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O ESPORTE COMO CONTEÚDO DA EDUCAÇÃO FÍSICA NO ENSINO FUNDAMENTAL: Uma abordagem multirreferencial

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO – UFMT FACULDADE DE EDUCAÇÃO FÍSICA – FEF

CAMPUS DE CUIABÁ – MT

EDUARDO CAVALCANTE CÂMARA

O ESPORTE COMO CONTEÚDO DA EDUCAÇÃO

FÍSICA NO ENSINO FUNDAMENTAL: Uma

abordagem multirreferencial

CUIABÁ - MT 2020

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EDUARDO CAVALCANTE CÂMARA

O ESPORTE COMO CONTEÚDO DA EDUCAÇÃO

FÍSICA NO ENSINO FUNDAMENTAL: Uma

abordagem multirreferencial

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado Profissional em Educação Física em Rede Nacional – ProEF da Universidade federal de Mato Grosso - UFMT, como requisito parcial para a obtenção do Título de Mestre em Educação Física Escolar.

Orientador: José Tarcísio Grunennvaldt

CUIABÁ - MT 2020

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AGRADECIMENTOS

A minha família que sempre demandou todo o apoio necessário em todos os momentos formativos da minha vida, inclusive mais esta etapa que estou a concluir.

Ao professor e orientador, Jose Tarcísio Grunennvaldt, um educador que por diversas vezes tive a alegria de encontrá-lo ao navegar pelo mundo da multirreferencialidade, pois ao descobrir que aquele que educa, deve ser aberto ao novo, ao inacabado, ao diferente, aquele que nas relações com o outro, independência de quem seja, é capaz de desnudar dos seus títulos e buscar uma equivalência, e foi justamente nessa trama relacional que se calcou essa orientação.

Ao professor Evando Moreira, que com seu aporte amplo de estudos e leituras relacionadas acerca da Educação Física e do esporte escolar pode contribuir de modo significativo na construção deste trabalho, aproveitar e estender minha admiração pela sua conduta atenciosa e ética que pautou a sua caminhada como coordenador deste programa de mestrado.

Ao professor Joaquim Barbosa, atualmente uma das autoridades que discute a multirreferencialidade no país, e que prontamente se colocou à disposição para as discussões inerentes ao tema e para composição da banca de avaliação deste trabalho.

Ao meu irmão e também professor Helder Cavalcante Câmara, quem me apresentou a multirreferencialidade e do início ao fim deste trabalho esteve sempre disponível nas discussões, orientações, correções, enfim demandou uma ampla contribuição, que sem a ela o trabalho não teria apresentado os contornos atuais.

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A minha irmã Ana Alice Cavalcante, que desde o inicio se colocou disponível para contribuir com essa pesquisa, onde, além de ceder uma de suas turmas para realização da intervenção foi meu braço direito para implementação da mesma.

Ao professor e amigo Francisco Vieira que por diversas vezes se mostrou acessível para discutir assuntos referente a multirreferencialidade, e pela sua propriedade para discutir o tema nos oportunizou momentos de reflexão e aprendizagem.

A todos os professores do Programa de Mestrado Profissional em Educação Física - PROEF, além dos já aqui citados quero estender os meus agradecimentos aos demais professores: Ana Carrilho, Cleomar e Marcia, pela dedicação e empenho nesta caminhada que perdurou por longos dois anos de profundos conhecimentos e aprendizagens.

Aos meus colegas do Programa de Mestrado Profissional em Educação Física – PROEF: Ana Paula, Amanda Farias, Celso, Eduardo Silva, Elisa, Edson Pedroso,

Noelle, Patrícia Germano, Romeu, Susan Kelly, Talita, Vanessa e Wilson, que no

decorrer desses dois anos em que estivemos juntos no propósito de melhor aproveitar os conhecimentos derivados do mestrado, sempre se mostraram solidários as demandas do outro nos momentos de dificuldade. Nesse sentido a existência de cumplicidade foi uma constante, até esse momento que se finda o curso.

A equipe gestora da Escola Municipal Severina Brito da Silva, pelo modo como me acolheram e deram total respaldo para que pudesse desenvolver minha pesquisa.

A todos os alunos do 6° D da Escola Municipal Severina Brito da Silva, que puderam vivenciar comigo ralações próximas de educador e educando, mas também de amizade, uma soma de ingredientes perfeitos para fazer desabrochar as mais diversas percepções que possibilitaram descobrir um modo diferente de aprender.

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À Capes/PROEB – Programa de Educação Básica pelo oferecimento do Programa de Pós-Graduação em Educação Física em Rede Nacional – ProEF.

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O apanhador de desperdícios

Uso a palavra para compor meus silêncios. Não gosto das palavras fatigadas de informar. Dou mais respeito às que vivem de barriga no chão tipo água pedra sapo. Entendo bem o sotaque das águas Dou respeito às coisas desimportantes e aos seres desimportantes. Prezo insetos mais que aviões. Prezo a velocidade das tartarugas mais que a dos mísseis. Tenho em mim um atraso de nascença. Eu fui aparelhado para gostar de passarinhos. Tenho abundância de ser feliz por isso. Meu quintal é maior do que o mundo. Sou um apanhador de desperdícios: Amo os restos como as boas moscas. Queria que a minha voz tivesse um formato de canto. Porque eu não sou da informática: eu sou da invencionática. Só uso a palavra para compor meus silêncios.

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CÂMARA, Eduardo. O esporte como conteúdo da educação física no ensino

fundamental: uma abordagem multirreferencial. 2020. Número de volumes ou folhas.

Dissertação (Mestrado em Educação Física Escolar) – Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2020.

RESUMO

O processo de formação escolar está eminentemente relacionado à aprendizagem de diversos saberes, os quais devem contribuir para a formação do sujeito na escola. Esses saberes estão organizados em disciplinas, sendo que cada uma delas, embora possam manter relações entre si, carregam suas especificidades. Dentre essas disciplinas, figura a educação física, componente curricular da educação básica que, dentre outros aspectos, aborda conhecimentos do corpo em movimento. Tal área agrega saberes como o jogo, o esporte, as danças, as lutas, as atividades rítmicas e expressivas, entre outros. Dentre esses saberes, o esporte emerge como o que se pressupõe, seja o mais abordado na disciplina. Todavia, o que parece que tem sido priorizado em sua abordagem é o trato com a ênfase quase que exclusiva aos saberes técnicos. Não se quer negar a importância desses saberes, todavia, fechar-se a essa ótica é limitar as possibilidades de aprendizagem que esse saber pode proporcionar. Considerando esses aspectos, passamos a pensar sobre as possibilidades de tratar esse conhecimento para além de uma perspectiva reducionista. Em nossas ponderações, direcionamos o olhar para a abordagem multirreferencial, que pode ser considerada uma perspectiva paradigmática de ver e pensar a realidade, considerando a multiplicidade de olhares que a cerca, o que é essencial ao desenvolvimento de uma formação do sujeito. Dessas reflexões, emergiu nossa questão de partida, que ganhou a seguinte redação: é possível uma prática pedagógica para o ensino de esporte pautada na multirreferencialidade? Dessa questão construímos nosso objetivo, que é analisar o trato pedagógico do esporte na escola a partir da abordagem multirreferencial, buscando identificar se essa prática contribui ao desenvolvimento do olhar plural e ao fortalecimento da autoria dos alunos nos esportes e para além deles. Perspectiva-se, assim, propor uma abordagem que possibilite trabalhar o esporte enquanto conteúdo da disciplina, que possa conferir ao aluno uma maior e melhor percepção de mundo, visto que permite a aproximação à realidade, identificando os múltiplos elementos que a compõem ― como os aspectos sociais, culturais e biológicos ―, o que o faz mais livre das determinações sociais, especialmente as pautadas nas perspectivas monológicas, além da instituição da autoria. Este trabalho foi realizado mediante a proposta da pesquisa-ação, na qual o pesquisador se encontra diretamente envolvido e indubitavelmente implicado no objeto pesquisado. Na colheita das informações lançou-se mão de dois dispositivos de pesquisa: diário de pesquisa e o questionário com questões abertas. Desse modo, o trabalho possibilitou constatar que grande parte dos alunos conseguiu, a partir das múltiplas referências oportunizadas durante o processo de intervenção, adquirir um novo olhar sobre os conteúdos. Tal olhar, gerado a partir de diversos saberes, contribuiu para uma maior e melhor compreensão acerca do conteúdo, além de possibilitar a alguns alunos a capacidade de manifestação a partir da sua própria

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autoria, percebendo-se, desse modo, como atores e autores das suas próprias ações, produções e pensamentos.

