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A partir da crise financeira de 2008, iniciada nos Estados Unidos e que atingiu todos os grandes mercados e maiores economias de maneira sistêmica puseram pesquisadores a estudarem as causas da sua eclosão.

Dois professores da FGV-EAESP28, Alkimar R. Moura e Maria Cecília Coutinho de Arruda, através do GVExecutivo, vol. 11, n. 1 trouxeram a sua contribuição à reflexão a respeito dessa crise econômica americana e mundial.

Dois são os artigos que escreveram no GVExecutivo Especial Ética em Tempos de Crise (v. 11, n.1), ambos tratam da ética.

Para Moura (2012, p. 51), que não se aprofundou sobre a reflexão filosófica da ética, visto não atender aos propósitos do seu artigo, intitulado A Dissipação dos Valores Éticos na Crise Financeira Global, preferiu trazer a ética da convicção29 de Max Weber para situar o seu trabalho no contexto teórico.

Segundo Moura (2012, p. 51), foi divulgado em documentos oficiais do governo norte-americano, que “a dissolução dos valores éticos foi apontada como uma das causas da derrocada financeira”.

2.10.1 Causas da ruptura dos padrões na crise americana de 2008.

Segundo o relatório do governo dos EUA três causas primordiais levaram a ruptura de padrões éticos nos “três elos da cadeira de financiamento imobiliário” (MOURA, 2012, p. 51):

1 – Tomadores de crédito fizeram operações sabendo que não tinha capacidade em pagá-los ou o fizerem deliberadamente para não honrarem o mesmo;

2 – As empresas financiadoras fizeram os empréstimos “sabendo de antemão que não seriam honradas” (MOURA, 2012, p. 51);

3 – Os bancos fizeram o “reempacotamento dos créditos e sua venda para investidores finais, ativos esses que não passariam nos seus próprios parâmetros de concessão de financiamento imobiliário” (MOURA, 2012, p. 51).

Moura (2012, p. 51) também coloca que o mesmo comportamento tóxico30 contaminou os outros intervenientes deste mercado: “corretores de empréstimos imobiliários, avaliadores de imóveis, construtores e agências de ratings”.

28 Fundação Getúlio Vargas – Escola de Administração de Empresa de São Paulo.

29 Ética segundo a qual as ações humanas devem ser julgadas de acordo com princípios e valores aceitos no mundo privado dos homens e que estão implícitos e sedimentados nos relacionamentos sociais. (MOURA, 2012, p. 51).

30 Tóxico: termo corrente para designar ativos financeiros de baixa ou nenhuma liquidez no mercado financeiro, especialmente utilizado após a crise de 2008.

Por analogia, se pode dizer que ao se admitir as falhas apontadas por Faria (2007, p. 137) em “a ética das palavras”, que o ambiente ou o clima ético adquire esse perfil tóxico e nocivo ao bem estar dos empregados e ao desenvolvimento das atividades profissionais quando “a ética das palavras” não é prática positiva.

O caso trazido por Moura (2012) é uma situação concreta, com exemplos facilmente apresentáveis, fartamente documentado e estudado de uma situação sistêmica, de uma ampla coletividade que resolveu ter um clima ético (negativo) causador de grande sofrimento e prejuízo, afetando milhões, muitos milhões de pessoas ao redor do mundo, em especial nas economias ocidentais.

Outro artigo que trata também da crise de 2008 apresenta a visão mais próxima das condutas e estratégias utilizadas pelos bancos norte-americanos, em especial, e que provocaram a grave crise, o que será estudada na próxima seção.

2.10.2 A ética em tempos de crise.

Em A Ética em Tempos de Crise, (ARRUDA, 2012), é o título de um artigo que complementa a temática da ética como fator da crise econômica que tomou o mundo em 2008, nele a autora busca, a partir da reflexão sobre a crise de 2008, entender a causa fundamental do que a teria causado.

No esforço de ter uma compreensão clara a respeito dos vetores da crise a autora formulou a seguinte indagação: “O que teria gerado essa crise?”, ela conclui que “foram muitas as causas ou interpretações, sendo difícil identificá-las isoladamente”. Para tanto relacionou uma série de causas possíveis, entre elas a questão da ausência da ética na gestão da economia mundial. (ARRUDA, 2012, p. 42).

Abaixo se reproduz as principais situações que em conjunto podem ser a causa da crise norte-americana de 2008. Entre elas Arruda (2012) coloca que está o afastamento da ética no concerto de uma economia globalizada.

Quadro 16 - Situações propulsoras da crise de 2008 nos EUA.

SITUAÇÕES PROPULSORAS DA CRISE DOS

EUA EM 2008. EXEMPLOS DE CONDUTAS INADEQUADAS.

1 - Erros nas políticas financeiras e econômicas? Excesso de estímulo ao consumidor. 2 - Fragilidade estrutural das instituições

políticas, econômicas e financeiras?

Regulação frouxa.

3 - Afastamento da ética no concerto de uma economia mundial pautada pelo egoísmo, pelo materialismo e pelo utilitarismo?

Valores da economia de mercado preponderante ante aos valores sociais necessários para o equilíbrio social.

3 - Erros técnicos (im)previsíveis? Análise de risco com critérios não conservadores.

Falta de responsabilidade moral? A cultura de mercado voltada apenas para a

função econômica, obliterando os demais valores. 4 - Bolha especulativa sobre crédito e imóveis? Oportunismo de toda a cadeia econômica para ganhos

fáceis.

5 - Excesso de confiança nos produtores, empresários, investidores e consumidores?

Cegueira voluntária.

6 - Descompasso entre geração de renda e crescimento financeiro, consumo e especulação?

Cegueira voluntária do mercado para a realidade econômica, tanto dos agentes econômicos, quanto dos reguladores e da gestão pública.

Fonte: Arruda (2012).

Nota: Quadro elaborado pelo autor, adaptando termos da fonte com citações diretas.

Nem todas as situações guardam referência com este estudo, contudo a situação 1, a 4 e a 6 têm grande aproximação com a empresa investigada, que é um grande banco.

Com tantas ocorrências divulgadas pela imprensa e com a opinião sintetizadora de uma solução futura e preventiva para outras crises, a autora diz que a racionalidade no processo de compra deve ser estimulado por todos e que o grande desafio para os empresários é incentivar o consumo sem transformar os consumidores em consumistas. (ARRUDA, 2012, p. 44).

A conclusão desse referencial ainda não chegou, mas é possível inferir que diante de todo o arcabouço teórico até agora construído a questão se coloca como complexa de estudar, de entendê-la, transpô-la para o ambiente real e principalmente, o de identificar nas organizações as ocorrências sob o signo da concordância cultural dentro de uma cultura corporativa cuja primazia é a função econômica como valor dominante, das táticas dispersivas e das cortinas de fumaças a enviarem sinais contraditórios permanentes com o intuito de esconder o real, podendo até ocorrer o apagamento de vestígios com demissões de funcionários que conhecem os fatos. (DEJOURS, 2012, p. 67).

Como o padrão de conduta eticamente questionável foi se implantando ao longo de um período, com a formação histórica de uma cultura empresarial, desmobilizar tal comportamento é um empreendimento de porte gigantesco e de determinação de estratégica, ante a banalização das condutas não éticas. (DEJOURS, 2012).

Contudo, parte da ciência que estuda a questão da ética nas organizações não o faz sob uma visão abstrata, trata da temática com uma visão prática e aplicável na gestão das organizações, dentre as correntes está a que estuda o Clima Ético, como uma parte importante do clima organizacional.