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Dispositivos para a produção de informações e compreensões

4 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA: PENSANDO OS “ANDAIMES DO

4.4 Dispositivos para a produção de informações e compreensões

4.4 Dispositivos para a produção de informações e compreensões.

Nenhuma construção de sentido dar-se-á sem o acesso aos fenômenos ou objetos investigados, por esse motivo, é preciso lançar mão de estratégias para deles se aproximar. Para tanto, utilizamo-nos de dispositivos qualitativos para construção de nossas compreensões, os quais foram fundamentais para nossas reflexões. As informações aqui levantadas se fundaram no uso de dois dispositivos investigativos: a construção dos diários de pesquisa (DP) pelos alunos e pelo professor pesquisado; além da aplicação de um questionário com os alunos. Além das próprias intervenções que se constituem como um instrumento que se faz no decorrer da implementação da pesquisa.

Inicialmente apresentaremos como dispositivo de coleta de dados o diário de pesquisa que se apresenta como uma das bases fundantes da abordagem por nós utilizada nesta pesquisa. Assim, essa parte da concepção do não dado, longe das amarras do absolutismo, nesse sentido, optamos por buscar através do processo investigativo mecanismos que deem conta da apreensão da realidade, mas uma realidade legítima conforme podemos encontrar dentro da fenomenologia a partir da fala de Macedo (2010, p. 08): “Para a fenomenologia a realidade é o compreendido, o interpretado e o comunicado. Não só uma realidade, mas tantas quantas forem suas interpretações e comunicações, a realidade é perspectival”. Nesse sentido, estamos diante de uma situação em que os sujeitos como seres existenciais, demandam o reconhecimento e a aceitação no sentido de as suas expressividades serem consideradas por estarem ancoradas naquilo que está intrínseco a sua essência e manifestado através do desejo, ou seja, as suas subjetividades, sem prejuízo de nelas

serem reconhecidas as objetivações sociais da qual o sujeito está implicado e não escapa. A partir desse entendimento a expressividade do sujeito pode ser manifestada conforme coloca Merleau-Ponty (s/d. apud MACEDO, 2010, p. 8):

A descrição ou o discurso, como expressividade do sujeito, é a prova da existência do sujeito, é o modo de o sujeito expressar sua experiência; ela é dotada de significados da totalidade da linguagem como discurso.

A partir de uma concepção dialógica em que as interações comunicativas se estabelecem mediante um espaço democrático e plural, afastando a ideia do poder e suas discrepâncias, essa interação se dá mediante relação comunicativa com o outro, o que implica em dizer conforme Macedo (2010, p. 9) que:

Como todo processo interativo, o discurso é sempre compreendido por outrem, que lhe atribui significações. Nesse veio, o discurso ao dar-se significação o faz como uma obra, isto é, dentro de um tipo de codificação num paradigma no qual é compreendido.

As possibilidades de comunicação dentro desse processo relacional manifestado de forma verbal, mas também passível de ser canalizado por meio da escrita, se traduz numa possibilidade viável de comunicação e ao mesmo tempo um mecanismo de formação do aluno a medida que possibilita esse o exercício da escrita. Segundo Barbosa (2010), o atual momento da Educação no nosso país, fortemente influenciado por uma era tecnológica e digital, se constitui num ambiente que não propicia ao aluno o exercício da escrita, ao mesmo tempo que essa escola se constitui em um espaço de cobrança do saber, ou seja, não se permite o não saber do aluno através de uma cobrança infindável sobre o que fora trabalhado. Para o autor o diário de pesquisa se coloca com uma forma possível de estabelecer uma cultura para que o aluno, por meio da escrita, possa manifestar uma forma de pensar de modo espontâneo natural e prazeroso.

Há uma aprendizagem a ser reescrita em nosso inconsciente. A aprendizagem da própria escrita. E tal aprendizagem somente se dará se houver dedicação, a insistência, a descoberta do lúdico, do prazer da escrita. Enfim, um exercício que se inicia na escrita pela escrita, cotidiana, que nos seja significativa, com a qual nos sintamos autores daquilo que expressamos, embora no dia seguinte possamos deixar de lado muito do que foi escrito por não vermos sentido algum, mas, pelo menos, escrevemos, sentimo-nos donos do nosso texto, e como

tais, podemos nos autorizar a reescrevê-lo, se julgarmos interessante fazê-lo ou, então, simplesmente desprezá-lo (BARBOSA, 2010, p. 46). Nos moldes de um diário, onde o aluno pode, dentro de uma rotina, fazer o uso do dispositivo, além do professor pesquisador que, apoderando-se deste diário de pesquisa, apontará suas conjecturas ou qualquer situação inerente a pesquisa que assim achar conveniente de ser descrita. Essa estratégia, no entanto, pela sua propositura que vai além daquela preconizada pelo diário de pesquisa recebe uma outra denominação, conforme expõe Barbosa (2010), quando afirma que o termo diário de pesquisa admite uma condição mais ampla, uma vez que engloba tanto as características de escrita íntima e pessoal, próprias do diário de pesquisa, como também admite uma dimensão pública quando se coloca como uma fonte de informações que se destina também a uma comunicação a ser socializada. Esse contexto pode ser enfatizado na visão de Barbosa (2010, p, 34.) quando aponta o diário de pesquisa como:

