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2. ANÁLISE DO FILME O QUE É ISSO, COMPANHEIRO?

2.2. Entrada

Para compor essa narrativa, as cenas são acompanhadas de uma música de suspense. Se inicia o ritual de entrada de Fernando no Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8). Marcão coloca um capuz em Fernando e o leva até um apartamento em um local desconhecido. Neste apartamento, outras pessoas, incluindo César, o amigo de Fernando, recebem novos nomes. Fernando passa a se chamar Paulo. César passa a ser Oswaldo. E ali conhecem Renê e Júlio.

Marcão dá as instruções de como eles devem agir dali para frente. Depois pede para que todos fiquem de frente para a parede, para que não vejam o rosto da líder do movimento, Maria, enquanto ela faz um discurso sobre os princípios em que o grupo acredita e defende.

Essa cena é também muito controversa, já que não consta do livro (GABEIRA, 2009) e foi incrementada de certa ficção de quem quer erigir uma ideia aventuresca para os movimentos de esquerda. Martins (in REIS FILHO, 1997, p. 123), ao analisar o filme, acentua a infantilidade desta cena. É de se questionar, de fato, quais produções de sentido a cena carrega. Por um lado, é possível se fazer uma leitura de amadorismo da liderança do grupo, que exige posturas inócuas de seus participantes. Por outro, é possível imaginar que toda a preocupação com as identidades dos integrantes é uma mostra do profissionalismo do grupo. A primeira hipótese ganha mais força no decorrer da história, tendo em vista que o MR-8 se mostrará um grupo organizado, mas não muito experiente em guerrilha urbana, o que, inclusive, custará desde a vida de alguns integrantes, até a captura de seus membros ao final do filme.

15 Jornalista. Foi ministro da Secretaria de Comunicação Social no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, entre 2007 e 2010.

Até aqui, Barreto (1997) segue a lógica clássica da jornada do herói, o monomito de Campbell (2003): apresenta o personagem principal em seu mundo comum, seguro - apartamento onde discutia com os amigos; ele recebe um chamado à aventura – conversa com Artur, caminhando pela rua; encontro com seu mentor, no caso Maria, que irá conduzir o herói em sua jornada; preparação para travessia do primeiro limiar – testes, encontro com aliados e inimigos; clímax – aproximação do desafio final; provação suprema; recompensa; e caminho de volta.

Essa lógica narrativa já está sendo traçada em O que é isso, companheiro? Após encontrar-se com Maria e Marcão, integrando-se ao grupo MR-8, dá-se início à preparação de Fernando. Eles vão para uma praia deserta, onde fazem treinos de tiro. Essa cena é usada pelo diretor para mostrar a faceta intelectual e menos operacional que Fernando desempenhará na história. Ele evidencia-se um mau atirador, tem dificuldade em acertar os alvos e é criticado por Maria. Os diálogos são também perpassados de jargões, como “só militares podem combater militares” e “toda crítica deve ser aceita se ela tiver fundamento”.

Esse trecho do filme funciona como preparação para o espectador. Os personagens ainda estão sendo descobertos, a trama central ainda está em construção. A consequência imediata é um início de filme um tanto lento e arrastado.

A quebra da lentidão se dá nas cenas seguintes. A sequência é vibrante, agitada, viva. Ao som de The House of The Rising Sun, da banda The Animals, uma música que se inicia calma e que vai ganhando volume e intensidade com o tempo, as imagens seguem a mesma lógica. O grupo está assaltando um banco e Marcão faz um discurso inflamado para os funcionários e clientes:

Isso aqui não é um assalto, vocês estão assistindo a uma expropriação revolucionária, nós estamos expropriando uma instituição bancária, que é um dos suportes dessa ditadura cruel e sanguinária. Muitos dos nossos companheiros que lutam pela liberdade e pela democracia estão sendo brutalmente torturados nas prisões desse governo militar e vocês não ficam sabendo de nada, porque a imprensa está censurada. Contem para seus amigos o que está acontecendo. Nós somos o Movimento Revolucionário 8 de outubro, o MR-8. (O QUE É ISSO, COMPANHEIRO? 1997).

