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Para compreender mais o ensino da dança na escola, é necessário entender a presença da disciplina de Arte no ambiente de ensino. A esse respeito, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) – Arte, um dos documentos oficiais que explica o ensino de arte na escola, preconiza que:

Desde o início da história da humanidade a arte sempre esteve presente em praticamente todas as formações culturais. O homem que desenhou um bisão numa caverna pré-histórica teve que aprender, de algum modo, seu ofício. E, da mesma maneira, ensinou para alguém o que aprendeu. Assim, o ensino e a aprendizagem da arte fazem parte, de acordo com normas e valores estabelecidos em cada ambiente cultural, do conhecimento que envolve a produção artística em todos os tempos. No entanto, a área que trata da educação escolar em artes tem um percurso relativamente recente e coincide com as transformações educacionais que caracterizaram o século XX em várias partes do mundo (BRASIL, 1997, p. 20).

Nesse sentido, o componente curricular Arte na escola é muito recente e vem se transformando ao longo dos anos em diversas partes do mundo. Ao perguntarmos aos nossos pais ou avós como era ensinada no tempo deles, provavelmente, eles irão responder que o professor entregava uma folha em branco e colocava um objeto ou uma fruta na mesa e pediam para eles desenharem ou dizer que arte era “somente”

pintar. Essa, sem dúvida, é uma das possibilidades que a arte pode proporcionar na escola, mas vale salientar que não é a única.

Ações como essas eram comuns, uma vez que o ensino de Arte somente foi incluso no currículo escolar em 1971, pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

Entretanto, o nome era educação artística e não era reconhecida como componente curricular, mas como uma aula de atividade educativa. Há alguns anos, esse contexto mudou, com a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Lei N° 9.394/1996, que afirma que “§ 2o O ensino da arte, especialmente em suas expressões regionais, constituirá componente curricular obrigatório da educação básica” (BRASIL, 1996).

A aula de Arte também depende de cada ambiente cultural e de sua sociedade. Portanto, o que é ensinado no Brasil pode ser que seja ensinado diferente em um país asiático, pois são culturas e sociedades diversas, com demandas diferentes para compreender a realidade única de cada lugar. Segundo Souza (2010),

A arte pode favorecer a formação da identidade e de uma nova cidadania de crianças e jovens que se educam nas escolas, contribuindo para a aquisição de competências culturais e sociais no mundo no qual estão inseridos. O objetivo a que se propõe o ensino de Arte, em toda a sua especificidade prevista na forma de lei, é essencial para a construção da cidadania. O ensino de Arte trata de relacionar sentimentos, trabalhar aspectos psicomotores e cognitivos, planejar e implementar projetos criativos e se engajar emocionalmente neles, num permanente processo reflexivo. Talvez mais que em outras disciplinas, no ensino de Arte, os alunos são obrigados a entrar em contato consigo mesmos, quando, por exemplo, criam uma coreografia, realizam um jogo teatral, interpretam uma música ou apreciam um quadro.

Isso não é nada menos do que formar a sua própria imagem de mundo, compreender a realidade (SOUZA, 2010, p. 3).

Como professora de Arte-Dança, sempre havia o questionamento sobre até que ponto havia a responsabilidade de formar a identidade de alguém somente com a aula ministrada. Seria possível transformar o aluno num bom cidadão numa aula de 50 minutos semanal num ano letivo? É função da arte transformar o outro? Todavia, essa reflexão de Souza (2010) destaca que “transformar o aluno” ou “mudar o aluno para melhor” não precisa ser a função da arte ou da professora, mas é relevante saber que, nesse processo, pode-se agir no campo específico da arte e dos seus conteúdos,

mesmo que seja somente para poucos alunos e compreender a imensidão que a arte alcança na escola.

Então, ela se faz necessária, ainda mais em momentos atuais em que a estética da arte é supervalorizada, como afirma a doutora em Educação pela Universidade de São Paulo, Mirian Martins (2011)

Em tempos em que a palavra estética cada vez mais se relaciona à beleza do corpo, com tratamentos e cirurgias, com esteticistas cada vez mais especializados, o termo parece distanciar-se de sua ligação com a educação ou com a experiência estética, ou, ainda, é travestido de uma intenção de beleza, frequentemente conectado com obras ditas bem feitas que reproduzem a realidade do mundo. Afinal, o que tenho chamado de “olhar de missão francesa”, preso a valores acadêmicos da arte, ainda está presente nas escolas como a melhor e verdadeira arte. Um exemplo disso é o modo como as releituras são muitas vezes traduzidas pela ação de cópia de originais, ou melhor, de reproduções de obras que nem sempre têm boa qualidade de impressão ou digitalização e das quais a materialidade e sua dimensão nem sempre são percebidas (MARTINS, 2011, p. 312).

