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Rosana Areal de Carvalho1

Lívia Carolina Vieira2

“Que lindo! Quantos anos têm? Já está na escola?” Esse é um diálogo muito comum em nossa realidade, mas não há cem anos. Por maiores que sejam os problemas, as críticas e o debate sobre o que fazer na escola pública brasileira atual, não há como negar o acelerado processo de escolarização vivido pelo Brasil ao longo do século XX. Ousamos afirmar que os problemas de hoje são problemas de crescimento: cresceram o número de escolas, de professores, de alunos; ampliou-se a responsabilidade da escola, dada a importância da educação, da informação na sociedade letrada e capitalista, que foi se consolidando ao longo do último século. É crescente o volume de conhecimentos a ser transmitido aos alunos desde as séries iniciais; ampliou-se o tempo de permanência de crianças, adolescentes, jovens e adultos na escola. Os termos da equação se ampliaram quantitativamente, mas os resultados – qualitativos – ainda não são os esperados.

Como era a escola no tempo dos nossos avós, bisavós? Como era a escola no final do século XIX? Como era a Cidade de Mariana nas últimas décadas do século XIX? O que pensavam sobre a escola os homens públicos, os letrados, a sociedade marianense? O que significava ir para a escola por volta de 1890? Como seria chegar à escola por volta das 10h da manhã, mas já tendo almoçado? Como seria estudar numa escola sem ter caderno ou livros? Em turmas apenas de meninas ou de meninos? Pedir licença ao professor para entrar na sala? Levantar-se à entrada de qualquer visita em sala de aula? Pendurar o chapéu no chapeleiro? Escarradeiras em sala de aula? Continuidades e rupturas fazem parte do cotidiano escolar. Não há como não reconhecer o prédio do grupo escolar numa cidade mineira!

Essas perguntas e muitas outras têm norteado nossa pesquisa. Neste artigo, apresentamos algumas respostas surgidas do diálogo entre o contexto político republicano, a legislação estadual e as iniciativas da Câmara Municipal de Mariana no âmbito educacional.

A necessidade do Governo da República, proclamada em 1889, em organizar o ensino, a fim de torná-lo mais eficaz e combater o alto índice de analfabetismo, fez com que, logo em 1890, a Reforma Benjamim Constant buscasse promover mudanças no ensino primário e secundário. No entanto, essa primeira tentativa esteve distante da realidade brasileira, alterando em muito pouco o cenário educacional.

A instrução torna-se uma necessidade, principalmente porque passa a ser vista como uma via de civilização, capaz de formar o cidadão para a democracia; além de ser a credencial para

a efetiva participação política – só tinham direito ao voto os alfabetizados. A Reforma Benjamim Constant de 1890 e a Constituição de 1891 propõem a laicidade e a gratuidade para o ensino primário no sentido de promover uma mudança na educação do país. A “bandeira” dos republicanos trazia como lema a “democratização do ensino”, requisito para a modernidade e o progresso tão almejado para a nação. Segundo os positivistas, a ordem e o progresso seriam conseguidos através da educação. Benjamim Constant, à frente do Ministério da Instrução, procurou promover as mudanças sob essas orientações.

A pouca eficácia da primeira tentativa de reforma nacional para a educação brasileira motivou a iniciativa do governo mineiro, em 1892, com a Reforma Afonso Pena3. Essa reforma

respondia a princípios já estabelecidos na Constituição Estadual, promulgada em junho do mesmo ano. Desta, destacamos alguns artigos que interessam ao presente trabalho. O art. 3°. tratava dos direitos dos cidadãos, nos mesmos moldes da Constituição Federal: §6o. O ensino primario será gratuito e o particular exercido livremente. Ao tratar da competência exclusiva do Congresso mineiro, incluía “Legislar sobre o ensino secundario e superior, que será livre em todos os graus e promover no Estado o desenvolvimento da educação pública...”4 Quanto ao ensino primário, não

era exclusividade do Congresso, ou seja, o município também tinha autoridade para definir diretrizes para esse grau de ensino.

Ainda no âmbito da Constituição Estadual, encontramos:

Art. 117. A lei de organização de instrucção publica estabelecerá: 1°. Obrigatoriedade do aprendizado, em condições convenientes; 2°. Preferencia dos diplomados pelas escolas normaes, para a investidura no magisterio; 3°. Instituição do fundo escolar; 4°. Fiscalização do Estado, quanto a estabelecimentos particulares de ensino, sómente no que diz respeito á hygiene, moralidade e estatistica.

