• Nenhum resultado encontrado

2.3.1 Redução sociológica das abordagens feministas ao contexto da ES

Considerando as contribuições dos estudos pós-colonialistas e dos estudos feministas pós-colonialistas em identificar lacunas e pontos dissonantes nas matrizes teóricas predominantemente centristas (Ávila, 2013; Bhabha, 1998; Costa e Ávila, 2005; Del Priore, 2017; Lugones, 2007; Mohanty, 2006; Saffiotti, 2013; Spivak, 2010; Rago, 2014), esta subseção intenta, a partir do método da redução sociológica proposta por Guerreiro Ramos (1996), transcender, no limite do possível, a assimilação da produção estrangeira e os condicionamentos circunstanciais que impendem a expressão autônoma no fazer da ciência. Como observado anteriormente, as teorias feministas dedicam-se à busca de igualdade e equidade de condições e oportunidades entre mulheres e homens, indo além da questão do gênero (Calás e Smircich, 2014; Ballestrin, 2017). Contudo, ao longo desse processo, muitos são os caminhos, e as tentativas ao pensar formas de alcance para tal equilíbrio social, visto

que cada abordagem atende a diferentes demandas de diferentes contextos, tais contextos definem que lacunas as teorias feministas vão trabalhar em suas análises. Neste estudo, são utilizados aportes teóricos da terceira onda dos estudos feministas, que procura contestar visões essencialistas e universalizantes sobre da mulher, notadamente as abordagens pós- estruturalistas e pós-colonialistas. Estas duas perspectivas opõem-se em alguns pontos, contudo, existem complementaridades na junção de tais pensamentos. Em vista do pensamento feminista pós-colonialista ainda estar em construção, e não haverem estudos sobre as práticas de gestão no contexto periféricos, neste estudo utilizam-se construções já realizadas pelo feminismo pós-estruturalista sobre tal tema. Destarte, como pontuado, o objetivo desta subseção foi, a partir da redução sociológica, analisar, utilizando-se da crítica do feminismo pós-colonialistas, as abordagem de justiça de gênero de Nancy Fraser e das práticas feministas de gestão de P. Y. Martin. Assim, a partir desta análise, busca-se identificar quais as construções necessárias e adequadas ao contexto das mulheres da Economia Solidária. Considera-se que nem tudo que foi pensado pelas autoras pode ser transmutado para a realidade destas mulheres, em vista de suas condições específicas de subalternidade socioeconômica.

Ramos (1996) parte do pressuposto de que existe uma perspectiva brasileira para a sociologia, e reconhece a emergência de uma consciência crítica da realidade nacional, verificada a partir das primeiras décadas do século XX17. Os pensadores brasileiros passaram a desenvolver uma consciência crítica própria além dos reflexos coloniais, motivada pelo surgimento de certa infraestrutura (industrialização, urbanização e mudança nos hábitos de consumo) que promoveu, à sua maneira, uma autoconsciência coletiva. A consciência crítica, por sua vez, constitui-se na capacidade de um povo refletir sobre seus determinantes (p. 61), que é o que distingue a pessoa da coisa, é, nas palavras do autor, “a luta pela posse de um destino próprio” (p. 62), que implica em uma autodeterminação que não exclui o diálogo com aquilo que o autor chama de consciência universal. Ou seja, a consciência crítica coloca o

17 Os antecedentes filosóficos utilizados por Guerreiro Ramos baseiam-se na fenomenologia, principalmente de Husserl e Heidegger, com a ideia do sujeito enquanto ser-no-mundo. Para Ramos (1996), “um objeto cultural é constituído não só pelos seus elementos objetivos, mas também pela função que exerce no sistema de objetos de que faz parte” (p. 98). Daí o entendimento de Ramos de que produtos culturais não produzem os mesmos efeitos em contextos diferentes daqueles para os quais foram criados. Uma sociedade que substitui suas estruturas, necessita substituir também seus pressupostos teóricos, até então importados por sua condição colonial. No tocante aos antecedentes sociológicos, Guerreiro Ramos baseia-se em parte no materialismo de Marx e na sociologia compreensiva de Weber e Monnerot, que apresenta a tese de que a condição humana está sempre situada e datada. Outros antecedentes sociológicos provêm de Mannheim, Marx, Luckács, etc, principalmente dos estudos que consideram o papel da ideologia na ciência. A partir de tais construções, a redução sociológica busca “descobrir as implicações referenciais, de natureza histórico-social, de toda sorte de produção intelectual e em referir sistematicamente essa produção ao contexto em que se verifica, para apreender exaustivamente o seu significado” (p. 105).

