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Capítulo 2

Presidentes, calendário

e desempenho eleitoral

dos primeiros-ministros

Há, nos sistemas parlamentares e semipresidencialistas, influência dos presidentes no desempenho eleitoral dos primeiros-ministros incumben- tes? Há uma vasta literatura que analisa de que forma os primeiros-mi- nistros são responsabilizados pelo desempenho no exercício do cargo, mas prestou-se pouca atenção ao papel exercido pelos presidentes eleitos direta ou indiretamente. Contudo, os chefes de Estado presidenciais têm poderes constitucionais que os permitem dissolver o parlamento e podem, portanto, exercer influência quando os primeiros-ministros são responsabilizados pelo eleitorado. Argumentamos que os presidentes usam estes poderes para conquistar vantagens partidárias, com efeitos di- retos no desempenho eleitoral dos primeiros-ministros. Para testar este argumento, recolhemos dados de dezoito democracias europeias. Os re- sultados demonstram que os poderes presidenciais de dissolução moldam a frequência e o tipo de eleições que ocorrem, bem como o sucesso elei- toral dos primeiros-ministros. Os presidentes com poder para influenciar a dissolução do parlamento representam, como tal, um papel crítico, mas negligenciado, na mediação da responsabilização de governos e primei- ros-ministros nas democracias europeias.

O que determina o sucesso eleitoral dos primeiros-ministros nos regi- mes parlamentares e semipresidencialistas? A resposta da literatura cen- tra-se quase inteiramente na forma como os eleitores avaliam o desem- penho dos primeiros-ministros e dos governos. O fator primário que molda esta avaliação é o estado da economia, entre outros indicadores

* Os autores estão apresentados por ordem alfabética. A corresponding author é Petra Schleiter. Tradução do inglês de Joana Rebelo Morais com apoio financeiro da FCT atra- vés do projeto UID/SOC/50013/2013.

de policy performance (Lewis-Beck e Stegmaier 2000; Anderson 2007; Duch e Stevenson 2008). Esta ênfase no voto baseado no desempenho e no estado da economia ignora o facto de a maioria dos regimes parlamen- tares e semipresidencialistas terem um chefe de Estado direta ou indire- tamente eleito e que quase sempre tem a capacidade de influenciar se são convocadas, ou não, eleições antecipadas (Schleiter e Morgan-Jones 2009). Estes presidentes podem determinar a altura em que os primei- ros-ministros são responsabilizados pelos cidadãos. Entre os dezoito paí- ses europeus examinados neste capítulo, a esmagadora maioria concede, ao presidente, um certo grau de influência sobre a dissolução do parla- mento.

Os poderes presidenciais que permitem influenciar a marcação de elei- ções legislativas antecipadas são politicamente consequentes: em Itália, em 1994, o Presidente Scalfaro, originalmente membro do partido de centro Democracia Cristã (Democrazia Cristiana, DC), que depois se juntou ao Partido Popular Italiano (Partito Popolare Italiano, PPI), de centro-esquerda, e depois ao La Margherita (Democrazia e Libertà – La Margherita, DL), recusou o pedido de dissolução do parlamento apre- sentado pelo primeiro-ministro de direita, Silvio Berlusconi (Grimaldi 2011, 112; Pasquino 2012, 850). Consequentemente, Berlusconi foi for- çado a abandonar o cargo. Outro exemplo bem documentado foi a de- cisão de Jorge Sampaio, presidente português socialista, de dissolver o parlamento em 2004. À data, Sampaio coabitava com uma coligação de centro-direita liderada pelo primeiro-ministro Pedro Santa Lopes. Du- rante esse ano, a austeridade económica e as políticas sociais do governo tornaram-se cada vez menos populares e as disputas no seio da coligação governativa colocaram em causa a competência e a estabilidade do go- verno. Quando o Partido Socialista (PS) elegeu um novo líder, José Só- crates Carvalho Pinto de Sousa, que provou ser muito popular entre o eleitorado, Sampaio aproveitou a crescente impopularidade do governo e as divisões internas para dissolver o parlamento um ano antes do pre- visto. Nas eleições seguintes, o presidente do PS assegurou a maioria ab- soluta no parlamento, enquanto o partido do primeiro-ministro (Partido Social Democrata, PSD) registou uma elevada perda eleitoral de 11,4% (Magone 2005; 2006).

Neste capítulo defendemos que os presidentes com poder para in- fluenciar a marcação de eleições antecipadas usam estas prerrogativas como extensão dos seus objetivos partidários, com consequências para o desempenho eleitoral dos primeiros-ministros. Empiricamente, apurá- mos que os presidentes com maiores poderes de dissolução afetam a in-

cidência de eleições antecipadas e escolhem as circunstâncias que mais favorecem os seus aliados políticos. Governos que incluam os partidos destes presidentes tendem a ter um desempenho melhor quando são convocadas eleições antecipadas do que aqueles que não têm represen- tação presidencial. Assim, o relacionamento político entre o presidente e o governo, bem como o alcance dos poderes constitucionais do presi- dente sobre a dissolução parlamentar, afetam o sucesso eleitoral do pri- meiro-ministro.

A elaboração destes argumentos baseia-se na literatura sobre respon- sabilisação eleitoral e ativismo presidencial. A investigação na área da responsabilização eleitoral frisa, tipicamente, o desempenho do próprio governo como fator crítico para a determinação do sucesso eleitoral (Lewis-Beck e Stegmaier 2000; Anderson 2007; Duch e Stevenson 2008). Com base na literatura sobre ativismo presidencial (Amorim Neto e Strøm 2006; Tavits 2009; Kang 2009; Schleiter e Morgan-Jones 2009; Schleiter e Morgan-Jones 2010), defendemos que os presidentes mode- ram este relacionamento regularmente, influenciando o momento em que se convocam as eleições antecipadas de forma a adequá-las aos seus próprios interesses políticos. Este argumento traz novas formas de pensar sobre o modp como os presidentes moldam e canalizam a forma como a responsabilização opera nos regimes parlamentares e semipresidencia- listas. Ao fazê-lo, contribuímos também para o trabalho na área do ati- vismo presidencial, na qual se mantém ainda por explorar a forma como os presidentes influenciam a relação de responsabilização entre os elei- tores e os governos.