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O período compreendido entre a segunda metade do século XIX e os dias atuais, o ensino de Ciências apresentou diferentes objetivos que tiveram como base, principalmente, as mudanças vigentes na sociedade em suas diferentes épocas, considerando aspectos políticos, históricos e filosóficos.

Algumas das tendências do ensino de Ciências não tiveram uma relevância significativa no Brasil, contrariamente ao que ocorreu em países da Europa e nos Estados Unidos. Porém acerca de uma dessas tendências que teve significado para a Ciência no Brasil, pode ser citado o ensino por investigação, conhecido também como “inquiry”, que recebeu grande influência do filósofo e pedagogo americano John Dewey (1980).

Na literatura, encontram-se diferentes conceituações de inquiry, como sendo: ensino por descoberta; aprendizagem por projetos; questionamentos; resolução de problemas, entre outras. A base do ensino investigativo tem como perspectiva possibilitar o aprimoramento do raciocínio e das habilidades cognitivas dos alunos, e também a cooperação entre eles, além de propiciar a compreensão da natureza do trabalho científico.

No Brasil, a abordagem do ensino envolvendo atividades de investigação é encontrada nos Parâmetros Curriculares Nacionais (1998). Entretanto, essa abordagem não é tão difundida. Mesmo assim, aqui, o interesse vem crescendo, sendo que alguns pesquisadores e educadores voltam-se para tal questão Azevedo (2004); Borges e Rodrigues, [2004]; Carvalho, Praia e Vilches, 2005).

No ensino de Ciências por/ou como investigação, os estudantes são inseridos em processos investigativos em que interagem, perguntam, experimentam, envolvem-se com todo o processo ensino-aprendizagem, elaboram hipóteses, comparam, analisam, tiram conclusões, questionam, comunicam os resultados. Nessa perspectiva, a aprendizagem de procedimentos ultrapassa a mera execução de certo tipo de tarefas, tornando-se uma oportunidade para desenvolver novas compreensões, significados e conhecimentos do conteúdo ensinado (MAUÉS e LIMA, 2006).

Neste contexto, a atividade de caráter investigativo contém estratégias, entre outras, que o professor utiliza para diversificar sua prática no cotidiano escolar, e que englobam quaisquer atividades, que, basicamente centradas no aluno, possibilitam alunos autônomos, que saibam pensar, tomar decisões, disposição em cooperar e de resolver problemas, apropriando-se de conceitos e teorias das Ciências da natureza.

Para Azevedo (2006) o ensino por investigação tem como objetivo levar os alunos a pensarem, debaterem, justificarem suas ideias e aplicarem seus conhecimentos em diferentes situações. Essas ideias são compatíveis com as apresentadas pelos demais autores como, Gil Perez (1996), Rodriguez (1995) e Gil (1993).

Desta forma, o ensino de Ciências investigativo fundamenta-se na ação do aluno, envolvendo em reflexões, experimentação, relatos, discussões, ponderações e explicações, sendo estas algumas características que evidenciam um ensino investigativo. Contudo, essas habilidades não precisam ser trabalhadas simultaneamente, de uma vez só ou em uma única atividade.

As atividades de caráter investigativo implicam, inicialmente, a proposição de situações-problemas, que, então, orientam e acompanham todo o processo de investigação. Desta maneira, o professor desempenha o papel de estimulador, orientador das atividades, sendo oportunizada a vivência de experiências dos alunos, os conhecimentos prévios, permitindo-lhes assim, a construção de novos conhecimentos acerca do que está sendo investigado.

Avaliando o ensino investigativo, é possível verificar que possui diversas características que o diferenciam dos métodos tradicionais de ensino, com destaque para a participação ativa dos alunos em seu próprio processo de aprendizagem, não sendo mais o seu interesse centrado no professor. Sendo assim, a responsabilidade pela aprendizagem deve ser tarefa de todos de maneira horizontal, onde alunos e professor se interagem, trocam informações, saberes.

Desta forma, o professor tem que criar possibilidades para que o aluno construa o conhecimento, não apenas transferindo conhecimento, e se assuma como subordinado da produção do saber durante sua formação (FREIRE, 1996).

No entanto, o professor tem o papel fundamental de orientar a aprendizagem em todo momento, devendo desenvolver habilidades para facilitar essa aprendizagem, orientando os alunos por meio da resolução do problema estudado. Deve, ainda, estimular o aluno a buscar as próprias respostas por meio de discussão em grupo, leituras de livros, artigos, consulta a especialistas (ARAÚJO, 2009 apud SANTOS, 2010).

A aplicação de atividades investigativas requer uma mudança no papel do professor, que passa de uma situação de protagonista (método tradicional) para uma de facilitador, passando a ser um estrategista, que deverá desenvolver uma série de

processos e atividades necessárias para conseguir que seus alunos se tornem mais autônomos e capazes de tomar suas próprias decisões, para melhor entender o problema a ser estudado.

Uma investigação só faz sentido quando explicita algo que se quer conhecer. O sujeito que aprende é aquele que se dispõe a atribuir significados ao mundo e a confrontar suas explicações com as dos outros. Essa disposição é da ordem do saber ser e estar no mundo, de se relacionar com os outros, com as próprias ideias e com as ideias alheias.

Assim, as atividades investigativas proporcionam levar para a sala de aula o confronto com perguntas para as quais não existem soluções prontas ou previamente conhecidas. Essa perspectiva de ensino permite a abertura ao inusitado e ao enfrentamento das dúvidas, sendo essa uma postura importante para o professor que pretende utilizar-se do ensino por investigação.

Para Brandão (2007), um saber que envolve percepções mais integradas, mais interativas e mais indeterminadas, leva a uma visão mais orgânica e mais compreensivelmente holística; desta forma, propomos um ensino investigativo que revele ao aluno que a ciência não é estratificada, mas sim interdependente em todos os sentidos, o que não ocorre quando o conteúdo é apresentado de forma estanque, sem dar oportunidade aos alunos de sintetizar e dar coerência ao conjunto.

Segundo Carvalho e Gil-Pérez (2001, p.41), a “[...] aprendizagem de ciências deve se basear na proposição de problemas que levem em conta as ideias, habilidades e interesses dos alunos”. Estas atividades devem, portanto, ser acessíveis, de modo a permitir aos estudantes a análise da situação problemática, em que, sob orientação do professor, eles possam formular hipóteses, estratégias de resolução de problemas e analisar os resultados obtidos na investigação, cotejando-os com os da comunidade científica.

A realização de atividades investigativas no ensino de Ciências é reconhecidamente um excelente instrumento para que o aluno consolide o conteúdo e estabeleça relação entre a teoria e a prática. A atividade investigativa, então, deve proporcionar

condições para que os alunos possam levantar e testar suas ideias e suposições sobre os fenômenos científicos que ocorrem no seu entorno, de modo que o ensino deve ser acompanhado de ações e demonstrações e, sempre que possível, deve propiciar aos alunos a oportunidade de agir (trabalho prático). No entanto, tais ações e demonstrações devem estar sempre integradas à argumentação, questionamentos e discussões com o professor, o qual atua como mediador da produção do conhecimento.

Neste contexto, é necessário que no ensino de Ciências, ao se fazer uma atividade de investigação, que ela seja planejada e executada por professores e alunos com o objetivo de verificar a veracidade das hipóteses formuladas. É claro que, enquanto se planejam e executam as atividades, é importante que o professor promova a aprendizagem de todos os conteúdos: conceituais, procedimentais e atitudinais.

Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais:

É necessário que os modelos trazidos pelos alunos se mostrem insuficientes para explicar um dado fenômeno, para que eles sintam necessidade de buscar informações e reconstruí-los ou ampliá-los. Em outras palavras, é preciso que os conteúdos a ser trabalhados se apresentem como um problema a ser resolvido (BRASIL, 1997a, p. 117).

Sendo assim, ao serem proporcionadas atividades investigativas, estas podem atuar como um poderoso catalisador no processo de construção de novos conhecimentos, ou seja, a relação ensino-aprendizagem, pois um ensino investigativo e a oportunidade de realizar diferentes atividades do conteúdo a ela relacionado podem oportunizar o aluno a construir novos conceitos.

É preciso salientar que produção do conhecimento crítico não é um processo que se viva solitário e que, quando sistematizamos a nossa prática educacional, realizando a reflexões teórico-práticas, não estamos sozinhos, o que implica que necessitamos atuar e refletir colaborativa e participativamente, produzindo e validando interpretações. Daí a importância da formação de comunidades de aprendizagem, das interações dialógicas, do imbricamento entre conteúdo/forma na prática de ensino investigativo.

Pode-se considerar a investigação como uma atividade que depende da habilidade não só de construir questões sobre o mundo natural, mas também de buscar respostas para essas questões. Aprender a investigar envolve aprender a observar, planejar, levantar hipóteses, realizar medidas, interpretar dados, refletir e construir explicações de caráter teórico. Contudo, essas habilidades não precisam ser trabalhadas simultaneamente, de uma vez só ou numa única atividade.

Sendo assim, no ensino de Ciências por investigação, os estudantes interagem, exploram e experimentam o mundo natural, mas não são abandonados à própria sorte, nem ficam restritos a uma manipulação ativista e puramente lúdica. Eles são inseridos em processos investigativos, envolvem-se na própria aprendizagem, constroem questões, elaboram hipóteses, analisam evidências, tiram conclusões, comunicam resultados.