Uma proposição de visão plural para a realidade a que se quer compreender, ou seja, a passagem de uma escrita pessoal para uma escrita pública: a possibilidade da escrita pessoal, despreocupada, criadora, como registro livre, ao mesmo tempo significativo para o sujeito que escreve, no momento em que escreve, mas que traz em seu bojo a possibilidade e o desejo contido de se tornar pública. O diário de pesquisa apresenta-se como uma possibilidade dual, figurando-se como estratégia tanto de pesquisa, quanto na participação do processo formativo dos sujeitos que o produz, visto que consiste em um mecanismo voltado para assunção da condição de sujeito implicado, sujeito a quem se destina o ato de educar. Nessa lógica, Borba (2000) apud BARBOSA, 2010, p.13) argumenta que: “o diário de pesquisa objetiva o descrever, o contar: uma espécie de apreensão que se globaliza”. Ainda sobre o mesmo assunto, o autor reforça, afirmando que o “diário de pesquisa é um re-olhar sobre si mesmo no ato de andar, fazer, estar, ser”. Como podemos perceber, a possibilidade de se trabalhar com os diários de pesquisa se constitui como um modo diferente daqueles tradicionalmente implementados os quais desconhecem o aluno sujeito e detentor de conhecimentos, diante disso a ideia do diário de pesquisa, segundo Barbosa (2010) é fazer com que aprendamos a lidar com essa situação de expor nossas implicações por meio da escrita, conferindo também a

possibilidade do tencionamento daquilo que nos é exterior e aquilo que comporta nossa subjetividade, atribuindo desse modo sentido a aprendizagem.

Ademais, numa outra perspectiva passa a possibilitar que esse aluno nas suas relações estabelecidas encontre espaço não somente para a condição de sujeito aprendiz, mas também um sujeito real a ser considerado, que pela condição humana, possui uma demanda significativa de sentimentos e emoções e, por isso, indispensável de serem considerados na relação do outro como condição decisiva de legitimação deste sujeito.

Trata-se de caminhar na perspectiva de abrir espaço para a autoformação como meio de pluralizar tal relação em que tão importante quanto as demandas e determinações do educador são as demandas, o desejo e o sentido por parte de quem aprende. Trata-se de um profundo, contínuo e sofisticado processo de negociação de sentido que professor e aprendiz desenvolvem no decorrer de um tempo não linear e não cronológico, mas vivido, e num espaço determinado como a escola, com o único objetivo de se tornarem mais sujeitos (BARBOSA, 2010, p. 20).

Considerados esses aspectos, o diário de pesquisa se apresentou como um dispositivo que possibilitou levantarmos informações acerca da apreensão dos alunos sobre os saberes obtidos no processo de ensino e aprendizagem. Por se caracterizar como uma escrita livre, pessoal, reflexiva, esse mecanismo coloca o aluno em uma condição de liberdade, na qual, ao mesmo tempo em que se compreende sujeito, expõe aquilo que lhe é subjetivo. Sobre isso, Barbosa (2010, p. 17) afirma que o diário de pesquisa pode

Contribuir como maneira de exercitar a compreensão de nós mesmos, de nossas implicações internas, e um mergulho denso e tenso nesse processo complexo, a partir do qual nos instituímos como autor cidadão, entendido aqui como o sujeito que se faz a partir de sua exterioridade social e exterioridade objetiva.

Ainda nessa lógica, o autor afirma que

A prática do diário de pesquisa tem auxiliado no esforço de criar condições para oportunizar o que podemos denominar de aprendizagem existencial, aquela voltada para o aprendizado não somente de fórmulas ou pensamentos prontos, mas do processo de elaboração de si (BARBOSA, 2010, p 18).

Como se trata de uma produção de rotina e algo escrito não no sentido de destituição ou redução da importância dos fatos e situações, mas a partir de uma

produção de certo modo imediatista para captar situações relevantes, que mexeram ou tocaram o sujeito que se manifesta através de escrita despreocupada e muitas vezes sem a devida organização que um trabalho final demanda e nesse sentido um dos aspectos cruciais dos diários de pesquisa segundo Barbosa (2010), está na ideia do registro dos nossos “Andaimes”, que consiste no que externamos e que representa o percurso trilhado, representado em todas aquelas manifestações por nós exprimidas e que carregam em si representações denominado pelo autor de entulhos, cacos, restos de matérias que representam as nossas implicações, mas que ao tornarmos pública essa produção, encontramos uma forma de ocultá-los. E é no sentido de reconhecer e assumir e evidenciar essas imperfeições como condição de assumirmos a nossa identidade que o diário de pesquisa propõe essa descoberta, essa revelação do que antes ficara nos porões as escondidas e agora vem à tona.

Quanto ao questionário, este pode ser caracterizado, de acordo com Bastos (2009), como uma técnica de observação direta extensiva. De acordo com o autor, trata-se de um mecanismo “que pode ser construído ou se basear em algum já existente, desde que contribua para com o processo de coleta de dados e venha ao encontro dos objetivos da pesquisa em questão” (BASTOS, 2009, p. 102).