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DA EDUCAÇÃO FÍSICA GINÁSTICA; DA ARTE DESENHO E CANTO: INÍCIO DE UM ENRAIZAMENTO ESCOLAR

SUMÁRIO

A DANÇA NAS DISCUSSÕES SOBRE CULTURA 161 1 “A dança como manifestação artística que tem presença

2. DA EDUCAÇÃO FÍSICA GINÁSTICA; DA ARTE DESENHO E CANTO: INÍCIO DE UM ENRAIZAMENTO ESCOLAR

Tomamos a análise apresentada por Saviani5, destacando que esse período, finais do século XIX e início do XX, que se estende de 1890 a 1931, corresponde ao protagonismo dos Estados frente à tarefa de garantir a oferta das

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SAVIANI, Dermeval. A política educacional no Brasil. In: STEPHANOU, Maria e BASTOS, Maria Helena (Orgs.). Histórias e Memórias da Educação no Brasil - Vol III. Petrópolis: Vozes, 2005. p.30-39.

escolas primárias, sob o ideário do iluminismo republicano, ficando o governo central responsável pelo ensino secundário e superior.

A instrução primária no Brasil, no período do Império, era descentralizada, tendo as Províncias a responsabilidade de sua existência. Com a República, essa condição não se altera, visto que o governo central continuou entendendo que o ensino superior e secundário eram prioritários pela sua condição primordial para a formação.

Imbuídos do movimento republicano que tinha como base modelos europeus de civilização, o processo de escolarização teve sua organização repensada. Para Bencostta6 (2005, p.68-69)

O discurso estruturado em retóricas originais de uma Europa influenciada pelas repercussões da Revolução Francesa, a qual apregoava que era preciso instruir a população para se alcançar a civilização, já não era mais uma grande novidade no final do século XIX. Porém, este mesmo discurso foi rapidamente reproduzido no Brasil republicano e fartamente utilizado, a ponto de ter pressionado o poder político instalado a apresentar uma proposta diferenciada de escolarização destinada àqueles que durante muito tempo ficaram sem qualquer oportunidade de instrução.

A organização do ensino primário ganha importância nesse contexto com a primeira reforma instaurada em 1890 no Estado de São Paulo, através de uma ampla revisão na forma de organização dos espaços educacionais. O marco dessa reforma foi a criação dos grupos escolares, que se caracterizavam como espaços onde se reuniam diversas classes em um mesmo prédio. Esses foram modelos para inúmeras outras reformas estaduais, cada qual com sua própria organização. O primeiro grupo escolar implantado no Brasil data de 1893 no Estado de São Paulo, tentando romper com a carência de espaços, livros,

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BENCOSTTA, Marcus Levy Albino. Grupos Escolares no Brasil: um novo modelo de escola primária. In: STEPHANOU, Maria e BASTOS, Maria Helena (Orgs.). Histórias e Memórias da Educação no Brasil - Vol III. Petrópolis: Vozes, 2005. p.68-76.

mobiliários, professores, além de ressaltar aspectos da higiene pessoal e social (FARIA FILHO, 1996; BENCOSTTA, 2005).

Entendendo que o espaço urbano central era o privilegiado na implantação dos grupos escolares, foram as capitais e as cidades maiores que receberam os edifícios, que eram destaques na cena urbana, com projetos arquitetônicos que tinham a intenção de atender e adequar ao discurso moderno, incluindo espaços para exercitações, ginástica, na perspectiva da “educação intelectual, física e moral”7. Como enfatiza Faria Filho8 foi um movimento "dos pardieiros aos palácios", pois a saída do modelo das escolas isoladas que representavam o passado e a miséria, os pardieiros, era um instrumento de progresso em direção aos palácios da modernidade.

Nesse processo de consolidar a educação escolarizada, muitos aspectos ganham destaque, tais como: o espaço da escola, saída dos espaços com característica de residências para uma construção arquitetônica própria para essa nova função, a educação escolarizada; os tempos escolares, caracterização de um tempo necessário para estar no espaço escolar e sua constituição e distribuição na forma de matérias; o mobiliário e materiais necessários para manter as crianças e jovens na escola por mais tempo e de forma mais organizada e higienizada; a produção de material pedagógico, os impressos inicialmente traduções e depois publicações próprias, vão dando especificidade a esse fazer educacional; a legislação, que vai normatizando a escola e o que nela se constitui; o método de ensino, uma busca constante de o quê, como, em que tempo se deve ensinar; e a formação dos professores, quem são e como se formam para atuar nas escolas (FARIA FILHO, 1996, 1997; BENCOSTTA, 2005).

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Ver: BRACHT, Valter. A constituição das teorias pedagógicas da educação física. In: Caderno CEDES. Campinas, v. 19, n.48, p.69-88, 1999.