Atendendo a esse artigo, temos a Lei no.41, de 03 de agosto de 1892, conhecida como

Reforma Afonso Pena, por ser este o presidente do Estado à época. Estabelecia a responsabilidade do ensino ao presidente do Estado, porém exercida pelo secretário de Estado e pelas demais autoridades criadas pela mesma lei. Dentre estas, o Conselho Superior, Presidido pelo secretário de Estado, que contava com a seguinte composição:

Reitor do externato do Gymnasio Mineiro da Capital, director da Escola de Pharmacia, director da Escola Normal, inspector municipal do municipio da Capital, dois membros do magisterio primario publico da Capital e dois do particular, dois membros do magisterio secundario publico da Capital.5

Curioso notar a predominância de membros estabelecidos na capital do Estado, Ouro Preto, cuja competência era administrativa e disciplinar. No âmbito administrativo, competia-lhe emitir pareceres sobre métodos e processo de ensino, escolha dos materiais didáticos, regimento interno das escolas, programas de ensino. Como conselho disciplinar, julgava as faltas de professores e inspetores ambulantes sujeitos às penas de suspensão.

Paralelos ao Conselho Superior, foram criados conselhos escolares municipais e distritais. Suas atribuições não concorriam com as do Conselho Superior, ao contrário, fortaleciam- nas no

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sentido da inspeção das escolas criadas, mantidas ou subvencionadas pelo Estado. Cabia a esses conselhos a organização estatística das escolas, o recenseamento escolar e a garantia do cumprimento da lei de instrução pública, dentre outras atribuições cabia-lhes ainda

Propor ao governo medidas convenientes a bem do ensino local, e bem assim a creação de novas cadeiras, e a suspensão do ensino nas que não tiverem frequencia legal e sua restauração, acompanhando as propostas documentos que as justifiquem.6 Tais conselhos eram eleitos no mesmo dia dos pleitos municipais, podendo votar os responsáveis pela educação das crianças em idade escolar e os contribuintes do fundo escolar; desde que soubessem ler e escrever.7

Consoante com os ares democrático e visando um maior alcance territorial tem-se a nomeação, mediante concurso, dos inspetores escolares ambulantes, com a incumbência de fiscalizar e opinar sobre o ensino praticado nas escolas de sua circunscrição, averiguando o seu funcionamento, fossem elas públicas ou privadas, detalhando desde o estado da mobília da escola à postura dos professores, métodos de ensino e frequência de alunos.8

O cenário educacional, no qual se inscrevia a Reforma Afonso Pena e do qual vamos tratar aqui nos limites do município de Mariana, se bem que experimentavasse as mudanças ordenadas pelos tempos de República, ainda apresentava características do período imperial. Como exemplo, temos as escolas isoladas, cujo funcionamento se dava em total revelia, ou melhor, de acordo com as aptidões e condições dos professores responsáveis. As medidas educacionais tomadas então, enfrentando dificuldades que pareciam intransponíveis, apontavam para um futuro sistema educacional. Daí as preocupações expressas na criação dos inspetores e dos conselhos superior, municipal e distrital, medidas destinadas a homogeneizar e dar uma identidade à instrução pública estadual.

Assim como ocorreu no cenário estadual, quando a Proclamação da República exigiu um reordenamento jurídico, os municípios também o fizeram, a seu tempo. Em Mariana, logo após a publicação da Constituição do Estado de Minas Geraes, foram promulgadas as leis orgânicas do município. Embasadas nessas leis, tiveram origem as resoluções, como a Resolução n°. 5, de 27 de dezembro de 1892, que, no seu artigo 7°., autorizava o Agente Executivo a confeccionar (...) regulamentos da instrucção publica municipal, creando escolas no maximo de seis cadeiras, com ordenado nunca excedente a seiscentos mil reis anuaes ... Em 23 de janeiro de 1893, foi publicado o Regulamento n°. 1 da Instrucção Publica9, cujo conteúdo, apesar de não se opor à legislação

estadual, continha particularidades próprias à conjuntura local.

