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1.5 As Escolas Itinerantes: escolas dos acampamentos do MST

1.5.1 A Escola Itinerante no Estado do Paraná

A Escola Itinerante no Paraná nasce tendo como referência as experiências escolares itinerantes desenvolvidas no Rio Grande do Sul e as práticas educativas realizadas nos acampamentos e assentamentos do Paraná. No ano de 2003 o número de acampamentos neste Estado era bastante elevado, assim como o de crianças acampadas sem acesso à escola:

Com o final da era Lerner e da era FHC, e com a entrada do Lula e Requião no governo houve uma esperança muito grande do povo que agora ia sair a Reforma Agrária e nós tínhamos muitos acampamentos, final de dois mil e dois, início de dois mil e três no Paraná tínhamos em torno de quinze mil famílias acampadas, aproximadamente 67 acampamentos e muitas crianças nesses acampamentos. Na maioria desses locais onde se tinham acampamentos muito grandes as crianças estavam sem escola. Não cabia mais nas escolas do município, no distrito, não tinha mais lugar para as nossas crianças, então nós tínhamos muitas crianças fora da escola nesse momento. E ai na primeira conversa que nós tivemos com o Governo Requião sobre a jornada de lutas de 2003 estave na pauta a questão da Escola Itinerante (Entrevista, Setor de Educação).

O grande número de crianças acampadas sem acesso à escola forçou uma tomada de decisão. Nesse momento, também a conjuntura mostra-se favorável com o primeiro ano de um novo governo estadual que acena positivamente para a legalização desta escola. Cria-se então, a partir da demanda reivindicada pelos Movimentos Sociais, a Coordenação de Educação do Campo, ligada diretamente, neste primeiro momento, à Superintendência da Secretaria do Estado de Educação do Paraná46. Esta coordenação assume como principal demanda a oficialização das Escolas Itinerantes no Estado. Sua aprovação ocorre por meio do Parecer n° 1033, datado de 08/12/2003, do Conselho Estadual de Educação do Paraná, o qual aprova a Escola Itinerante como experiência pedagógica.

No entanto, a coordenadora de educação do MST no Paraná indica que o processo não foi construído sem tensões: “A aprovação do primeiro parecer no conselho não foi tão tranqüilo teve que ter todo um processo de convencimento no Conselho, principalmente na questão dos educadores serem do próprio acampamento” (informação verbal47).

As pressões por parte do MST foram indispensáveis para aprovação das Escolas Itinerantes também no Paraná. Antes mesmo da aprovação do parecer, o Movimento realizou

46 Atualmente a Coordenação de Educação do Campo está localizada na Secretaria de Educação do Paraná, no

Departamento de Diversidade, juntamente com as coordenadorias de Educação Indígena, Alfabetização de Adultos e a coordenação de Desafios Educacionais Contemporâneos.

47 Fala de Izabel Grein, dirigente nacional do MST no I Encontro de Avaliação das Escolas Itinerantes do MST,

a inauguração da Escola Itinerante Chico Mendes no acampamento José Abílio dos Santos, em setembro de 2003, contando com a presença do Secretário da Educação e outras autoridades, visando acelerar e garantir o processo de legalização desta escola. A partir de 2004 as Escolas Itinerantes iniciam oficialmente seus anos letivos. Naquele momento eram, ao total, cinco acampamentos com escolas em funcionamento. Essas escolas estavam ligadas à Escola Base – o Colégio Estadual Iraci Salete Strozak48, localizada no assentamento Marcos Freire, no município de Rio Bonito do Iguaçu, e compreende os seguintes níveis de ensino: Educação Infantil, Ensino Fundamental, Médio, Educação Profissional e modalidade de Jovens e Adultos49.

Em 2004, houve um transtorno na tentativa de enquadrar as Escolas Itinerantes na SEED, que não deu muito certo, demoram seis meses para regularizar as matrículas das crianças. Ouvimos coisas como: o estado vai comprar lona pros Sem Terra? Houve muitos questionamentos nesse sentido. Mas depois com o passar do tempo o Estado foi entendendo mellhor isso. Mas ainda hoje temos dificuldades, muitas escolas ainda não receberam o material. (...) por exemplo, tinha acampamento que tinham 420 crianças indo pra escola, mas somente 120 matriculadas efetivamente. Documentos encaminhados para escola base se perderam no meio do caminho. Tivemos que criar, adaptar formas para resolver esses problemas (informação verbal50).

Algumas destas dificuldades expressas na fala acima demonstram que a relação da Escola Itinerante com o Estado não ocorre sem conflitos, pois se tratam de duas lógicas distintas: a lógica presente no Movimento Social e a que rege o Estado, questão que trataremos mais adiante.

No Paraná, no ano de 2007, existiam 11 Escolas Itinerantes ligadas a duas escolas bases: a Colégio Estadual Iraci Salete Strozak e o Colégio Estadual Centrão. Esta segunda escola base foi criada em novembro de 2006, a título de experiência, objetivando dinamizar as tarefas referentes à garantia de documentação das Escolas Itinerantes. O Colégio Centrão está localizado no assentamento Pontal do Tigre, no município de Querência do Norte, no noroeste do Estado do Paraná. O quadro a seguir traz algumas informações sobre as Escolas Itinerantes no Paraná. Os dados referem-se à sua localização, ao tempo que as famílias estão ocupadas,

48 Para termos uma dimensão das dificuldades e das modificações enfrentadas pela Escola Base nesse período, a

diretora da escola relata: “no ano de 2003 nós tínhamos 360 alunos, em 2004 passamos para 1986 alunos. Então aumentou 1.600 alunos de um dia pro outro, e nós continuávamos com o mesmo número de funcionários” (Relatório pessoal do I Seminário de Avaliação das Escolas Itinerantes, maio 2007).

