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O EMPRESARIADO INDUSTRIAL NO CENTRO DO GOLPE DE 1964

1 INTERPRETAÇÕES SOBRE A BURGUESIA NACIONAL E O EMPRESARIADO

2.2 O EMPRESARIADO INDUSTRIAL NO CENTRO DO GOLPE DE 1964

Esses limites tornam-se mais visíveis quando se analisa a articulação tramada em diversos setores da sociedade para desgastar o governo Jango. Para além do papel dos partidos e das Forças Armadas, o golpe de Estado desferido em 1964 que depôs um governo democraticamente eleito foi gestado na sociedade civil – tendo papel fundamental, nesse processo, a burguesia nacional, com forte destaque para setores de grande representatividade no empresariado industrial nacional.

É nesse sentido também que se deve refletir, de acordo com as considerações expostas pela dissertação, sobre as reconfigurações do pensamento desenvolvimentista. A convergência política entre o setor público desenvolvimentista não nacionalista e o setor desenvolvimentista privado ao longo da aprofundamento da crise politica e econômica nos governos de Jânio Quadros e Joao Goulart coloca em evidência a formação de um campo conservador em contraposição ao campo nacionalista, que se radicalizava na defesa pela reformas de base. Então, por mais que houvesse diferenças entre o rigor monetarista de Roberto Campos e as defesas contundentes da CNI em torno dos esforços para a manutenção de uma política de crescimento econômico, ambos se contrapunham à agenda das reformas de base encampadas pelos desenvolvimentistas nacionalistas do setor público.

A articulação do campo conservador passa, necessariamente, pela compreensão de como se deu a movimentação política da burguesia industrial brasileira a partir da realidade econômica do país nos anos de desenvolvimentismo e domínio do pacto trabalhista. E, nesse aspecto, o contexto de internacionalização da estrutura industrial do país coloca-se como uma questão central. De acordo com Dreifuss (2008), o período pós-Segunda Guerra Mundial representou, para a economia brasileira, um desenvolvimento caracterizado pela predominância do capital transnacional e oligopólico, marcado pela subordinação ao centro capitalista (DREIFUSS, 2008, p. 59). A integração do capital estrangeiro à estrutura produtiva brasileira deu-se por meio da associação às empresas nacionais privadas e estatais – estas últimas por meio de joint ventures e da participação nas ações das empresas.

O capital monopolista, mediado pela penetração de corporações multinacionais, redefinia a divisão internacional do trabalho e estabelecia um centro produtivo- chave e um bloco organizacional dentro da estrutura socioeconômica brasileira. A industrialização do Brasil seria integrada e absorvida por corporações multinacionais de acordo com a estratégia de expansão do capital global, sublinhando os novos graus de internacionalização, centralização e concentração de capital. O capital monopolista transnacional ganhou uma posição estratégica na economia brasileira,

determinando o ritmo e a direção da industrialização e estipulando a forma de expansão capitalista nacional. (DREIFUSS, 2008, p. 71)

Assim, Dreifuss (2008) aponta para a formação de um novo bloco de poder, que reunia sua força econômica a uma eficiente organização administrativa e política, no seio de sua estrutura oligopólica. O capital monopolista, predominante, integrava os complexos financeiro-industriais, sendo difícil distinguir aqueles de caráter nacional ou associado daqueles de capital estrangeiro. Brasileiros ou transnacionais, esses complexos econômicos agiam como um bloco de poder, ao procurar confrontar os governos tidos como populistas sem, contudo, submeter-se à estrutura política tradicional do país. (DREIFUSS, 2008, p. 114)

Nesse aspecto, é importante destacar a concepção da formação de bloco de poder a partir das conceituações propostas por Poulantzas (1977). Farias (2009) explica que, para o pensador grego, as classes dominantes são constituídas por frações de classe, cuja existência está associada às estruturas econômicas e políticas da sociedade capitalista. As frações da classe dominante seriam, portanto, as burguesias industriais, comercial e financeira. Dentro de suas especificidades e interesses distintos na esfera econômica, as frações de classe comungam de estratégias políticas comuns para afirmar seu poder em relação às outras classes sociais. Ao mesmo tempo, conflitos entre as frações da classe dominante também ocorrem, gerando disputas no bloco de poder, que precisam ser mediados de forma política.

