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A DITADURA CIVIL MILITAR COMO EXPRESSÃO DO PODER DO EMPRESARIADO INDUSTRIAL

1 INTERPRETAÇÕES SOBRE A BURGUESIA NACIONAL E O EMPRESARIADO

2.3 A DITADURA CIVIL MILITAR COMO EXPRESSÃO DO PODER DO EMPRESARIADO INDUSTRIAL

INDUSTRIAL (1965-1974)

Diante da conjuntura de crise econômica, a ditadura civil-militar implementou, inicialmente, no governo Castelo Branco (1964-1967), o Plano de Ação Integrada do Governo (Paeg) comandado pelos ministérios da Fazendo e do Planejamento. Para conter o processo inflacionário, o Governo Federal adotou medidas recessivas: cortou gastou e elevou os juros, com a finalidade de restringir o crédito. Além disso, estabeleceu uma política salarial que reduziu seu valor progressivamente, ao impedir que os aumentos dos ordenados ultrapassasse

41 Um dos casos mais emblemáticos é o do empresário Henning Albert Boilesen, dinamarquês, presidente da Ultragaz, conhecido por ser um dos organizadores da “caixinha” para financiar a Operação Bandeirantes (Oban) (GASPARI, 2002).

42 Também são conhecidas as articulações da participação do Estado estadunidense no golpe de 1964, que contou com apoio decidido da Agência Central de Inteligência (CIA) ao complexo Ipes/Ibad (DREIFUSS, 2008).

a taxa de inflação. Como resultado, a inflação caiu de 91,% para 30% entre 1964 e 1967 (BRITO, 2004).

O novo regime também promoveu alterações no sistema tributário e financeiro, com a finalidade de aumentar a capacidade de arrecadação de recursos para financiamento da economia nacional em investimentos produtivos. No âmbito tributário, impostos em cascata foram convertidos em impostos do tipo valor adicionado (como o Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias – ICM e o Imposto sobre Serviços – ISS); a União centralizou a maior parte dos impostos e aproveitou-se dos fundos fiscais, com destaque para o Programa de Integração Social (PIS) e o FGTS, como importantes fontes de poupança compulsória (BRITO, 2004). Houve também a criação do sistema de correção monetária, buscando conter os atrasos no pagamento de tributos. Já na área financeira, foram criados dois órgãos fundamentais para a política monetária e cambial do regime – o Banco Central e o Conselho Monetário Nacional. Ainda, reformulou-se o mercado de capitais, com o objetivo de estimular a captação de recursos pelas empresas na Bolsa de Valores, e revogou-se, como já mencionado, a lei que regulamentava o teto para a remessa de lucros de empresas multinacionais.

Feito o ajuste recessivo – principalmente sobre as classes trabalhadoras – e criadas as condições para o aumento da capacidade do fluxo de inversões estatais e privadas na economia, a partir de 1967 a política econômica do regime passou a privilegiar o crescimento econômico, reorientando, para isso, a política de créditos e de juros (SINGER, 1976). Em seu planejamento, o desenvolvimento industrial, montado no consolidado tripé de capitais – estatal-estrangeiro-nacional –, foi recolocado como vetor do crescimento. Sob o comando de Antonio Delfim Netto no Ministério da Fazenda, a guinada expansionista na política econômica da ditadura baseou-se na retomada dos investimentos públicos na área de infraestrutura, aproveitando as melhores condições financeiras adquiridas pelo Estado após as reformas promovidas pelo Paeg. Nesse aspecto, houve também um aumento significativo das inversões nas empresas estatais, principalmente por meio da criação de subsidiárias - 231 empresas estatais foram criadas entre 1967 e 1973 (GREMAUD;PIRES, 1999).

Outro pilar para a retomada do crescimento econômico deu-se a partir da expansão fiscal e de créditos para o consumo, o que estimulou as indústrias a saírem da operação ociosa em que se encontravam para a atividade em plena capacidade, sem a necessidade de grandes investimentos. O crédito ao consumidor, direcionado para a aquisição de bens de consumo duráveis, proporcionou um crescimento de 26% ao ano desse setor industrial durante o período 1967-1973 (FURTADO, 1982). A expansão da atividade industrial é revelada

também pelo aumento nas importações em bens de capital entre 1970-1973. Além do estímulo ao consumo de produtos industrializados, a expansão creditícia foi um instrumento utilizado para a habitação, aliada ao aumento dos gastos públicos na área (infraestrutura) – o setor da construção civil, nesse mesmo período, cresceu em torno de 15% ao ano (SUZIGAN, 1996).