Esse discurso é uma das cenas mais interessantes de todo o filme. À parte a excelente atuação de Luiz Fernando Guimarães, o personagem é apaixonado em suas palavras. Ele transborda emoção e é cativante. Interessante notar como o grupo entende que o que estão

fazendo não é roubo, mas expropriação. Marcão sabe do poder das palavras sobre a opinião pública e, por isso, não quer que as pessoas leiam seus atos de outra maneira.

Outro ponto de destaque para o discurso é a referência ao jornalismo censurado. Para o MR-8, a imprensa não denunciava os abusos de poder da ditadura porque estava sufocada. Os militares censuraram boa parte da grande mídia da época e trabalharam arduamente para moldar a opinião pública em seu favor. Assim, o discurso assume também um caráter de denúncia.

A censura ao jornalismo foi uma marca do governo militar brasileiro. O discurso oficial para repressão seguia a lógica de assegurar a segurança nacional contra o comunismo, além do combate à corrupção. Esse não era, absolutamente, um discurso novo. Como já visto anteriormente, a alegação de garantir a segurança e o bem-estar da maioria da população foi usada em muitos governos autoritários, ao longo da história, com o propósito de emudecer posicionamentos contrários ao poder vigente.

É importante lembrar que, em 1964, no momento em que os militares tomam o poder, boa parte da mídia apoia a chamada revolução. No entanto, esse apoio logo perde força em decorrência do posicionamento autoritário dos militares. Já na década de 1970, o governo colocou censores nas redações e nas gráficas dos principais veículos da época. O Estado de S. Paulo, O Pasquim, Opinião, Movimento e Veja foram alguns dos veículos que sofreram com censores em suas redações.

Os jornais buscaram, então, alertar seus leitores de que haviam sido censurados. Os meios mais comuns para isso foram as publicações de poesias, receitas, paródias, trechos de clássicos, como Os Lusíadas, de Luís de Camões, faixas pretas e etc. no lugar das matérias retidas pela ditadura. Havia nas, redações, uma lista de temas proibidos, que envolviam desde corrupção no governo, greves, protestos estudantis, até a própria existência de censura.

As ameaças para quem não cumprisse com as determinações militares do que devia ou não ser publicado não se davam apenas com a prisão de jornalistas ou a invasão de redações. Questões comerciais e financeiras também eram alvo de ameaças. Licenças de rádio e televisão eram cassadas e empresas anunciantes eram coagidas a cortar investimentos em determinados veículos. Dessa maneira, o aparato governamental para controle dos formadores de opinião era mais complexo do que simplesmente um grupamento militar truculento. Os chefes de governo souberam usar das mais variadas estratégias para chegar ao seu objetivo de perpetuação no poder.

A questão do jornalismo censurado será, inclusive, um dos argumentos de Paulo (Fernando), mais à frente, para justificar o sequestro de um embaixador.

Ainda no assalto ao banco, enquanto Marcão discursa, a sequência de imagens se alterna, mostrando o grupo em ação, saindo do banco com sacolas de dinheiro. Paulo (Fernando) é o motorista do carro que aguarda do lado de fora. Ao final do discurso, o grupo foge em direção ao carro, mas, na saída, um policial aparece e começa a trocar tiros com o grupo. Oswaldo (César) é baleado na perna e cai. O restante do grupo consegue entrar no carro e fugir, abandonando, no entanto, o companheiro baleado.

Enquanto, por um momento, o espectador é apresentado às operações dos grupos revolucionários, por outro, Barreto (1997) irá mostrar como o governo agia em casos de prisão. A sequência de fuga é alternada para uma cena de Oswaldo sendo carregado por militares em um corredor escuro. À frente, estão Henrique e Brandão, dois personagens que se mostrarão importantes na história.

Esta será a primeira vez que o espectador assistirá a uma cena de tortura. Oswaldo está em uma sala muito escura, nu, com as mãos amarradas atrás do corpo, sendo afogado em um tanque por Brandão. Não há janelas ou pontos de iluminação externa, apenas a luz de uma lâmpada mostrando o afogamento. Enquanto Oswaldo está com a cabeça submersa, os agentes têm discussões banais, do dia a dia de trabalho: “vai ao aniversário do Vitor hoje à noite?” (O QUE É ISSO, COMPANHEIRO? 1997). Oswaldo não resiste à pressão e, durante um interrogatório, entrega os nomes dos companheiros e o endereço do apartamento que o grupo usava como sede.