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CÂMARA, Eduardo. O esporte como conteúdo da educação física no ensino

fundamental: uma abordagem multirreferencial. 2020. Número de volumes ou folhas.

Dissertação (Mestrado em Educação Física Escolar) – Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2020.

ABSTRACT

The school formation process is mainly related to the learning of several sabers, which should contribute to the formation of the subject at school. These sabers are organized into disciplines, each of which, although maintaining relations with each other, carries their specificities. Among these disciplines, there is physical education, a curricular component of basic education that, among other aspects, addresses knowledge of the body in moviment, which are comprised in an área called “body culture of movements” (BRASIL, 1998). This area adds knowledge such as the game, Sport, dances, fights, rhythmic and expressive activities, among others. Among this knowledge, Sport emerges as the one that hás perhaps been the most worked in this discipline. However, what seems to have been prioritized in his approach is the treatment with na almost exclusive emphasis on technical knowledge. We do not want to deny the importance of this knowledge, however, closing ourselves to this perspective is to limit the learning possibilities that this knowledge can provide. Considering these aspects, we started to think about the possibilities of treating this knowledge beyond a reductionist perspective. In our considerations, we look at the multi-referencial approach, which can be considered a paradgimatic perspective of seeing and thinking about the reality, considering the mutiplicity of views that surrounds it, which is essential to the development of a subject formation. From these reflections, our starting question emerged, which gained the following wording: is it possible a pedagogical practice for teaching aports based on multi-referentiality? From this question, we built our objective, which is to analyze the pedagogical treatment os sport in school from the multirreferencial approach, seeking to identify if this practice contributes to the development of the plural look and to the strengthening of students’ authorship. Perspective us, ths, propose na approach that makes it possible to work on Sport as contento f the discipline, which can give the student a greater and better perception of the world, since it allows the approximation to reality, identifying the multiple elements that compose it – such as social, cultural and biological aspects – which makes it freer from social determinations, especially those based on monological perspectives, in addition to the institution of authorship. This work was carried out through the action research proposal, in which the researcher is directly involved and undoubtedly involved in the researched object. For data collection, we Will use three research instruments: research journal, questionnaire with open questions and evaluation forms. In this way,the work made it possible to verify that a large parto f the students managed – from the multiple references provided during the intervention process – to acquire a new look about the contents. Such a look, generated from different types of knowledge, contributed to a greater and better understanding of the content, in addition to allowing some students the ability to Express themselves from their own authorship, thus

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perceiving themselves as actors and authors their own actions, productions and thoughts.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 14

2 O ESPORTE ENQUANTO CONTEÚDO NA ESCOLA: “ENTRE O NÃO MAIS E O AINDA NÃO”. ... 19

2.1 Escola da bola ... 26

2.2 Abordagem Critico-emancipatória. ... 28

3 MULTIRERREFERENCIALIDADE: APROXIMAÇÕES À TEORIA PARA PENSAR A ESCOLA ... 36

4 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA: PENSANDO OS “ANDAIMES DO PERCURSO” ... 48

4.1 Tipo de Pesquisa ... 48

4.2 Universo da Pesquisa ... 49

4.3 Participantes ... 51

4.4 Dispositivos para a produção de informações e compreensões. ... 52

4.5 Procedimentos para a produção de informações e compreensões ... 56

4.6 Dispositivo de Análise das informações – construindo compreensões e sentidos... 59

5 ENTRE RASGOS E REMENDOS: ANALISANDO A ABORDAGEM MULTIRREFERENCIAL E O ENSINO DO FUTSAL ... 61

6 PLURALIZANDO O ACESSO AOS SABERES ... 107

6.1 Compreendendo o futsal: um jogo ou uma modalidade? ... 108

6.2 Na quadra, na praia, no terreiro: o gol para ganhar ou para brincar? ... 112

6.3 A gente não quer só saúde, a gente quer saúde, diversão e arte. ... 116

6.4 Da miopia à apercepção ... 119

6.5 Dizem que sou louco por eu ter um gosto assim... Na rua, na chuva, na fazenda. ... 123

6.6 O esporte e as suas múltiplas possibilidades ... 126

6.7 A falta de conhecimento e a exclusão ... 128

6.8 Futebol não se aprende na escola!? Essa regra tá errada vamos refazer! 133 6.9 Não troco minha “bicuda” pela “trivela” de ninguém ... 137

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7. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 144

8. REFERÊNCIAS ... 147

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1 INTRODUÇÃO

O esporte adentrou às instituições educacionais com o objetivo de formar homens altruístas e, a partir do ideal do fair play, produzir implicações capazes de constituir sociedades justas e democráticas. Em sua manifestação atual o esporte moderno resultou de um processo de desportivização (ELIAS, 1992) ou esportivização (BRACHT, 2003) de elementos da cultura corporal de movimento das classes populares inglesas, a exemplo dos jogos populares, com proeminência aos jogos com bola. É uma atividade corporal de movimento, com caráter competitivo, que surgiu no contexto da cultura europeia a partir de meados do século XVIII e se difunde pelo mundo no final do século XIX e XX.

A presença do esporte na sociedade contemporânea é inquestionável, a tal ponto que é possível dizer que o modo pelo qual essa cultura1 está arraigada na

sociedade nos permite o apontarmos como um fenômeno mundial que não se desvincula de qualquer estrato social, conseguindo perpassar no seio cultural das diversas nações e atingir todas as suas esferas sociais. Todavia, essa grande abrangência e o modo como esse esporte tem sido tratado e discutido, sob uma ótica duvidosa em diversos espaços sociais inclusive a escola, estando muitas vezes alheia a construção humana, faz com que aspectos inerentes à sua prática, como lazer e qualidade de vida, passem a ser secundários em vista da priorização aos aspectos da quantificação ligados às altas performances esportivas. Entre a prática do esporte e esses aspectos, constroem-se lentes que direcionam os olhares para outros enfoques. Nessa perspectiva, o esporte passa a ser uma opção industrial extremamente lucrativa. Para tanto, a indústria cultural do esporte lança mão dos diversos espaços midiáticos, a fim de fabricar vínculos entre a sociedade e esta cultura, criando-se desejos e necessidades. Não se pode crucificar o esporte, mas também é equívoco não perceber aspectos alienantes que podem estar nele atravessados, sobretudo naquelas práticas em que temos uma aproximação ou como referência o esporte de alto rendimento, conforme Bracth (2003) destaca a aproximação do esporte escolar com as práticas advindas do esporte de rendimento, quando este incorpora as suas vivências às características deste (resultado) como referência.

1 É preciso deixar claro que há uma relação imbrincada entre esporte e cultura, pois, conforme

destacam Silva e Zamboni (2010, p. 1050), “a prática esportiva como elemento de formação da cultura e de como a cultura influencia a visão de mundo dos indivíduos e suas ações em sociedade; numa relação circular, esporte é cultura e a cultura define o esporte.

