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Documentalidade: fragmentos do real no live cinema

3. REFLEXÕES SOBRE O REAL

3.4 Para além da sala escura: a documentalidade no cinema experimental e expandido

3.4.3 Documentalidade: fragmentos do real no live cinema

3.4.3 Documentalidade: fragmentos do real no live cinema

Com quase duas décadas de existência explorando o território do experimental por meio de abstração, sinestesia e edição de imagens que costumam acontecer num ritmo frenético, o live cinema desloca-se, também, para as construções de realidade em ato performático, aproximando-se do documentário. Tem-se, então, um campo em formação que vem ganhando novos adeptos com trabalhos consistentes que se apoiam nas representações do real. Chamamos, aqui, de live doc o live cinema, seja ele apresentado com edição em tempo real e com música ao vivo, seja, ainda, inserido no contexto da dança, da lecture performance ou do teatro documentário. A palavra doc usada para se referir não ao documentário, mas às documentalidades que essas apresentações incorporam.

Na primeira mostra, no Brasil, que promoveu a passagem do VJ ao live cinema, chamada Red Bull Live Images (2002), o feitoamãos/F.A.Q., coletivo formado por André Amparo, André Melo, Claudio Santos, Lucas Bambozzi, Marcelo Braga, Rodrigo Minelli, Ronaldo Gino e Vítor Garcia, além de outros artistas convidados, apresentou Veja as Instruções Primeiro (2002). Com muitas imagens apropriadas de forte valor documental, a performance, conforme aponta o site da Associação Cultural VideoBrasil, funcionava como um jogo:

[...] parte da ideia de jogo, acaso, desafio, transgressão e enfrentamento. As sensações das apostas serão traduzidas para um clima eletro, a 128 BPM, com influências de punk-rock, noise e industrial, interferências ao vivo e andamento descontínuo. As imagens referenciadas no movimento caótico

urbano transformam todo o texto do jogo em objeto80

Um jogo de combinações do material de arquivo apresentado numa velocidade acelerada, com forte estética das projeções dos VJs das pistas de dança da época, porém com o diferencial ensaístico, com frases como “todos os governos têm seus dias contados”, “no man wanted”, “emergency rations” e “o fim da guerra é a revolução”, e imagens de ditadores, zonas de conflitos, muitos jornais sendo impressos, dentre outras que levavam à reflexão sobre o papel da mídia na construção de realidades e da violência do sistema capitalista.

Em 2005, o feitoamãos/F.A.Q. realizou a performance Carro Bomba no Festival VídeoBrasil. As imagens de uma Kombi explodida com muitos quilos de dinamite e filmadas em película eram manipuladas ao vivo e mescladas com imagens de telejornais que traziam notícias de ataques terroristas em uma Londres assustada, com capas de jornais sobre a Al Qaeda, notícias com as manchetes “Avós conheceram o neto na véspera dos assassinatos”,

“Suspeito foi reconhecido durante a tortura”, “Qual o limite da intolerância?”, textos citando, em ordem alfabética, diversas frentes de libertação e partidos, como Black Panthera Party, além de muitas outras imagens coladas umas às outras numa intensa velocidade. A mídia tornava-se tema central, sintetizada na frase apresentada “todo dia a mídia estraga um pouco o meu dia”, juntamente com todo o ódio causado pela intolerância. Num determinado instante, surgiam imagens da CNN e NBC com soldados norte-americanos no golfo pérsico, George W. Bush e noticiários com a frase no rodapé “America Under Attack”. Todas elas sendo apresentadas em três telas. Durante a performance, os artistas soltavam pequenas bombas mo meio da plateia, daquelas utilizadas nos festejos juninos, as quais, além do barulho, provocavam um cheiro de pólvora e muita fumaça, que ajudavam a criar o clima da apresentação.

Ainda com a estética próxima das narrativas utilizadas pelos VJs nas pistas de dança, a incorporação da documentalidade criou uma diferenciação em relação aos demais trabalhos realizados no começo dos anos 2.000, sobretudo pelo trânsito de artistas entre o documentário e o VJing. Vale ressaltar que, Lucas Bambozzi, um dos integrantes do feitoamãos/F.A.Q, já havia, até aquele momento, dirigido alguns documentários: Cidade sem Janelas (em parceria com Eliane Caffé, 1994), Oiapoque (1998), O fim do sem fim (em parceria com Cao Guimarães e Beto Magalhães), Do outro lado do rio (2004).