A sequência retoma para o MR-8. O grupo, agora, discute sobre o sucesso ou não da operação. Maria discursa a respeito da seriedade dos atos do movimento, ressaltando que não pode haver “vacilações”. Este episódio quer mostrar como se deu a concepção da ideia de sequestrar o embaixador. Durante a conversa, Paulo (Fernando) argumenta que o que eles precisam é de uma ação que quebre o ciclo vicioso da censura à imprensa e, por conseguinte, quebre a ditadura. A ideia, portanto, que ele propõe é sequestrar o embaixador dos Estados Unidos: “E para libertar o patrão, eles vão ser obrigados a libertar companheiros nossos que estão sofrendo na prisão”. (O QUE É ISSO, COMPANHEIRO? 1997).

Esse trecho do filme é parte da ficção inserida na história. O livro de Gabeira (2009) não levanta a ideia do sequestro como vinda de uma pessoa, mas algo que surgiu entre os membros dos movimentos revolucionários.

Gabeira é apresentado como o sujeito que teve a idéia do seqüestro, escreveu o manifesto divulgado pela TV e, por fim, foi o primeiro a fazer o balanço de que a luta armada era um sonho derrotado e sem remédio. Isso está longe de ser verdadeiro. Gabeira entrou e saiu da operação como um militante raso do MR-8, ou pouco mais do que isso. Já residia na casa onde o embaixador foi abrigado — ali deveria cuidar da imprensa da organização — e por essa razão ficou no local. (LEITE in REIS FILHO, 1997, p. 55).

No filme, ele é o intelectual do grupo, o único que faz uma reflexão mais livre, que teve a idéia do seqüestro (o que não é verdade, ele só soube da ação poucos dias antes), que escreveu o célebre manifesto pedindo a libertação de 15 prisioneiros políticos (e um libelo contra a ditadura militar), lido em rede nacional no horário nobre da televisão (na realidade, quem o escreveu foi o hoje jornalista Franklin Martins) [...]. (SALEM in REIS FILHO, 1997, p. 48).

O que Leite e Salem (in REIS FILHO, 1997) comentam acerca do personagem de Fernando Gabeira no filme é que ele foi romantizado. Segundo eles, Fernando é colocado como personagem principal da história e, por isso, deveria conduzir as principais ações da trama. O que se percebe, de fato, é que o personagem de Gabeira está elevado a um status que não possui no livro. A transposição desse personagem para o cinema se deu com uma série de ficcionalizações a fim de construir um herói mais cativante aos olhos do espectador.

Assim, enquanto no livro se observa um personagem ingênuo, embora intelectual, sendo conduzido à ação por outros personagens mais atuantes nas guerrilhas, no filme, Fernando é mais arrojado, consciente de si, maduro em suas convicções e decisões. Não surpreende, dessa maneira, Barreto (1997) ter estruturado o personagem de Fernando desse modo. Ele está construindo seu herói.

A cena que se segue é de uma ocasião comum ao embaixador. O filme mostra Elbrick em seu cotidiano, no seu contexto de trabalho regular. Mas essa sequência também traz uma crítica à sociedade carioca da época. Enquanto o embaixador está em sua mesa de trabalho, seu secretário chega para conferir uma lista de convidados para a festa em comemoração à conquista da lua pelos americanos. Elbrick se mostra um pouco incomodado em ter que decidir algo que ele considera banal. Seu secretário irá explicar que, no Brasil, as festas são muito importantes para as relações sociais e empresariais. Desse modo, a cena critica, implicitamente, como a alta sociedade do Rio de Janeiro estava alheia aos acontecimentos políticos, e, ao mesmo tempo,

demonstra a futilidade e promiscuidade dos relacionamentos entre os norte-americanos e o Rio de Janeiro.

Muito embora esta seja uma crítica sutil, ela é relevante, porque busca contribuir para a formação do personagem do embaixador. Ele está claramente abismado e descontente com essas trivialidades inerentes ao seu ofício. Assim como em outros episódios mais a frente, ele se mostrará um personagem complexo, um pouco fora dos muitos estereótipos exibidos no filme.