O Estado capitalista torna-se, dessa forma, um objeto de conquista do bloco de poder, na medida em que sua conservação permite a manutenção das relações existentes na sociedade capitalista. A luta política faz-se necessária para sustentar suas posições econômicas e os distintos interesses de suas frações, sendo preciso transformar suas demandas em interesse geral da sociedade como um todo, sob a lógica capitalista. Desse modo, o Estado é definido a partir das relações de classe, ou seja, sua prática política não se define automaticamente como a realização dos interesses da classe dominante, mas sim a partir de suas relações com os interesses das classes dominadas.

Poulantzas (1977) apropria-se do conceito de hegemonia para compreender a atuação política da classe dominante, cuja luta de classes possibilita a existência do bloco de poder, integrado por suas frações, uma das quais assumirá um papel dominante. Isso exige que o Estado também assuma uma autonomia relativa perante o bloco de poder, para se tornar um organizador político dos interesses das frações de classe burguesas e, ao mesmo tempo, desorganizar as classes dominadas, reproduzindo, assim, as relações de produção capitalistas. Mesmo a existência de grupos multifuncionais – conglomerados econômicos que atuam em mais de uma atividade (industrial, bancária, comercial) – não impede a necessidade de mediar

e organizar as relações do bloco de poder, tendo em vista os distintos interesses e a força política e econômica de uma fração de classe sobre as outras para a reprodução capitalista em determinado contexto histórico. Para Farias (2009, p. 98),

Dadas a sucessão de políticas do Estado e as várias dimensões dessas políticas (monetária, cambial, industrial etc.), distribuindo os agentes em diversas frentes de conflitos, concebe-se uma abordagem dinâmica e flexível da problemática poulantziana das frações de classe dominante. Isso permite que se levem em conta as várias possibilidades: a emergência, a desaparição, a reaparição, o cruzamento de sistemas de fração. Assim, tem-se ora burguesia industrial versus comercial, ora industriais do centro econômico contra industriais da periferia do país, ora comércio atacadista versus varejista. Por um lado, a política econômica ou social do Estado torna-se o fator determinante de agregação das frações de classe dominante, que o fazem para defender ou rejeitar certas medidas governamentais. A prevalência sistemática nos benefícios dessas políticas especifica a hegemonia no interior do bloco no poder, sendo a homologia estrutural e a capacidade de pressão política sobre o aparelho do Estado os elementos principais na concretização dessa hegemonia ou de sua crise (bonapartismo). Por outro, os conflitos internos à classe dominante, à medida que condicionam as políticas do Estado, constituem um dos fatores determinantes da dinâmica do processo político (um outro é o conflito capital e trabalho). Dependendo da conjuntura histórica, variará o modo de articulação da competição intercapitalista com os embates entre o capital e o trabalho.

Refletindo sobre a realidade brasileira, o peso econômico do capital multinacional e associado estava consolidado na década de 1960, constituindo-se como a principal força econômica do país. Porém a hegemonia do pacto trabalhista impedia que seus interesses se efetivassem como controle político do Estado. Para garanti-los, seria necessário construir uma estrutura de ação política que influenciasse diretamente a formulação das políticas econômicas.

No limite, se o desenvolvimentismo proporcionou uma industrialização embasada na integração entre capital estrangeiro e nacional, o mesmo não se pode dizer quanto ao controle do Estado nacional por parte do capital multinacional e associado. Evidentemente, o interesse multinacional e associado do setor industrial fazia-se presente, mas isso não significava, no início da década de 1960, o domínio do Estado nacional, na medida em que os interesses do setor agrário-exportador e das camadas populares também possuíam forças consideráveis, tanto na mobilização política institucional (na qual a elite agroexportadora tinha grande poder, e os trabalhadores conquistavam cada vez mais espaço), como na própria disputa ideológica, discutida na seção 1, que apontava para as dicotomias entre modernização versus atraso e nacionalismo versus entreguismo. De certo modo, o capital multinacional e associado não encontrava reverberação de seus interesses na política institucional e na sociedade. Pelo menos, não à altura de seu peso econômico.

Para conquistar o Estado nacional, esse setor industrial precisou encontrar espaços de influência na estrutura do Estado e na sociedade civil. Para além de seu poder econômico, era necessário desenvolver uma estratégia que produzisse efeitos políticos práticos na condução da economia – buscando contornar adversidades relativas a seus interesses na estrutura estatal. Dessa forma, estabeleceu-se, entre o capital multinacional e associado e o Estado, políticas as quais Cardoso (1975) definiu como “anéis burocráticos” – redes delimitadas por um número determinado de agências da estrutura burocrática caracterizada por relações clientelistas entre segmentos do setor privado e da esfera pública33.

