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1.2 Cerâmicas de infraestrutura 16

1.2.1 Zircónia 17

1.2.1.2 Envelhecimento da zircónia 22

Um outro fenómeno intrínseco à zircónia é o seu envelhecimento ou Low

Temperature Degradation (LTD) que pode ter efeitos negativos nas

propriedades mecânicas do material (Swab, 1991; Luthardt, Holzhüter, Sandkuhl et al., 2002; Douillard, Chevalier, Descamps-Mandine et al., 2012). No entanto, é reconhecido que a redução do tamanho dos grãos da zircónia e a distribuição e aumento da concentração dos óxidos estabilizantes e a sua distribuição reduzem a taxa de transformação (Piconi et al., 1999; Lughi e Sergo, 2010).

Sabe-se no entanto que o envelhecimento da zircónia é devido à transição da fase cristalina tetragonal para monoclínica, que provoca micro e macro fissuras que têm início na superfície e se prolongam para o interior. Este processo leva à desagregação de grãos na superfície, o que provoca um aumento de rugosidade, que por sua vez induz a uma transformação de fase mais rápida. Este envelhecimento é acompanhado pela diminuição na percentagem de ítria e é mais crítico a temperaturas entre os 200 °C e 300 °C

e na presença de vapor de água (Swab, 1991). No entanto, estudos mais recentes revelam que a zircónia pode sofrer transformação à temperatura corporal e na presença de água (Chevalier, Cales e Drouin, 1999). Neste estudo, o envelhecimento foi simulado submetendo a zircónia a um ciclo de 1 hora em autoclave a 134 °C, o que para os autores representa o mesmo que vários anos, entre 1 e 4, à temperatura de 37 °C.

Toda esta problemática do envelhecimento está diretamente relacionada com a granulometria da zircónia e a percentagem de ítria. Para uma granulometria inferior a 6 µm e com 3% de ítria, o envelhecimento da zircónia é mais lento ou é inibido. No entanto, a falta de regulamentação própria, através por exemplo de normas ISO, faz com que as diferentes marcas de zircónia possam desprezar estes parâmetros, facilitando assim o envelhecimento da zircónia (Deville, Chevalier e Gremillard, 2006; Lughi et al., 2010).

A microestrutura da zircónia pode ser alterada durante o seu processo de fabrico. Tal poderá suceder na fase inicial da mistura dos vários elementos no pó de zircónia, dependendo da concentração dos diferentes elementos e da compactação da zircónia numa fase denominada verde. A microestrutura da zircónia poderá também ser influenciada pela temperatura e tempo de sinterização, pelo processo de pigmentação da estrutura, fresagem, acabamento e mesmo da limpeza ou esterilização (Chevalier, 2006). Consequentemente, são várias as fases em que a microestrutura da zircónia pode sofrer alterações, tornando-a mais suscetível ao envelhecimento (Li et

al., 2014).

Para além disso, os tratamentos de superfície preconizados para aumentar a adesão da cerâmica de revestimento à zircónia, tais como o jateamento da superfície e condicionamentos por ácidos podem aumentar a rugosidade da superfície e deste modo aumentar a possibilidade de uma transformação de fase, principalmente se na presença de um meio húmido (Chevalier, Loh, Gremillard et al., 2011).

A LTD foi considerada a responsável pela falha de um grande número de próteses femorais no início deste século (Clark, 2006; Chevalier, 2006), havendo uma relação entre a idade da zircónia e a sua resistência à fadiga. A exposição das restaurações em zircónia à humidade da cavidade oral e a amplas variações de temperatura e pH pode causar hidrólise das ligações sílica-oxigénio, afectando as propriedades mecânicas da cerâmica (Denry et al., 2010).

Estudos com zircónias estabilizadas com cério ou alumina, parecem mostrar que estas são menos susceptíveis ao envelhecimento do que as estabilizadas por ítria, e devem ser estudadas mais profundamente como alternativas para infraestruturas (Kohorst, Borchers, Strempel et al., 2012).

1.3 – Cerâmicas de recobrimento

A cerâmica de recobrimento, tanto para infraestruturas de metal como para outras cerâmicas, é uma cerâmica com base feldspática. A cerâmica feldspática é constituída por uma matriz de sílica (SiO2) e alumina (AL2O3)

que representa cerca de 80% da sua composição e de óxido de sódio (Na2O)

e óxido de potássio (K2O) em menores concentrações. Para além destes

componentes, a cerâmica feldspática tem na sua constituição outros óxidos metálicos responsáveis pela cor da restauração final, após a sinterização (McLean, 1979).

No intuito de melhorar as propriedades mecânicas das cerâmicas feldspáticas, nomeadamente a resistência à fratura, e simultaneamente conseguir uma melhor adesão às cerâmicas de infraestrutura, tem sido introduzido na sua composição partículas de cerâmicas cristalinas em percentagens reduzidas. Os principais cristais adicionados, para além da alumina, sáo a leucite, um mineral cristalino formado por silicato de potássio e alumínio, e a zircónia (Denry et al., 2010).

