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1. ANÁLISE DE CAMPO EM 3 ATOS

1.2 ARE WE DOING RIGHT? REMIX (Embolex, 2013)

1.2.1 Sequência 02 Belo Monte

A sequência 02 começa com projeções apenas nas telas laterais, imagens iguais, porém com as da direita espelhadas, fazendo-as convergir para o centro. O que se vê representado são planos gerais e aéreos de floresta com rio ao fundo. Ouve-se uma batida marcada por um som grave sobre a paisagem sonora feita com timbres sintetizados. A cada pulsação sonora, a imagem reage retrocedendo alguns frames. Na tela superior e da bancada, começam as exibições de um vídeo institucional com características de documentário expositivo, locução em inglês feita por uma voz masculina treinada, aveludada e que impõe supostas verdades. Ela diz: “Hoje, o Brasil está entre os países mais comprometidos com a preservação do meio ambiente e a proteção dos povos indígenas e suas terras.” Neste instante, a legenda que traduz para o português sai do eixo e fica horizontalmente espelhada. Ela continua: “E a legislação vigente garante a sua integridade e sobrevivência. É no Pará, rio Xingu, perto da cidade de Altamira, que a hidrelétrica de Belo Monte está sendo construída.” O discurso dessa abertura, que, talvez, para um estrangeiro que não conhece a realidade brasileira, possa parecer sério, para nós, é carregada de ironia. Logo após, na tela central, são projetadas imagens de uma liderança indígena, num plano próximo, dentro de um ônibus que pulsa de acordo com a música. O som eletrônico com predominância de frequências mais graves funciona como base para um depoimento que diz: “Os senhores precisam se desenvolver. O país precisa crescer. O país precisa de energia. Essa região toda precisa se desenvolver.” Na tela inferior, surge uma sobreposição de imagens de um entardecer à beira do rio com indígenas na floresta e textos que pontuam o que está sendo dito. A palavra “desenvolver” é repetida algumas vezes no tempo da música.

Figura 10 –Frames registro de Are we doing right? Remix (Embolex, 2013)

A segunda parte da sequência de Belo Monte começa com imagens áreas de cidade e florestas justapostas às de indígenas que realizam uma dança ritualística em plano conjunto, com cortes rápidos para closes de pinturas rupestres. A trilha sonora é composta por cantos ritualísticos, com instantes de falas exaltadas de um indígena, proferidas em sua língua original. A tela central apresenta fusões rápidas da imagem aérea da cidade com a do indígena no ônibus. A tela inferior apresenta um pôr do sol com a sobreposição de dois indígenas num plano conjunto em contraluz. Na tela da direita, vê-se uma mulher indígena dizendo que o rio sempre foi o sustento da comunidade. Surgem, na tela central, cortes rápidos com planos repetidos de indígenas entrando em um ônibus e de imagens aéreas do rio já apresentadas anteriormente. Nas telas laterais, as danças continuam, com planos rápidos de uma escavadeira em ação e de um indígena dizendo “Nós precisa desse rio, nós precisa”. Na tela inferior, vê-se um plano geral de imagens aéreas do rio. As combinações das quatro telas continuam, entrecortadas por depoimentos, como o de uma especialista, num plano próximo, que diz: “Não interessa se a sociedade civil apresenta argumentos; não interessam os problemas no estudo de impacto ambiental. Não importa.” A tela inferior é dividida entre as imagens aéreas do rio e uma câmera que passeia em close por um documento. A especialista continua: “A lógica do crescimento infinito é também a lógica de que a Amazônia também tem que ser explorada energeticamente. Porque há um limite que ainda não foi explorado.” E, por fim, ouve-se uma voz masculina em off: “Sem Belo Monte é muito difícil, muito difícil, desenvolver toda essa região.”

Figura 11 - Frames do registro de Are we doing right? Remix (Embolex, 2013)

Os cantos ritualísticos sobre uma base eletrônica continuam, entrecortados por sons diegéticos de um discurso na língua local. Nas telas laterais, um grupo de indígenas dança e discursa dentro de uma sala que lembra uma câmara de vereadores. Na tela central, um close de uma liderança é sobreposto sobre as imagens aéreas do rio e, na bancada, a tela divide-se entre closes de um documento e outras aéreas do rio. As falas em língua local incorporam algumas frases em português, tais como “Você ensinar nós a usar roupa e agora vocês falam que a gente não pode pegar em dinheiro. Porque vocês mesmo ensinar a gente” (sic). A dimensão sonora ganha mais intensidade, e o som eletrônico incorpora mais uma camada. Um dos integrantes do Embolex começa a tocar bateria em sincronia com a paisagem sonora eletrônica, aumentando a dimensão performativa da apresentação. Nesse instante, um personagem em close é projetado na tela lateral direita dizendo frases que destoam do discurso do filme: “nós viemos aqui para resolver essa situação, para ajudar a melhorar a vida das pessoas. Agora existem pessoas que pensam ao contrário”. O que se vê na sequência é uma montagem vertiginosa de imagens de indígenas dentro de uma sala de reunião, com cortes rápidos que seguem o ritmo, alternâncias de velocidade, pulsão e cadência da trilha sonora. Frases soltas são incorporadas ao som. Nesse estímulo de informações, um senhor sentado numa cadeira de palha diz: “Eles jogam dinheiro nas aldeias e isto é muito perigoso, porque eles pensam que com dinheiro eles podem calar. Eu chamo isso de autoexílio, que mata alguém com dinheiro.” A palavra “mata” é remixada diversas vezes. Outros sons diegéticos provenientes das entrevista surgem nesse fluxo sensorial: “Pra fazer essas coisas, do mesmo

jeito pra fazer obras, precisa de dinheiro”; “há uma corresponsabilidade do que cabe à empresa e do que cabe ao estado, precisa fazer juntos as coisas”; “se nós tivermos um indicativo que vai faltar peixe, será desumano não dar uma solução a este problema”.

O músico para de tocar a bateria. A trilha se sustenta por uma nota grave. Imagens de documentos que trazem uma lista com as aquisições de territórios e aldeias indígenas invadem todas as telas. Encerra-se, assim, a segunda sequência da performance.