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3. Espécies de infrações tributárias

3.2. Crimes e contra-ordenações tributárias

3.2.1. Os crimes tributários: enquadramento geral

3.2.1.1. Em especial: as penas aplicáveis aos crimes

“A sanção é como que o reverso da infração” (174)

. É a consequência desfavorável aplicada ao agente da infração por ter assumido um comportamento contrário ou desconforme ao ordenamento quando podia e devia agir de acordo com ele, com tradução na pena de multa e de prisão, se a infração tributária cometida for um crime.

À semelhança do direito penal comum, as penas do direito penal tributário também têm como função (ou finalidade) a prevenção geral e a

prevenção especial (175).

A ideia da prevenção geral como finalidade da pena radica na conceção desta última como instrumento de atuação (psíquica) sobre a generalidade dos membros da sociedade, de sorte a afastá-los da prática de crimes (tributários) através da ameaça penal estatuída pela lei, da realidade da sua aplicação e da efetividade da sua execução (176 ), apresentando uma dupla perspetiva. Em primeiro lugar, a pena pode ser concebida como uma forma de intimidação da comunidade, através do sofrimento que se inflige ao agente com a sua aplicação e cujo receio a conduzirá a não cometer factos puníveis. Neste caso,

( 173 ) Relativamente a esta categoria de crimes, apenas referir que a fraude no crime de “introdução

fraudulenta no consumo” está apenas na sua designação, já que os factos tipificados nas várias alíneas do artigo 96.º do RGIT não envolvem necessariamente um comportamento fraudulento, mas antes o incumprimento de formalidades legalmente exigidas pelas leis fiscais que regulam os impostos especiais sobre o álcool e bebidas alcoólicas, produtos petrolíferos e energéticos ou tabaco. Neste sentido, veja-se, também, ISABEL MARQUES DA SILVA, Regime Geral…, op. cit., pág. 197.

(174) Cf. PEDRO SOARES MARTÍNEZ, Direito…, op. cit., pág. 367.

(175) A propósito do assunto, vejam-se, por todos, JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal…, op. cit.,

págs. 43-85; e MANUEL CORTES ROSA, “Natureza Jurídica das Penas Fiscais”, in Boletim da Direcção-Geral das

Contribuições e Impostos, Lisboa, Ago/Set, n.º 20/21, 1960, e, em especial, do mesmo autor, “Natureza Jurídica das

Penas Fiscais”, in Boletim da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, Lisboa, Out., n.º 22, 1960, págs. 1759- 1770.

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fala-se em prevenção geral negativa ou intimidação. Em segundo lugar, a pena pode ser concebida como a forma de que o Estado se serve para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força da vigência das suas normas de tutela de bens jurídicos, falando-se, agora, em prevenção geral positiva ou integração.

Já na prevenção especial, a pena é instrumento de atuação preventiva sobre o agente, com o fim de evitar que, no futuro, volte a praticar outros crimes. Pode ser negativa ou positiva. No caso da prevenção especial negativa, a pena está dirigida, em primeiro lugar, à intimidação do agente de tal forma que ele não volte a repetir, no futuro, o mesmo comportamento, e em segundo lugar, a separar o agente do meio social, de forma a neutralizar a sua perigosidade social. Com a prevenção especial positiva, a pena surge como instrumento necessário para criar as condições necessárias para que o agente possa, no futuro, continuar a viver a sua vida sem cometer crimes, falando-se, também, a propósito, na prevenção da reincidência.

Posto isto, as penas têm como fins mediatos a proteção de bens jurídicos com um significado prospetivo, e como fins imediatos, a prevenção geral positiva e a prevenção especial positiva, excecionalmente também negativa. Com relação à prevenção geral negativa, esta, sozinha, não tem autonomia, antes sendo um efeito lateral da prevenção geral positiva, já que, como bem se percebe, não se prende o agente com a única finalidade de intimidar a sociedade.

3.2.1.1.1. Sanção principal: as penas de prisão e multa

As sanções principais aplicáveis aos agentes de crimes tributários são as penas de multa e de prisão, sendo que no caso de agente pessoa singular a pena de prisão pode ir até ao limite máximo de 8 anos e a multa entre 10 até 600 dias, com um valor a variar entre € 1 e € 500 por dia (177). No caso de

agente pessoa coletiva, a pena aplicável é, compreensivelmente, tão-só a pena

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de multa, que pode ir de 20 até 1920 dias, com um valor diário que pode variar entre os limites mínimo de € 5 e máximo de € 5000 (178)

