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Dos Fundamentos da Análise de Conteúdo em dados jornalísticos

1 PARADIGMAS UTILIZADOS NA PRESENTE PESQUISA

1.3 Dos Fundamentos da Análise de Conteúdo em dados jornalísticos

A Análise de Conteúdo é pertinente à presente pesquisa, uma vez que é uma técnica adequada para se elaborar/ extrair categorias temáticas de uma grande quantidade de textos (discursos/ narrativas), sejam jornalísticos (como é o nosso caso) ou de outro tipo. Este procedimento permite que se vincule as muitas fontes, desorganizadas, às categorias temáticas elencadas, de modo a organizar e sistematizar os dados, para uma melhor compreensão e análise posterior.

A técnica de Análise de Conteúdo construiu, ao longo do tempo, um conjunto de procedimentos de extração do sentido de um texto, por meio das unidades elementares de que se compõem produtos documentários (jornais, p. ex.): Palavras-chave, categorias, temas, procurando identificar a constância dessas unidades para fazer inferências e extrair os significados inscritos no texto a partir de indicadores objetivos. (CHIZZOTTI, op cit, p. 115).

A Análise de Conteúdo surgiu nos Estados Unidos, no início do Século XX, para análise de material jornalístico. Posteriormente, entre 1940 e 1950, os cientistas começaram a se interessar pelos símbolos políticos, tendo este fato contribuído para seu desenvolvimento. Depois se estendeu, entre 1950 e 1960, para várias outras áreas. (LASWEL, 1952, Apud CHIZZOTTI, 2006, p. 115).

Portanto, essa técnica existe há mais de 55 anos entre as Ciências Humanas e Sociais, sendo anterior, inclusive, à Análise do Discurso, já comentada alhures.

A Análise de Conteúdo pode ser quantitativa e/ ou qualitativa, a depender da abordagem que se dá aos textos. Na abordagem quantitativa traça-se uma frequência das características que se repetem no conteúdo do texto; na abordagem qualitativa, por sua vez, considera-se a presença ou a ausência de uma dada característica de conteúdo ou conjunto de características em um determinado fragmento da mensagem.

O fracionamento e a quantificação não impedem analisar, com proveito, qualquer tipo de comunicação, nem inviabilizam uma análise qualitativa de um texto. Nessas análises qualitativas, o pesquisador procura penetrar nas idéias, mentalidade, valores e intenções do produtor da comunicação para compreender sua mensagem.

São analisadas as palavras, as frases e temas que dão significado ao conjunto, para relacioná-las com os dados pessoais do autor, com a forma literária do texto, com o contexto sóciocultural do produtor da mensagem: as intenções, as pressões, a conjuntura, a ideologia que condicionaram a produção da mensagem, em um esforço para articular o rigor objetivo, quantitativo, com a riqueza compreensiva, qualitativa. (Cf. CHIZZOTTI, Op cit., p. 116-117)

A eleição das categorias é fundamental para se atingir os objetivos que se pretende, pois devem estar claramente definidas e serem pertinentes aos objetivos pretendidos na pesquisa, a fim de condensar um significado a partir de unidades temáticas.

Essas unidades correspondem a uma ideia, em geral uma afirmação que vai ser demonstrada ou tratada, ou uma sentença com sujeito e predicado que exprima um significado a partir do qual são compreendidas as palavras significativas. Destarte, os temas são codificados, com os dados brutos reunidos e condensados, de modo a permitir a descrição objetiva das características mais relevantes do conteúdo.

Para o que interessa à nossa pesquisa, a análise consistiu em relacionar a frequência da citação de alguns temas, sendo medido o peso relativo atribuído a um determinado assunto pelo(s) seu(s) autor(es). Socorremo-nos, então, da quantificação para estabelecermos a frequência estatística dessas unidades de significado (temas).

Os procedimentos acima descritos nos possibilitaram identificar três categorias ou dimensões temáticas implícitas nas notícias de jornais que compuseram nossas fontes históricas. Assim, nos foi possível agrupar/ vincular todas as notícias de jornais (968, no total) da nossa pesquisa a uma das três dimensões temáticas elaboradas por meio da nossa análise de conteúdo .