autor coletivo em uma posição que não se confunde com o nacionalismo que exclui o universal. Para o autor, quanto mais uma população assimila hábitos de consumo, de forma crítica, tanto mais cresce uma consciência política, e maior se torna a sua pressão no sentido de obter recursos que lhe asseguram níveis superiores de existência (Ramos, 1996, p. 78).

A redução sociológica de Guerreiro Ramos (1996) propõe um método sociológico nacional, na obra “A redução sociológica” de 1958, que o autor reconhece tratar-se de um esboço, contudo, trata-se de um exercício para pensar a reflexão sociológica brasileira como condição das estruturas de desenvolvimento nas quais o Brasil se encontrava há época da elaboração do trabalho. Para Ramos (1996) a redução sociológica é um método de análise de concepções e fatos sociais, destinado a habilitar o estudioso a praticar “a transposição do conhecimento e de experiências de uma perspectiva para outra.” (p.54). Por redução, o autor compreende a ideia de eliminar tudo aquilo que lhe é desnecessário, uma depuração, o desenvolvimento compreende “a promoção mediante a qual as regiões e nações passam de uma estrutura a outra superior” (p. 149), tais estruturas elevadas são aquelas capazes de liberar a mão de obra do setor primário e transferi-la para o secundário.

Para Ramos (1996) a redução sociológica pode ser descrita como uma atitude metódica que obedece regras e depura objetos. Parte do pressuposto de que a realidade social é dotada de sentido. Postula uma noção de mundo, ou seja, estabelece que consciência e objetos estão relacionados. É perspectivista, porque entende que o sentido dado a um objeto só é possível dentro do seu contexto. Seus suportes são coletivos e não individualistas, na medida em que um ponto de vista é limitado pelo seu contexto. Estabelece um procedimento crítico-assimilativo da experiência estrangeira e é uma atitude que mostra os pressupostos históricos e sociais dos objetos, assim, embora seus suportes sejam vivências populares, a redução sociológica é atitude elaborada de percepção da realidade. Uma importante reflexão do autor é sobre a própria ideia de desenvolvimento, para Ramos (1996), a avaliação do desenvolvimento deve seguir critérios que caminhem além do cálculo econômico, assim, o desenvolvimento está sim relacionado aos aspectos econômicos, mas também está relacionado a melhorias nos níveis de condição de vida dos indivíduos. Ramos (1996) estabelece algumas leis a serem observadas ao adotar-se o método da redução sociológica:

a) Lei do comprometimento: nos países periféricos, a ideia e a prática da redução sociológica somente podem ocorrer ao cientista social que tenha adotado sistematicamente uma posição de engajamento ou de compromisso consciente com o seu contexto. A redução sociológica, portanto, só ocorre quando o estudioso de um país periférico estiver conscientemente engajado com seu contexto, ou seja, não há ciência imune aos

condicionamentos, porque “vivemos necessariamente a visão de mundo da nossa época e da nossa nação” (Ramos, 1996, p. 115);

b) Lei do caráter subsidiário da produção científica estrangeira: toda produção científica estrangeira é, em princípio, subsidiária. Assim, uma teoria, um conceito e uma técnica são criados para atender a uma intencionalidade, visto que “ao utilizarmos um objeto ou produto, sem reduzi-lo, somos envolvidos pela intencionalidade de que é portador” (Ramos, 1996, p. 122). É, portanto, a própria sociedade que deve impor ao sociólogo seus objetos, e a produção teórica estrangeira deve ser condicionada aos fatos particulares desta sociedade.