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De acordo com Darido e Rangel (2011), o esporte é reconhecido como um fenômeno social contemporâneo e, tem instigado várias reflexões, inclusive àquelas relacionadas ao seu tratamento como um conteúdo curricular da escola. Desse modo, a reflexão se faz necessária, sobretudo, no ambiente escolar, uma vez que os sujeitos desse espaço são os mesmos que estão submetidos àquelas aprendizagens advindas do contexto social em que vivem, que por sua vez se caracterizam por uma aprendizagem existencial, que embora deva ser considerada, muitas vezes, são incapazes de uma análise mais crítica da realidade, absorvendo “tudo” como verdades, inclusive as disseminadas no contexto midiático. Emerge assim, a necessidade de um contraponto àquilo que é veiculado como verdade e a escola pode se instituir como lugar de resistência. Como já ventilado, o esporte trabalhado no interior da escola pode reproduzir uma lógica, um modelo de prática esportiva alinhada com os princípios mercadológicos e em descompasso com os propósitos da escola democrática que, de acordo com Domingues (2019), admite as diversidades sociais, reconhecendo essa pluralidade como um enriquecimento cultural indispensável ao processo de inclusão dos alunos, além da constituição dos princípios de participação efetiva dos mesmos, que os colocam em condição de atores centrais do processo educacional.

Assumindo essa perspectiva de escola democrática, é possível fazer perceber aquilo que pode estar implícito no esporte, como o uso pela mídia, os valores e comportamentos escusos que se manifestam em condutas antiéticas, desrespeitosas e violentas, a vitória a qualquer custo, a competição exacerbada, a exclusão, dentre outros. Portanto, é no campo escolar que se faz necessária a reflexão, cabendo aos professores, a missão de propiciá-la, mediando esse diálogo, de modo que possamos extrapolar os muros da escola e ofertar gradativamente uma prática pautada na consciência social crítica e reflexiva, de modo que o aluno possa se apoderar dessa nova apropriação e, a partir daí, fazer uso da prática dos esportes de modo mais independente e com uma consciência crítica e social mais elaborada, denotando novos sentidos para a sua prática sob um olhar agora autônomo e alheio aos determinismos.

Consideramos importante enfatizar que não podemos banir ou negar a cultura do esporte na escola, uma vez que este é um dos conteúdos que necessita ser abordado nas aulas de educação física escolar (SOARES et al.,1992). Partindo dessa

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premissa, poderíamos nos questionar se há outra possibilidade de se trabalhar o esporte como conteúdo na disciplina, sendo uma prática que pode conferir ao aluno o protagonismo pedagógico e que o mesmo possa, além de construir seu processo de apreensão do conteúdo, garantir a construção de condição de sujeito integrante de uma sociedade plural ― marcada pelo reconhecimento das diversas possibilidades individuais de cada um ―, ao mesmo tempo em que possa assumir o seu “eu”, reconhecendo e respeitando o “eu” dos outros, garantindo, dessa forma a pluralidade de manifestações que permeiam a sociedade.

Dadas essas asserções, passamos a pensar na multirreferencialidade que, segundo Câmara (2014), permite o acesso a novos referenciais, os quais poderão ser a porta para a inserção em um novo mundo e para constituição de um novo ser, que seja mais autônomo, mais livre e com maior capacidade de pensar por si a partir de si. Dessas reflexões, emergiu nossa questão de partida, que ganhou a seguinte redação: é possível uma prática pedagógica para o ensino de esporte pautada na multirerencialidade? A partir dessa indagação, que será orientadora da elaboração dessa investigação e da construção de nossas reflexões, elaborou-se o objetivo deste trabalho, que é analisar o trato pedagógico do esporte na escola, a partir da abordagem multirreferencial, buscando identificar se essa prática contribui para o desenvolvimento do olhar plural e no fortalecimento da autoria dos alunos nos esportes e para além deles.

Assim, por visualizarmos um contexto que em comumente se apresenta no interior da escola por meio da prática dos esportes e, que culturalmente se manifesta dentro desta instituição como conteúdo hegemônico, traz na sua essência ainda uma herança de vivências e saberes pautados em um aprendizado para o saber fazer, advindo de perspectivas monólogas de aprendizagem. Ou de outro modo, representado por vivências recreativas que se destituem do conteúdo, da disciplina a de sua responsabilidade formativa para o aluno por não existir previamente objetivos e intervenções didático-pedagógicas do professor para essas “aulas”, ou porque não dizer “atividades recreativas”.

Nesse sentido, é importante frisar que a produção deste trabalho se constitui a partir de um desejo pessoal de pensar uma prática pedagógica de educação física e, especificamente dos esportes, onde os alunos possam compreender, se manifestar corporal e intelectualmente por meio da prática dos esportes, legitimando as suas

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subjetividades, em detrimento das proposições pedagógicas tradicionais que condicionam a passividade dos alunos nos seus processos formativos.

Desse modo, insatisfeito com o quadro traçado pela revisão de literatura acerca do uso do esporte nas aulas de Educação Física e diante de minha própria prática, propus-me o desafio, diante da oportunidade que o PROEF me proporcionou, de investir na minha prática, tendo em vista a vontade de querer fazer diferente. Lancei mão à “obstinação de um logus propriamente humano”, com vistas de desenvolver e implementar uma Unidade Didática para o futsal na realidade de uma escola pública com alunos do 6º ano do Ensino Fundamental de uma escola no município de Caicó-RN.

No intuito de não perder de vista a perspectiva de dialogar com o legado do pensamento complexo, nossa intenção tem-se pautado pelo olhar para o Futsal, como uma cena de jogo como uma unidade e que se configura por sujeitos repletos de diversidades/heterogeneidades (ARDOINO, 1998, p. 24).

Ademais, dentre as diversas propostas pedagógicas para educação física e para os esportes já presentes na literatura, que buscam a idealização e a materialização de uma superação das práticas tradicionais existentes, a multirreferencialidade pode se constituir como mais uma possibilidade de mudança a partir da sua proposta particular de permitir praticar/conhecer o esporte por meio dos seus diversos referenciais possíveis, contribuindo para que o aluno possa melhor compreendê-lo.

Este trabalho tem início com essa introdução e, posteriormente, traz no seu segundo capítulo, trazemos o marco teórico. Este se apresenta dividido em dois subcapítulos, o primeiro denominado: “O esporte enquanto conteúdo da escola: entre o não mais e o ainda não”, onde descrevemos inicialmente uma prática dos esportes comumente presentes nas aulas de educação física e ancorada em duas perspectivas, uma relacionada à prática na ênfase dos aspectos técnicos e táticos dos esportes, por vezes incorporando suas regulamentações rígidas, ou de outro modo quando a prática dos esportes realizada sob um contexto recreacionista, subtrai-lhe sua obrigação pedagógica. Devido a esses contornos, ambas se enquadram em um entendimento de práticas que não se apresentam mais legítimas no chão da escola. Ao longo da discussão, apresenta ainda possibilidades de inserção do esporte nas aulas de educação física como alternativas para superar essa realidade que ora é contestada. Dentre essas possibilidades, são expostas duas propostas de trabalho para a

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abordagem dos esportes, as quais buscam ampliar o sentido dessa vivência para o aluno, a “Escola da bola” e a abordagem crítico emancipatória. É de se destacar que, embora existam esforços de diversos profissionais da área para a sua implementação das alternativas de superação, essas ainda não conseguiram instituir-se de forma efetiva e massiva no espaço da escola. No outro subcapítulo, intitulado de “Multirreferencialidade: aproximações a teoria para pensar a escola” apresentamos as bases teóricas da abordagens, assim como seus conceitos fundantes na busca de aproximações com a prática dos esportes como meio de promover o ensino desse conteúdo para além das visões limitantes do mesmo.