Por fim, não obstante o reaquecimento industrial ter se sustentado primordialmente no mercado interno, observa-se uma nova orientação voltada também para a exportação de artigos industriais – com a finalidade de manter-se o equilíbrio na balança comercial (GREMAUD;PIRES, 1999). Desse modo, o Estado formulou uma série de estímulos, entre linhas de crédito especiais e incentivos fiscais, bem como operou uma política cambial pautada em minidesvalorizações da moeda, procurando dar maior competitividade internacional aos produtos fabricados em território nacional.

O lançamento de uma série de instrumentos voltados para o crescimento da atividade industrial e para a ampliação do consumo confirma a manutenção, na ditadura, do ideal de planejamento econômico. Nessas bases, o planejamento do Estado deve ser entendido como uma política, a essa época, já historicamente reivindicado pelo empresariado industrial brasileiro – sendo fundamental na experiência histórica do desenvolvimento da indústria no país e de sua fração nacional. Também, portanto, uma evidência do poder da burguesia industrial nacional na organização política da ditadura civil-militar. Tal condição reafirma-se quando observado o fortalecimento de um modelo de desenvolvimento dependente para a economia nacional, dada a intensa participação das multinacionais no complexo industrial do país. Ainda, a despeito de as reformas do Paeg terem possibilitado uma maior capacidade de investimento, destaca-se a opção de o regime financiar o crescimento da economia brasileira por meio do endividamento externo, o que certamente atendia às demandas do bloco de poder multinacional e associado, interessado na internacionalização da economia (CORONEL; AZEVEDO; CAMPOS, 2014).

O quadro de expansão econômica mundial na década de 1960 indicava uma grande liquidez de crédito internacional a juros reduzidos e com possibilidades de alongamento dos prazos. A captação de recursos externos foi instrumentalizada por meio da Lei n.º 4.131, de 1962, e da Resolução n.º 63, de 1967, já na ditadura. A primeira permitia o acesso direto das empresas ao sistema financeiro internacional, enquanto a segunda garantia a captação de recursos no exterior pelos bancos nacionais. Dessa forma, houve um grande estímulo à realização de empréstimos, puxado, sobretudo, pelas empresas multinacionais – tanto no setor industrial como financeiro – e pelas empresas estatais e privadas nacionais. Assim, o recurso à poupança externa não se explica por um processo de estrangulamento interno, mas como

uma estratégia de desenvolvimento que arrastava ainda mais a economia nacional ao seu caráter dependente – em suma, uma estratégica do bloco de poder multinacional e associado, que fortalecia seu peso econômico no país.

Como resultado dessa política econômica, durante o elevado crescimento entre 1967 e 1973, fenômeno que ficou conhecido como “milagre econômico”, a dívida externa triplicou, e a concentração de capital em grandes conglomerados foi privilegiada, consolidando as características oligopólicas já então marcantes no Brasil. Se o país indubitavelmente obteve um crescimento extraordinário, este foi puxado pelo grande capital e destinou-se a beneficiar apenas uma parcela da população brasileira. Além do arrocho salarial – justificado pela proteção ao aumento dos custos para as empresas e pelo ímpeto de conter a inflação –, mesmo num momento de aumento do PIB, o crédito para o consumo e a construção de moradias destinou-se às classes médias e à elite, alijando as classes populares desse processo (SINGER, 1976). Essa lógica de exclusão das classes populares das riquezas materiais produzidas pelo crescimento econômico era uma das faces do real desenvolvimento brasileiro (OLIVEIRA, 2003). A exploração do trabalho à qual foram submetidas essas classes conjugava-se com sua própria marginalização, ambas fundamentais para a garantia da alta lucratividade como um fator de dinamismo da economia brasileira. Confirma-se tal condição quando se observa, por exemplo, a diminuída importância do consumo de bens não duráveis para o crescimento econômico – um fator indicativo da manutenção de classes populares em situações materiais mais precárias.

