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4. Resultados e discussão

4.3. Obtenção in situ de nanoestruturas mono ou bimetálicas a partir das sílicas

4.4.2. Efeito da natureza do metal na atividade catalítica

Todos os materiais formados por nanopartículas metálicas sintetizados nesse trabalho foram testados quanto a sua performance na reação de redução do 4-nitrofenol, sendo que a quantidade total de metal (mol) foi mantida constante em todas as reações catalíticas (1:10:500, metal:4-NP:NaBH4), exceto nos testes

discutidos no item 4.4.3. Inicialmente será explorado o efeito da natureza do metal na atividade catalítica investigando-se a reatividade de cada metal nas amostras monometálicas sintetizadas nas matrizes SBA-Imi+ e SBA-Bipi2+. A Equação 7

apresenta a reação química global da redução do 4-nitrofenol com boroidreto de sódio 57, desconsiderando-se a desprotonação do grupo fenol do 4-NP.

Equação 7

Superfícies de diferentes metais são ativas frente à redução do 4-NP 55–57. Os catalisadores metálicos têm capacidade de quimissorver o 4-NP e o boroidreto nos sítios ativos e essas ligações químicas com a superfície dos diferentes metais promovem a ativação dessas espécies quimissorvidas. A reação se processa mais rapidamente porque o sólido proporciona um caminho reacional alternativo de menor energia de ativação. No final do processo, os produtos são dessorvidos e o catalisador regenerado como mostra a representação do processo catalítico da Figura 37.

Figura 37. Representação fora de escala do processo catalítico na superfície de uma nanopartícula, indicando a etapa de adsorção dos reagentes e a dessorção dos produtos formados após a reação na superfície metálica; o azul no fundo da imagem representa o meio aquoso.

Estudos mecanísticos da redução de 4-NP mostram que a reação ocorre segundo o mecanismo de Langmuir-Hinshelwood 61,62, o qual parte do pressuposto

que ambos reagentes estão ligados com superfície do catalisador e que a reação ocorre entre estas duas espécies quimissorvidas no caso de reações bimoleculares. Essa reação superficial é considerada a etapa limitante da velocidade segundo esse modelo, então as etapas de difusão, de adsorção de reagentes e dessorção dos produtos são rápidas em relação à reação na superfície 61.

Outros estudos mostram também que as adsorções de ambos reagentes na superfície do catalisador são exotérmicas, porém a quimissoção do 4-NP apresenta valor de constante de adsorção (Langmuir) expressivamente maior 61,62.

Desse modo, a concentração em excesso de boroidreto de sódio tem mais de uma função, além de assegurar a cinética de pseudo primeira ordem em relação ao 4-NP, esse excesso faz com que o equilíbrio de adsorção desse reagente seja deslocado no sentido da formação das espécies quimissorvidas e faz com que haja boroidreto suficiente para completar a reação de redução uma vez que essa molécula reage com a água utilizada como solvente.

A Figura 38 mostra os espectros de UV-vis com os valores de absorbância em função do comprimento de onda para a reação catalisada com a amostra SBA-Bipi2+-Pd1,00 e apresenta uma mudança espectral ao longo do tempo

característica da reação. 250 300 350 400 450 500 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 SBA-Bipi2+-Pd1,00 Ab s . Comp. de onda / nm OH NH24-AP = 300 nm O NO24-NP = 400 nm

Figura 38. Valores de absorbância em função do comprimento de onda para a redução do 4- nitrofenol catalisada com a amostra SBA-Bipi2+-Pd1,00, juntamente com representações das

moléculas de reagente e produto e os comprimentos de onda de máxima absorção desses compostos.

A diminuição da absorbância da banda referente ao 4-nitrofenolato (400 nm) juntamente com o aumento da intensidade da banda de absorção do 4- aminofenol (300 nm) com o decorrer do tempo corroboram com o progresso da reação no sentido da redução do grupo nitro. Os menores valores de intensidade para a banda com máximo em 300 nm são ocasionados pelo menor valor de absortividade molar do 4-aminofenol em relação ao 4-nitrofenolato. O ponto isosbéstico entre as duas bandas, em 323 nm aproximadamente, indica que não há formação de outros produtos 58. Alguns estudos mostraram por 1H NMR que o único

produto da reação de redução do 4-NP é o 4-aminofenol, e outros estudos revelaram que o único produto da redução de outros nitrocompostos com nanopartículas metálicas é o amino composto correspondente 55.