No terceiro capítulo apresentamos um enfoque acerca do encaminhamento metodológico apresentando de modo explícito todo o percurso investigativo a partir dos dispositivos retratados do tipo de pesquisa utilizado, o seu universo que traz as características do lócus da pesquisa bem como informações inerentes aos sujeitos da mesma e, por fim, aborda os dispositivos de coleta, procedimentos e avaliação de dados.

O quarto capítulo, “A abordagem multirreferencial e o ensino do futsal”, consiste na apresentação da análise dos dados coletados através intervenção pedagógica realizada para o ensino dos esportes sob a perspectiva da multirreferencialidade. Os dois dispositivos utilizados na pesquisa são apresentados em subcapítulos: “as palavras ganham forma: a intervenção sob a ótica dos diários de pesquisa”, apresentados e discutidos sob o paradigma da multirreferencialidade dos dados obtidos através dos diários de pesquisa; no outro subcapítulo temos “Aprendendo com a abordagem multirreferencial”, momento em que discorremos sobre a análise de dados a partir dos questionários respondidos pelos alunos.

E por fim, em considerações finais, apontamos um panorama geral do trabalho, apontando os possíveis alcances dos objetivos propostos, as dificuldades e limitações que se apresentaram no decorrer da intervenção além de promovermos sugestões relacionadas a futuras pesquisas que envolvam essa temática.

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2 O ESPORTE ENQUANTO CONTEÚDO NA ESCOLA: “ENTRE O NÃO MAIS E O AINDA NÃO”.

Ao se defender o nascedouro da Educação Física no Brasil, cuja inclusão oficial na escola se deu em 1851, com a reforma Couto Ferraz (DARIDO, 1999), percebe-se que no seu longo percurso, a mesma nunca foi isenta de intencionalidades. É possível pensar que desde a sua inserção, algumas tendências pedagógicas influenciaram a prática pedagógica dessa disciplina, como as tendências higienista, militarista, pedagogicista e competivista (GHIRALDELLI JÚNIOR, 1988), assim como abordagens mais atuais, como as abordagens superadora, crítico-emancipatória, dentre outras.

Cada perspectiva carrega(va), em maior ou menor profundidade, uma fundamentação que orienta a escolha dos saberes tratados e suas ações propriamente pedagógicas. Se direcionarmos o olhar aos conteúdos presentes nessas diferentes perspectivas teórico-metodológicas, podemos perceber que o esporte está presente em praticamente todas elas, todavia, o olhar conferido a esse saber por alguns, ora o colocam em uma posição destacada, ora o demonizam.

Não podemos, no entanto, pressupor que rotulá-lo, incluí-lo ou excluí-lo da educação física escolar resolveria esse dilema. Na verdade, é possível dizer que o esporte não é bom nem causa mal por sí só, mas é aquilo que fazem com ele (é o uso político que se faz dele). É a forma de tratar esse conteúdo que conduzirá a um tipo ou outro de formação.

Sem entrar no mérito dessa discussão, o que temos visto é que, com a instalação do Regime Militar, na década de 1960, o seu trato ganhou forte impulso, adentrando de forma mais intensa as aulas de educação física, mas assumindo um modelo que tinha a intenção de melhorar o rendimento do aluno/atleta e fazer da educação física um sustentáculo ideológico de governos não legitimados pela via democrática, na medida em que promoveria a nação a partir do êxito em competições de alto nível, minimizando as críticas ao regime, ao deixar transparecer um clima de prosperidade e desenvolvimento (DARIDO, 1999).

Todavia, esse modelo não se sustentou, não alcançando seus objetivos, em especial, o de elevar o país à potência internacional no esporte (BRASIL, 1998). Paralelo a esse “fracasso”, surgem vários movimentos renovadores na educação física, intencionando superar esse modelo esportivista instalado (SOARES et al.,

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1992) e, o que nos parece é que, ainda hoje, continua essa busca pela instituição de uma forma diferente de abordar dos saberes dessa disciplina, com ênfase do olhar sobre o esporte.

Segundo González e Fensterseifer (2009), a educação física escolar no Brasil vive um contexto transitório, no qual nós temos a constatação de um processo de superação de uma prática da disciplina alicerçada em bases esportivizadas, condicionada em “um fazer para” e pautada como mera atividade. No entanto, nesse processo transitório que vem a se configurar enquanto disciplina curricular, têm-se encontrado dificuldades de vislumbrar uma proposição pedagógica que contemple uma formação que subsidie ao aluno a apreensão crítica, criativa, reflexiva, autônoma, dentre outros aspectos indispensáveis na formação do homem na sociedade que se pretende inclusiva.

Em outras palavras, parte dos profissionais da área tem ciência de que o modo como outrora o esporte era tratado no “chão da escola” não tem mais espaço nas proposições pedagógicas da disciplina, tendo em vista, que do ponto de vista legal a sua elevação a status de componente curricular. No entanto, criou-se um distanciamento abissal entre o que “era” e o “devir”, pois, uma vez destituído, aquilo que era a essência das práticas da educação física (o esporte rendimento), os professores, por motivos diversos, encontraram dificuldades de postular uma nova prática da disciplina.

São diversos os motivos pelos quais a disciplina de educação física encontra dificuldades de galgar um espaço no interior da escola, estabelecendo uma relação significativa enquanto componente curricular, de modo a articular seu objeto de estudo enquanto área de conhecimento com os objetos das demais disciplinas, para culminar na formação do sujeito que propõe a escola. No entanto, é possível admitir a existência de uma diversidade de práticas pedagógicas da disciplina que se distinguem e que carregam, em si, implicações das mais diversas naturezas que, por sua vez, desenvolvem diferentes ações pedagógicas na escola.

Considerando esse aspecto do contexto situado, González e Fensterseifer (2009) identificam três grandes categorias de atuação docente na educação física escolar: práticas tradicionais, abandono do trabalho docente e práticas renovadoras. Sobre práticas tradicionais, nós podemos imaginar como sendo aquelas que se referem à vivência do esporte, em um contexto institucionalizado, em que os

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propósitos dessa prática passam a ser a formação de atletas, mediante os princípios de rendimento, competição, regulamentação rígida, sucesso do esporte como sinônimo de vitória e racionalização do gesto técnico.

Já o abandono do trabalho docente, como o próprio nome supõe, consiste na existência de um descaso com aquilo que é pertinente aos atributos do professor, no caso, não proporcionando a mediação necessária ao processo de aprendizagem do aluno. Assim, nós temos uma relação professor-aluno destituídas de uma atuação pedagógica, fato extremamente comum nas aulas de educação física. Neste tipo de prática, as aulas sob a regência do professor traduzem-se, unicamente, ao recreacionismo, prática em que os alunos determinam as atividades que desejam vivenciar, destituídas de qualquer viés pedagógico, condicionando a prática da educação física a uma mera atividade, que poderia ser realizada em qualquer outro espaço e sem a necessidade de um professor.

Em meio a esse processo de transição, caracterizado pela negação de um modelo já contestado e que não mais responde aos propósitos da educação física enquanto componente curricular, o que se vislumbra para a disciplina são novas perspectivas de ações pedagógicas que possam corroborar com a formação integral do aluno e sua promoção enquanto sujeito de uma sociedade republicana e democrática.

Com esse propósito, as práticas renovadoras buscam promover a inserção de uma proposta de trabalho ancorada na superação de uma prática de educação física fundada apenas no fazer, para pensar a apreensão do seu objeto de estudo não mais nos aspectos exclusivamente práticos, mas também nas dimensões conceituais do conteúdo.

Para González e Fensterseifer (2009), essa nova organização pedagógica com caráter de disciplina escolar suscita questões de extrema relevância como: Por que a disciplina deve compor o currículo da escola? Que conteúdos trabalhar? Quais os objetivos? Como são sistematizados os conteúdos ao longo dos diferentes níveis de ensino? Enfim, aspectos que possam legitimar a disciplina de educação física enquanto componente curricular no projeto educacional da escola.