As concentrações dos óxidos de potássio e sódio e da leucite, para além de responsáveis pelo aumento do CET da cerâmica, são importantes na diminuição da temperatura de sinterização da cerâmica para temperaturas compatíveis com as ligas metálicas. Sendo assim, quando se trata de ligas com alto conteúdo de ouro, as cerâmicas de recobrimento têm maiores percentagens de leucite que as cerâmicas de recobrimento para ligas não nobres (McLean, 1979).

A matriz vítrea é a responsável pelas propriedades óticas, necessárias para mimetizar a translucidez do esmalte dentário, enquanto que a componente cristalina é responsável pelo aumento da resistência da cerâmica (Giordano

et al., 2010)

As cerâmicas de recobrimento para metalo-cerâmica têm CET maiores que as cerâmicas de recobrimento para alumina ou zircónia uma vez que os CET das ligas metálicas são mais altos que o CET das cerâmicas de infraestruturas. Sendo assim uma das principais características das cerâmicas de recobrimento para zircónia é da alteração do CET para valores mais baixos.

A composição da cerâmica de recobrimento para as infraestruturas em alumina são muito idênticas às cerâmicas de recobrimento para metal apenas com o aumento da concentração de óxidos de potássio e sódio.

Como consequência do aumento da fabricação de estruturas de zircónia, surgiu no mercado um número elevado de empresas que comercializam cerâmicas de recobrimento próprias para as estruturas de zircónia. A cerâmica para estas estruturas continua a ser a tradicional cerâmica feldspática com incorporação de uma pequena percentagem de zircónia (2 a 5%). No entanto, a cerâmica de recobrimento para zircónia apresenta valores de resistência à flexão similares aos apresentados pela cerâmica de recobrimento para metalo-cerâmica (Fisher, Stawarczyk e Hämmerle, 2008). Interessante também a referência a cerâmicas de recobrimento de zircónia

com CET tão díspares e com intervalos entre os 8,8x10-6xK-1 e os 10,5x10- 6xK-1 (Diniz, Nascimento, Souza et al., 2014).

A cerâmica de recobrimento para zircónia pode ser aplicada de três formas: a técnica convencional, a técnica por injeção e a técnica mista.

Na técnica convencional a cerâmica após misturada com líquido próprio é colocada com pincel ou espátula sobre a infraestrutura de zircónia. Esta técnica de aplicação de cerâmica e o processo de queima para além de tecnicamente exigente é por vezes pouco previsível quanto ao resultado final (Miyazaki et al., 2013). No entanto, esta técnica é ainda a mais usada e tem como grande vantagem a possibilidade de, utilizando diferentes pós de cerâmica, conseguir reproduzir com mais eficácia o dente natural. Assim, esta técnica é essencial quando existe uma exigência estética grande e principalmente quando se trata de dentes anteriores, apesar de maior incorporação de porosidade e micro-fendas na interface zircónia-cerâmica de recobrimento (Guess, Kulis, Witkowski et al., 2008).

Recentemente, têm surgido no mercado cerâmicas injetadas para zircónia, utilizando lingotes de cerâmica de recobrimento. Este tipo de técnica é menos exigente do ponto de vista das capacidades artísticas do técnico de prótese dentária, mais rápida e menos sensível do que a tradicional aplicação com pincel. Necessita, no entanto, de forno de queima próprio para injeção.

Os estudos revelam que os métodos de colocação de cerâmica de recobrimento por injeção apresentam menor taxa de falha da restauração final do que a colocação de cerâmica por método convencional (Aboushelib, Kleverlaan, Feilzer, 2006, Aboushelib, Kleverlaan, 2008b, Raigrodski, Hillstead, Meng et al., 2012). A técnica da cerâmica injetada apresenta, contudo, uma menor resistência à fractura e à compressão limitando, deste modo, a sua utilização a trabalhos mais conservadores (Choi, Waddell, Torr

et al, 2011a e Miyazaki et al, 2013). Para além disso, o resultado estético final

é inferior ao método tradicional, uma vez que os blocos de cerâmica são normalmente monocromáticos e é através da pintura que é feita a sua

caraterização. Esta técnica apresenta resultados adequados para restaurações para os sectores posteriores e para casos anteriores com reduzida exigência estética.

Uma terceira técnica de aplicação da cerâmica de recobrimento, a técnica mista, tenta combinar os aspetos positivos de cada uma das técnicas acima descritas (Aboushelib, Kleverlaan e Feilzer, 2008c; Luo e Zhang, 2010). Por conseguinte, pretende aliar a vantagem de uma melhor adesão da cerâmica de injeção à estrutura de zircónia e as características estéticas pela aplicação de cerâmica pela técnica tradicional ou estratificada sobre a cerâmica injetada. No entanto, este é um tipo de restauração pouco utilizada por consumir maior tempo de trabalho e não ser economicamente tão vantajosa como as anteriores.