c) Lei da universalidade dos enunciados gerais da ciência: admite-se a universalidade da ciência tão somente no domínio dos enunciados gerais, assim, apenas se reconhece a universalidade no domínio dos enunciados gerais. Para o autor, os cientistas integram uma rede de trocas, que é universal, e ocupam um mesmo campo semântico com um repertório de enunciados amplamente aceito e compartilhado. Fora isto, a sociologia é nacional, na medida em que seus sociólogos são motivados por uma nova condição social, não colonial, à qual são convocados a responder. Esta sociologia nacional, entretanto, não se reduz a uma sociologia aplicada; e

d) Lei das fases: à luz da redução sociológica, a razão dos problemas de uma sociedade particular é sempre dada pela fase em que tal sociedade se encontra. A fase em que se encontra uma sociedade interfere nas possibilidades da redução sociológica. Ramos (1996, p. 142) reflete que o “fenômeno social total” depende do pensamento em termos de fase, fundamenta- se na categoria de totalidade, logo, a fase é uma totalidade histórico-social, cujas partes estão dialeticamente relacionadas.

Dessa forma, utilização da abordagem pós-colonial de Guerreiro Ramos prevê que os esquemas de prioridades das teorias pensadas no norte e no contexto europeu não induzem a realidade brasileira periférica, em sua totalidade, daí, a necessidade de pensar uma assimilação crítica das teorias feministas para o contexto das práticas organizativas das mulheres na Economia Solidária brasileira, assim, a produção cientifica estrangeira foi subsidiária na reflexão sobre as práticas de gestão das mulheres na ES. Como exposto anteriormente, optou-se por utilizar para o contexto de prática da mulher na ES a abordagem de justiça de gênero de Nancy Fraser e as práticas feministas de gestão propostas por P. Y. Martin. Neste estudo, tais perspectivas, que são complementares ao analisar a prática feminina de gestão, foram reduzidas ao contexto da ES, como proposto por Ramos (1996), tal redução busca assimilar apenas o que for vantajoso e adequado à análise do fenômeno. Assim, a redução sociológica das duas perspectivas feministas, sob o enfoque pós-colonialista,

passarão por uma seleção, em seguida por uma reflexão, para, por fim, serem aplicadas em propostas de práticas feministas de autogestão. Para Ramos (1996), tal processo segue quatro etapas principais:

(i) Contextualização da produção científica; (ii) Valoração ético-política de tal produção;

(iii) Equilíbrio de técnicas e métodos de pesquisa qualitativos e quantitativos; e (iv) Busca por uma intervenção na realidade visando aprimorá-la.

Tal processo de redução é um desafio patente para o pesquisador, visto que exige certa maturidade. Não se ousa aqui atingir a perfeição do processo de redução sociológica das teorias feministas, mas, principalmente, adequar tais abordagens, pensadas no âmbito do pensamento nortista, ao contexto periférico em que se desenvolve o trabalho da mulher na ES. A primeira etapa, de contextualização da produção científica, relaciona-se com as leis do comprometimento e das fases. Tal etapa requer a análise da produção científica no contexto e no estado da sociedade em que foi elaborada. Assim, reconhecem-se os traços que podem ser utilizados no contexto subalterno, selecionando apenas o que for condizente com a realidade do contexto. Nesse sentido, nesta etapa inicial o estudioso deve reconhecer, dentro do possível, as condições subjetivas e objetivas do contexto em que o conhecimento foi produzido, abrangendo condições socioeconômicas, culturais, históricas, entre outras. A segunda etapa, de valoração ético-política da produção científica relaciona-se com a busca pelos pressupostos conceituais que fomentaram as reflexões realizadas pelos(as) estudiosos(as). Nesse sentido, para Ramos (1996), noções do que é o mundo e perspectivas influenciam na produção científica. Tal análise segue lei da universalidade dos enunciados gerais da ciência e a lei do caráter subsidiário da produção científica estrangeira, visto que, a partir de tal observação, devem ser considerados pertinentes apenas o que for de conteúdo geral da ciência e o que for adequado ao contexto analisado. A terceira etapa, equilíbrio de técnicas e métodos de pesquisa qualitativos e quantitativos. Tal etapa prevê que a análise do fenômeno é melhor assimilada a partir de diferentes formas de observação, daí, a busca por diferentes tipos de métodos, de natureza qualitativa e quantitativa, permite uma compreensão mais próxima da realidade do fenômeno, considerando que a pesquisa social sempre é uma aproximação. Por fim, a quarta etapa, que busca realizar uma intervenção na realidade visando aprimorá-la, é a culminância da redução sociológica que permite a aplicação do conhecimento científico depurado e adequado ao contexto, especialmente o contexto pós- colonial subalterno e periférico. Ressalta-se que as duas primeiras etapas da redução sociológica relacionam-se à análise da produção científica utilizada pelo pesquisador, e as