Co-financiado pela Columbia, produzido com ambição de fazer bonito no mercado externo — e por isso com Alan Arkin como estrela de primeira grandeza —, O que é isso, companheiro? tem no embaixador seu maior personagem. Elbrick tem um discurso que tenta colocar ordem no filme, seu olhar examina e julga o que se passa. Brilhante estudioso do cinema brasileiro, o professor Ismail Xavier, da Universidade de São Paulo, observa que, no final “só o personagem do embaixador parece ter história, não se esfumaça, merece referência”. O professor ficou incomodado com esse tratamento diferenciado. “E as outras figuras desse episódio? Como lhes dar cidadania para além do ocorrido?” (LEITE in REIS FILHO, 1997, p. 58-59).

Leite vai defender a ideia de que o embaixador é o melhor personagem da história. Segundo ele, há uma explicação mercadológica para isso: Barreto (1997) teria interesse em alcançar visibilidade e mercado nos Estados Unidos e, para isso, precisaria dar destaque à representação norte-americana do filme.

De fato, em comparação ao livro (GABEIRA, 2009), o personagem do embaixador no filme é bem mais complexo, interessante e relevante. Concorda com esta tese Almada (in REIS FILHO, 1997), para quem não há dúvidas sobre as intenções de Barreto (1997) ao colocar Charles Elbrick da maneira como foi posto:

Contar para o público norteamericano que o seqüestro do seu embaixador Elbrick, em 1969 no Brasil, foi fruto da ação juvenil inconseqüente de um grupo chamado Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), grupo esse comandado por dois mafiosos de uma tal Aliança Libertadora Nacional, pode ser palatável àquele mercado. Mas, ainda assim, é ingênuo do ponto de vista político e desrespeitoso à própria memória do embaixador, homem suficientemente corajoso para criticar, na época, a ditadura militar brasileira com maior veemência do que aquela que o filme sugere. (GABEIRA, 2009, p. 146-147).

A crítica que se faz, assim, é a de que diretor, roteirista e produtores do filme subestimaram o espectador, em benefício de seus próprios interesses, criando uma figura fictícia, embora faça evidente referência a uma pessoa real.

Para este pesquisador, no entanto, há que se criticar a maneira como se construiu esse personagem à luz de estratégias literárias e jornalísticas. Sob o olhar da literatura, ele é encantador e imprevisível, um tanto romantizado, é verdade, mas com efeito um personagem completo, que tem incertezas, fraquezas, forças, dúvidas e convicções. Sob o olhar jornalístico, a apuração da informação não foi completa no texto pronto, tendo em vista que em muitos momentos, como anteriormente já foram apresentados, o personagem distanciou-se demais da pessoa que ele representa.

Voltando para a sequência da história, o espectador será apresentado à preparação da ação de sequestro do embaixador, cena que é muito semelhante à narrada por Gabeira (2009) em seu livro. A grande diferença é que na obra escrita, a sequência narrada segue o fluxo de pensamento do narrador, não necessariamente a ordem cronológica dos acontecimentos. Barreto (1997), por outro lado, opta pela sequência temporal dos fatos.

Renê finge ser uma estudante recém-chegada de Minas Gerais, ainda ingênua, em busca de emprego na casa do embaixador. O chefe da segurança da embaixada se engraça com a moça e, crendo na inocência de Renê, revela algumas informações importantes sobre a rotina do embaixador, como, por exemplo, o fato de o carro principal de Elbrick não carregar bandeiras dos Estados Unidos para não chamar a atenção de terroristas.

Os maiores levantamentos do género foram sempre feitos por mulheres. Apesar das sucessivas notícias sobre a participação de mulheres em ações armadas, o peso da estrutura patriarcal ainda impedia que muitos as associassem à violência ou mesmo à coragem. Assim que a casa foi descoberta, o primeiro contato que ela fez foi diretamente com o chefe da segurança pessoal do embaixador. Ele se chamava António Jamir e se interessou especialmente por aquela candidata a empregada doméstica. "Mãos tão finas. Ah, só arrumadeira? Bem, talvez precisem, não sei. Você não gostaria de conhecer a casa?"

Vera sentiu no ar que havia sexo e conduziu imediatamente para esse lado. Chegou a marcar um encontro com o chefe de segurança mas antes disso fez inúmeras perguntas. Ela dizia por exemplo: "Que lindo automóvel!". António respondia: "Lindo, mas há outros, muito mais bonitos ainda". (GABEIRA, 2009, p. 98).