Nesta direção, existem atualmente várias abordagens pedagógicas da educação física que propõem uma prática de ensino sistematizada e com um viés

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alinhado com a escola democrática, que buscam, paulatinamente, o seu espaço na escola. Nesse sentido, segundoMorschbacher e Maurente (2011, p. 86),

A Educação Física passa a ser questionada e tratada, de modo mais intenso, sob a fundamentação das ciências humanas e sociais, este movimento comumente identificado e denominado por “Movimento crítico da Educação Física”, contribui, sob o ponto de vista da Educação Física Escolar, o “redimensionamento” da função social na escola, e por consequência, da sua prática pedagógica nesse espaço. Nessa mesma perspectiva de não se acomodar, Neira (2018), descreve o caminho tenso da educação física escolar atrelada às necessidades momentâneas da sociedade. Segundo o autor,

Na última década do sec. XX, em sincronia com a democratização da sociedade, o ensino da Educação Física experimentou uma mudança de paradigmas: inspirando-se na pedagogia crítica, passou a adotar as ciências humanas como referencial, substituiu o exercício físico e o movimento enquanto objetos de estudo pela cultura corporal do movimento. Mais recentemente, no esforço de responder aos dilemas enfrentados por uma escola cada vez mais plural e democrática, ampliou o seu aporte teórico com as contribuições dos estudos culturais e do multiculturalismo crítico (NEIRA, 2018, p. 04).

Conforme mencionado anteriormente, a necessidade de admitir essa tendência plural da sociedade fez surgir o debate pedagógico, tendo como cerne o aspecto cultural intrínseco às análises de outros campos teóricos. Assim, essa proposta vem sendo implementada na educação básica, admitindo a cultura corporal, concebida a partir da pluralização dos diversos grupos, democratizando assim, os conhecimentos atrelados a essa cultura que, por sua vez, vão além das reflexões críticas da cultura corporal. Ainda sobre essa perspectiva curricular “cultural”, Neira (2011 apud NEIRA, 2018, p. 9) reforça que:

A experiência escolar é um campo aberto ao debate, ao encontro de cultura e a confluência de práticas corporais pertencentes aos vários setores sociais. O currículo cultural de Educação Física é uma arena de disseminação de sentidos, de polissemia, de produção de identidades voltadas para a análise, interpretação, o questionamento e o diálogo entre as culturas e a partir delas.

Ocorre que, segundo o autor, as instituições de ensino, nos tempos atuais, têm por finalidade abarcar os distintos grupos que compõem a sociedade, não em um sentido meramente formal, mas que sejam ofertadas as condições necessárias para que o percurso desses grupos, ao longo da sua formação, seja bem-sucedido.

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Deixando evidente que a participação efetiva de todos é um ponto de partida necessário numa lógica da interação ampla de todos os grupos sociais, tendo em vista que, existe historicamente uma condição de lutas antagônicas onde o capital cultural de alguns grupos são majoritariamente legitimados em detrimento de outros, estabelecendo-se assim à disputa de poder entre as classes sociais, esse contexto se mostra evidente, inclusive nas instituições educativas, se colocando como um desafio primordial para essas instituições de ensino e os personagens que dela fazem parte. Para reforçar essa ideia do papel da escola, Giroux (2006 apud NEIRA 2018, p. 9) aponta: “do ponto de vista das práticas educativas desejadas, a ideia básica reside nas proposições de situações pedagógicas que, em substituição à cultura do silêncio, façam ecoar as vozes das minorias”.

Em se tratando da prática do esporte nas aulas de educação física, a prática tecnicista pautada na instrumentalização dos gestos, que em um passado recente era confundido como sinônimo da educação física pela sua presença unânime nos espaços da escola, e que atualmente, a partir de uma mudança paradigmática da área, tem o seus princípios contestados, e, dessa crítica fez-se surgir os novos propósitos para o esporte escolar que, agora abordado de um outro modo, estabelece um contraponto com aquilo que até então era o objetivo fim da prática esportiva, conforme aborda Bracht (2000) quando diz que abordar o esporte de modo critico na educação física, não é ser contra a técnica esportiva. Ainda sobre a questão da prática do esporte, mas explicitamente nos aspectos da realização do trabalho da técnica esportiva, para Morschbacher e Maurente (2011, p. 87), “A técnica esportiva necessita ser abordada e oportunizada aos sujeitos enquanto formas históricas e culturalmente constituídas que lhes possibilitam atuar de modo bem-sucedido no esporte, ampliando sentidos e significados.”

Desse modo, vê-se que o esporte enquanto prática pedagógica e as suas vivências relacionadas aos aspectos técnicos, podem e devem ser trabalhados no âmbito da escola, desde que os mesmos não sejam realizados de modo isolado e destituídos de qualquer significado, recaindo por sua vez em uma lógica racionalizada do movimento humano.

Nessa lógica, as práticas educativas devem envolver elementos básicos no trato com o esporte, apontando para uma vivência que contemple a significação desta

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com o aluno. Conforme Kunz (2006 apud MORSCHBACHER, MAURENTE, 2011, p.90):

Considerar os sujeitos das práticas educativas em relação ao seu mundo vivido (sobretudo quanto as suas vivências e experiências corporais e de movimento e conhecimentos relativos ao esporte); o mundo do movimento e dos esportes que necessita ser problematizado e criticamente compreendido; as diferentes modalidades esportivas instituídas histórica e culturalmente e, ainda, os sentidos e significados relacionados a estas.

É vital admitir que os diversos alunos envolvidos na prática esportiva possam ter reconhecidos o acervo de conhecimentos que dispõem, próprio das suas relações sociais, além de suas experiências, que são singulares e inerentes as suas vivências anteriores. Desse modo, possibilita-se a aproximação do sujeito a essas práticas, imprimindo sentido às mesmas.

É nesse terreno a ser percorrido, entre “o não mais e o ainda não”, que um agregado de fatores, desde um cenário em que temos a disposição com um acervo de abordagens que busca superação do atual quadro, em que a valorização do protagonismo dos sujeitos envolvidos em suas mais diversas instâncias em a educação física acontece com relações pessoais de interdependência horizontalizadas na construção da educação física republicana que queremos.

Esse terreno percorrido entre “o não mais e o ainda” não está estéril. Existiram e continuam existindo profissionais e estudiosos que procuram dar um sentido pedagógico a disciplina, o que tem contribuído, notadamente, para evolução do trato da educação física na escola. Esse cenário que se renova é percebido em pesquisas realizadas pelo país, dentre elas podemos citar o exemplo de um estudo com um grupo de professores de educação física no estado de São Paulo, que organizaram um evento destinado tão somente para educadores com atuação permanente nas redes de ensino, denominado de Seminário de Metodologia da educação física da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo - SEMEF, evento que busca demonstrar as “experiências de caso” desses professores, com fim de analisar como a prática da educação física vem sendo manifestada no meio educacional após a apresentação das diversas abordagens possíveis para o trabalho pedagógico da educação física. Em seu artigo, (NEIRA, 2014), ao analisar o relato desses professores, mais precisamente aqueles que retratam a sua prática da educação física tendo como conteúdo o esporte, postula uma divisão de dois grupos de professores

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que apresentam características de trabalho distintas e que o autor classificou de consciência transitiva ingênua e o esporte como artefato cultural produzido pela linguagem corporal, esta última classificada como uma visão crítica de ensino.