Bachelard (1997, p. 10) atribui importância ímpar à questão dos problemas como geradores e articuladores de todo e qualquer conhecimento em Ciência. Na visão do epistemólogo, a busca de soluções para problemas consistentemente bem formulados representa a gênese do conhecimento científico. Assim, no contexto da Ciência, o papel do problema é entendido como gênese da produção de novos conhecimentos, pois só há desenvolvimento de conhecimento científico na medida em que se enfrenta um problema.

Para Hodson (1994), quando os alunos participam de investigações científicas, esses tendem a aprender mais sobre a ciência e ampliam mais seu conhecimento conceitual.

Ao concordar com Bachelard (1996, p. 127), para quem “[...] todo conhecimento é a resposta a uma questão”, perceber-se-á que o questionamento e a curiosidade são condições necessárias para a aprendizagem em Ciências. Uma investigação só faz sentido quando explicita algo que se quer conhecer. O sujeito que aprende é aquele que se dispõe a atribuir significados ao mundo e a confrontar suas explicações com as dos outros.

Visto que a proposta de ensino por investigação ocorre por meio da problematização, alguns autores consideram o termo “problema” de diferentes significados e perspectivas.

De acordo com Henning (1994), problema é uma situação de dúvida, um estado de tensão psicológica capaz de estimular a curiosidade, o pensamento reflexivo e provocar a ação em busca de uma solução ou atitude de trabalho.

Silva e Nunes (2002) consideram o uso de problema no ensino uma estratégia que permite os educandos, a partir das suas reflexões, conscientizarem-se dos processos utilizados e dos erros e acertos, pois a própria contradição, expressa no problema, ativa o raciocínio, promove o desenvolvimento cognitivo e o pensamento dialético.

Para Carvalho, o problema impulsiona diversas atitudes dos alunos, como motivação, desafios, interesses e discussões, além de promover a autoconfiança. “Resolver um problema intrigante é motivo de alegria, pois promove a autoconfiança necessária para que o aluno conte o que fez e tente dar explicações” (CARVALHO, 2007, p. 20-21).

É interessante ressaltar que nas revisões a respeito de situações-problema é que esse tipo de atividade problematizadora e investigativa valoriza as ideias dos estudantes. Neste contexto, para desencadear um processo de ensino-investigativo, faz-se necessário que o aluno tome para si sua aprendizagem, de maneira que esta se torne seu problema, para então estimulá-lo à elaboração de hipóteses e ao desenvolvimento de estratégias na procura de respostas adequadas ao problema (CARVALHO; LIMA, 1999, p. 47).

Os PCNs também abordam a importância de o professor selecionar corretamente o fenômeno a ser problematizado. Essa atitude se deve ao fato de que as vivências dos alunos podem estar ligadas aos mais diferentes fenômenos naturais e tecnológicos e que suas explicações ocorrem segundo as suas vivências. Sendo assim, o documento defende a posição que as atividades problematizadas permitem

que as vivências e os conhecimentos dos alunos aproximem-se das explicações próprias da ciência (BRASIL, 1998).

Carvalho (2006) considera que, para favorecer a construção de conhecimentos pelos alunos, os professores devem-lhes propor questões interessantes e desafiadoras aos mesmos para que, ao resolverem os questionamentos propostos, possam conhecer os enfoques próprios da cultura científica, promovendo um processo de enculturação ou alfabetização científica.

Sendo assim, é necessário que essas atividades investigativas possam ser baseadas em problemas que os alunos devem resolver, promovendo uma proposta de ensino que se apresenta muito diferente da abordagem do ensino tradicional, no qual o professor tem a preocupação de desenvolver uma lista de conteúdos, muitas vezes de modo expositivo, sem proporcionar aos alunos uma reflexão mais profunda.

A estratégia de ensino com caráter investigativo pode ser usada em diferentes atividades e com os mais variados assuntos e conteúdos da área de Ciências. Ao elaborar uma atividade investigativa, temos que procurar envolver a participação do aluno ao máximo. Sendo assim, pesquisas no ensino de Ciências têm mostrado que quando os alunos participam ativamente das atividades de ensino, eles tornam mais presentes, atuantes nas salas de aulas, obtêm melhores resultados, considerados por muitos como satisfatórios. Mas em grande parte, acredita-se que quando o professor assume um papel de mediador, este poderá possibilitar as discussões, provocar novas questões, questionar e favorecer um processo de ensino.

A partir daí busca-se a construção do conceito científico, contrapondo-ser às ideias que os estudantes têm de senso-comum com as teorias científicas.

Nas palavras de Schnetzler e Aragão (1995, p. 30):

O professor precisa saber identificar as concepções prévias de seus alunos sobre o fenômeno ou conceito em estudo. Em função dessas concepções, precisa planejar desenvolver e avaliar atividades e procedimentos de ensino a que venham promover a evolução conceitual nos alunos em direção às

ideias cientificamente aceita. Enfim, ele deve atuar como professor- pesquisador.