Para Evans (2004), é nesse sentido que se deve compreender a formação, no país, de um Estado regulador. Por meio de um conjunto de diferentes técnicas administrativas de intervenção econômica, o Estado produz efeitos sobre a economia nacional, considerando seus objetivos – política industrial, tarifas e taxas cambiais, incentivos e subsídios, por exemplo.

A partir dessas considerações, a formação do Estado regulador no Brasil adquire um caráter específico, pois, diferentemente de seu processo nos países desenvolvidos do centro capitalista, não houve conflitos de classes que resultariam na organização da burocracia estatal. As disputas pelo poder deram-se entre os grupos dominantes, que já possuíam canais de acesso ao Estado, gerando uma burocracia estatal intimamente ligada a representantes do poder econômico oligárquico e burguês, associada ao capital estrangeiro – no que se configurou como uma aliança entre a tecnocracia e esses setores sociais, perpetuando-se o patrimonialismo, nos termos apontados por Faoro (2001). Com o golpe de 1964, tal relação se intensificaria ainda mais, reafirmando um modelo de desenvolvimento dependente autoritário. O Estado regulador, portanto, forjou-se no país de maneira diretamente ligada a uma forma política autoritária – notadamente durante a ditadura civil-militar (1964-1985), em que a sociedade civil e as instituições da república, como o Congresso e o Judiciário, tiveram suas atuações restritas diante do alto poder ditatorial concentrado no Executivo, que concentrou as responsabilidade pela formulação e desenvolvimento das políticas públicas a partir do seu corpo tecnocrático. Este, por sua vez, orientava sua produção e gestão a partir das relações de poder estabelecidas com as elites locais e multinacionais, excluindo o restante da sociedade civil, que tinha seu acesso vetado.

33 Para Mattos (2006, p. 144): “A contribuição de Cardoso é importante porque mostra como o autoritarismo no Brasil, legitimado seja por políticas populistas, seja por altos índices de crescimento econômico, teria sido incorporado na base de funcionamento do sistema político. E, como consequência do fenômeno do Estado regulador, o crescimento da burocracia estatal teria sido também incorporado como forma de garantia do exercício de poder político autoritário pelas classes dirigentes e por aqueles a elas associados por meio dos anéis.”

O caso mais emblemático, em relação aos “anéis burocráticos”, foram os grupos executivos e de trabalho criados no governo Juscelino Kubistchek – elaborados, justamente, para dinamizar os projetos de desenvolvimento industrial sem que houvesse a necessidade de se passar por toda uma estrutura burocrática do Estado nacional –, controlados pelas elites econômicas tradicionais (oligarquias e setor exportador). Destacam-se na dinâmica desses anéis o papel desempenhado pelos escritórios de consultoria tecnoempresarial, como o Centro Brasileiro de Produtividade (CBP) e a Companhia Sul-Americana de Administração e Estudos Técnicos (Consultec), criados para servir às articulações do empresariado multinacional e associado com a administração estatal. Esses escritórios prestavam serviços de consultoria para o setor privado e para o setor público, em assuntos de perícia e orientações técnicas, estudos de viabilidade, planejamento e eficiência na administração. O CBP, no setor público, por exemplo, prestava serviços ao BNDE, ao Geia, ao Instituto Brasileiro de Petróleo, à Carteira de Crédito Industrial e Agrícola do Banco do Brasil. Já no setor privado, tinha entre seus clientes a CNI, a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Fierj) e a Votorantim. A CONSULTEC, por sua vez, teve grande desenvoltura entre o setor público e o privado, trabalhando para empresas privadas e estatais, além de políticos brasileiros34. Entre seus membros, encontravam-se diversa pessoas ligadas à administração pública – como Roberto Campos (Presidente do BNDE na administração Juscelino Kubistchek), Edmar de Souza (BNDE), Eduardo Silveira Gomes (consultor da Sumoc), John Cotrim (diretor das Centrais Elétricas de Furnas), Glycon de Paiva (CVRD e BNDE), Lucas Lopes (ministro da Fazenda no governo Juscelino Kubistchek), Otávio Gouveia de Bulhões (Sumoc) – e de entidades empresariais privadas, como Mario Henrique Simonsen (CNI), João Mello Flores (FGV e Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira) e Harold Cecil Polland (Unitor S.A.).

