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2.3 AÇÃO E SUAS OPERAÇÕES

2.3.1 Espaços para anunciantes externos e para a emissora

Entre as ações de caráter promocional, identifica-se a ocupação de espaços na grade de programação tanto por anunciantes externos, decorrente da compra de espaços para exibição dos seus produtos, quanto pela emissora, voltados à fala sobre a própria produção (CASTRO, 2012b, p. 80).

Quanto aos anunciantes externos, sabe-se que uma veiculação realizada em televisão atinge um número significativo de possíveis consumidores, em virtude do amplo alcance obtido, uma vez que o meio constitui uma das maiores forças para mover massas de consumidores em direção a um objetivo (adesão a uma ideia, marca, compra de um produto, utilização de um serviço, etc.). Dada a natureza comercial da televisão, a compra de espaços pelo anunciante converte-se em sustentabilidade para o negócio televisão.

A proximidade e a reciprocidade originam um estreito fluxo de troca entre emissoras e anunciantes, muitas vezes intermediadas pelas agências de publicidade. Qualquer projeto comercial de uma emissora de televisão quase sempre prevê a participação de marcas investidoras, mas também reflete a dependência que essas iniciativas têm em relação às verbas. No plano comercial relativo ao Planeta Atlântida 201416, por exemplo, a viabilidade do projeto fica condicionada à comercialização de todas as cotas de patrocínio.

A mesma proximidade pode ser examinada nas propostas relativas ao merchandising, uma vez que essa ação aponta dois caminhos possíveis de realização (SCHIAVO, 1995, p. 86- 96): (1) por iniciativa do anunciante, que contata a emissora televisiva, de forma direta ou indireta, sobre a possibilidade de abertura de um espaço para sua marca, no qual seja possível explicar conceitos, demonstrar procedimentos, exibir formas de uso, entre outros aspectos, com objetivo último de fomentar o consumo; (2) por oferta da emissora, que divulga um eventual programa futuro e projeta possíveis anunciantes, a partir das oportunidades latentes pela sinopse. Nesse caso, também conhecido como levantamento de oportunidades (LEVOPs), a emissora explora as características do programa (tramas, temas, personagens, etc.) e produz um levantamento das oportunidades, apresentados às agências e anunciantes. No caso de uma telenovela, essa apresentação “se dá em um concorrido coquetel, com a presença do autor, do diretor, de atores e atrizes que participam de elenco, contatos, pessoal de atendimento e, em alguns casos, até de anunciantes potenciais, entre outros” (SCHIAVO, 1995, p. 90).

Independente da iniciativa (anunciante ou emissora), o resultado da ação de merchandising tende a ser o mesmo, ressaltando a reciprocidade possível entre anunciante e emissora, típica das ações promocionais, nas quais novas possibilidades são criadas a partir de um fluxo de mão dupla, em que ambos se valem desses canais. Aliás, a noção de reciprocidade é característica do merchandising, que se origina, de um lado, da necessidade

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Festival de música promovido desde 1996 pela Rede Atlântida, emissora de rádio FM integrante do Grupo RBS (parceiro do Grupo Globo na região sul do país), em praias do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, durante o verão. O plano comercial pode ser acessado no endereço:

de cobertura dos custos de produção dos programas, e, de outro, da possibilidade de um anunciante ganhar visibilidade por aparecer na trama.

Dessa forma, a ação promocional decorrente do merchandising implica, em relação aos espaços ofertados aos anunciantes externos, um alargamento daquela noção de espaços predefinidos para inserção e exposição de anunciantes, como os intervalos dos programas em televisão. Além disso, diz respeito à inserção nos programas, com o intuito de valorizar o produto, pela aproximação com o apresentador, exibir a marca, colada a iniciativas do programa, e/ou propor quadros ou programas sob seu patrocínio. Cabe pontuar que não se trata de uma volta ao início da televisão, quando os anunciantes comandavam a programação, mas de uma troca, de forma recíproca e consentida, na qual os participantes agem de forma estrategicamente organizada.