Desta forma, acabamos por identificar as seguintes dimensões temáticas relativas à Campanha Nacional de Alimentação Escolar, no Ceará, no recorte temporal proposto (1964- 1972):

1) discursos sobre a dinâmica administrativo-operacional da Campanha; 2) discursos sobre a dinâmica pedagógica da Campanha e;

3) discursos sobre a dinâmica político-ideológica da Campanha.

Essa descoberta, no entanto, exigiu-nos qualidades psicológicas complementares, como a fineza, a sensibilidade e a flexibilidade para apreender aquilo que importava à pesquisa. Foi necessário, ademais, passar por etapas que incluíram a pré-análise do material; a sua exploração e; por fim, o tratamento dos resultados e interpretação.

Na primeira etapa organizamos o material por meio de procedimentos de leitura flutuante, hipóteses, objetivos e indicadores que pressupúnhamos como fundamentos à interpretação.

Na segunda etapa codificamos os dados a partir das unidades de registro.

E, na última etapa, fizemos a categorização, que consistiu na classificação dos elementos segundo suas semelhanças e diferenças, com agrupamento em função de características comuns.

Queremos aqui, antes de adentrarmos na questão da História Oral, discorrer um pouco acerca das minúcias de análise de fontes históricas jornalísticas, como é o caso da nossa pesquisa, pois é muito importante que o pesquisador entenda o processo de análise inerente a esse tipo de fonte histórica.

Não obstante a longa entrevista colhida com o principal sujeito histórico da nossa pesquisa, bem como a intensa pesquisa junto aos vários bancos de documentações, repositórios institucionais, livros, artigos e demais documentos que a cotejaram, temos que o jornal é uma das principais fontes de informação histórica, mas que nem sempre a independência e a exatidão dominam seu conteúdo, caracterizado como "mistura do imparcial e do tendencioso, do certo e do falso". (PINSKY, Op cit, p. 116)

Será sempre difícil sabermos que influências ocultas exerciam-se em um dado momento sobre um órgão de informação, qual o papel desempenhado, por exemplo, pela distribuição da publicidade, qual a pressão exercida pelo governo, etc. É preciso se inquirir a respeito das fontes de informação de uma dada publicação, sua tiragem, área de difusão, relações com as instituições políticas, grupos econômicos e financeiros. (IDEM, p. 116)

Assim, muitos historiadores experientes do passado já questionaram sobre o uso instrumental e ingênuo que tomava os periódicos como meros receptáculos de informações, selecionadas e utilizadas ao 'bel prazer' do pesquisador. Daí prescreviam sobre a prudência de

não se correr riscos com essas fontes de pesquisa. Recomendavam, inclusive, que só dispusessem dos mesmos quando da absoluta falta de outras fontes. (IBIDEM, p. 116)

Outros historiadores, porém, tomavam a imprensa como instância subordinada às classes dominantes, como mera caixa de ressonância de seus valores, interesses e discursos ideológicos. Assim, tais leituras contribuíam para uma "interpretação" da realidade, vinculada a ideologias dominantes.

O fato é que, desde o trabalho pioneiro de Gilberto Freyre4, que por meio dos anúncios de jornais estudou diferentes aspectos da sociedade brasileira do Século XIX, a produção de vários pesquisadores5 não tem dispensado o uso de jornais em suas pesquisas, seja para evidenciar aspectos da vida social e política, seja para obter dados de natureza econômica (câmbio, produção e preços), sempre com resultados originais e postura muito distante da temida ingenuidade comentada acima. (IBIDEM, p. 117)

Na década de 1970, o próprio jornal tornou-se objeto da pesquisa histórica. A tese precursora de Arnaldo Contier, Imprensa e ideologia em São Paulo (1973), já indicava esse caminho ao valer-se da Semântica e da Linguística para analisar o vocabulário político-social de um conjunto de jornais publicados entre o final do Primeiro Reinado e o início da Regência (1827-1835). Assim, o trabalho identificou os matizes da ideologia dominante num momento de acirrada disputa pelo controle dos quadros políticos e burocráticos da nação recém- independente.

Portanto, cremos que diante dessas observações e do manancial de instrumentos de análise que hoje dispomos e que, inclusive aqui já destacamos, não caímos na tentação da interpretação "literal" do material jornalístico utilizado na presente pesquisa, uma vez que esta se pretende crítica, com todas as implicações desta corrente teórica.