Membros da CONSULTEC também organizaram a Análise e Perspectiva Econômica (Apec), que contava com economistas, administradores públicos e empresários do setor privado. Além de funcionar como uma organização tecnoempresarial, a Apec produzia publicações visando a exercer influência sobre o empresariado industrial – destacavam-se

34 “As atividades da CONSULTEC se estendiam da consultoria dada a pedidos de empréstimos feitos ao BNDE por companhias multinacionais até a redação de discursos públicos, de preparação de projetos de lei, decretos e regulamentos até a obtenção de acordos comerciais. A CONSULTEC preparou inclusive o programa apresentado ao Congresso em 192 pelo então Primeiro-Ministro Tancredo Neves, assim como o Plano Governamental referente ao petróleo, que o primeiro ministro comissionou também a esse escritório técnico. A posição da tecnoburocracia e as ligações econômicas de membros da CONSULTEC foram especialmente vantajosas aos setores de mineração, petróleo, energia e transporte, aos quais a CONSULTEC serviu como consultora. Ela exerceu papel crucial complexo BNDE-SUMOC-CACEX, agências chave para o crescimento multinacional e industrial durante o governo de Juscelino Kubistchek. Um levantamento dos empréstimos concedidos pelo BNDE e das recomendações e estudos econômicos subjacentes a esses empréstimos mostrou que 50% de tais pareceres haviam sido fornecidos pela CONSULTEC.” (DREIFUSS, 2008, p. 95)

análises sobre a economia nacional, empresas públicas e a defesa do capital privado para o desenvolvimento do país. Sua participação e influência eram consideráveis na Escola Superior de Guerra (ESG) – núcleo de formação do pensamento orgânico das Forças Armadas: entre seus quadros estavam alunos, professores e palestrantes.

As associações de classe também desempenharam um papel organizativo importante para a promoção dos interesses multinacionais e associados, revelando o nível de integração entre o capital nacional e o capital estrangeiro. Entidades como a Fiesp, a CNI e a Conferência Nacional das Classes Produtoras (Conclap) tinham entre seus membros empresários representantes das multinacionais (DREIFUSS, 2008, p. 103). Muitos de seus membros participaram e/ou financiaram ações políticas e ideológicas para derrubar o governo João Goulart, que se desdobraram na criação do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (Ipes) e do Instituto Brasileiro de Ação Democrática (Ibad). A própria Conclap, criada em 1955, atuou de forma militante nos ataques ao “populismo” de Jango, à política de controle de preços, ao direito de greve, à estabilidade de emprego; na defesa do capital estrangeiro, das empresas privadas e da necessidade do equilíbrio monetária e financeiro. Muitos de seus membros integraram a ESG como alunos ou professores.

Além das entidades patronais tradicionais, as associações de classe setoriais foram instrumentos criados na década de 1950 pelo bloco multinacional e associado para ampliar sua influência no Estado. Ao reunir interesses específicos de um setor industrial, a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e a Associação de Máquinas, Veículos e Autopartes (Amvap) agilizavam as demandas dos setores que representavam junto ao poder público, constituindo- se como espaços para essas articulações. Criadas na década de 1950, fortaleceram a lógica estabelecida pelos grupos executivos de Juscelino Kubistchek, que visavam a acelerar a industrialização. A Abdib, por exemplo, integrava o Geimape, responsável pelo planejamento e programação das linhas de produção da indústria pesada. (DREIFUSS, 2008, p. 107)

Contudo, a possibilidade de o projeto político do empresariado multinacional e associado ser legitimado pelas urnas demonstrava claros limites, visto que representantes das demandas populares continuaram a conquistar mandatos. Além disso, o setor agrário- exportador mantinha considerável controle do eleitorado, verificado por sua forte base congressual, estendida em diversos partidos – principalmente PSD e UDN.