O cenário de retomada do crescimento econômico brasileiro a partir do final dos anos 1960 passa, necessariamente, pela considerável liquidez internacional e pelo aproveitamento da capacidade ociosa da indústria existente no país. Ao mesmo tempo, o saldo da balança comercial durante o milagre econômico foi se tornando negativo, na medida em que sustentava o acelerado ritmo de crescimento. Nesse sentido, de acordo com Lamonica e Feijó (2011, p. 125), deve-se destacar também a manutenção de uma política industrial voltada para a substituição de importações:

Vale observar que a economia brasileira não se desenvolveu “voltada para fora”, e em grande medida, suas fases de crescimento, dado se tratar de uma economia dependente de capital externo, foram condicionadas pelos contextos internacionais de maior ou menor liquidez. Na ausência de um setor exportador dinâmico, o déficit externo era coberto com fluxos de capitais autônomos. Entretanto, o aprofundamento do processo de industrialização buscou deliberadamente, até fins dos anos 1970, reduzir as importações de bens industrializados passando a fabricá- los no país.

A questão do déficit na balança comercial, entretanto, deve ser analisada em conjunto com o pagamento de juros. Houve uma política de crescimento pautada no endividamento do Estado e das empresas como saída para a estagnação econômica, na direção de continuar o processo de mudança na estrutura da economia nacional por meio da substituição de importações – de forma concomitante ao estímulo às exportações de produtos industrializados. Se esse processo gerou uma diversificação da atividade produtiva no país, é preciso observar que a continuidade da substituição de importações gerava uma maior demanda para a compra de produtos estrangeiros fundamentais na manutenção das novas atividades industriais (matérias-primas, peças e componentes). Ao estabelecer no mercado interno a sustentação do crescimento econômico, aumentava-se o endividamento, o que reforçava o estrangulamento externo, que, por sua vez, era enfrentado com novos estímulos à substituição de importações, financiado por novos endividamentos.

Ao mesmo tempo, esse processo de desenvolvimento industrial do país fomentou-se na monopolização da economia que, somada à contração de empréstimos, produziu a ascensão do capital financeiro sobre o desenvolvimento nacional, tornando-o hegemônico de forma precoce. Configurou-se, durante a ditadura, o rebaixamento dos salários a partir da repressão política aos trabalhadores, juntamente à modernização econômica, de modo que um movimento contrarrevolucionário impulsionou transformações modernizantes no país, expresso na expansão do capital monopolista concomitantemente à retomada de uma acumulação primitiva.

Essa necessidade de homogeneização monopolística é que será a determinante principal para os esforços tendentes a manter alta e elevar, quando possível, a taxa de lucro dos setores mais capitalistas da economia, verbi gratia, da indústria. Essa necessidade afetará todas as variáveis da reprodução do capital: por ela, mantém-se, por exemplo, uma estrutura de proteção tarifária extremamente alta; por ela, fundamentam-se todas as formas de incentivo à capitalização e de subsídio ao capital, aparentemente paradoxais, quando a economia mostra taxas de expansão surpreendentemente altas. A homogeneização monopolística é não somente uma necessidade de proteção de mercados, mas, principalmente, uma necessidade da expansão das empresas monopolísticas em áreas de setores da economia ainda não sujeitos às práticas da monopolização. Assim, mantendo-se alta a taxa de lucro e, pelo subsídio ao capital, elevando-se a taxa de lucro potencial nas áreas e setores não monopolizados, forma-se um superexcedente nas superempresas que alastram sua influência e seu controle às outras áreas da economia. (OLIVEIRA, 2003, p. 101)

Essa dinâmica de desenvolvimento enfrentaria uma nova realidade a partir da crise internacional provocada pelo primeiro choque do petróleo, em 1973. O crescimento econômico puxado pela industrialização via substituição de importações fora posto em risco num momento em que o país não havia diversificado por completo sua matriz industrial e

encontrava o processo de substituição de importações não somente atrelado, mas condicionado à dinâmica externa internacional.

Como resposta à desaceleração econômica e ao fim do milagre, a ditadura civil-militar redobrou sua aposta na continuidade do processo de industrialização por meio do aumento do déficit externo, financiado pelo fluxo de capitais autônomos que entravam na economia nacional. Nesses termos, o governo lançou o II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), organizado para garantir em alta a taxa de investimentos, que se desdobraria na continuidade do processo de industrialização.