As ações promocionais, tanto em favor dos anunciantes externos, quanto das emissoras, englobam ações stricto e lato sensu (CASTRO, 2010). As primeiras (stricto sensu) voltam-se pontualmente para a divulgação de qualquer produto e podem ser entendidas como mais próximas ao que se denomina de publicidade, uma vez que ocupam espaços predefinidos como publicitários e facilitam sua identificação como um ato que visa influenciar alguém em favor de uma marca (que pode ser a da própria emissora). Predominantemente são exibições autônomas, veiculas nos espaços entre os programas ou espaços intervalares.

As outras (lato sensu) são as ações construídas na e pela televisão, que misturam divulgação do anunciante com divulgação da própria emissora, extrapolando a concepção mais tradicional anteriormente referida, uma vez que “passa a comportar atos publicitários difusos e indiretos” (CASTRO, 2007, p. 126). São mensagens que parecem migrar do tradicional espaço comercial para a própria programação televisual.

No fundo, trata-se de um fazer estratégico, não importando o objeto a que se refere, que contamina a programação televisual e, ao mesmo tempo, procura atingir o consumidor. Em face às tendências de aumento do número de canais no meio televisivo, aos mecanismos de fuga dos anúncios publicitários e ao aumento das opções de entretenimento proporcionadas pela tecnologia, as emissoras procuram criar mecanismos de visibilidade dentro da própria programação, sobretudo para responder ao telespectador que, frequentemente, nos intervalos, recorre ao zapping.

Nesse cenário, enquanto os anunciantes externos exploram as possibilidades permitidas pelo veículo, as emissoras atuam em um espaço sobre o qual possuem controle total, o que leva o fazer promocional, inúmeras vezes, a ser confundido com a programação, pois alguns programas apresentam um caráter de recorrência ao próprio universo televisivo.

Torna-se comum o emprego de estratégias como participação de atores reconhecidos pela atuação em programas ficcionais em talk shows ou programas de auditório da emissora.

As ações promocionais inseridas na programação buscam romper com a racionalidade do telespectador, seu espírito crítico, em face da dimensão emocional, do encantamento, que pode levar a ações por impulso (CASTRO, 2007). Assim, a sutileza, ou a falta de identificação clara dos propósitos da mensagem, torna-se uma característica das ações lato sensu.

Pertencentes a grandes grupos empresariais, as emissoras de televisão adotam estratégias com um sentido principal: aproveitar sua força para projetar o que nela se mostra e atingir o maior contingente de público possível. Nessa tarefa, o ponto essencial em análise, por parte do veículo de comunicação, parece ser um único: as possibilidades de rentabilização. Ao mesmo tempo em que mantém certo regramento com relação às ações dos anunciantes externos, extrapola nas operações que se voltam para a própria emissora e seus fazeres.

Centrada nos próprios processos e produtos, essa fala de si mesma, em termos de conteúdo, compreende o processo comunicativo instaurado pela televisão, os programas ofertados, o crescimento tecnológico da emissora, o comando diretivo da empresa, as ações sociais que desenvolve na comunidade, os atores e personagens de seus programas (CASTRO, 2010, p. 3).

Frente ao volume de produção e ao acirramento da concorrência (entre emissoras e, também, plataformas), parece natural que as emissoras abram espaços para a autopromocionalidade, ou seja, para falar de si mesmas (CASTRO, 2009, 2010, 2012b). No Brasil, a televisão segue a relação de mercado, demarcada pela lógica entre oferta e demanda. As cinco redes privadas17 (Globo, SBT, Record, Band e Rede TV!) demonstram vasta capacidade produtiva, o que origina uma indústria com tamanho considerável, em comparação com outros países. Tomando como exemplo apenas a ficção, produzida e veiculada, foram ofertadas, no ano de 201218: 1.503 horas de ficção nacional; 35 títulos de ficção nacional; 2.186 capítulos/episódios (Brasil e México são os únicos países do Obitel a superar os dois mil capítulos ofertados). Ainda, dos países ibero-americanos (analisados pelo Obitel), coube ao Brasil o maior número de títulos de ficção no ranking dos mais vistos, ocupando oito dos dez primeiros lugares, todos produzidos pela Globo, sendo sete telenovelas e uma minissérie.

