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2 RESGATE HISTÓRICO

2.2 O ENSINO MÉDIO E A MATEMÁTICA NO BRASIL

O Ensino Médio, hoje, é um nível de ensino pertencente à Educação Básica, situado entre o Ensino Fundamental e a Educação Superior. Além da preparação básica para o trabalho e o exercício da cidadania, o Ensino Médio tem por finalidades a continuidade dos estudos

iniciais e a possibilidade de acesso ao Ensino Superior e/ou à formação em cursos profissionalizantes.

Como já vimos anteriormente, o marco inicial da história do ensino brasileiro remonta à chegada dos padres da Companhia de Jesus, no Brasil, em 1549. Miorim (1998) relata que, durante o período em que o ensino brasileiro foi dominado pelos jesuítas, as escolas secundárias seguiram a tradição clássico-humanista. Naquele período, o equivalente ao Ensino Médio atual eram os studia inferiora, que defendia uma educação baseada apenas nas humanidades clássicas, cujas disciplinas eram a retórica, as humanidades e a gramática. As ciências, mais especificamente as matemáticas, eram reservadas aos studia superiora, mas em tempo reduzido.

Com a expulsão dos jesuítas, em 1759, o Sistema Educacional Brasileiro praticamente desmoronou: restaram alguns poucos colégios dirigidos por outras ordens religiosas. Em 1772, foram criadas, pela reforma pombalina, as aulas régias, com o objetivo de preencher a lacuna deixada pela eliminação da estrutura escolar jesuítica.

As aulas régias eram disciplinas isoladas, dadas em locais diferentes, sem nenhum planejamento ou articulação, e com professores sem formação adequada para o exercício do magistério. Com as aulas régias, vieram algumas modificações nos conteúdos escolares, entre elas a introdução das aulas régias de Matemática.

Na primeira metade do século XIX, as aulas avulsas das disciplinas de Matemática eram em número reduzido e pouco frequentadas; observava-se um desinteresse pelas aulas régias, sobretudo por aquelas consideradas modernas como as matemáticas.

A criação do Colégio Pedro II, em 1837, foi o marco inicial para as mudanças necessárias no ensino brasileiro, principalmente no ensino secundário, uma vez que esse ensino, segundo Miorim (1998, p. 86-87), era “[...] reduzido a poucas aulas avulsas, sem nenhuma inspeção, incentivo ou orientação, onde professores escolhiam seus horários de aula e os conteúdos de suas lições e os alunos matriculavam-se e retiravam-se das aulas quando bem entendessem!”.

O Colégio Pedro II foi criado segundo os moldes dos colégios franceses pelo então Ministro e Secretário de Estado da Justiça e interino do Império, Bernardo Pereira de Vasconcelos. De acordo com Miorim (1998, p. 86):

Pela primeira vez, foi apresentado um plano gradual e integral de estudos para o ensino secundário, no qual os alunos eram promovidos por série, e não mais por disciplinas, e obtinham, ao final do curso, um título de bacharel em Letras, que lhes garantia a matrícula em qualquer escola superior, sem a necessidade de prestar exames [...] As matemáticas – aritmética, geometria e álgebra – tiveram, assim, seu lugar

garantido a apareceram em todas as oito séries do curso. Nesse primeiro plano de estudos, a aritmética compareceu nas três primeiras séries; nas duas séries seguintes estudava-se a geometria, na sexta série, a álgebra, e, nas duas últimas séries, reservavam-se respectivamente seis e três lições para Matemática.

Os planos de estudo do Colégio Pedro II passaram por várias reformas, oscilando entre o ensino clássico e o científico. A Matemática, no entanto, esteve sempre presente, variando a profundidade com que os conteúdos eram tratados e a quantidade de horas destinada a ela.