O II PND tinha como uma de suas metas aumentar a participação dos artigos industrializadas na pauta de exportações, buscando contrabalancear o crescimento do déficit no balanço de pagamentos – decorrentes do alto valor do petróleo após o primeiro choque e da contínua deterioração dos termos de troca dos produtos do setor agroexportador.

Para sair da condição de extrema dependência externa ocasionada pelo intenso crescimento econômico com base na necessidade constante de se adquirir petróleo, a política econômica orientou-se no sentido de priorizar o processo de substituição de importações nos setores de capital-intensivo e tecnologia-intensiva – ampliando o parque industrial brasileiro ao fomentar o setor de bens de capital e intermediário, e procurando criar setores de ponta, capazes, inclusive, de concorrer no mercado internacional. Por fim, é preciso afirmar que o II PND também manteve uma política industrial baseada em medidas protecionistas – evidenciadas por barreiras tarifárias e administrativas, reduzindo a concorrência, no mercado interno, de artigos industrializados produzidos no estrangeiro –, além de continuar com a prática de incentivos fiscais e crédito, a fim de assegurar uma alta taxa de investimento na indústria (CASTRO; SOUZA, 1988.

Ao final da década de 1970, o Brasil apresentou um crescimento econômico considerável, embora com significativa redução após 1974. Os resultados obtidos explicam- se, indubitavelmente, pela implementação de um complexo parque industrial aliado aos investimentos estatais realizados na infraestrutura, geradores de um novo dinamismo econômico sustentado pela atividade industrial – consolidando, portanto, a mudança da característica produtiva brasileira ao longo do século XX para o setor secundário. Como marcante particularidade desse processo de mudanças, intensificado a partir da década de 1950, com um período de estagnação entre 1960-1967 e retomado com grande força até 1981, apresenta-se o mercado de trabalho: ao final da década de 1970, a mão de obra na indústria correspondia a 24% dos trabalhadores, enquanto no setor primário atingia os 30% (BAER; GUILHOTTO; FONSECA, 1986).

Nesse sentido, há um reforço não só da visão de que a modernização brasileira se deu num cenário de marginalização de boa parte da classe trabalhadora, como a constatação de que o desenvolvimento do capitalismo brasileiro, tardio, tem como um dos seus dínamos um violento processo de expropriação dos trabalhadores, passível de se verificar quando analisada a participação dos diferentes setores no crescimento da indústria. De acordo com Baer, Guilhotto e Fonseca (1986, p. 32), os setores intensivos em escala, entre os quais se incluem os intensivos em ciência, aumentaram de 51,5% em 1970 para 53,1% em 1980; a indústria intensiva em trabalho, por sua vez, cresceu de 15,2% para 17,2%; já a indústria ligada aos recursos naturais apresentou uma queda de 32,6% para 29,6%. Considerando que a indústria, nesse período, continuou a aumentar sua participação no PIB, é possível observar a diversificação da produção, quando verificada sua participação nas exportações: entre 1971 e 1980, os produtos manufaturados passaram de 16% para 38,8%, com destaque para aqueles ligados ao uso intenso de tecnologia e capital, como máquinas e equipamentos, materiais de transporte e produtos de metal.

Recuperando o histórico de desenvolvimento industrial a partir da segunda metade do século XX, observam-se claramente as diferenças entre o primeiro período, experimentado na década de 1950, e o segundo, a partir de 1967 até 1980. Se ambos foram fundamentados na substituição de importações, deve-se ter a ciência de que esse modelo não havia se esgotado ao fim do primeiro ciclo. Na medida em que o ideal desenvolvimentista apresentara limites na condução econômica do país, sua superação por meio de uma guinada conservadora de caráter nitidamente antipopular garantiu a continuidade do processo quando criadas as condições para a expansão e diversificação dos setores industriais, expressas por meio de uma política econômica que assegurava altos lucros às inversões estrangeiras e nacionais na indústria, incentivadas por um planejamento econômico cuja essência encontrava raízes na manipulação de instrumentos econômicos (linhas de crédito, protecionismo, fim da taxação a remessa de lucros, financeirização), na formação de oligopólios, na participação estatal em setores que exigiam um grande volume de inversões e no ataque aos salários e direitos dos trabalhadores.