Esse referido estudo constata uma mudança nas ações pedagógicas, especificamente no trato com o conteúdo esporte, onde os professores têm objetivado atrelar a prática dos esportes dentro da escola a um significado que possa superar o modelo padronizado e racionalizado que tanto limitou às possibilidades de aprendizagens dos alunos. Nesse sentido, o estudo apresentou uma mudança significativa quando da apresentação dos relatos de trabalho, pois apenas uma pequena parcela demonstrou um ensino dos esportes voltados para as aprendizagens das técnicas corporais enquanto a maior parte dos trabalhos demandou o desenvolvimento da criticidade dos alunos a partir em relação à prática dos esportes.

Para explicitar os dois modelos de práticas apresentadas pelo estudo exposto pelo SEMEF, foram identificadas duas abordagens pedagógicas que podem representar de modo fiel os modelos de trabalhos descritos pelos dois grupos de professores. A começar pelo grupo que propôs no seu trabalho ações pedagógicas voltadas restritamente aos aspectos técnicos do futsal, que apesar disso foram trabalhados didaticamente a partir de uma lógica não reprodutiva do sistema esportivo, mas de adaptar o conteúdo à escola e às características dos alunos (NEIRA, 2014). A prática apresentada por esse grupo, embora tenha alinhado o esporte a um contexto pedagógico de aprendizagem o seu alcance a esse propósito se mostra limitado e, pode ser enquadrado no âmbito da prática de consciência transitiva ingênua:

A consciência transitiva ingênua é aquela que amplia o poder de captação e de resposta às sugestões que partem do seu contexto. Seus interesses e preocupações se alongam a esferas bem mais amplas que a simples esfera vital. É a consciência típica do homem massa que não consegue estabelecer uma progressão intensiva no diálogo com o mundo e com os homens. (OLIVEIRA; CARVALHO, 2007, p. 222)

Dentro desta perspectiva de prática transitiva ingênua nós temos a proposta da “Escola da Bola” que busca superar a prática dos esportes em um modo da racionalização irrefletida dos gestos técnicos oriunda do esporte institucionalizado e tem como idealizadores Christian Kroger e Klaus Roth (2002). Na perspectiva apontada por esses dois autores para o melhor aproveitamento dos alunos no jogo,

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as circunstâncias de aprendizado não podem ser propostas a partir de uma sequência lógica de habilidades distintas para, posteriormente, serem agregadas ao jogo.

Numa outra perspectiva, em que a prática dos esportes é vista a partir de um contexto real e imerso a uma realidade multicultural, é reconhecido que o acesso de todos à prática dos esportes e a possibilidade de apreensão de diversos saberes inerentes ao referido conteúdo, pode contribuir para aformação crítica do aluno e que vai além do saber fazer. Felizmente, conforme indicam os estudos do SEMEC, a prática dos esportes nos moldes dessa abordagem, denota uma presença mais significativa no âmbito das escolas, pelos menos, no reduto em que a pesquisa fora realizada e, para exemplificar a materialização dessa abordagem, demostraremos adiante uma proposta pedagógica que muito se aproxima ao trabalho intencional desse grupo de professores, denominada crítico-emancipatória.

Observamos que, nesse cenário atual no qual a pratica dos esportes no interior da escola, pode em alguns casos ser percebida pela redução das suas possiblidades a aspectos técnicos e táticos, ou de outro, assumindo um caráter meramente recreativo, é que podemos constatar que os profissionais da área de modo massivo, comungam da ideia de que essas práticas a pouco citadas já não respondem mais aos anseios de um aprendizado necessário à formação do sujeito na configuração da sociedade atual. Apesar deste entendimento, ainda existe certa dificuldade por parte dos professores em assumir intervenções pedagógicas que favoreçam uma formação mais ampla e significativa tão desejada no interior das escolas e nas aulas de Educação Física. A partir dessa necessidade é que fez surgir outras possibilidades pedagógicas na área conforme podemos ver a seguir.

2.1 Escola da bola

Kroger e Roth (2002) elaboraram uma estratégia de ensinar esportes, denominada de escola da bola natural, que parte das vivências dos esportes realizados na rua (jogo de rua), onde as crianças, os jovens seduziam-se naqueles momentos de jogo, desenvolvendo suas experimentações de acordo com seus interesses e peculiaridades. Esse contexto de esporte jogado na rua, não é mais tão evidenciado, como era há 30, 40 anos, conforme destacaram os autores. Praticamente não há mais possibilidades de aprendizagens pautadas nesse enfoque.

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O que predominantemente tem existido atualmente é a iniciação precoce dos alunos ao contexto de prática esportiva, na qual o modelo de ensino trabalhado é o convencional, assumindo uma lógica em que a aprendizagem mecânica dos fundamentos ganha relevo, em detrimento a visão de totalidade presente na prática do esporte.

A proposta Kroger e Roth (2005) faz uma alerta para a participação precoce dos alunos nas atividades esportivas, sobretudo, àquelas práticas alinhadas ao esporte de rendimento, tendo em vista a maior sobrecarga demandada, a especialização em uma única modalidade e ao método de aprendizado que confere ao aluno o domínio dos diversos fundamentos do jogo para, em seguida, aprender sobre a lógica da modalidade. Segundo os autores, essa metodologia transcorre da seguinte forma:

Na metodologia dos esportes vale, como em outras áreas, que primeiro se aprende o “ABC”, as primeiras letras, para depois de forma garantida, poder passar a falar em palavras mais complexas (técnicas especificas) e logo “regras gramaticais” (competência tática especifica) (KRUGER; ROTH, 2005, p. 9).

A preocupação aqui é resgatar um contexto da escola da bola natural, em que a tônica do jogo recaia sobre a criatividade e a descontração dos alunos, para tal propõem processos didático-pedagógicos que visam à iniciação do aluno na prática esportiva. Assim, com a proposta denominada escola da bola, Kroger e Roth (2005), lançam mão de três pilares básicos para a sua idealização: 1) Jogos orientados para a situação; 2) Orientação para capacidades coordenativas; e, 3) Orientação para habilidades.

Para o primeiro pilar privilegia-se o espaço da liberdade no jogo, de modo que o aluno deve compreender a lógica do jogo sem se ater tanto aos aspectos técnicos. O segundo pilar demanda a necessidade de um aprendizado rápido e correto; que o aluno possa controlar o movimento com precisão e dirigido ao objetivo; variar de forma múltipla e rica, sempre adaptado à situação. E, o terceiro, que recai sobre a proposição do ensino de habilidades técnicas mais amplas que poderão, consequentemente, serem introduzidas no jogo de determinadas modalidades, mas com ressalva de que o que se objetiva nessa proposta não é de modo algum uma especialização técnica padrão. A proposição explícita desta abordagem se concentra na intenção deliberada de promover o aprendizado dos aspectos inerentes aos esportes, sobretudo àqueles

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de ordem técnica e tática, uma vez que, o jogo pelo jogo não garante uma aprendizagem desses aspectos a todos os alunos incorrendo no erro de tornar a prática um mero jogo recreacionista como é manifestado o jogo através das práticas dentro do contexto do “rola bola”.

Sobre o alcance pedagógico desta abordagem em relação ao ensino dos esportes se mostra limitado, devido ao seu enfoque exclusivo aos aspectos técnicos e táticos inerentes ao jogo, mesmo reconhecendo a eficácia dos seus métodos no trato metodológico da prática esportiva, tendo em vista que a sua propositura supera o aprendizado do aluno pautado na racionalização do gesto técnico pouco reflexivo. Ao propor um ensino dos esportes em que o aluno trabalhe em contexto de imprevisibilidade com uma demanda acentuada de possibilidade de tomadas de decisões desperta no aluno uma capacidade reflexiva que corrobora o desenvolvimento da criatividade e racionalidade. Quando se fala numa formação integral do aluno, a abordagem se mostra insuficiente, tendo em vista que seu alcance se restringe ao saber fazer, onde apenas os aspectos procedimentais são trabalhados, em contrapartida fica destituída da proposta uma formação fundamental do aluno, àquela inerente ao saber sobre o fazer além de outros temas que dizem respeito à constituição do aluno enquanto ser em coletividade, que se relaciona com os seus iguais.