49 Sobre a história desta escola ver: MONTEIRO, Gilmar. Colégio Iraci Salete Strozake: conquistando um

latifúndio do saber. In: ITERRA. Alternativas de escolarização dos adolescentes em assentamentos e acampamentos do MST. Cadernos do ITERRA, ano III – novembro de 2003.

50 Fala de Alessandro Mariano, membro do Coletivo de Educação do MST, no I Encontro de Avaliação das

período de existência da escola, número de famílias acampadas, número de educandos e número de educadores destas escolas.

Tabela 1: Escolas Itinerantes nos acampamentos do MST no Paraná Nome da Escola

Itinerante (EI) Acampamento/Município ocupação Data da famílias n° de acampa das Início das atividades da escola n° de educand os n° de educadore s EI Antônio

Tavares Espigão Alto do 2ª Conquista/ Iguaçu

Anterior a

2003 38 Março 2003 14 05 EI Anton

Makarenko Companheira RoseliNunes /Amaporã 27/07/2005 60 Outubro de 2005. 41 06 EI Caminhos do Saber Maila Sabrina/ Ortigueira ______ 330 Outubro de 2005 95 10 EI Carlos

Marighella Elias Gonçalves de Meura/ Planaltina do Paraná

31/07/ 04 100 Setembro de

2004 70 12

EI Ernesto Che

Guevara Palmares/ Jardim Quilombos dos Olinda Em 2005 120 Em 2005 35 05 EI Novo Caminho do Campo 4 de setembro/ Céu Azul (BR 277 Km 617) 04/07/2006 68 Fevereiro de 2007 37 06

EI Paulo Freire 1°de maio/ General

Carneiro 15/08/2002 170 Junho de 2003 92 16 EI Oziel Alves Casa Nova/

Cascavel 28/09/1999 80 Fevereiro de 2007 46 12 EI Sementes do

Amanhã Chico Mendes/ Matelândia 01/08/2004 230 Abril de 2005 140 25 EI Terra Livre Terra Livre/Santa

Helena do Oeste

14/03/2006 60 Março 2006 28 08 EI Zumbi dos

Palmares 1° de Agosto/ Cascavel 01/08/2003 500 Fevereiro 2004 350 53 Total 948 158 Fonte: Relatório pessoal do I Seminário das Escolas Itinerantes, maio 2007.

Nos acampamentos: 2ª conquista e 1° de maio existiam escolas anteriormente a aprovação do parecer pelo Conselho Estadual. Estas eram extensões de Escolas Municipais, dos municípios em que se localizam os referidos acampamentos.

No ano de 2007 todas as Escolas Itinerantes atendiam a Educação Infantil e os anos iniciais do Ensino Fundamental (primeiro e segundo ciclos)51 e turmas de Educação de Jovens e Adultos. Dessas escolas, a única que possui turmas de 5º à 8º série do Ensino Fundamental e o Ensino Médio é a Escola Zumbi dos Palmares. As itinerantes no Paraná agregam em maio de 2007, um total aproximado de novecentos e quarenta e oito educandos e cento e cinqüenta e oito educadores. Porém em momentos anteriores esse número já foi bem maior. Em março de 2006 eram dois mil e trezentos e trinta e oito educandos e cento e noventa e quatro educadores. Nesse período existiam duas escolas com um número elevado de pessoas, eram as: Chico Mendes (Acampamento José Abílio dos Santos - Quedas de Iguaçu) e Olga Benário (Acampamento 10 de maio - Quedas do Iguaçu)52. Essas duas escolas não são mais Itinerantes, pois as áreas em que se encontravam foram desapropriadas, constituindo-se assim, em assentamentos. A escolarização dessas crianças, nesse momento, ocorre através de dez escolas (municipais e estaduais) localizadas nas comunidades dos referidos assentamentos.

As Escolas Itinerantes não atendem toda a população acampada no Estado Paraná, o que significa que nem todo acampamento possui escola. Em março de 2008 segundo informações do MST - Paraná, existiam neste estado 5 mil famílias acampadas em 73 acampamentos, em números aproximados. O que nos indica que há uma seleção e uma escolha para que no acampamento exista uma Escola Itinerante. Em síntese, identificamos que estes critérios definidos pelo Movimento referem-se a: a organicidade do acampamento; a organicidade do Setor de Educação (existir essa organização no acampamento, assim como responsáveis para coordenar o trabalho do setor e de assumir a escola); Pessoas dispostas e com qualificações para assumir a função de educador; e também que seja uma necessidade coloca no acampamento e discutida por todas as famílias que o integram.

Nós entendemos aqui no Paraná, que nós só vamos colocar escola, onde ela há condições objetivas de realmente a escola acontecer. A gente quer uma escola de qualidade, apesar de ser um acampamento, eles tem direito de ter uma escola de qualidade, com educadores com capacidade para dar aulas e que as crianças aprendam, e que a escola seja assumida pelo acampamento e pela direção (Entrevista, Setor de Educação).

51 Interessante é refletir sobre esses dados num momento de municipalização desta etapa do Ensino

Fundamental. Atualmente a organização do sistema educacional brasileiro coloca esta etapa como não sendo, de forma prioritária, competência dos governos estaduais.

52 Informações extraídas do folder: Escola Itinerante [2006] produzido em parceria pelo Governo do Estado do