Considerando os poderes do historiador, não é possível acompanhar os movimentos desse período sem se ter como referência o fim próximo do cenário marcado pelas escolas isoladas. Logo no início do século XX, o governo de João Pinheiro estabeleceu uma reforma – em 1906 – que inaugurou a era do grupo escolar. Modelo de organização escolar, deu origem ao que temos hoje como escolas estaduais. Para além do currículo, inúmeras outras variáveis eram controladas por funcionários de confiança do governo – os inspetores escolares. O modelo grupo escolar trazia o compromisso da modernidade, da homogeneização e da racionalidade. A competência do professor, ou professora, como era a maioria (também diferente do que ocorria das escolas isoladas, nas quais a figura do professor era mais frequente), era avaliada não só nos concursos, mas também

ao longo de toda a sua carreira. Algo da autonomia anterior que gozava o professor foi extinta. Até os horários escolares – distribuição das disciplinas, de acordo com as cargas horárias semanais – foram estabelecidos pela legislação.

Portanto, o cenário aqui registrado – sem qualquer pretensão de esgotá-lo – é, sem dúvida, um cenário de transição. E isso podemos observar na legislação local, que buscava conciliar forças, pelo menos momentaneamente, em posições opostas: a República e a Igreja. Entendemos que Mariana – e também Ouro Preto – experimentaram particularmente esse conflito: Mariana como sede da Arquidiocese, com poderes que se estendiam por todo o país; Ouro Preto, capital do Estado que, logo em seguida, se viu destituída de tal privilégio com a construção de Belo Horizonte. A proximidade entre as duas cidades, os vínculos entre os habitantes, a força política e a força religiosa traçaram para essas cidades particularidades que têm nos instigado a melhor compreendê-las.

Podemos cotejar o Regulamento n°1 da Instrucção Publica, de 1893, com as proposições da Reforma Afonso Pena, trata da compreensão do funcionamento das escolas isoladas atendidas pela Câmara Municipal de Mariana.

Os artigos 1º e 2º do Regulamento estabeleciam a criação de escolas atendendo, em cada localidade, a população escolar e a renda arrecadada. As escolas poderiam ser mistas e deveriam ter, no mínimo, 15 alunos. Consoante com a legislação estadual, que determinava que o ensino primário era obrigatório para crianças de ambos os sexos, de 7 a 13 anos, o Regulamento municipal estendia o limite de idade para ingresso na escola: “idade de 6 annos no minimo e 16 no maximo”.

Agosto de 2008: as famílias começam a procurar as escolas para matricularem seus filhos para o próximo ano; reservas aqui e ali; seleção acolá. No final do século XIX, o período de matrícula se estendia ao longo de todo ano letivo. Deduz-se que, por um lado, a população não encontraria obstáculos em matricular seus filhos; mas, por outro lado, denuncia-se também que a preocupação com a formação escolar ainda não era predominante naquela população.

A preocupação com as condições de higiene e saúde determinava, como critério de matrícula, a vacina e que o aluno não sofresse de nenhuma moléstia. A frequência também era critério de garantia da vaga: seria eliminado o aluno que faltasse por mais de 15 dias sem justificativa.

O ano letivo, segundo o Regulamento municipal, iniciava-se em 15 de janeiro e terminava em 15 de dezembro, sendo que, nos feriados, domingos e quintas-feiras, não haveria aulas, ampliando-se em um mês a legislação estadual, que previa o período letivo de 15 de janeiro a 15 de novembro.

Os exames finais constituíam-se de um momento importante para o sistema escolar, contando com a participação de convidados para comporem as bancas examinadoras. Na legislação estadual, os exames ocorriam nos primeiros dias de férias10, durando quanto fosse necessário. Já

na legislação marianense, os exames ocorriam nos três últimos dias do desenvolvimento dos trabalhos escolares. A municipal estabelecia que os exames deveriam ser realizados nos três primeiros dias de férias e a banca examinadora seria composta por três membros nomeados pelo Agente Executivo.11

Quanto ao horário das aulas, a legislação estadual previa o funcionamento da escola em dois turnos: pela manhã, das 8h30 às 11h; e à tarde, das 13h às 15h30. É importante esclarecer que

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a legislação estadual trabalhava com um cenário de escolas urbanas, cuja demanda era maior. Já o Regulamento da Câmara Municipal de Mariana se inscrevia num cenário de população mais rarefeita, seja nos distritos ou na área rural. Por isso, o Regulamento municipal definiu o funcionamento das escolas em apenas um turno: das 9h30 às 14h, havendo intervalo de 30 minutos ao meio-dia.