A Figura 39 mostra os valores de absorbância em 400 nm em função do tempo para as reações catalisadas pelos materiais monometálicos sintetizados a partir das matrizes modificadas SBA-Imi+ e SBA-Bipi2+.

0 100 200 300 400 500 600 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 Imi-Au Imi-Pt Imi-Pd Bipi-Au Bipi-Pt Bipi-Pd Ab s ( = 4 0 0 nm ) Tempo / s

Figura 39. Valores de absorbância em 400 nm em função do tempo para os testes catalíticos realizados com os materiais monometálicos suportados nas matrizes SBA-Imi+ e

SBA-Bipi2+; a legenda interna apresenta a nomenclatura simplificada das amostras.

Alguns dos materiais sintetizados apresentaram um período sem diminuição do valor da absorbância em 400 nm, seguido de decréscimo exponencial esperado para reações de primeira ordem. Esse tempo sem diminuição de absorbância é chamado de período indutivo e estudos do mecanismo reacional com

os isótopos hidrogênio e deutério (BH4- e BD4-) realizados por Fountoulaki et al. 95

mostram que este período é associado à adsorção de boroidreto e/ou hidreto no metal.

Esses estudos também sugerem que essa etapa intermediária de adsorção dos ânions na superfície e formação de espécies do tipo M-H (M representa o metal) é a etapa limitante da velocidade. Wunder et al. 61 reportaram

que a constante de equilíbrio de adsorção de boroidreto na superfície do catalisador apresenta valores expressivamente baixos.

Deve-se destacar que essa etapa de adsorção de boroidreto é limitante da velocidade considerando-se o processo global, enquanto que a etapa limitante segundo o modelo de Langmuir-Hinshelwood é a reação entre as espécies quimissorvidas que ocorre após o período indutivo, ou seja, estritamente durante o decréscimo exponencial da absorbância. Os estudos mecanísticos de adsorção não discordam do modelo cinético adotado, porque o primeiro descreve o fenômeno global e o segundo descreve apenas os processos que ocorrem após o tempo indutivo.

Com base nos valores de absorbância em 400 nm monitorados em função do tempo e na equação de velocidade de reações de primeira ordem 46, foi

possível determinar as constantes de velocidade (k’ap.) para cada material. A partir

do gráfico do logaritmo natural da absorbância em 400 nm em função do tempo foi ajustada uma reta referente a cada material, considerando-se 10 pontos após os respectivos tempos indutivos e com intervalos de 10 s entre cada ponto. Para os materiais sem tempo indutivo foi considerado o intervalo entre 10 e 100 s. Os valores das constantes de velocidade foram obtidos a partir do valor negativo dos coeficientes angulares e estão mostrados na Tabela 8.

Tabela 8. Valores de constantes de velocidade aparentes dos testes catalíticos a 298 K com catalisadores monometálicos sintetizados a partir das matrizes SBA-Imi+ e SBA-Bipi2+.

Material k’ap. / 10-4 s-1 Material k’ap. / 10-4 s-1

SBA-Imi+-Au1,00 10,6 SBA-Bipi2+-Au1,00 2,9

SBA-Imi+-Pt1,00 13,6 SBA-Bipi2+-Pt1,00 30,8

Tanto o material SBA-Imi+-Au1,00 quanto os materiais sintetizados na

matriz SBA-Bipi2+ apresentaram o período indutivo antes da reação. A constante de

velocidade do teste catalítico feito com a amostra SBA-Imi+-Au1,00 foi determinada

entre 310 e 400 s, as constantes das amostras SBA-Bipi2+-Pd1,00 e SBA-Bipi2+-

Au1,00 foram determinadas entre 30 e 120 s e a do material SBA-Bipi2+-Pt1,00 entre

20 e 110 s. Os outros materiais sintetizados na matriz SBA-Imi+ iniciam a reação

imediatamente após a adição dos reagentes.

As constantes de velocidades medidas são constantes aparentes (k’ap.),

então seu valor inclui a difusão, a adsorção, a área total metálica e a velocidade da reação global ao invés de apenas uma etapa elementar, ainda assim é um parâmetro relevante para fins comparativos 56. Os valores de k’

ap. obtidos são

relativamente altos e mostram que os materiais sintetizados são vantajosos em relação aos análogos reportados na literatura.

