitos humanos na ordem normativa. Por isso seriam direitos humanos fundamentais somente aqueles expressamente previstos no ordenamento jurídico positivado.

A teoria moralista fundamenta os direitos humanos fundamentais na própria experiência e consciência moral de um povo.

O ponto comum a todas essas teorias era a necessidade de limitação e controle dos abusos de poder do próprio Estado.51

Merece especial destaque em nosso estudo a Declaração dos Direitos do Homem de 1948, pois, como visto, é o marco contemporâneo da ascensão e profusão dos conceitos e valores dos direitos humanos na civilização ocidental. Flávia Piovesan lembra que “(...) a Declaração de 1948 vem a inovar a gramática dos direitos humanos, ao introduzir a chamada concepção

49 Les dimensions internationales des droits de I’homme. Unesco: 1978, p.11. apud MORAES,

Alexandre de. Direitos humanos Fundamentais e as Constituições Brasileiras. In: PELLEGRINA, Maria Aparecida. TORRES DA SILVA, Jane Granzoto (coord.). Constitucionalismo Social: estudos em homenagem ao Ministro Marco Aurélio Mendes de Farias Mello. São Paulo: Ltr, 2003. p. 227.

50 Op. cit.. p. 227. 51 Ibid., p. 227.

contemporânea de direitos humanos, marcada pela universalidade e indivisibilidade desses direitos.”52

Como se observa, a Declaração Universal dos Direitos do Homem contemplou duas características definidoras dos direitos humanos que marcaram todos os demais ordenamentos jurídicos de proteção dos direitos humanos: a universalidade e a indivisibilidade.

A universalidade significa a extensão universal dos direitos humanos, considerando o ser humano – titular de direitos – como um ser moral dotado de unicidade existencial e dignidade. A dignidade é inerente e incondicionada. A dignidade humana foi adotada como valor fundante e norteador dos instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos.

Ressalte-se que, após a Segunda Grande Guerra, emergiu uma forte crítica ao positivismo jurídico puro. Isso porque tanto o fascismo como o nazismo ascederam ao poder na Itália e Alemanha, respectivamente, sob o manto da legalidade e em nome dela promoveram barbaridades.

Com isso, ganhou corpo a crítica ao positivismo jurídico puro. Pensadores passaram a repudiar a ideia de um ordenamento jurídico indiferente a valores éticos.53

A indivisibilidade dos direitos humanos é a conjugação dos direitos civis e políticos com os direitos econômicos, sociais e culturais. Quando um deles é violado, os demais também são. Por isso Flávia Piovesan ensina que os direitos humanos compõem uma unidade indivisível, interdependente e interrelacionada de direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais.54

Como visto, a evolução dos direitos humanos, tendo por norte o princípio da dignidade humana, espraiou-se para os ordenamentos jurídicos do mundo

52 Op. cit. p. 6. 53 Ibid., p. 6. 54 Op. cit. p. 7.

ocidental moderno, contaminando, ainda, os principais ramos da ciência jurídica. Interessa-nos, sobretudo, o estudo da influência dos direitos humanos no direito do trabalho, o que será objeto de estudo no tópico seguinte.

1.3 Reflexos da evolução dos direitos humanos no âmbito do trabalho: