• Nenhum resultado encontrado

ARTE DE CONTAR HISTÓRIAS

Constelação 2 Dissertações de Mestrado.

46 CARTOGRAFIOS DE UMA NARRATRIZ Kalinde Braga Augusto Vicente Juliana Ferreira Machado (Juliana Mado) A formação do contador de histórias hoje: a parceria teatral e outros caminhos Performance narrativa e transmissão da experiência em dois narradores natos: Sebastião Biano e

Marilene Paschoal. Instituto de Artes

da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”/2015 Mestrado em Artes Cênicas. Linha de pesquisa: Estéticas e poéticas cênicas. Programa de Pós- graduação em Artes da Cena do Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas Área de Concentração AA: Teatro, Dança e

Performance. Unicamp/2015

Fonte: Catálogo de teses e dissertações da CAPES.

Foram encontradas quatro teses e cinco dissertações com o entrelaçado que destacamos anteriormente. Trarei a seguir considerações sobre elas, especificamente apontando de forma geral do objeto que tratam, mas também das poéticas com as quais são desenhadas. Inicio com a tese da educadoranarradora mineira Aline Cântia Miguel (2017) que estudou O educadornarrador: uma

Performances entre contação de histórias, teatro e educação 47 e narradores contemporâneos e no seu próprio percurso como contadora de histórias e educadora modos deste educadornarrador se constituir, aprender a narrar, a partir de conceitos e teorias referentes ao contexto da cultura popular, da educação popular, da experiência e do cotidiano. Vinculada ao Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense, na linha de pesquisa de Estudos do Cotidiano da Educação Popular, a pesquisadora tece de forma poética a discussão e apresenta com embalo e rigor a rede conceitual que sustenta seu trabalho. Mesmo não apresentando relação com as artes cênicas, o trabalho de Miguel (2017) interessa-me aqui pela forma de escrita e por ser um estudo que traz importantes considerações da interface do narrador com/ na educação.

No caminho de investigar a existência do contador de histórias nas cidades, o contador de histórias e curador da Casa Tombada (SP), Giuliano Tierno de Siqueira (2016), construiu a tese O Narrador: Considerações sobre a arte de

contar histórias na cidade, na qual pesquisa as especificidades dos narradores de

histórias urbanos, seres que não tem em sua trajetória a apreensão deste ofício de forma tradicional, como nas sociedades africanas, por exemplo. O interesse do pesquisador/contador de histórias é compreender como se dá o ressurgimento dos contadores de histórias, da existência de uma palavra pública em meio à

Sociedade do Espetáculo, conceito de Guy Debord (1931-1994) e à Sociedade Excitada, tese de Christoph Turcke (1948 -), criando uma narrativa fictícia com

estes e outros interlocutores para construir suas reflexões.

Já a tese de Ângela Barcellos Café (2015), intitulada Os contadores de

histórias na contemporaneidade: da prática à teoria em busca de princípios e fundamentos é elaborada a partir das experiências vividas pela pesquisadora como

contadora de histórias e formadora de contadoras/es de histórias ao longo de 20 anos. Com metodologia criada a partir do método dialógico, Café (2015) apresenta

48 CARTOGRAFIOS DE UMA NARRATRIZ

seu percurso como narradora e formadora, elaborando conceitualmente quem é o sujeito contador, como se dá a presença deste e que ela diferencia do que conhecemos como presença no Teatro. Discute também como o autoconhecimento de cada sujeito é caminho para constituir a linguagem corporal a partir dos distintos textos e das distintas experiências, visto que ela também traz narrativas de outras/os sujeitas/os contadoras/es.

Nas três teses que apresentamos6, fica evidente o quanto a imersão no saber-

fazer da contação de histórias está impregnado nos cotidianos de Aline Cantia, Giuliano Tierno e Ângela Café, dos quais pude também ouvir as narrativas sobre

seus trabalhos em espaços como o Boca do Céu7 e o recentemente acontecido

Oralidades – Simpósio Nacional de Contadores de Histórias (Santos-SP), em que Giuliano Tierno esteve na curadoria e Aline Cântia, na produção. Como somos pesquisadoras/es da palavra, poder escutar estes conceitos sendo debatidos, questionados e ampliados com outras vozes, também me interessa e nutre. Ângela Café pude conhecer e ouvir questões de sua pesquisa em momentos distintos, ambas as vezes no Boca do Céu.

Dando sequência à busca de pesquisas que estejam ancoradas no entrelaçar da contação de histórias, das artes cênicas e da educação, foi encontrado um

número maior de dissertações do que de teses, totalizado em cinco8. Das quatro

6 - Não consegui acesso à tese de Toni Edson Costa Santos, que consta em nosso quadro por compor o catálogo de teses da CAPES, porém não foi possível o acesso ao trabalho nem no referido site, nem no repositório da UFBA, consultado posteriormente.

7 - Encontro internacional de narradores de histórias idealizado e coordenado por Regina Machado, que acontece bienalmente na cidade São Paulo- SP.

8 - Não consegui acesso ao texto da pesquisa de Alexandre Geisler de Brito Lira : Jogos para despertar o contador que cada um traz dentro de si, que consta no catálogo de teses e dissertações da Capes, mas não está disponível no repositório da UFBA.

Performances entre contação de histórias, teatro e educação 49 a que tive acesso, a dissertação de Lígia de Moura Borges (2017), Tecendo o Sopro

do Narrador, apresenta uma discussão sobre a vocalidade poética de quem narra,

a partir das/os narradoras/es tradicionais e da artesania de uma Palavra Viva que estes possuem. Já a dissertação de Wellington Rodrigues Barros (2017) A

Terceira Margem da Performance: um estudo do ato-narrativo em três contos de Guimarães Rosa, discute a interface contador de histórias e ator na produção do

ato narrativo9.

Num recorte para pensar as contribuições do Teatro para o contador de histórias, a dissertação de mestrado de Kalinde Braga Augusto Vicente (2015) , sob o título A formação do contador de histórias hoje: a parceria teatral e outros

caminhos, apresenta-nos ideias, conceitos e aberturas para o diálogo entre Teatro

e contação de histórias, colocando em conversa os estudos de Regina Machado e Gislayne Avelar Matos e as pesquisas de formação do ator de Matteo Bonfitto e Cassiano Quilici. Já a pesquisadora Juliana Ferreira Machado (2015) na dissertação

Performance narrativa e transmissão da experiência em dois narradores natos: Sebastião Biano e Marilene Paschoal, contribui com a caracterização dos conceitos

de performance narrativa, numa perspectiva da possibilidade da experiência no mundo contemporâneo com estes narradores orais natos, nos quais ela observa uma atitude narrativa.

Como forma de ampliar o nosso escopo da pesquisa, principalmente no que tange à questão corporal como elemento específico da discussão da formação e criação da/o contador/a de histórias e das contribuições da performance, é importante evidenciar a pesquisa da professora, pesquisadora e contadora de 9 - Pude conhecer o trabalho de Wellington Barros também na mesa em que estivemos juntos na Mostra Transborda do Sesc Pernambuco em 2017, que teve como tema O ator contador de histórias, um dos recortes curatoriais da mostra naquele ano.

50 CARTOGRAFIOS DE UMA NARRATRIZ

histórias Luciana Hartmann da Universidade de Brasília, que em sua tese de doutorado no ano de 2004 tratou sobre “Aqui nessa fronteira onde tu vê beira de

linha tu vai ver cuento...” Tradições orais na fronteira entre Argentina, Brasil e Uruguai. Em seu artigo Crianças contadoras de histórias: narrativa e performance em aulas de Teatro, Hartmann (2015), faz um Breve panorama dos estudos das narrativas em performance, no qual apresenta o conceito de performance em

Richard Bauman, com destaque para o que considera umas das importantes contribuições do autor: “evento narrado (o conteúdo das histórias) e evento narrativo (a situação discursiva da sua narração)” (p. 233).

Com relação ao corpo em performance, a autora, que tem pesquisado tanto o trabalho com crianças contadoras de histórias quanto contadores de “causos” da fronteira do Brasil com o Uruguai e Argentina, nos diz:

São também importantes para essa minha pesquisa os textos de Simone Grande, Hemilin Faustino (Emilie Andrade) e Letícia Liesenfeld Erdtmann no livro Narra-te cidade: pensamentos sobre a arte de contar histórias hoje (2017). Para mim, são pistas de uma cartografia que se forma ao propor pensar a contação de histórias a partir do corpo que vibra a palavra. As contadoras e pesquisadoras, que também são atrizes, com formação no Teatro e na Dança, discutem a corporeidade de quem narra a partir de autores e autoras como Christine Greiner, José Gil, Ciane Fernandes e Klaus Vianna, como também de suas experiências pessoais.

É no corpo, portanto, que reagimos aos estímulos multissensoriais produzidos pela performance. E é ele que nos permite a atribuição de sentido. Por este motivo que acredito que o trabalho com as narrativas orais seja tão produtivo em aulas de teatro, sobretudo com crianças. (HARTMANN, 2015, p. 234)

Performances entre contação de histórias, teatro e educação 53 Essa história segue conectada com o era uma vez, na ação de escrever e olhar. Meu olhar no teu que me lê, que permite um contato com meu corpopalavra, com a corporeidade dissertativa que se apresenta. Estas linhas que seguem são bordadas em conjunto com você, sua leitura, seu corpo, então o que quero dizer, neste instante, é do prazer de estar nesta troca! Esta história se instabelece aqui, no tempo presente, em que nós nos encontramos. Um tempo presente fora do tempo comum, um presente suspenso, que se encontra no potente momento em que nossos corpos se irmanam no sentir, na respiração, na energia, no vínculo, no tempo do “agora eu era”. Nas palavras de Machado (2015a):

Pois bem... uma vez além do tempo, agora eu era Escola! Há muitas histórias para serem contadas sobre a escola, na escola, com a escola. Nesta história, Escola é performer, com corpo, sentimentos, ações, contradições, inferências e dúvidas, por vezes até personagem. E, como nos mostra Machado (2004b, p. 11), “antes de mais nada, parti de um ensinamento valioso, que sempre está presente para mim: aprendi que nos contos tradicionais os personagens não são pessoas, mas expressam qualidades e possibilidades humanas de desenvolvimento”. É extrapolando esse