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A promoção de SAN está como um dos principais pilares do PAA, tendo em vista a relevância dos pequenos agricultores na produção dos alimentos consumidos pela grande maioria dos brasileiros. Além desse programa, a construção de instituições e aparatos jurídicos que dessem o respaldo e ajudassem a garantir o conceito de SAN também foi essencial. Em 1985, houve uma primeira menção ao termo de SAN em uma política pública, ainda sem a noção do nutricional envolvida (MACHADO, 2017, p.82).

Especialmente a partir de 2003, com a criação do Programa Fome Zero, de onde se originou o PAA, e com a recriação do Conselho Nacional de SAN (CONSEA), essa temática ganhou força para então ser criada a Lei Orgânica de SAN (LOSAN). O mapeamento do cumprimento ou não das diretrizes da lei podem ser feitos através de políticas municipais, ou observando a ação de governos estaduais na implementação de restaurantes populares, por exemplo. São vários os equipamentos que compõem o SISAN (Sistema Nacional de SAN) e contribuem para amenizar situações de IAN, uma vez que esses conceitos andam juntos, como pudemos ver no MAPASAN citado acima (MDS, 2014).

O último relatório produzido pela FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) sobre o Brasil traz perspectivas otimistas com relação à SAN, com o grande avanço de termos saído, à época, do mapa

da fome. Os avanços foram de fato inegáveis e davam sólidas esperanças de continuarem, uma vez que:

As estruturas e capacidades que resultam da evolução e institucionalização da governança da segurança alimentar e nutricional e o contínuo compromisso político e orçamentário colocam o Brasil em uma base sólida para proteger os avanços alcançados e para enfrentar os novos desafios (FAO, 2014, p.9).

Contudo, o compromisso político que podíamos enxergar de certa forma engajado com essa temática não mais se encontra no poder. O próprio Plano Nacional de SAN (PLANSAN), para o período de 2016 a 2019, relata inúmeros desafios que ainda precisam ser enfrentados no Brasil. Infelizmente, essa é uma tendência observada em várias partes do mundo em relatório mais recente da FAO, em 2017.

No presente trabalho, denominam-se de beneficiários aqueles que receberam as “Cestas Verdes” pelo menos uma vez ao longo do período em que o PAA esteve em voga, mas, se compreendermos de maneira mais ampla a abrangência dessas políticas, os agricultores também podem ser considerados beneficiários. Ainda que esse seja um termo que conote uma ação benevolente das instituições públicas, de fato é uma obrigação do Estado à garantia de vida digna a toda sua população (LIMA, 2016, p. 17).

Ao considerarmos então o público alvo deste capítulo a população limeirense (ainda que restrita apenas a parcela que recebia os produtos das cestas), vamos atentar-nos a seguir aos números sobre SAN especificamente no munícipio.

O relatório municipal de Informações de SAN, fornecido pela CAISAN a respeito da cidade de Limeira traz alguns dados para auxiliar o município na elaboração de seu próprio diagnóstico e nos informa também a respeito da população ouvida nos grupos focais. Os dados demográficos, os indicadores de SAN e os equipamentos do SISAN presentes em Limeira compõem o painel situacional da população e da gestão.

A inserção econômica da cidade sempre foi pelo viés da agricultura, passando pela cana-de-açúcar e do café, posteriormente a produção de laranjas ganhou grande força, aliado ao desenvolvimento industrial (D’ANTONA et al., 2012). O crescimento da cidade se deu conjuntamente à urbanização,

assim, hoje 97% da população do município reside em áreas urbanas (Idem, p. 77). É um município de médio porte, com a parcela majoritária de sua população branca. Os dados do último Censo demográfico que o documento da CAISAN relata circunscrevem na porcentagem de 1,7% da população vivendo em extrema pobreza em relação à população total do município, entre os que habitam na zona urbana e rural.

Além dos macro dados apresentados acima, para compreendermos melhor a situação da população com qual íamos trabalhar nos grupos focais, fizemos a escolha de aplicar alguns questionários elaborados por uma das gestoras entrevistadas. O intuito da gestora foi elaborar um questionário com a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA) e, ao adaptar para o contexto do PAA, compreender duas instâncias: tanto a situação em que viviam as pessoas e assim ponderar se valia a pena instituir um desvio de curva do projeto inicial e colocar em prática as “Cestas Verdes”; quanto para realizar um proto diagnóstico de IAN no município, aproximando os dados de seu poder de realização ao fazer ela e sua equipe a coleta.

No entanto, a aplicação não foi uniforme em todas as localidades, ela mesma não soube responder em quais lugares foram aplicados, as gestoras dos centros comunitários e as assistentes sociais dos CRAS também não precisaram a informação. Dos questionários que encontramos, nenhum tinha sido tabulado, e assim, a partir dos dados a informação não foi gerada. O que impossibilitou fazer uma avaliação de continuidade, sobre o antes e depois do PAA. O não diagnóstico da SAN, nesse caso, por si só já caracteriza o quadro da cidade, seja pelas dificuldades encontradas em sua efetuação, seja na aproximação daqueles que mais precisam do diagnóstico.

De qualquer forma, resolvemos aplicar alguns questionários, ao longo de duas horas, enquanto as cestas eram distribuídas, no penúltimo dia de entrega em que o projeto estava em voga. A experiência serviu para dar o tom dos grupos focais. Nada do que já tinha vivido enquanto pesquisadora de campo poderia me preparar para perguntar àquelas pessoas se elas sentem fome, se passam um dia inteiro sem comer nada, se seus filhos ou outras crianças também passavam fome ou ficavam sem uma das refeições do dia.

A mera preocupação se o dinheiro ou a comida vai acabar já caracteriza um lar com insegurança alimentar leve (MDS, 2014), que foi o indicador que

mais ouvimos das pessoas. A insegurança grave, caracterizada pelos lares em que crianças passam privações (Idem), não foi captada em nosso breve campo porque, à época, em período letivo e, pelo menos nos dias de semana, as crianças comem na escola e não ficam sem pelo menos uma refeição.

Assim como será possível observar na sessão a seguir, passar pelas perguntas do questionário de qual a frequência com que comiam frutas, hortaliças, e mesmo carnes, a resposta vinha com um sorriso de constrangimento, repetia-se “quase nunca”, “nunca”. Certas categorias provocavam risadas do entrevistado, como que zombando deles, por exemplo, na pergunta “com qual frequência você costumar comer castanhas ou oleaginosas?”. As maiores frequências de resposta ficavam nos alimentos que veremos abaixo bem representados, arroz, feijão, pão, macarrão, mas também outros que não captamos nos grupos focais, como sucos em pó industrializados, embutidos como salsichas e biscoitos recheados.