O primeiro período de substituição de importações baseou-se nas indústrias de bens de consumo, com crescimento centrado nos setores de materiais de transporte e elétrico, e dos de química, farmacêutica e perfumaria, além de plásticos. Nas indústrias de base, com crescimento menor, destacam-se os setores de mecânica e metalurgia. Nesse momento, segundo Baer, Guilhotto e Fonseca (1986), denota-se uma diversificação da estrutura industrial, mas com pouca interligação, fato que será alterado no segundo período. Entre 1967 e 1981, o desenvolvimento industrial verticalizou-se, puxado pelo setor mecânico e químico,

enquanto a participação do setor têxtil e de alimentos bebidas apresentou uma queda, e os setores de material elétrico e transportes estabilizaram-se.

A grande participação das indústrias pesadas e de bens de consumo duráveis em relação aos demais setores (bens não duráveis, sobretudo) são um indicativo da concentração de renda no país como estruturante no modelo de desenvolvimento industrial brasileiro. Nesse sentido, o crescimento dos setores de mecânica, transportes e química revela o aumento do consumo de bens duráveis, automóveis, peças e de derivados do petróleo (gasolina, gás, etc.), respectivamente. A referida concentração de renda é ainda mais significativa quando se apresenta como condição necessária para a acumulação de capitais. Para Oliveira (2003, p. 100),

o nível de renda mais elevado das classes médias decorre das novas ocupações criadas pela expansão industrial e da posição que essas novas ocupações guardam em relação à estrutura produtiva, em termos de escala social global. [...] Sem embargo, a repressão salarial é um fato. Onde vai parar, pois, o superexcedente arrancado aos trabalhadores e que fins ele serve dentro do sistema? Aqui, se pré- esboça, sinteticamente, a resposta: o superexcedente, resultado da elevação do nível de mais-valia absoluta e relativa, desempenhará, no sistema, a função de sustentar uma superacumulação, necessária esta última para que a acumulação real possa realizar-se.

Esses processos de transformação passaram, também, pelo aumento da interdependência entre os diferentes setores industriais – significando um alto grau de completude da indústria brasileira quando da consolidação dos setores pesados, que passaram a fornecer no mercado doméstico os insumos antes importados. Ainda que nos setores químicos, farmacêutico e de plásticos essa tendência não verifique, o decréscimo das importações de insumos foi notável nos demais setores.

Em um olhar mais próximo, tal característica relaciona-se com a mudança tecnológica na indústria. Se na década de 1950 o equipamento industrial era composto basicamente de maquinário de segunda mão importado dos países desenvolvidos, no segundo período foram equipamentos com alto grau tecnológico produtivo que comandaram a expansão industrial, o que se confirma quando observados o declínio da participação da mão de obra no valor adicionado e o aumento da produtividade por trabalhador. Ainda assim, durante todo o segundo período de desenvolvimento industrial o arrocho salarial permaneceu intacto – e cristalizado, falsamente, como um fator inflacionário – ou seja: a serviço dos altos lucros empresariais. Nos setores de tecnologias intensivas em mão de obra (borracha, energia, água, saneamento e construção civil), também houve crescimento na intensidade de capital.

Para se compreender a estrutura econômica nacional ao final desse processo, é preciso pensar de que modo o desenvolvimento dependente brasileiro, necessariamente, atualiza e repõe sua dinâmica. Na medida em que a industrialização tardia se completava, seu propósito/objetivo de independência econômica já não mais fazia sentido, dada a integração do Brasil com a economia internacional. Financiada pela poupança externa, via endividamento internacional, a consolidação do Brasil como país industrial exigia um equilíbrio na balança de pagamento que o condicionava a orientar a produção de artigos industrializados para o exterior. O Brasil chegara ao patamar de país industrializado e confirmava, ao mesmo tempo, que sua modernização tardia não o levara, automaticamente, ao lugar de país desenvolvido. Pelo contrário, reforçara seu subdesenvolvimento ao optar por um modelo altamente excludente e violento contra a maior parte de sua população, alienada de cidadania, direitos políticos e participação na riqueza produzida.

Se o expressivo crescimento econômico, em tão pouco tempo, encontra no desenvolvimento dependente a condição sine qua non para esse processo, deve-se conjugá-lo com a constatação de que a integração/reatualização do país no circuito internacional de