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Segundo Lopes e Gómez (2013), existem no Brasil seis redes nacionais de televisão aberta, das quais cinco são privadas e a TV Brasil é estatal.

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Quanto aos horários de veiculação, das campeãs de audiência citadas, uma foi exibida à tarde, seis no horário nobre19 e três à noite (LOPES; GÓMEZ, 2013).

A liderança de produção da TV Globo frente às demais emissoras também se reflete na audiência. Segundo dados do IBOPE20, o início desta década mostrou a Globo com uma audiência equivalente às outras quatro juntas, e, reconhecidamente, como a emissora líder no país, que, no mais das vezes, chega até a condicionar os hábitos dos telespectadores. Naturalmente, nem todos os períodos de aferição têm a mesma disparidade de audiência, como já apresentado no gráfico 2.

Os números de 2014 e início de 2015 indicam que, em linhas gerais, a televisão enfrenta períodos de perdas e outros de recuperação de público. A Globo, na condição de emissora líder, teve uma perda de cerca de 10% do seu público nos últimos anos21. Em abril de 2014, a programação de novelas (Meu pedacinho de chão, 17 pontos em média; Além do horizonte, 19 pontos em média; Em família, 26 pontos em média) e até o Jornal Nacional (JN) (18 pontos), pilares de sustentação da programação, refletiam números preocupantes para a emissora. Os motivos seriam o aumento da concorrência, as mudanças dos hábitos dos telespectadores, outras formas de entretenimento eletrônico e rejeição à própria Globo. Em janeiro de 2015, a situação parece outra para a emissora líder: ambas as novelas (Boogie Oogie e Alto Astral) que antecedem o JN atingiram em torno de 20 pontos de audiência, enquanto Império, sucessora de Em família, mantém-se em torno de 38 pontos22.

É nesse contexto que as emissoras recorrem à fala de si. Aliás, conforme afirmam Contreras e Palacio ([s.d], p. 152, tradução livre), “todos os estudos realizados até hoje confirmam, uma vez ou outra, que não existe melhor suporte para promover produtos

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“A composição da programação varia de emissora a emissora. Mas ela é basicamente integrada por cinco categorias: novelas, noticiários, filmes, shows e entretenimento infantil. A distribuição se faz em quatro faixas horárias, sendo o horário nobre compreendido entre 19 e 22 horas. As outras faixas são matutina (6 às 12 horas), vespertina (12 às 18 horas) e noturna (22 às 5 horas). Quase sempre a última faixa se interrompe à meia-noite ou a 1 da madrugada, nos dias da semana. Enquanto as novelas são exibidas durante o horário nobre e o horário vespertino, os filmes ocupam principalmente o horário noturno. Os noticiários se distribuem ao longo de toda a programação, sendo que nas principais emissoras são difundidos no horário nobre, entre 19 e 22 horas. Por sua vez, os programas infantis se localizam na programação matutina e vespertina, cabendo aos shows espaços privilegiados no prime-time ou na programação noturna, especialmente no fim de semana” (MELO, 2010, p. 37). 20

Informações do Mídia Dados Brasil 2013, estudo com informações demográficas, mercadológicas e comerciais referentes ao setor de mídia e editado pelo Grupo de Mídia São Paulo.

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Informações disponíveis em http://diversao.terra.com.br/tv/nada-interrompe-a-queda-de-audiencia-da- globo,3663cbc7a23b5410VgnVCM3000009af154d0RCRD.html. Acesso em: 2 mai. 2014.