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FARIA FILHO, Luciano. Dos pardieiros aos palácios: forma e cultura escolares em Belo Horizonte - 1906/1918. 1996. 362 p. Tese (Doutorado em Educação). Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1996.

Os grupos escolares foram instalados, em diferentes Estados, como um espaço que tinha como perspectiva, para a formação das crianças, ser um local que encarnaria "[...] a esperança de intervir o quanto mais profundo possível em sua formação: civilizá-las, arrancá-las do estado de indigência, impor-lhes uma transfiguração que faria delas potenciais construtoras da prosperidade do Estado" (VAGO, 2002, p.13).

Sobre a consolidação dos grupos escolares, há diferentes pesquisas que refletem seus processos de implantação, destacando os procedimentos de instalação dos mesmos em alguns Estados9. Esses estudos elucidam que a implantação dos grupos escolares foi lenta, com destaque para a ausência de verbas para criação e ampliação dos espaços, aquisição de novos materiais, mobiliário, contratação de professores etc., além de reconhecer um período com grande índice de irregularidade na freqüência dos alunos, o que gerou inúmeras políticas na tentativa de garantir a presença, até punitiva, dos alunos nesses espaços.

No processo de implantação da instrução primária estava prevista a distribuição do conhecimento escolar na forma de matérias, sendo as mesmas organizadas nos quatro anos de ensino da formação elementar. Bencostta (2005) apresenta que durante a primeira fase de implantação dessa forma de organização escolar, nos grupos escolares de Curitiba estavam indicadas as seguintes matérias para o ensino: leitura, caligrafia, aritmética, desenho, linguagem, música, geometria, trabalhos manuais, história, ginástica, geografia e cosmografia, ciências físicas e naturais - higiene, moral e cívica. E Vago (2002)

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Ver: BENCOSTTA, Marcus Levy Albino . Arquitetura e espaço escolar: reflexões acerca do processo de implantação dos grupos escolares de Curitiba (1903-1928). Educar em Revista. n.18, p.103-141, 2001; FARIA FILHO, Luciano Mendes. Dos pardieiros aos palácios: cultura escolar e urbana em Belo Horizonte na primeira república. Passo Fundo: UPF, 2000; PINHEIRO, Antonio Carlos Ferreira. Da era das cadeiras isoladas à era dos grupos escolares na Paraíba. Bragança Paulista: EDUSF, 2002; SOUZA, Rosa Fátima de. Tempos de civilização: a implantação da escola primária graduada no Estado de São Paulo (1890-1910). São Paulo: UNESP, 1998.

localiza que no novo programa para o ensino primário, de 1906, seja nas escolas isoladas, seja nos recém criados grupos escolares mineiros, estavam incluídas as seguintes matérias: leitura, escripta, língua pátria, arithmetica, geographia, historia do Brasil, instrução moral e cívica, geometria e desenho, historia natural, physica e

hygiene, trabalhos manuaes e exercícios físicos.

Constitui-se nesse período a inserção das matérias desenho, música, trabalhos manuais, exercícios físicos, ginástica, que vêm integrando os componentes curriculares de educação física e de arte ao longo do processo de escolarização brasileira.

Outro destaque na constituição dos grupos escolares, é que esses espaços eram freqüentados, em sua maioria, por homens, sendo registrado que a presença das mulheres na escola crescia significativamente ao longo do século XX. Bencostta (2005) observa que nesse espaço já era possível distinguir diferenças na presença de homens e mulheres entre algumas matérias, e exemplifica com duas: a primeira "[...] Prendas Domésticas, destinada ao público discente feminino, na qual ensinava-se o trabalho com agulhas, bordados, enfeites, crochê etc."; e a segunda eram "as aulas de Educação Física que ocorriam em horário e público definidos conforme o sexo" (BENCOSTTA, 2005, p.74).

Vago (2002) apresenta que foi possível verificar diferenciação nas práticas corporais entre meninos e meninas, no início do século XX em Minas Gerais, onde eram apresentados para os meninos os exercícios viris, incluindo as marchas militares, enquanto para as meninas, exercícios controlados de flexão e extensão10.

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Sobre essa discussão de gênero recomendo a leitura da tese: SOUSA, Eustaquia S. Meninos, a marcha! Meninas, a sombra: a historia do ensino da Educação Física em Belo Horizonte (1897- 1994). 1994. 265 p. Tese (Doutorado em Educação). Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1994.

Portanto, no intuito de estabelecer aproximações com o tema desta pesquisa, busco compreender os papéis que essas áreas vão assumindo no processo de escolarização brasileiro, assim como os conhecimentos que são ensinados por elas.

3. ARTE E EDUCAÇÃO FÍSICA: SIGNIFICADOS ASSUMIDOS NO PROCESSO