Figura 66 – Frames dos registros de Veja as Instruções Primeiro (2002) e Carro Bomba (2005), de

feitoamãos/F.A.Q.

Voltando a trazer, aqui, experiências pessoais, nesse mesmo ano de 2005, eu e o músico Dudu Tsuda apresentamos, em numa casa de shows na Vila Madalena, em São Paulo, chamada Blen Blen, a performance de live doc chamada Mate Ka Moris81. O título referia-se ao lema dos guerrilheiros do Timor-Leste, que, traduzido do tetum, quer dizer literalmente “vida ou morte”, mas que era proferido no sentido de “viver sempre, morrer jamais”. Imagens de arquivo realizadas pelo jornalista inglês Max Stahl e imagens registradas por mim, durante o período em que vivi na ilha de Timor-Leste trabalhando voluntariamente como professor, traziam os horrores da guerra num país que foi ocupado pela Indonésia e que, ao longo de 25 anos, executou 1/3 da população. As projeções da apresentação desfilavam uma sequência de conflitos, depoimentos de guerrilheiros e pessoas que conseguiram sobreviver ao massacre trilhados por uma música sombria, intensa, com elementos sonoros retirados do material bruto que criavam uma paisagem sonora. Num determinado momento, ouvia-se o depoimento de Dom Basílio, Bispo de Baucau, que dizia “foi um milagre Timor ter-se salvo, porque, se os militares indonésios quisessem limpar-nos, as Nações Unidas, quando chegassem, iam encontrar só cadáveres” e, logo na sequência, numa das últimas cenas, viam-se e escutavam- se jovens tocando violão e cantando em português, para, no final, o Bispo concluir:

[...] e pegavam no português como uma forma de defesa, uma forma de afirmação de identidade [...] tudo aquilo que aparecia como o português, era uma forma de uma ligação afetiva ao exterior. Eu acho que nestas situações a gente agarra-se a estas tábuas de esperança, que podem não ter solidez nenhuma, que podem não ter significado nenhum, mas que do ponto de vista simbólico, do ponto de vista da motivação, estas pequeninas coisas, que em tempo normal não valem nada, mas nesses momentos de luta, nesses momentos de falta e de dificuldade, são consideradas como coisas

fundamentais.82

Figura 67 – Frames de Mate Ka Moris (2005), de Rodrigo Gontijo e Dudu Tsuda

81 Esse trabalho é citado na introdução desta tese.

82 Trecho do depoimento de Dom Basílio do Nascimento, que integra o live doc Mate Ka Moris (2005), de Rodrigo

Foi no momento em que reuni a experiência que tinha com as projeções em festas noturnas, a estreia bem-sucedida83 no universo da dança contemporânea como videoartista e o documentário que realizei sobre o Timor-Leste – O escasso ar de uma ilha (2005), premiado no Festival de Gramado como melhor documentário na categoria Cine-Vídeo – que surgiu o Mate Ka Moris. A aproximação da performance audiovisual com o documentário foi quase um movimento natural aos projetos em que eu estava envolvido naquele momento. Por conta disso, passei a denominar o Mate Ka Moris como um live doc, vislumbrando a criação de um documentário ao vivo e as potências que isso poderia trazer. O músico, artista e pesquisador Carlos Eduardo Tsuda, que assina astisticamente como Dudu Tsuda, parceiro de diversos trabalhos e colaborador no Mate Ka Moris, afirma:

Eu acho que, naquele período, a gente não tinha claro que existia uma oportunidade de fazer cinema ao vivo. A gente não chamava de cinema ao vivo também; não era claro que era um formato. Sinto que, como a gente trabalhava dessa forma na dança, era uma forma de performance, um jeito de fazer alguma coisa. Era um tipo de apresentação e a gente tinha essa possibilidade de edição, de manipulação em tempo real de som e imagem. O interessante é que, depois, isso virou uma modalidade, uma modalidade que várias pessoas se encaixaram e aí foi se expandindo ao que se chama, hoje, de audiovisual expandido. Mas teve um momento do live cinema, como um tipo de modalidade artística e que eu acho que a gente inaugurou. Tanto o live

cinema como o audiovisual expandido é posterior a isso. Acho que, da minha

parte, o que eu tinha de conhecimento de processo criativo na época era de uns trabalhos de música na cena experimental, questões de experimentação

entre colaborações de dança, música, artes visuais e cinema experimental84

(TSUDA:2019).