Com o advento da República, o Sistema Educacional Brasileiro sofreu uma grande mudança. Em seu governo, Benjamin Constant promoveu uma reforma elaborada segundo a filosofia positivista de Augusto Comte, com um peso maior – se comparado à estrutura anterior – às disciplinas científicas, ampliando o caráter enciclopédico do currículo da escola secundária. O positivismo considera a Matemática uma ciência fundamental e contempla tanto a parte concreta quanto a abstrata. Na sua concepção positivista, Comte (1959 apud MIORIM, 1998) estabelecia o programa da Matemática de acordo com a seguinte hierarquia, que passou a ser adotada, por orientação do governo, nos colégios brasileiros: 1º ano) aritmética e álgebra elementar; 2º ano) geometria preliminar, trigonometria retilínea e geometria espacial; 3º ano) geometria geral e seu complemento algébrico, cálculo diferencial e integral; 4º ano) mecânica geral, astronomia, geometria celeste e noções sucintas de mecânica celeste.

Até 1930, segundo Miorim (1998), nenhuma outra reforma produziu mudanças significativas no ensino secundário brasileiro. Ele continuou sendo entendido como destinado à preparação para profissões liberais como: direito, medicina e engenharia.

A expansão da indústria nacional nos grandes centros urbanos, no entanto, aliada ao desenvolvimento da agricultura e à influência das ideias que agitavam a Europa e os Estados Unidos após a Primeira Guerra Mundial, produziram um movimento de renovação social, cultural e educacional no Brasil: o Movimento da Escola Nova. Esse movimento englobava uma série de correntes pedagógicas modernas que advogavam novos princípios norteadores à Educação, como, por exemplo, o “princípio da atividade” e o “princípio de introduzir na escola situações da vida real”. Esses princípios provocaram uma grande mudança no ensino, principalmente no da Matemática, pois contestavam o ensino baseado na memorização e na assimilação passiva dos conteúdos, sem relação com a vida do aluno (MIORIM, 1998).

No que se refere especificamente à Matemática, Miorim (1998) escreve que, a partir de 1928, ideias modernizadoras defendidas pelo Movimento Internacional para o Ensino de Matemática começaram a penetrar no Colégio Pedro II. Euclides Roxo, então professor desse

colégio, foi o maior responsável pela elaboração da proposta de reforma modernizadora destinada ao ensino da Matemática no Brasil.

Com essa reforma, ficou estabelecido o currículo seriado, a frequência obrigatória, a divisão em dois ciclos (um fundamental e um complementar) e a exigência de habilitação neles para o ingresso no Ensino Superior. Além disso, as geometrias, a aritmética e a álgebra apareceriam englobadas numa única disciplina sob o título de Matemática, com três aulas por semana em cada uma das cinco séries que compunham o curso fundamental. No curso complementar, eram quatro aulas por semana, em uma das duas séries, para os candidatos aos cursos de Medicina, Farmácia e Odontologia. Para os candidatos aos cursos de Engenharia ou Arquitetura, seis aulas por semana nas duas séries do ensino complementar.

O objetivo do estudo da Matemática ‒ segundo a Portaria Ministerial nº 19.890, de 30 de junho de 1931, na qual foram apresentados os programas do curso fundamental e do ensino secundário e as instruções pedagógicas ‒ era voltado não apenas ao desenvolvimento do “raciocínio lógico” dos alunos, mas ao desenvolvimento de outras faculdades intelectuais ligadas a aplicações da Matemática, principalmente àquelas relacionadas às ciências empíricas (MIORIM, 1998).

Segundo Miorim (1998, p. 95, grifo do autor): “O ensino da Matemática tem por fim desenvolver a cultura espiritual do aluno pelo conhecimento dos processos matemáticos, habilitando-o, ao mesmo tempo, à concisão e ao rigor do raciocínio pela exposição clara do pensamento em linguagem precisa”.

Essa reforma sofreu muitas críticas, tanto dos defensores das línguas clássicas quanto dos professores de Matemática que defendiam a Matemática Clássica, trabalhada nos moldes euclidianos.