2.2 Abordagem Critico-emancipatória.

Em meio esse quadro de uma prática dos esportes enquanto conteúdo determinante da educação física, citada a partir da crítica de diversas correntes pedagógicas renovadoras, que não agrega a disciplina um compromisso pedagógico em virtude a sua condição quase servil ao esporte institucionalizado, entre outras, surge a proposta do professor Elenor Kunz, denominada de “transformação didático pedagógica do esporte”. Nela o professor busca instituir como proposta de ensino uma prática de efetiva mudança e que possa de fato se materializar no campo de ação da educação física, o que segundo Kunz (2004) é tido como grande entrave naquilo que é proposto por correntes pedagógicas, especialmente àquelas de cunho crítico e fundamentadas no marxismo, que embora esbocem críticas contundentes, não apontam caminhos práticos para superação do quadro.

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O que se está a buscar mediante essa proposta de Kunz (2004) é a instituição de práticas por meio de um ensino problematizador nas aulas educação física, transformando a didática promovida, vindo ao encontro de uma atuação bem-sucedida de todos os alunos envolvidos. Essa nova perspectiva de trabalho acerta em cheio o cerne da prática esportiva celetista e excludente, possibilitando a todos os alunos o acesso à cultura corporal do movimento.

Essa transformação da prática dos esportes, segundo Kunz (2004), citando um trabalho de Hildebrandt e Laging (1986) intitulado Concepções Abertas no ensino da

educação física aponta para um ensino da educação física não que ocorre de modo

alheio à realidade dos alunos e do contexto de trabalho local, pois para que essa transformação ocorra de modo a atender à necessidade e o sucesso a totalidade do grupo, fatores como as experiências anteriores dos alunos inerentes determinada modalidade, o aporte material e físico disponível para realização da mesma, organização do tempo da escola, o grau de influência que o esporte normatizado estabelece com o público em questão, devem ser superados. Observados esses fatores estar-se-á promovendo vivências que indicam a proposição do ensino dos esportes mediante a abordagem defendida por Kunz. Considerar a realidade dos alunos é uma condição necessária quando o assunto é uma nova proposição de prática dos esportes, segundo (NEIRA, 2014, p. 57)

É interessante observar, nos relatos de práticas que procuraram desenvolver uma visão crítica, que o esporte a ser estudado foi selecionado através do mapeamento. Para coletar as informações necessárias, os educadores realizaram uma pesquisa de campo, reconheceram os locais de prática existentes na comunidade, observaram a ocorrência de manifestações corporais ou constataram uma temática candente nas turmas com que trabalharam. Foi com base nessas informações, que os professores organizaram seus planos de trabalho.

O que se necessita diante nessa nova prática de esportes é uma “mudança de sentido” no que se refere à compreensão que o aluno tem acerca do esporte tradicional. Para Kunz (2004), os alunos devem aprender a compreender a partir do esporte tradicional uma melhor forma do seu agir a partir dessa vivência, uma análise de sentidos em que pese à escolha de uma prática inerente a uma melhor compreensão do seu mundo e, para tanto, se faz necessário um trabalho conjunto entre professor e aluno. Acontece que, muitas vezes o que está posto em termos de condições físicas e materiais e ou didáticas para o aluno, é uma prática do esporte

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muito próximo às normatizações, aos padrões de movimentos, além de uma estrutura de espaço físico totalmente adequado às normatizações das diversas modalidades esportivas, onde as práticas devem ser trabalhadas dentro deste contexto, isso acaba por suprimir às possibilidades de um agir subjetivo do aluno pela prática esportiva. Assim, para que o aluno possa estabelecer uma mudança de sentido nas vivências esportivas, esse aparato de estruturas normatizadas, tanto no seu aspecto estrutural quanto regimental, imprescindivelmente, deve ser superado para que a partir daí, as vivências esportivas possam adquirir identidades diversas que contemplem uma formação emancipatória conforme propõe (KUNZ, 2004, p. 29):

Um esporte que não necessariamente precise ser tematizado na forma tradicional com vista ao rendimento, mas com vistas ao desenvolvimento do aluno em relação a determinadas competências imprescindíveis na formação de sujeitos livres e emancipados. Refiro-me as competências da autonomia, da interação social e da competência objetiva.

Ainda segundo Kunz (2004), no desenvolvimento da competência objetiva os conteúdos devem ser apresentados aos alunos enquanto um patrimônio cultural e, portanto, um saber que deve ser historicizado no intuito de ampliar o olhar crítico do aluno que ainda deve conhecer os aspectos mais inerentes os movimentos intrínsecos aos esportes, das atividades motoras, lúdicas, etc.

Tem-se como um dado pouco questionável que a escola é o espaço institucional no qual os diversos saberes são socializados mediante uma organização didática com intenções formativas deliberadas. No entanto, é totalmente inverídico negar os outros espaços sociais como ambientes não educativos. Os indivíduos ao interagirem em coletividade, independente do lugar onde estejam, demandam uma necessidade incessante de aprender mediante o contato com o outro. No contexto da educação física, mais especificamente dos esportes, existe uma variedade de possibilidades de vivências que perpassam pela lógica dos esportes, sejam elas mais institucionalizadas ou mais recreativas, mas todas demandam a existência de um saber particular às intenções de cada uma dessas realidades. Para retratar esse contexto, Kunz (2014, p. 73) afirma:

Assim, não só a escola se configura numa organização social onde as encenações pedagógicas do esporte acontecem, mas também na família, os parques e as áreas de lazer, os clubes, etc. e neste sentido, o esporte sempre que for encenado em algum lugar por algum motivo tem um caráter educacional. O problema é descobrir que compromisso educacional a encenação pedagógica do esporte deve assumir

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quando da presença de um educador e no espaço escolar. Pois, a escola é por excelência o lugar social especifico onde a organização da situação educativa é formal e explicita e onde o espaço pedagógico é penetrado de intenções políticas. Neste espaço pedagógico o profissional e Educação Física deve propiciar pela historicidade do seu conteúdo especifico, uma compreensão crítica das encenações esportivas.

A competência da autonomia se figura como um dos principais pontos da proposta da Transformação didático pedagógica do esporte, na qual o aluno deve ser capaz de agir criticamente e de atuar de modo autônomo na prática dos esportes, e de acordo com Kunz (2004), para tal objetivo não é necessário abdicar dos princípios que são inerentes ao esporte, mas sim há necessidade de adequação de objetivos que possam propiciar o desenvolvimento da competência da autonomia. Logo, um agir para a autonomia implica o distanciamento das práticas monologas que veem no esporte escolar uma extensão do esporte institucionalizado, trilhando um caminho para um campo das vivências esportivas que admitam a diversidade de possibilidades, a diversidade de saberes nas suas subjetividades individuais, as diversas intencionalidades do movimento, enfim, que o plural seja sempre a tônica de uma diversidade na sociedade.

Neste sentido, a pedagogia que estuda os esportes para a Educação Física deve estudar o homem que se movimenta, relacionado a todas as formas de manifestação deste se-movimentar, tanto no campo dos esportes sistematizados, como no mundo do movimento, do mundo vivido, que não abrange o sistema esportivo. Ou seja, na família, no contexto onde vive, no trabalho etc., pois o homem continua um ser que se-movimenta mesmo quando ele age fora dos seus contextos materiais previamente estabelecidos para a pratica esportiva. (KUNZ, 2014, p. 68).