.

Em 2007, o grupo D-Fuse realizou a performance audiovisual chamada Latitude [31o10N/121o28E] concebida a partir de uma residência artística na China. Nela, o coletivo inglês promoveu uma remontagem ao vivo que partia de fragmentos de conversas, multidões, viagens, e espaços arquitetônicos que representavam o crescimento vertiginoso das grandes cidades da China em pleno século XXI. Em entrevista publicada no catálogo do festival Multiplicidade, que ocorreu no Rio de Janeiro, um dos integrantes do grupo traçou um paralelo com o movimento das Sinfonias Urbanas, refletindo sobre uma produção de live cinema para

83 Em 2004, o recém-criado Núcleo Artérias, com direção de Adriana Grechi e participação de Tarina Quelho,

Tatiana Melitello, Eros Valério, Rodrigo Gontijo e Dudu Tsuda, foi contemplado no Festival Cultural Inglesa para a criação do espetáculo Por que nunca me tornei um/a dançarino/a, inspirado no trabalho homônimo da artista britânica Tracey Emin (que foi citado nesta tese). No ano seguinte, esse espetáculo recebeu o prêmio da APCA (Associação Paulista dos Críticos de Arte) na categoria pesquisa em dança.

além das imagens experimentais e gráficas que estabelecem relações sinestésicas com a música.

Nosso principal interesse está no “Cinema ao Vivo”. Acreditamos ser esse o próximo desenvolvimento do VJ, em vez de simplesmente responder a ritmos, queremos explorar toda a nova experiência de A/V e montar isso em uma experiência cinemática. Estamos trabalhando num lançamento cinemático chamado “Cidades Infinitas”. Muito do nosso trabalho está relacionado a cidades e fazemos uma série de performances centradas nesse tema, com áudio e vídeo bem amarrados, mas reconfigurados ao vivo a cada apresentação. Isso nos tornou mais interessados em conceitos e técnicas de produção de filmes experimentais, sinfonias de cidade, poemas visuais, etc. (FAUKNER: 2015, p.103).

Nesse projeto, o D-Fuse promoveu uma releitura contemporânea de um movimento cinematográfico que abordava o crescimento vertiginoso dos grandes centros urbanos na década de 1920. Durante o período da Sinfonia Urbana, foram realizados filmes sobre Berlim, Paris, Moscou, Amsterdã, dentre outros, e tais produções ajudaram John Grierson, o pai do termo documentário, a rever suas próprias definições.

Neste caso [sobre os filmes de Flaherty], pode-se sentir que queremos o drama em termos de algum corte transversal da realidade que irá revelar a natureza essencialmente cooperativa ou massificante da sociedade: deixar que o indivíduo encontre suas honras na investida das forças sociais criativas. Em outras palavras, é provável que abandonemos o formato narrativo e procuremos, como o expoente moderno da poesia, da pintura e da prosa, um assunto e um método mais satisfatório à mentalidade e ao espírito da época.

Berlim – Sinfonia da metrópole (Berlin: Die Sinfonie der Grosstadt, Walter

Ruttman, 1927) iniciou a mais moderna maneira de encontrar material para documentários logo à nossa porta: em eventos que não trazem a novidade do desconhecido, ou o idílio do bom selvagem numa paisagem exótica, a recomendá-los. Representou, escassamente, o retorno do romance para a realidade. (GRIERSON: 2015, p.26)

Figura 68 – Imagem de Latitude [31o10N/121o28E]

Em 2014, uma década depois da viagem realizada ao Timor-Leste, voltei ao material bruto para explorar suas potencialidades combinatórias com base no conceito de espaço vazio e natureza morta de Deleuze.

Uma natureza morta não se confunde com uma paisagem. Um espaço vazio vale antes de mais nada pela ausência de conteúdo possível, enquanto a natureza morta se define pela presença e composição de objetos que se envolvem em si mesmos ou se tornam seus próprios continentes. (DELEUZE: 1990, p.27)

Depois da participação dos músicos e pesquisadores Wilton Azevedo e Sergio Basbaum na criação da trilha sonora do documentário Sons da Penha, Notas de um Bairro (2014), que dirigi para a Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo em parceria com a TV Cultura, fui convidado para participar da gravação do DVD da dupla, batizada como Pantharei, com sons de caráter exploratórios e improvisativos, guiados por dez mandamentos em forma de instruções. Conforme aponta Basbaum (2018), “um diálogo aberto ao erro, fundado na entrega à performance e sem qualquer restrição de nenhuma das partes […] a um só tempo irônicos, poéticos e fundantes”.