Nesse sentido, é possível observar que a arte presente na escola pode estar seguindo determinados padrões previamente elaborados e se distanciando da experiência estética em si, impedindo a diversidade de vivências que o aluno pode descobrir em suas próprias criações. Dessa maneira, apesar da importância da presença dessa disciplina na escola, ainda é necessário justificar sua existência, uma vez que essa disciplina geralmente é uma das primeiras a sofrer o risco de ser eliminada do currículo escolar de tempos em tempos, na concepção de vieses políticos, como na lei do novo ensino médio, em que a Arte chegou a ser excluída pelo texto original da Medida Provisória, em 2016, mas voltou a ser obrigatória.

Desde 1997, os Parâmetros Nacionais Curriculares (PCN) orientam e norteiam educadores de todo o país na elaboração do programa curricular das escolas. Entretanto, em dezembro de 2017, o Ministério da Educação homologou a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), buscando um ensino mais igualitário no país e orientando os objetivos de aprendizagem das etapas da formação escolar.

Apesar de alguns especialistas explicarem que a visão da arte na BNCC ainda seja retrógrada por tratar a arte como polivalente, o documento postula que

No Ensino Fundamental, o componente curricular Arte está centrado nas seguintes linguagens: as Artes visuais, a Dança, a Música e o Teatro.

Essas linguagens articulam saberes referentes a produtos e fenômenos artísticos e envolvem as práticas de criar, ler, produzir, construir, exteriorizar e refletir sobre formas artísticas. A sensibilidade, a intuição, o pensamento, as emoções e as subjetividades se manifestam como formas de expressão no processo de aprendizagem em Arte. O componente curricular contribui,

ainda, para a interação crítica dos alunos com a complexidade do mundo, além de favorecer o respeito às diferenças e o diálogo intercultural, pluriétnico e plurilíngue, importantes para o exercício da cidadania. A Arte propicia a troca entre culturas e favorece o reconhecimento de semelhanças e diferenças entre elas (BRASIL, 2018, p. 193, grifo do autor).

Nesse contexto, é possível observar que o documento define o componente curricular Arte englobando as linguagens: Artes Visuais, Dança, Música e Teatro. De fato, na leitura desse pequeno trecho e nas páginas seguintes do documento, essas linguagens são abordadas de maneira coletiva até o momento em que se articulam as seis dimensões de conhecimento dessas linguagens, sendo elas: criação, crítica, estesia, expressão, fruição e reflexão. Sobre a dança, especificamente, o documento preconiza que

A Dança se constitui como prática artística pelo pensamento e sentimento do corpo, mediante a articulação dos processos cognitivos e das experiências sensíveis implicados no movimento dançado. Os processos de investigação e produção artística da dança centram-se naquilo que ocorre no e pelo corpo, discutindo e significando relações entre corporeidade e produção estética. Ao articular os aspectos sensíveis, epistemológicos e formais do movimento dançado ao seu próprio contexto, os alunos problematizam e transformam percepções acerca do corpo e da dança, por meio de arranjos que permitem novas visões de si e do mundo. Eles têm, assim, a oportunidade de repensar dualidades e binômios (corpo versus mente, popular versus erudito, teoria versus prática), em favor de um conjunto híbrido e dinâmico de práticas (BRASIL, 2018, p. 195).

Apesar da fala breve sobre a dança, o documento continua a legitimar sua existência no componente curricular Arte. Com isso, observa-se a relevância desse documento para a construção do ensino da arte na escola, mais especialmente da dança e seu desenvolvimento em transformação para as propostas pedagógicas considerando o processo de aprendizagem dos alunos.

Além disso, vale salientar que estamos numa fase de transição dos PCN, que

“traziam orientações mais generalizadas”, para a BNCC, que “mostra o que deve ser ensinado em cada ano escolar” (CÂNDIDO; GENTILINI, 2017, p. 328). Aos poucos, os PCN deixarão de ser referência na educação básica para que a BNCC prevaleça.