duas seguintes, à análise do fenômeno que deseja interpretar, portanto, a redução sociológica atua tanto no âmbito teórico quanto no âmbito metodológico da pesquisa. Portanto, ressaltam- se que nesta fase da pesquisa, foram aplicadas apenas as duas primeiras etapas da redução sociológica, as duas últimas etapas foram explanadas e operacionalizadas na seção metodológica e na seção de análise e discussão dos resultados. A partir dessa explanação, iniciamos a redução da produção científica feminista selecionada para esta pesquisa, a partir da contextualização e valoração ético-política da produção científica.

A pensadora norte-americana Nancy Fraser é considerada uma expoente dos estudos feministas inserida nas tradições progressistas da Teoria Crítica e do Pós-estruturalismo, suas análises sobre justiça social e gênero resultaram na abordagem da justiça de gênero, tendo iniciado seus estudos a partir da reflexão e questionamento da Teoria Crítica18, e das contribuições do movimento da segunda onda do feminismo. Nancy Fraser vivenciou um contexto histórico de grandes transformações como “ser-no-mundo” e “ser-do-mundo”, e a partir da reflexão das grandes transformações sociais ocorridas ao final do século XX e início do século XXI, tem expandido sua compreensão sobre a justiça de gênero. Sua produção científica pode ser valorada, do ponto de vista ético-política, a partir tanto do contexto e de sua agenda de pesquisa, quanto das interações teóricas, abrangendo estudos relacionados à justiça social em Karl Marx e Karl Polanyi, à microfísica do poder de Foulcault e autores da Teoria Crítica, como Habermas, entre outros. Na análise de Fraser (2007), a segunda onda do feminismo desabrochou com o radicalismo de esquerda, bem como com o surgindo de movimentos sociais contestatórios que desafiaram as estruturas normatizadoras da social democracia após a Segunda Guerra Mundial. A ampliação da discussão no que tange às injustiças sociais buscou ir além do viés econômico, trazendo para a esfera do debate questões pertinentes à sexualidade, violência doméstica e reprodução, do mesmo modo, as estruturas representadas pelo ethos burocrático-administrativo do capitalismo estatal não mais serviam aos interesses feministas. Para Fraser (2007), a segunda onda feminista, embora de fundamental relevância, retrata uma sociedade norte-americana, com alguns setores europeus, que não serve de paradigma padrão para a realidade latino-americana, que na década de 1970 vivia, em diferentes níveis, sob o domínio do autoritarismo e repressão de ditaduras ou falsas

18 Fraser (1987) realiza uma crítica contundente em artigo publicado no livro “Feminismo como crítica da modernidade” organizado por Seyla Benhabib. Em “Que é crítico na Teoria Crítica? O argumento de Habermas e Gênero” Fraser questiona o nível de criticidade nos estudos de Habermas a respeito das categorias produção e reprodução, o que o autor considera ação (que homens e mulheres performatizam diferentemente) e os conceitos de espaço público e privado adotados pelo mesmo. Fraser observa especialmente que Habermas minimiza o espaço privado da família como um sistema econômico, retirando do espaço das famílias os atributos de trabalho, troca, cálculo, distribuição e exploração. Tais questionamentos não rompem com o pensamento de Habermas, apenas aprimoram a perspectiva voltando seu olhar para o gênero.