OS DEZ MANDAMENTOS DO PANTHAREI 1.Não repetirás 2. Não combinarás 3. Não reprimirás 4. Sintetizarás 5. Imaginarás 6. Poetizarás 7. Performarás 8. Verouvirás 9. Ouvirverás 10. osgasmarás (BASBAUM:2018, p.166)

Com a parceria estabelecida, desenvolvemos juntos o live doc FUTU MANU85, que foi

selecionado para participar da 7ª Mostra Live Cinema, um dos eventos dedicados às performances audiovisuais mais importantes naquele momento no Brasil. A liberdade da experimentação, regra do Pantharei, permitiu testar, descobrir e retrabalhar, usando um conjunto de imagens, diferentes caminhos e sentidos na construção de realidades nos anos de conflitos vividos em Timor-Leste. Mapas, ruas vazias, carros queimados, cartelas de textos com informações históricas, uma rinha de galo de 1896, filmada por Thomas Edison, e outra de 2004, que registrei em Soibada, no distrito de Manatutu, em Timor-Leste, e exibidas em slow motion numa vídeo dança mortífera, metaforizavam os horrores da guerra vividos pelos timorenses. Ali, os espaços vazios contrastavam com as naturezas mortas, em que elementos da paisagem indicavam a presença humana que foi devastada pela guerra.

[...] tratava-se não simplesmente de fazer cinema ao vivo, mas de fazer um documentário ao vivo, um live-doc; e, além do peso semântico que o referente da realidade agrega ao sentido da performance, a questão da violência que as imagens carregavam nos colocou diante do desafio ético de não banalizar, no

flow estético performativo, a dimensão da violência capturada no contexto em

que se deram as imagens (BASBAUM: 2018, p.172).

85 FUTU MANU, que significa briga de galo, em tetum - a língua oficial do Timor-Leste, ao lado do português, é

um jogo de apostas popular, que funciona como uma espécie de catarse coletiva para exorcizar os traumas da guerra.

Figura 69 – Imagem de Futu Manu (2014) de Rodrigo Gontijo, Sergio Basbaum e Wilton Azevedo

Nesse universo das narrativas de guerra, veem-se diversas experiências de live doc no campo do teatro documentário, no qual o cinema expandido se faz presente, hibridizando-se com as artes cênicas. As dimensões da performatividade e da documentalidade encontram-se ou nas relações entre personagens e imagens em movimento ou na filmagem de cartas, documentos e fotos, articulados num cinema em circuito fechado. Já que a performance é um comportamento restaurado (Schechner) e a documentalidade constrói realidades (Steyerl), o teatro documentário apropria-se da tecnologia de sua época para produzir provas de evidências que se articulam em cena para trazer recortes de realidades, que se transformam a cada apresentação.

O teatro documentário surgiu nos anos 1920 como uma proposta de criação de uma dramaturgia politizada e militante apoiada em documentos, fotos, cartas, notícias de jornais e revistas, depoimentos, filmes ou gravações em áudio de pessoas ou eventos, que funcionavam como uma comprovação documental do assunto tratado, potencializando a autenticidade factual. O precursor foi o alemão Erwin Piscator, que produzia peças com conteúdos sociopolíticos e utilizava a palavra documentário em seus escritos sobre as artes cênicas, retirando-o do universo semântico da linguagem cinematográfica.