A cena cinematográfica assemelhou-se muito ao narrado por Gabeira. Mas o livro traz a personagem Vera como autora da investigação sobre a casa e hábitos do embaixador. No filme, quem faz isso é Renê. Em verdade, Vera Sílvia foi transposta para o filme nas personagens de Maria e Renê. E à segunda coube o papel de investigadora de Elbrick.

Durante a preparação, dois personagens aparecem enviados de São Paulo pela Ação Libertadora Nacional (ALN), organização semelhante ao MR-8 criada por Carlos Marighella, um dos maiores nomes da resistência armada na ditadura. A ALN e o MR-8 foram os responsáveis pelo planejamento e execução do sequestro do embaixador.

Chegam de táxi, portanto, Toledo e Jonas. O primeiro é um senhor que parece trazer mais experiência para o grupo. O segundo, mais sisudo, será representado no filme como um companheiro firme, impaciente, arrogante e um tanto ignorante.

Na reunião de apresentação, Maria os apresenta ao restante do grupo. Seguem-se “aplausos” (estalos com os dedos). Jonas é o primeiro a falar e começa se colocando como líder da operação, dizendo que quem agora dá as ordens é ele. Câmera em contra-plano, faz uma panorâmica mostrando os rostos assustados dos membros do MR-8. Essa linguagem de câmera funciona muito bem como descritivo da situação, mostrando as reações, as expressões e o clima do ambiente “Eu quero avisar que eu mato o primeiro que vacilar ou discordar” (O QUE É ISSO, COMPANHEIRO? 1997), complementa Jonas. Seguem-se a isso, imagens em primeiro plano dos rostos assustados e tensos, evidenciando a gravidade da ação que planejavam. Começa, nesta cena, uma música de tensão, que, sutilmente, ajuda a compartilhar com o espectador a inquietude da situação.

Em seguida, a sequência dá um pequeno salto no tempo da narrativa e os dois novos companheiros já estão devidamente instalados na casa onde todo o grupo está hospedado. Maria avisa Paulo que ele não irá participar da operação, ficando responsável por salvaguardar o retorno do grupo à casa, já com o embaixador sequestrado. Em um quarto da casa, Jonas e Toledo conversam mais intimamente e Jonas externa sua desconfiança com o MR-8. Para ele, trata-se de um grupo de “amadores pequeno-burgueses” (O QUE É ISSO, COMPANHEIRO? 1997). Toledo, contrabalanceando a situação, defende-os argumentando que não se pode subestimá-los, tendo em vista que conseguiram cumprir operações para levantamento de verba (expropriação bancária) e, efetivamente, tiveram a ideia do sequestro.

2.3. Clímax

Transição com cenas do Rio de Janeiro. Neste ponto em que o filme começa a se encaminhar para os momentos mais dramáticos, as cenas se tornam mais avermelhadas, sugerindo ação, sangue. Esse efeito nas cenas não é coincidência e, muito menos, aleatório. Propositadamente, o filme assume essa coloração provocando força, movimento, tensão, calor e paixão ao espectador.

Sobre a imagem surge o letreiro: “Quinta-feira, 4 de setembro, 1969” (O QUE É ISSO, COMPANHEIRO? 1997). A inserção de datas exatas sugere aspecto documental ao filme, dá a ele caráter testemunhal. Ficção e realidade mais uma vez se sobrepõem. Os cineastas usam essa aproximação para trazer um caráter mais realista para o filme, para lançar ao espectador a ideia de fato e não de retrato. Na literatura, essas estratégias ganharam o nome de verossimilhança e, no jornalismo, verdade.

Agora, a retórica do discurso jornalístico (posto que todo dizer requer sua retórica, implícita ou explícita, formal ou informal) é, em muitos casos, essencialmente coincidente com a do discurso literário. Com efeito, se a ficção própria da literatura a exime das provas comprobatórias e se baseia mais em um pacto estético do que em um pacto ético de credibilidade (como acontece com o discurso jornalístico), podemos estar diante de ficções fantásticas (nas que o conteúdo funciona de modo muito distinto ao mundo em que habitualmente nos encontramos inseridos) ou diante de ficções realistas (nas que a retórica do discurso funciona, seguindo os velhos postulados da

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