Os edifícios escolares, segundo o Regulamento, funcionariam na residência do professor e deveriam ser, preferencialmente, centrais para auxiliar a freqüência dos alunos. O artigo 331 da legislação estadual autorizava o governo a despender gastos na construção de prédios para o funcionamento das escolas. As despesas deveriam ser divididas com as Câmaras Municipais que providenciariam também as mobílias necessárias. Mas o regulamento da cidade não previu gastos com construções de prédios e ainda determinou, no artigo 5º, que a povoação que necessitasse de escolas deveria providenciar a casa e a mobília necessárias.

À Câmara caberia conseguir os livros que, segundo o artigo 7º, eram também escolhidos por ela, e demais utensílios úteis à aprendizagem. Pela legislação estadual, o governo deveria prover os prédios escolares com a mobília adequada, que, além dos bancos e carteiras, consistia em:

lousas e pedras para demonstrações mathematicas e mappas parietaes, globos geographicos, livros didacticos, quadros commemorativos de acontecimentos memoraveis, photographias, gravuras ou oleographias que recordem personagens ilustres e benemeritos, ou representem factos e scenas, cujo conhecimento possa despertar no espirito e coração da infancia idéas nobres ou sentimentos generosos; e ainda os simples ornatos das salas de aulas, jardins, pateos, etc., que possam contribuir para torar a escola alegre, aprazivel e attrahente para os alumnos.12 O professor ficava responsável pelo estabelecimento escolar e por seus objetos, ficando determinado pela Câmara que os livros didáticos deveriam ser utilizados somente nas aulas, sendo posteriormente guardados pelo professor ou professora. Ainda quanto aos livros, só seriam renovados depois de dois anos, a menos que se aumentasse o número de alunos.

Era de responsabilidade do professor manter a escrituração da escola em dia, ou seja, atualizar e organizar, segundo orientações da Câmara, os livros de matrícula, inventário, ponto e termo de exames.

Mas quem eram esses professores? Que requisitos deveriam cumprir para ocuparem esse cargo? O Capítulo III da Reforma Afonso Pena trata dos deveres e direitos dos professores. Havia os professores efetivos, que eram nomeados pelo presidente do Estado, e os provisórios e os substitutos, que eram nomeados pelo presidente dos Conselhos Escolares. O Regulamento municipal, pelos artigos 27 e 28, determinava que tanto os professores quanto os inspetores deveriam ser pessoas de reconhecida honra e moralidade. Para as cadeiras que estavam sendo criadas pelo mesmo Regulamento, os professores seriam nomeados pelo agente executivo, mas as próximas vagas seriam preenchidas por concurso.

O fato de serem ou não normalistas – não havia essa exigência expressa na legislação –, distinguia os vencimentos dos professores eram distintos.

TERMO DE MARIANA | História e Documentação 180 Os professores normalistas das escolas urbanas ganhavam 1:800$000 por ano, seguindo-se os das escolas distritais, com 1:400$000, no mesmo período, e os rurais com 1:200$000 em igual tempo. Os que não fossem normalistas ganhariam menos de acordo com a tabela oficial.13

No caso das escolas mantidas pela Câmara Municipal de Mariana, o pagamento dos ordenados provinha da verba “Obras Públicas” – 600$000 – independentemente de serem ou não normalistas.

Os inspetores não recebiam salário. Eram nomeados pelo agente executivo e deveriam inspecionar a higiene das escolas, a regularidade do ensino moral, a conduta dos professores, e revisar os mapas feitos pelos professores e encaminhados ao agente executivo.

Nesses mapas, cobrindo períodos trimestrais, estavam as informações do movimento escolar: data da matrícula, frequência, a idade dos alunos, o grau de inteligência atribuído aos alunos pelos professores – não havendo quantificação de desempenho, esse era medido qualitativamente: nenhuma, pouca, bastante, alguma – e o nível de comportamento – sofrível, bom, regular, excelente. Para a época, um dado importante constante dos mapas escolares era a frequência dos alunos: essa era a garantia de a escola manter-se funcionando. A legislação estadual determinava o número mínimo de alunos para que uma escola, rural, distrital ou urbana, se mantivesse aberta. Na legislação municipal, o número mínimo de alunos era 15.