1.4 – Métodos de união entre a cerâmica de recobrimento e o

material de infraestrutura

Nas restaurações metalo-cerâmicas a união entre os dois materiais é conseguido através de três mecanismos: união química, retenção mecânica e retenção física, através de tensões de compressão da cerâmica de recobrimento sobre a liga metálica, que se estabelecem pela existência de pequenas diferenças entre o CET dos dois materiais (McLean, 1979; Shillingburg et al., 1986).

A união química ocorre entre os óxidos metálicos formados na superfície do metal e a cerâmica utilizada como opaco. Nas ligas metálicas não preciosas esses óxidos são evidentes. Na ligas de alto conteúdo de ouro é necessário realizar um ciclo térmico prévio à colocação da cerâmica para promover a formação desses óxidos. No processo de sinterização da primeira camada de cerâmica opaca, esta une-se quimicamente aos óxidos metálicos da superfície da infraestrutura. Esta união é maioritariamente conseguida

através de ligações iónicas entre os iões metálicos da liga e os não metálicos da cerâmica podendo também haver ligações covalentes (Hong, Smith e Srolovitz, 1995).

Em relação à retenção mecânica, esta é conseguida através da microrrugosidade da superfície do metal. Uma das formas de conseguir esta microrrugosidade é através do jateamento com óxido de alumínio da superfície do metal, que para além de limpar a superfície de impurezas, aumenta a energia de superfície e aumenta a superfície de adesão (Nieva, Arreguez, Carrizo et al., 2012). Assim, durante a sinterização da cerâmica, esta tem um bom escoamento pela superfície do metal, proporcionando uma retenção mecânica entre os dois materiais.

A compressão da cerâmica de recobrimento à liga metálica é obtida através de diferenças entre o coeficiente de expansão térmica entre a cerâmica de recobrimento e a liga metálica utilizada. Isto é, a cerâmica de recobrimento deve ter um CET ligeiramente inferior ao CET da liga metálica utilizada para que durante o arrefecimento da cerâmica, após a sinterização, esta crie tensões de compressão na estrutura metálica aumentando a resistência adesiva entre os dois materiais (Aboushelib, Jager, Kleverlaan et al. 2005, Fissher et al., 2008, Thompson et al., 2011; Miyazaki et al., 2013).

A combinação destes três fatores é a responsável pelo grande sucesso das restaurações metalo-cerâmicas ao longo do tempo.

Se a adesão da cerâmica de recobrimento ao metal está hoje bem documentada e é um sucesso, o mesmo não se passa com a adesão da cerâmica de recobrimento à zircónia.

A compatibilidade entre CET da zircónia e da cerâmica de recobrimento tem sido referido como fundamental para um maior sucesso deste tipo de restaurações (Saito et al., 2010, Komine, Strub e Matsumura, 2012 e Diniz et

Em relação à retenção química entre a cerâmica de recobrimento e a zircónia não se encontra na literatura referência a este tipo de ligação.

Os procedimentos laboratoriais utilizados para as restaurações metalo- cerâmicas são os mesmos que têm sido preconizados para as restaurações zircónia-cerâmica, mas com resultados menos positivos. Apesar de existir um grande número de tratamentos de superfície propostos na literatura com vista a aumentar a rugosidade, não é consensual que estes aumentem a adesão da cerâmica de recobrimento à zircónia (Miyasaki et al., 2013).

Têm sido propostos variadíssimos tratamentos de superfície no intuito de aumentar a adesão da cerâmica de recobrimento à zircónia (Elsaka, 2013; Noro et al., 2013; Özcan et al., 2013). O mais comum dos tratamentos propostos é o jateamento com óxido de alumínio (Curtis, Wright e Fleming, 2006; Wang, Aboushelib e Feilzer, 2008; Karakoka e Yilmaz, 2009; Oyagüe, Monticelli, Toledano et al., 2009; Cassucci, Mazzitelli, Monticelli et al., 2010; Butze, Marcondes, Burnett Júnior et al., 2011; Demir, Subasi e Ozturk, 2012; Hallmann, Ulmer, Reusser et al., 2012a e 2012b; Noro et al., 2013; Ozcan et

al., 2013). Todavia os estudos apresentam diferentes variáveis como a

granulometria, a pressão de jateamento e a distância do jato à zircónia tornando difícil fazer um paralelismo entre estudos. De igual modo, os condicionamentos com broca de diamante e a aplicação de diferentes ácidos têm apresentado resultados díspares sobre o efeito destes na adesão da cerâmica de recobrimento à zircónia (Ersu, Yuzugullu, Yazici et al., 2009, Kim, Lim, Park et al., 2011 e Elsaka, 2013).