Os valores da Tabela 8 mostram que os catalisadores formados por metais 4d (Pd) são mais ativos que os catalisadores formados por metais 5d (Pt e Au). A reação de redução pode ser descrita pela transferência de hidretos e/ou elétrons para o grupo nitro do 4-NP após ambos reagentes estarem adsorvidos no metal. Metais que doam elétrons mais facilmente são mais ativos cineticamente frente à redução do 4-NP e essa capacidade de doação de elétrons pode ser estimada qualitativamente pelos valores de função trabalho (Φ) dos metais (bulk).

A função trabalho é definida como a energia potencial mínima necessária que um elétron de valência mais fracamente ligado seja removido de um sólido para o vácuo, a 0 K e com energia cinética igual a zero 96. Quanto maior a função trabalho

mais energia é necessária para ionizar um sólido. O Pd apresenta valor de Φ próximo a 5,00 eV então doa os elétrons, hidretos e/ou íons boroidreto mais facilmente que os outros dois metais, que apresentam Φ iguais a 5,40 (Pt) e 5,48 eV (Au) 97. Assim, o Pd reage mais rápido independentemente do suporte

funcionalizado utilizado e a atividade catalítica do metal é controlada majoritariamente pela função trabalho.

A adsorção de boroidreto e/ou hidreto é a etapa limitante do processo global e apresenta várias etapas elementares 98,99. Guella et al. 98 reportaram que o

boroidreto em contato com platina metálica sofre hidrólise mais rápida que a troca de hidreto adsorvido por deutérios do solvente (D2O). Em contato com paládio metálico,

indesejada na reação de redução do 4-NP porque resulta em perda de atividade catalítica, já que transforma [BH4]- em espécies oxidadas ([B(OH)4]-, HBO2 ou

H3BO3), que não apresentam capacidade redutora. A Equação 8 apresenta a reação

de hidrólise do boroidreto de sódio, amplamente explorada na geração de hidrogênio gasoso.

1 𝐵𝐻

4 (𝑎𝑞)

+ 3 𝐻

2

𝑂

(𝑙)

→ 1 𝐻𝐵𝑂

2 (𝑎𝑞)

+ 1 𝑂𝐻

(𝑎𝑞)

+ 4𝐻

2 (𝑔)

Equação 8

Brown e Brown 100 investigaram a hidrólise de boroidreto de sódio em

água por diferentes metais, a partir da adição de solução aquosa de boroidreto de sódio em soluções dos respectivos cloretos metálicos. Em todos os casos formaram- se precipitados pretos, caracterizados como sólidos metálicos (de acordo com Goia e Matijević 101 , todos esses cátions metálicos utilizados no trabalho de Brown e

Brown originam nanopartículas metálicas em condições de temperatura e pressão ambientes quando em contato com solução de NaBH4). Brown e Brown propuseram

uma ordem de velocidade para a hidrólise a partir do tempo necessário para a evolução de uma quantidade determinada de H2 gasoso, e essa reatividade mostrou

a seguinte ordem decrescente: Rh ~ Ru > Pt >> Co > Os ~Ni > Ir > Fe >>> Pd.

A partir dos trabalhos de Guella et al. 98 e de Brown e Brown 100 pode-se

concluir que a reatividade da platina metálica é controlada pela velocidade de hidrólise do boroidreto. A amostra SBA-Imi+-Pt1,00 apresenta baixa atividade

catalítica frente ao 4-NP porque a hidrólise ocorre antes da redução do grupo nitro. A amostra SBA-Bipi2+-Pt1,00 apresenta maior atividade catalítica em

relação à SBA-Imi+-Pt1,00 porque o catalisador cria uma rota reacional alternativa a

essa hidrólise. O funcionalizante Bipi2+ pode receber um elétron e originar o cátion

radical Bipi+*, que apresenta estabilidade relativamente alta em água e pode

transferir o elétron recebido para o metal. Os derivados desse cátion radical são chamados de viologen e são aplicados em reações eletro e fotoquímicas devido à capacidade de mediar transferências de elétrons 102–104. Então, no catalisador SBA- Bipi2+-Pt1,00 os grupos Bipi2+ são mediadores das transferências entre o ânion

boroidreto e a superfície metálica, evitando assim que a maior parte do reagente seja hidrolisado como no caso da reação com o catalisador SBA-Imi+-Pt1,00.