O sistema disciplinar apresentava, tanto na legislação estadual como na lei municipal, uma interpretação bem diferente do modo como era administrado no período imperial. Tratava- se de uma questão de honra a erradicação dos castigos físicos. O texto da legislação estadual era explícito:

Não serão applicadas aos alumnos penas degradantes, nem castigos physicos. A disciplina escolar deve repousar essencialmente na affeição do professor pelos alumnos, possuindo-se aquelle de sentimentos paternaes para com estes, de modo a corrigil-os pelos meios brandos da persuação amorosa.

Nenhum castigo physico será permittido, ainda quando reclamado ou auctorizado pelos pais, tutores ou protectores dos alumnos.

O professor que infringir esta disposição fica sujeito à pena de multa e suspensão.14 Em Mariana, o Regulamento define que as penas para os alunos são: “1º) reprehenção, 2º) privação do recreio, 3º) retenção de até meia hora depois de findo os trabalhos, 4º) expulsão por um dia, 5º) expulsão defenetiva”15; ou seja, a postura adotada pelo Estado estava presente

também no regulamento do município.

No caso dos professores que não cumprissem o regulamento, as penas eram: 1º) admoestação, 2º) multa, 3º) suspensão, 4º) demissão. Aos inspetores só cabiam a 1ª e 4ª penas.

Não só os castigos mudaram, como surgiu a iniciativa de premiação aos que se destacassem. Para os professores, o Regulamento n° 1 da Instrucção Publica propôs que aqueles

que mostrassem aptidão e o maior número de alunos seriam premiados. Aptidão não só para ensinar o previsto pelo currículo, mas também em questões de higiene.

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Sobre as licenças do professorado, ficou definido que, para aquelas superiores a 15 dias, poderia ser nomeado um substituto. As que durassem até 90 dias podiam ser nomeadas pelo agente executivo, e o professor recebia metade de seus ordenados, destinando a outra metade ao pagamento do professor substituto. Para as licenças superiores a 90 dias, cancelavam-se os vencimentos do professor e, ultrapassando um ano, o cargo era colocado à disposição. O fato de o agente executivo ter a liberdade de conceder licença de até 90 dias é outro fator que aponta o caráter descentralizador da reforma, pois até o momento a licença só podia ser concedida mediante autorização do governo estadual.

Quanto ao currículo ministrado nas escolas, a Reforma Afonso Pena era flexível às particularidades e aos diferentes interesses de cada região. O Artigo 88 apresentava currículos diferenciados para as escolas rurais, distritais e urbanas. Nas rurais, o conteúdo se restringia a “noções” de aritmética e língua pátria, instruções de moral e cívica, agricultura e trabalhos manuais para as meninas. Já o das escolas distritais, acrescentava ao conteúdo o conhecimento de medidas de área e capacidade, regras de três e de companhia, proporções, Geografia e História de Minas e do Brasil. O ensino nas escolas urbanas era o mais elaborado, como aponta Paulo Kruger:

os programas eram os mesmos das escolas rurais e distritais, com maior desenvolvimento, e acrescidos de: Gramática Portuguesa; Leitura e Elocução: Raízes Quadradas e Cúbicas; Curso completo de Geografia do Estado de Minas; Geografia do Brasil; noções de Geografia Geral; História de Minas; Educação Cívica; Leitura e explicação da Constituição Federal; noções de Ciências Físicas e Naturais.

Haveria, além disso, cantos e hinos patrióticos, trabalhos manuais, ginástica e evoluções militares, para os meninos, além de corte, costura e trabalhos de agulha para o sexo feminino, a que se davam também noções de Economia Doméstica.16 O currículo seguido pelo Regulamento publicado pela Câmara Municipal de Mariana melhor se aproximava ao destinado às escolas distritais. Constituía-se de instrução cívica e moral, leitura e escrita, noções de gramática portuguesa, noções de aritmética, noções de história do Brasil e de Minas e noções de geografia e catecismo. Este último conteúdo desperta atenção, pois o ensino laico já havia sido implantado no Brasil, em 1890, com a Reforma Benjamim Constant. Tal