democracias com caracteristicamente autoritárias. A partir desta visão macro dos contextos, Fraser desenvolveu um pensamento crítico sobre o que é a justiça social em diferentes contextos. Ao trabalhar o conceito de justiça, Fraser (2010) desloca a discussão, dada no âmbito da filosofia política, para a vida prática. A partir do debate sobre justiça “para quê”, como observado por Amartya Sen em “igualdade para quê”, e justiça “para quem”, a autora transporta o debate também para a justiça “como”. O debate sobre a justiça “para quê” buscou identificar o quê poderia ser razoavelmente distribuído em termos de “direitos, recursos, bens primários, oportunidades, liberdades reais”, e capacidades alternativas para valorar metricamente as relações de justiça social, este seria o primeiro “dogma da igualdade” (Fraser, 2010, p. 32). Contudo, essa visão, segundo Fraser, negligencia as relações humanas que se desenvolvem em determinados contextos. No tocante à abordagem da justiça “para quem”, estudiosos da justiça social, ligados às correntes keynesianas, buscaram preencher a lacuna do primeiro “dogma da igualdade”, passando a considerar as relações dos indivíduos no âmbito social, e que as ciências sociais seriam capazes de determinar o “quem” da justiça, este seria o segundo “dogma da igualdade”. Conquanto tal visão tenha ampliado a discussão sobre justiça social, Fraser (2010) aponta que tal visão acabou por generificar os contextos globais e nacionais, homogeneizando as relações entre os indivíduos, o que resulta em uma estrutura básica que não atende à diversidade de demandas domésticas e intranacionais. Fraser (2010, p. 36) parte desta discussão para refletir, além dos dogmas, sobre “how should one determine pertinent frame for reflecting on social justice in a globalizing world? What criterion or decision procedure should one invoke? And who in the end is the one who should decide? Assim, a autora discute criticamente a base da discussão sobre como decidir quem decide o que é justiça social, indo ao encontro das teorias pós-colonialistas, que se propõem redefinir conceitos definidos fora dos contextos periféricos.

A crítica de Fraser (2007) ao pensamento da segunda onda questiona a tentativa de tal fase do feminismo buscar inserir-se em um Estado de Bem Estar Social apenas através da redistribuição sob o viés econômico, a fim de maximizar sua atuação e visibilidade. Contudo, com o enfraquecimento e ruptura do estado de Bem estar Social e o surgimento do neoliberalismo, o poder político público voltou-se para os mercados econômicos, tornando o ambiente público através das desregulamentações e privatizações em favor dos mercados. Fraser (2007) aponta que tal fenômeno afetou consideravelmente a segunda onda, pois a inserção nas estruturas públicas de poder foi dirimida com a nova agenda estatal. A crítica ao economicismo ampliou-se no debate feminista alterando as reivindicações por justiça, a segunda onda passou a buscar em vez da redistribuição, o reconhecimento da identidade e das

diferenças. Contudo, para Fraser (2007), a luta pelo reconhecimento, preservando, assim, as diferenças, tornou-se, tal qual a antiga busca pela redistribuição, uma batalha unilateral e isolacionista. Fraser (2009, p. 23-24) conclui, sob este ponto de vista, que, em vez de optar por um “paradigma mais amplo, mais rico, que poderia abranger tanto a redistribuição quanto o reconhecimento, as feministas da segunda onda trocaram um paradigma incompleto por outro”. O reconhecimento das diferenças abriria espaço, na terceira onda, para as discussões sobre a subalternidade e as mulheres em contextos periféricos, a autora reconhece a importância da segunda onda em identificar o reconhecimento como categoria de análise, contudo, realiza a crítica sobre o abandono da redistribuição como categoria também importante à luta das mulheres, afinal de contas, essa também ainda é uma agenda do movimento. Tais reflexões resultaram no desenvolvimento, pela autora, de mais uma categoria de análise para os estudos feministas, que é a representação. Fraser (2007) observa que a nova compreensão feminista deve ser direcionada para uma visão completa e tridimensional de justiça social, aplicada à justiça de gênero, que promova a junção das agendas políticas de demandas das mulheres, comungando a redistribuição, o reconhecimento e a representação. Segundo Fraser (2007), a representação marca a terceira fase da segunda onda feminista, para a autora, a representação não é apenas uma questão de assegurar voz política igual a mulheres em comunidades políticas já constituídas.

Fraser (2009) aponta a importância e necessidade de uma democracia efetivamente participativa, cuja intenção não é dissolver o poder público, mas fortalecê-lo visando alcançar níveis aceitáveis de justiça social. Assim, a luta ainda é pela ruptura da distinção entre público e privado, devendo ambas as esferas manter um diálogo que permita a sua compatibilização ante uma sociedade plural (Costa, 2009; Matos, 2010). Fraser (2009) avalia a necessidade de romper as barreiras nacionais, tornando visíveis outros pontos de vista das mulheres, especialmente as que não estão nos centros de poder do capital. Fraser (2007) questiona, em