. As penas aplicáveis a cada crime encontram-se fixadas no respetivo tipo legal, constante da parte especial do RGIT. Por vezes, a pena de multa fixada nos tipos legais é fixada somente com relação às pessoas singulares, havendo por isso que recorrer à regra do artigo 12.º, n.º 3, do RGIT, nos termos da qual os limites da pena de multa previstos no tipo duplicam quando aplicáveis a pessoas coletivas, sem prejuízo dos limites gerais e salvo disposição em contrário. No caso de agente pessoa singular, a execução da pena de prisão pode ser suspensa se o agente proceder ao pagamento, num prazo a fixar e com limite até aos cinco anos subsequentes à condenação, da prestação tributária e acréscimos legais, do montante dos benefícios indevidamente obtidos, e caso assim entenda o juíz, ao pagamento da quantia até ao limite máximo estabelecido para a pena de multa (179 ). Caso essas quantias não sejam pagas, o tribunal pode sempre exigir garantias de cumprimento, prorrogar o período de suspensão até metade do prazo inicialmente fixado, mas sem exceder o prazo máximo de suspensão admissível e, no limite, revogar a suspensão da pena de prisão (180). Se a pena de prisão aplicada ao agente for igual ou inferior a 3 anos e aquele repuser a verdade sobre a situação tributária, a pena pode ainda ser dispensada se a ilicitude do facto e a culpa do agente não forem muito graves, se a prestação tributária e demais acréscimos legais tiverem sido pagos, ou tiverem sido restituídos os benefícios injustificadamente obtidos, até à dedução da acusação e se à dispensa da pena se não opuserem razões de prevenção (181). No caso de o agente repor a verdade fiscal e pagar a prestação tributária e demais acréscimos legais até à decisão final ou no prazo fixado, a pena será especialmente atenuada (182).

Quanto ao prazo de prescrição do crime tributário, este é, via de regra, de cinco anos ( 183 ), a não ser que a pena de prisão aplicável atinja ou

(178) Cf. artigos 12.º, n.º 2 e 15.º, n.º 1, 2.ª parte, do RGIT. (179) Cf. artigo 14.º, n.º 1, do RGIT.

(180) Cf. artigo 14.º, n.º 2, do RGIT. (181) Cf. artigo 22.º, n.º 1, do RGIT. (182) Cf. artigo 22.º, n.º 2, do RGIT. (183) Cf. artigo 21.º, n.º 1, do RGIT.

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ultrapasse cinco anos, caso em que o prazo de prescrição passará a ser de dez anos (184).

Para terminar este ponto devemos fazer aqui uma pequena observação. Como vimos, o artigo 12.º, n.º 3, do RGIT manda elevar para o dobro os limites mínimo e máximo das multas previstas nos tipos legais sempre que aplicadas a pessoas coletivas. Quando procurámos, porém, uma justificação para esta norma, parece-nos que a mesma se atém com razões de instrumentalização dos entes coletivos. Com efeito, a própria ideia de responsabilização da pessoa coletiva já traz subjacente uma ideia puramente pragmática, no sentido de precaver ou evitar que aquelas possam servir de biombo à prática de crimes pelos seus órgãos ou representantes, deixando-se “usar” ou instrumentalizar. A sua punição evita essa instrumentalização, contribuindo para a prevenção da criminalidade no seio da atividade empresarial. Com efeito, não nos podemos esquecer que as pessoas coletivas são os grandes motores da vida económica e portanto, também pretexto para a prática dos mais variados crimes relacionados com essa mesma atividade. Se não houvesse esta preocupação do legislador em responsabilizar as pessoas coletivas, agravando a sua punição, estas poderiam ser ainda mais instrumentalizadas do que já são. Seriam pessoas coletivas ao serviço de interesses criminosos ocultos. Ao punir-se a pessoa coletiva de forma um tanto quanto severa, maxime, com a sua dissolução – artigo 16.º, al. h), do RGIT – está-se, de alguma forma, a impedir que quem por de trás delas está possa continuar a lucrar com o produto do crime. Punindo-se também a sociedade pelos atos dos homens colocados à sua frente, impede-se que estes continuem a beneficiar do crime, criando neles um sentimento de desinteresse na prática criminosa no seio da sociedade.

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3.2.1.1.2. Sanções acessórias

A par das sanções principais, o RGIT prevê ainda sanções acessórias a aplicar aos agentes de crimes tributários.

Estas estão previstas no artigo 16.º, são de aplicação cumulativa com a pena principal e podem consistir:

a) na interdição temporária do exercício de certas atividades ou profissões;

b) na privação do direito de receber subsídios ou subvenções concedidas por entidades ou serviços públicos;

c) na perda de benefícios fiscais concedidos, ainda que de forma automática, franquias aduaneiras e benefícios concedidos pela administração da segurança social ou inibição de os obter;

d) na privação temporária do direito de participar em feiras, mercados, leilões ou arrematações e concursos de obras públicas, de fornecimento de bens ou serviços e de concessão, promovidos por entidades ou serviços públicos ou por instituições particulares de solidariedade social comparticipadas pelo orçamento da segurança social;

e) no encerramento de estabelecimento ou de depósito;

f) na cessação de licenças ou concessões e suspensões de autorizações;

g) na publicação da sentença condenatória a expensas do agente da infração;

h) na dissolução da pessoa colectiva; e,

i) na perda de mercadoria, meios de transporte e outros instrumentos do crime (Cf. a respeito, artigos 18.º, 19.º e 20.º do RGIT).

De referir que à exceção da pena acessória prevista na al. h), todas são aplicáveis quer a agentes pessoa singular, quer a agentes pessoa coletiva. Os

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pressupostos para a sua aplicação são os previstos no CP ( 185 ), a que acrescem as especificidades do artigo 17.º do RGIT.