Se os anéis burocráticos consolidavam espaços de influências nas políticas do Estado para os interesses do bloco multinacional e associado, o Ipes e o Ibad constituíram-se como

entidades de formação ideológica e ação política do empresariado. Foram instrumentos que procuravam unificar o empresariado em torno de pautas que reunissem a oposição ao campo reformista, durante o governo João Goulart.35

O país apresentava um quadro de crise econômica fundamentada no processo de industrialização estabelecido. Juntamente, o cenário político indicava um fortalecimento das posições dos setores trabalhistas e do nacionalismo para enfrentar a crise, durante o governo Jango. Nesse cenário, a estrutura montada pelo setor multinacional e associado passou a operar no sentido de derrubar a ordem democrática vigente. De acordo com Dreifuss (2008, p. 117),

Quando os canais político-partidários e administrativos não obtiveram êxito em atingir as reformas necessárias prenunciadas pelo bloco modernizante-conservador, e quando os interesses multinacionais e associados notaram as dificuldades crescentes em se conseguir conter a massa popular dentro do sistema político populista, o bloco de poder emergente teve de recorrer a outros meios. As várias organizações da sociedade civil e política foram reconciliadas como expressão da consciência coletiva de classe pelo núcleo organizado do bloco multinacional e associado em seu estágio militante, desenvolvendo conjuntamente formações ideológicas e políticas capazes de alcançar seus objetivos estratégicos, traduzindo-os em ação política e estabelecendo a si próprias firmemente no poder.

Criado em 1961, o Ipes tem sua origem vinculada a reuniões entre grupos de empresários paulistas e fluminenses36. Dedicava-se a estudos sobre a conjuntura econômica e política nacional, procurando atingir o empresariado e mobilizá-lo por meio da publicação de livros, reuniões e conferências. Também visava a atingir o conjunto sociedade brasileira por meio de livretos, folhetos e filmes, disseminando sua propaganda antijanguista. Já o Ibad, criado em 1959, configurou-se como um instrumento de combate ao comunismo no Brasil, tendo por objetivo influenciar diretamente a economia e a política nacional, sob o lema da “defesa da democracia”. Assim como o Ipes, o Ibad recebia contribuições de empresários brasileiros e estrangeiros para financiar políticos e campanhas eleitorais, no Poder Legislativo

35 Para o presidente da Fiesp e líder da UDN na época, Raphael Norchese, “O IPES surge com o objetivo de esclarecer primordialmente a classe empresarial que, diga-se de passagem, precisa mais do que qualquer outra classe saber realmente quais são os limites ideias do regime de livre iniciativa no campo econômico” (NORCHESE apud DREIFUSS, 2008, p. 181).

36 Dreifuss (2008, p. 198, 700-717) apresenta uma série de listas com lideranças empresarias e entidades que participaram do Ipes. Dentre os nomes, destacam-se os industriais Antonio Carlos Pacheco e Silva (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo – Ciesp), Raphael Noschese (Fiesp), Gilbert Huber Jr (Conclap), José Ignácio Versiani (Federação das Indústrias do Estado da Guanabara – Fiega), Zulfo de Freitas Mallman (Centro de Indústrias Guanabara), Bento Ribeiro Dantas (Centro Industrial do Rio de Janeiro – Cirj), Paulo Mário Cerne (Sindicato Nacional da Indústria de Cimento), Gustavo Bhorgoff (Amvap), Mário Henrique Simonsen (CNI), Jayme Torres (Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos), Lélio Toledo Pizza (Anfavea), Luiz Dumont Villares (Abdib), Olavo de Carvalho (Firj), João Baylongue (Sindicato das Indústrias Mecânicas e de Material Elétrico).

e nas disputas estaduais. O Ibad fornecia dinheiro, materiais em geral para campanha, faixas, cartazes e propagandas, que eram produzidas pela própria entidade. No congresso, o braço do Ibad era a Ação Democrática Popular (Adep), que reunia políticos de diversos partidos, majoritariamente da UDN e da ala conservadora do PSD. O Ibad organizava a propaganda política de seus candidatos e era responsável também pelo lobby no Congresso. Juntos, o complexo Ipes/Ibad angariou o apoio de cerca 500 lideranças empresariais de corporações multinacionais e associadas, financiando suas ações. (DREIFUSS, 2008, p. 182)

Mesmo que observada de forma breve, a movimentação do empresariado industrial nacional indica sua atuação dentro do bloco de poder multinacional e associado de forma consciente (DREIFUSS, 2008). Em outras palavras, a participação ativa do empresariado industrial nacional por meio de suas associações de classe, grupos de pressão, parlamentares, escritórios técnicos, grupos de ação política e grupos de produção ideológica deixa clara a opção política do setor em partir para o rompimento constitucional e institucional a fim de salvaguardar seus interesses. Mais que isso, o golpe de Estado deve ser considerado uma ação de classe, tendo o empresariado industrial nacional papel relevante como articulador do projeto de poder do capital multinacional e associado.37