Afinal, como podemos definir de modo regulamentar uma prática esportiva? Certamente, para tal existem delimitações que caracterizam e regulam às diversas práticas esportivas, sendo assim, no campo da informalidade, diariamente diversas pessoas assumem o exercício regular do esporte, quando afirmam andar de bicicleta para ir ao trabalho ou dançar forró em festas noturnas. De fato, em relação as suas especificidades nenhuma dessas atividades se enquadra como práticas esportivas oficialmente regulamentadas, mas em se tratando de um se-movimentar, essas pessoas não estariam de fato se propondo a uma vivência “esportiva”? Embora essas não se enquadrem numa lógica legítima segundo uma ótica tradicional, entendemos que para atender os propósitos da abordagem aqui mencionada essas práticas

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“informais” devem ser legitimadas enquanto objeto de um se-movimentar. Acerca do mundo da vida, Jurgern Habermas tem uma posição interessante. Habermas (1981

apud KUNZ, 2004, p. 64):

Assim, a moradia, o campo de vivência social da família, dos amigos, do trabalho, são enquanto determinantes na compreensão de ser humano e movimento, muito mais importante do que o esporte de rendimento, que corporifica o sistema.” No entanto, conceitualmente os estudos sobre o tema o admitem somente enquanto sentido restrito:

O conceito de esporte enquanto mundo vivido, no entanto, implica em um problema terminológico. Ou seja, os estudos existentes sobre o tema esporte referem-se sempre ao esporte enquanto conceito restrito. E com relação ao conceito amplo do esporte como me refiro aqui, talvez expressões “cultura do movimento”, “mundo do movimento” ou até mesmo “atividades lúdicas” fossem mais exatas (KUNZ, 2004, p. 66-67).

Conforme pudemos observar nos cuidados que são demandados na proposição pedagógica no ensino dos esportes no ambiente escolar, fica claro nas exposições aqui citadas, que o espectro do trato pedagógico deve ser ampliado para além de conteúdos limitantes, restritos, mas que possa fazer uso da amplitude das referências desses saberes e, como mencionado anteriormente, os alunos devem ser observados não como seres estanques e vazios, prontos para receber conhecimentos “ideais”, mas como sujeitos em constante formação e, possuidores de um acervo de conhecimentos que devem ser considerados e a partir daí, através do contexto de ensino proposto pela competência comunicativa possa se efetivar. Sobre esse processo pedagógico Kunz (2004, p.39) faz a seguinte observação:

O ensino aqui pretendido não é um ensino “fechado” que se concentra na aprendizagem de destrezas técnicas para o rendimento esportivo e nem um ensino “aberto” para atender, na maior parte, os interesses dos alunos – que não são reais.”

Como o ensino dos esportes no espaço da escola tem a finalidade de permitir ao aluno o acesso a essa cultura dos esportes, e ainda, ampliar os seus conhecimentos acerca desses saberes, fazendo com que esse novo entendimento possibilite o melhor usufruto do indivíduo pelo esporte na sua vida adulta em todos os seus contextos, está implícito que para atingir tal objetivo são necessárias reflexões e vivências através deste conteúdo e, conforme mencionado anteriormente, nesse processo de aprendizagem deve haver um tensionamento entre o que Kunz (2004)

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denomina de ensino “aberto e fechado”. Em se tratando do conceito aberto de ensino, recai na necessidade de considerar os interesses e os desejos dos alunos nesse processo, faz-se um alerta no sentido de ponderar esses desejos, uma vez que os mesmos podem se apresentar como não reais, pois como afirma Kunz (2004, p. 25.):

O homem é um ser capaz de se desenvolver graças a seus interesses, seus desejos e suas necessidades. Infelizmente no estágio de desenvolvimento científico e tecnológico de hoje, e pela sua influência em todas as estâncias da vida, especialmente através da indústria cultural e dos meios de comunicação, os interesses, os desejos e as necessidades podem ser “formados” ideologicamente por essas instituições.

Em termos práticos, a sociedade atual está minada de instituições que exercem influência sobre tal, uma relação que na maioria das vezes esta assenhorada por uma lógica de mercado que de longe está preocupada com o bem estar social. Essa necessidade escusa de perpetuar uma cultura de esporte descompassada com os interesses reais do praticante, camuflam a partir dessas instituições, falsas necessidades e desejos que se explicitam nos princípios de sobrepujança do jogo, mas que, por meio de uma emancipação esclarecedora, o aluno pode superar esses desejos previamente forjados em caminho da instituição de desejos reais, compatíveis com a capacidade do se-movimentar. Nessa perspectiva, para que os alunos possam por meio do fenômeno do esporte desenvolver atividades inerentes a ele a partir de interesses reais, sendo essa participação desenvolvida na sua dimensão polissêmica, como propõem Brodtman e Trebels (1979 apud KUNZ, 2004, p. 29):

1.ter a capacidade de saber se colocar na situação de outros participantes no esporte, especialmente daqueles que não possuem aquelas “devidas” competências ou habilidades para a modalidade em questão; 2. ser capaz de visualizar componentes sociais que influenciam todas as ações socioculturais no campo esportivo (a mercantilização do esporte, por exemplo); 3.saber questionar o verdadeiro sentido do esporte e por intermédio dessa visão crítica avaliá-lo.

Um exemplo claro desta realidade abordada por Kunz (2004) repousa nas aproximações do esporte rendimento, que conforme evolui, pela sua especialização técnica cada vez mais acentuada, um número cada vez menor de pessoas consegue por efeito uma condição exitosa de prática. No entanto, mesmo diante desse insucesso, continua sendo a prática aclamada e requisitada por todos. Sobre esse cenário adverso, o autor encontra em Habermas uma saída, segundo ele, esse

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estágio de dependência somente poderia ser superado mediante ações dos próprios sujeitos sociais a partir de uma reflexão inerente à historização e a dialética dessa realidade, culminando na percepção dos seus determinantes.

De acordo com o exposto, fica evidente que o ensino do esporte deve perpassar o campo da prática a ser explorado enquanto conteúdo, um saber possível de discussões, reflexões, avaliações. E segundo a abordagem critico-emancipatóriaque vai conferir ao aluno esse contexto reflexivo em torno dos conhecimentos referentes a este conteúdo é o que Kunz(2004) denomina de competência comunicativa, que capacita o aluno a transcender o mundo do esporte, dando-lhe condições de perpassar os vários campos do saber, uma vez que por meio do processo de ensino deve adquirir condições de agir no campo, não apenas do esporte, mas cultural, político, entre outros. Desse modo, podemos colocar a didática comunicativa como uma ferramenta capaz de promover a interação comunicativa entre os personagens da prática pedagógica, tendo em vista que, essa relação se faz em um cenário essencialmente de ações comunicativas.

A partir desse contexto o que propõe de fato o ensino da prática dos esportes postulados pela abordagem crítico-emancipatória é um ensino voltado para os aspectos práticos e teóricos, onde o aluno além de aprender e desenvolver os aspectos técnicos dos esportes, poderá compreender e aprender a partir dos saberes implícitos neste conteúdo a melhor se organizar em torno dessa prática. Dentro dessa perspectiva, para uma melhor forma de organização e compreensão o trabalho, o conteúdo é divido em categorias que devem ser consideradas na construção dessa proposição amplificada de ensino: o trabalho, que recai sobre as possibilidades do treinamento de habilidades técnicas; a interação social, que envolve o processo coletivo de ensinar e aprender, sempre na coletividade privilegiando a cooperação e a participação; e a linguagem, que se refere às expressões de linguagem verbal e corporal do se-movimentar. O ensino realizado e mediado por essas categorias deve proporcionar ao aluno o desenvolvimento de determinadas competências denominadas de objetiva (categoria trabalho), social (categoria interação) e comunicativa (categoria linguagem). No que se refere à competência objetiva, essa deve permitir que o aluno através do aprendizado dos diversos aspetos técnicos e táticos possa adquirir um saber racional o qual possa exercer suas ações dentro do esporte de modo racional e eficiente. Para a competência social o que se deseja é

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