Uma outra grandeza física importante a ser considerada na reatividade dos catalisadores é a energia de adsorção de boroidreto nos diferentes metais. Escaño et al. 105 relataram as energias de adsorção de boroidreto em alguns metais

de transição a partir de cálculos de DFT e mostraram que essa energia de ligação decresce na seguinte ordem: Pt > Ru > Rh > Pd >> Au (-4,5, -4,4, -4,0, -3,7 e -2,0 eV respectivamente). Essas energias de ligação mostram que o boroidreto é fortemente adsorvido em platina, o que corrobora com a discussão anterior acerca da atividade catalítica baixa dos catalisadores formados por esse metal ser causada pela reação lateral de hidrólise de boroidreto, e não devido à adsorção fraca desse reagente. Além disso, a baixa energia de ligação entre boroidreto e a superfície de Au pode ser considerada o fator determinante na atividade catalítica dos materiais SBA-Imi+-

Au1,00 e SBA-Bipi2+-Au1,00, uma vez que o Au catalisada fracamente a hidrólise do

boroidreto 56.

Os estudos mecanísticos de tempo indutivo mostram a correlação desse fenômeno com reestruturação superficial dos metais após a adsorção de boroidreto. Catalisadores formados por nanopartículas de Au usualmente apresentam tempo indutivo 56,57,62, o que condiz com o fato de a baixa energia de ligação de boroidreto

com esse metal ser a principal causa da baixa atividade catalítica dos materiais de Au.

Ansar et al. 106 estudaram por DFT as energias de ligação de alguns tióis,

boroidreto, hidreto e de hidrogênio com nanopartículas de Au e mostraram que a ligação da superfície metálica com hidreto é energética e pode ser empregada para remover moléculas de tiol adsorvidas. A passivação da superfície de Au por espécies aniônicas como hidreto, boroidreto e cloreto parece ser a principal causa estabilidade de suspensões de ouro sintetizadas a partir soluções aquosas diluídas de HAuCl4 e NaBH4 56,64, produzindo nanopartículas com carga elétrica negativa e

estáveis segundo mostra a teoria DLVO (Equação 6).

Além disso, materiais metálicos formados por partículas na escala nanométrica apresentam maior energia livre de Gibbs de superfície decorrente da maior razão área/volume. Essa maior energia livre é compensada pela adsorção de diferentes espécies 47. Dessa maneira, parte da baixa atividade dos catalisadores de

Au também está relacionada com a maior capacidade de adsorção de ânions desse metal e, consequentemente, indisponibilidade dos sítios ativos em escalas de tempo curtas.

As considerações acima foram feitas com base nas propriedades macroscópicas de cada metal (bulk). Outros sistemas análogos, principalmente catalisadores formados por suspensões metálicas nas quais a superfície dos catalisadores está fortemente passivada, podem não seguir as mesmas tendências porque nesses materiais os efeitos dos estabilizantes de superfície não podem ser desprezados.

Os materiais obtidos nesse trabalho apresentam parte da superfície metálica exposta e passivada por ligantes lábeis como Cl-, OH- e H

2O, então esses

estabilizantes não alteram a reatividade das superfícies metálicas em extensão apreciável. Por exemplo, há catalisadores de Au, Pt ou de ligas metálicas desses metais que são expressivamente ativos, formados por suspensões desses metais. Nesse caso, os efeitos superficiais dos passivantes não podem ser desconsiderados.

Se as considerações anteriores acerca das tendências de reatividade de cada metal estiverem corretas, elementos como o ródio ou o rutênio devem apresentam atividade catalítica expressivamente alta se forem sintetizados segundo os mesmos procedimentos experimentais (a partir das amostras SBA-Imi+ e SBA-

Bipi2+), sendo que essa atividade catalítica deve ter a mesma ordem de grandeza da

atividade apresentada pelos materiais formados por Pd.

Os metais Rh e Ru são do quinto período da tabela periódica (metais 4d) e apresentam funções trabalho de valores próximos ao Pd. Além disso, as energias de ligação do boroidreto com esses metais também mostra valores semelhantes à ligação do boroidreto com Pd. Contudo, tanto o Rh quanto o Ru devem apresentar maior atividade catalítica se forem sintetizados a partir da matriz SBA-Bipi2+ porque

ambos catalisam a hidrólise do boroidreto com velocidades substancialmente altas e maiores que a velocidade de hidrólise com Pt. Então, tais metais necessitam dos grupos Bipi2+ para mediar a transferência de cargas do boroidreto para o metal e,

finalmente, do metal para os grupos nitro adsorvidos.