Consciente da especificidade da maneira com que fazia teatro, Piscator, em 1929, publica Teatro político, livro no qual reflete sobre sua própria produção teatral, fazendo uma espécie de inventário de opções e teorias. É nessa obra que, pela primeira vez, utiliza o termo documentário para qualificar uma das peças dirigida por ele. Mais especificamente no capítulo oito, batizado como “O drama documentário”, o uso de documentos, em especial de filmes, no espetáculo Apesar de Tudo! (1925) – encenação que trouxe ao palco os fatos relativos à Revolução Alemã de 1918-1919 –, foi descrito e analisado. Neste capítulo, o encenador não se preocupou em teorizar sobre o que seria esse tipo de drama, apenas levou o leitor – por simples associação – a entender que

Apesar de tudo! corresponderia a um exemplo de documentário em teatro

Em Pixelated Revolution (2012), Rabih Mroué, no formato de uma lecture performance, desempenha um papel de seletor, intérprete e comentarista das imagens que ele próprio controla de seu laptop, sempre sentado diante de uma mesa, com luminária e folhas repletas de anotações, parecendo estar num ambiente acadêmico. Ao fundo, veem-se as projeções das imagens. No início, o artista libanês diz: “Tudo começa com uma frase. Os manifestantes sírios estão filmando a própria morte”, o que desencadeia uma série de análises sobre o poder da imagem amadora e sua capacidade de ser compartilhada, disseminada e viralizada em redes sociais, como uma forma de ato revolucionário. Como, no início dos conflitos da Síria, os manifestantes ainda não estavam armados e a imprensa estava ausente, pois era proibida de entrar no país, os manifestantes registravam os eventos para chamar a atenção da comunidade internacional num "tiroteio duplo" - pensando no significado da palavra shoot (atirar/registrar). Dentro desse contexto, Pixelated Revolution gira em torno de uma imagem encontrada na internet, em que um civil sírio está filmando uma troca de tiros entre milícias e, subitamente, é alvejado, morrendo com a câmera nas mãos.

Figura 70 – Imagens de Pixelated Revolution (2012), de Rabih Mroué

No espetáculo da companhia catalã Agrupación Señor Serrano, três performers desdobram-se em cena para abordar uma das maiores caçadas da história, utilizando maquetes, soldadinhos de chumbo, carros e helicópteros de brinquedos ampliados pela câmera em circuito fechado, juntamente com atuação, imagens de arquivo de noticiários da época, música e narração em off. Todos esses elementos que compõem House in Ásia (2014) formam um live doc em circuito fechado. Com o emprego, sobretudo, da decupagem clássica com muitos closes, de campo e contracampo e visão subjetiva, assiste-se a uma narrativa permeada por realidade e fabulação dos eventos que seguiram o ataque do 11 de setembro e a intensa busca que se deu a um dos homem mais procurado do século XXI, Osama Bin Laden.

Figura 71 – Imagens de House in Ásia (Agrupación Señor Serrano, 2014)

Em 2013, a argentina Lola Arias deu início a uma trilogia sobre a Guerra das Malvinas, que começou com a videoinstalação Veteranos, na qual ex-combatentes argentinos que reencenavam histórias trágicas da guerra. Querendo saber mais sobre o outro lado da trincheira, nos anos seguintes, em 2014 e 2015, Arias entrevistou diversos veteranos ingleses, além de outros argentinos e, por fim selecionou seis pessoas para, juntas, criarem o teatro documentário e live doc Campo Minado (2016). Colocando supostos inimigos lado a lado mais de trinta anos depois, os ex-combatentes atuavam como atores que reencenavam suas próprias memórias, superando seus ódios, medos, inseguranças e desconfianças. Esse teatro documentário, que se assemelhava mais a um set de filmagem, converteu-se numa máquina do tempo, estruturando- se com apoio em depoimentos e entrevistas captadas em cena, num cinema em circuito fechado, materiais de arquivo como fotografias pessoais, matérias de revistas e jornais manipulados diante de câmeras ao vivo, músicas executadas por uma banda de rock formada pelos próprios personagens e áudios originais com discursos do ditador argentino Leopoldo Galtieri e da Primeira Ministra do Reino Unido Margaret Thatcher, dublados, diante da câmera ao vivo, pelos atores utilizando máscaras dos respectivos personagens históricos.

Figura 72 – Imagens de Campo Minado (2016) de Lola Arias

Entrevistas, narrações explicativas – inseridas no filme ou mesmo em cena, apresentadas pelo performer durante o espetáculo – e imagens de arquivo são os procedimentos estilísticos que operam como ferramentas para a construção de verdades e que podem ser observados em Sequenze, Are We Doing Right? Remix e O Pianista Fracassado.

A entrevista é um elemento narrativo, que leva o espectador a acreditar na existência do fato ou da pessoa, trazendo credibilidade, legitimada pelo encontro com o outro, sendo a