De 1942 a 1946, ocorre uma série de reformas, denominadas de Reforma Capanema12.

Nesse período, foi criado o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac). Essa reforma também normatiza os ensinos industrial, comercial, primário, secundário, normal e agrícola.

O ensino secundário, regulamentado em 1942 por meio da Lei Orgânica do Ensino Secundário, foi organizado em dois ciclos: o ginasial, de quatro anos, e o colegial, de três, este último nas modalidades clássico e científico. Criou-se, também, o ramo secundário técnico-

12 Essa reforma é conhecida por esse nome porque foi instituída no período em que a pasta da do Ministério da

profissional, subdividido em industrial, comercial e agrícola; e o normal, para formar professores para a escola primária.

Segundo Saviani (2013), o conjunto de reformas tinha caráter centralista e dualista no sentido de separar o ensino secundário, destinado às elites, do ensino profissional, voltado para os setores menos favorecidos da população, pois somente os egressos do ensino secundário tinham o direito de acesso aos cursos superiores.

De acordo com Gomes (2012), a partir da década de 1950, as disciplinas escolares – e entre elas, a Matemática – começam a se modificar. A transformação das condições econômicas, sociais e culturais do Brasil e das possibilidades de acesso à escola propõe alterações no funcionamento e nas finalidades dessa instituição, o que repercute no ensino das disciplinas. Nesse sentido, ocorrem os primeiros congressos nacionais em Matemática: em Salvador, no ano de 1955, e em Porto Alegre, em 1957.

Em 1971, com a Lei das Diretrizes e Bases para o Ensino de 1º e 2º graus (LDB 5692), ocorrem mudanças na organização do ensino brasileiro. Entre essas mudanças, destaca-se a divisão do ensino em dois níveis: o primeiro grau, com duração de oito anos, e o segundo grau, com duração de três. Com esse novo formato, o primeiro grau é estruturado pela união do curso primário com o curso ginasial, deixando de existir o Exame de Admissão, que selecionava os alunos do curso primário para prosseguirem os seus estudos, após os quatro primeiros anos de escolarização. O segundo grau, por sua vez, volta-se à preparação profissional com o objetivo de desviar a procura pelo ensino superior, uma vez que o número de vagas disponibilizadas para esse nível de ensino era insuficiente para atender o número existente de alunos oriundos do 2º grau.

No que se refere ao ensino da Matemática, chega ao Brasil, no final da década de 1950, o Movimento da Matemática Moderna que tinha como principais objetivos integrar os campos da aritmética, da álgebra e da geometria por meio de elementos unificadores como a linguagem dos conjuntos, as estruturas algébricas e o estudo de relações e funções. Para Gomes (2012, p. 24):

Enfatizava-se, ainda, a necessidade de conferir mais importância aos aspectos lógicos e estruturais da Matemática, em oposição às características pragmáticas que, naquele momento, predominavam no ensino, refletindo-se na apresentação de regras sem justificativa e na mecanização dos procedimentos.

No final dos anos de 1970, têm início as críticas ao Movimento da Matemática Moderna em vários países. No Brasil, a crítica ao Movimento se junta ao contexto de renovação dos ideais educacionais, com o fim da ditadura militar, na década de 1980. Como

consequência, há uma renovação na estrutura curricular da Matemática. Conforme Gomes (2012, p. 26):

Entre essas alternativas destacam-se a preocupação com uma abordagem histórica dos temas, a ênfase na compreensão dos conceitos, levando-se em conta o desenvolvimento dos alunos, a acentuação na importância da geometria e a eliminação do destaque conferido aos conjuntos, à linguagem simbólica e ao rigor e à precisão na linguagem matemática.

Em 1996, ocorre a publicação da Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que contém em seu documento uma nova estruturação de todo o sistema educacional brasileiro, que será descrito a seguir.