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Informações disponíveis em http://diversao.terra.com.br/tv/sala-de-tv/blog//2015/01/09/novelas-da-globo-se- recuperam-apos-queda-drastica-de-audiencia/. Aceso em: 03 fev. 2015.

televisivos do que o mesmo monitor onde são exibidos23”. Além disso, em um ambiente de transmidiação, o meio digital tem aumentado a participação nos índices de acesso e levado as emissoras a ocupá-lo também, transformando o movimento de valorização do próprio fazer em operação de autopromocionalidade.

No plano organizacional, inclusive, as emissoras de televisão instauram estruturas que buscam assegurar viabilidade e visibilidade no mercado. Para tanto, instituem, por exemplo, a Direção de Autopromoção, ligada ao departamento de programação, atividade tida sob a responsabilidade de competentes profissionais da área, geralmente com experiência em produção, publicidade e/ou marketing (CONTRERAS; PALACIO, [s.d]).

No Brasil, a estrutura da Rede Globo pode ser usada para demonstrar essa organização. A partir de Almeida (2006)24, identifica-se na emissora um departamento específico voltado exclusivamente às ações de divulgação da emissora. Convém ressaltar que, na época da pesquisa da autora, a emissora contava com cinquenta e dois profissionais entre gerentes, produtores, editores, redatores, videografistas, sonoplastas, assistentes e estagiários.

A atividade promocional e autopromocional no meio televisivo extrapola o ambiente de suas práticas e ganha contornos de um verdadeiro mercado de promoção: existem organizações como a Promaxbda (The international association for entertainment marketing professionals), uma comunidade mundial que envolve profissionais de marketing e divulgação de conteúdos de vídeo e televisão (CONTRERAS; PALACIO, [s.d]). A realização de grandes convenções internacionais constitui-se em uma forma de intercâmbio de experiências e descoberta de novas tendências de um dos departamentos mais adeptos à inovação em televisão25.

Ainda segundo Almeida (2006), a Globo mantém, no plano operacional, profissionais da área que desenvolvem tarefas de criar e produzir os materiais de divulgação da programação televisiva, principalmente os materiais publicitários; planejar a inserção dos materiais criados de forma a atingir o público pretendido para o programa em foco; analisar, a

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Todos los estudios realizados hasta la fecha confirman uma y outra vez que no hay mejor soporte para promocionar productos televisivos que ele mismo monitor donde se van a difundir.

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Consideradas de caráter estratégico pela emissora, informações sobre o departamento de promoções, estratégias da emissora e informações similares não são repassadas, mesmo através do Globo Universidade. Assim, o trabalho de Almeida (2006) torna-se relevante, uma vez que a autora fez parte do quadro funcional e das atividades da emissora durante um longo tempo. Ressalta-se, porém, que atualmente a estrutura de promoção da emissora pode ter sofrido mudanças, uma vez que se passam alguns anos da pesquisa relatada.

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Ao analisar o site é possível notar que um dos eventos mais representativos do segmento é realizado anualmente nos Estados Unidos e que existem eventos sobre o tema em todos os continentes. Site: http://promaxbda.org/.

partir da audiência e dos objetivos estabelecidos para determinado programa, necessidades de mudanças nas estratégias adotadas.

Tais ações, em qualquer plataforma, têm como objetivos: “vender” um produto, no caso, um programa de televisão; criar expectativa em torno do novo produto midiático, quando se tratar de um lançamento; familiarizar o telespectador com as ofertas da emissora; criar um laço social entre os programas da emissora e o público que vê televisão; produzir uma identificação com os telespectadores através de sua memória emocional; fazer com que os temas dos produtos midiáticos sejam incorporados nos discursos interpessoais; divulgar o programa ou a emissão a que se refere, de forma a gerar audiência (ALMEIDA, 2006).

Isso mostra a necessidade permanente da Globo investir em divulgação dos próprios produtos, com a definição de ações e de profissionais competentes para realizar essas tarefas e dar visibilidade à empresa, reforçando a busca permanente por um produto qualificado.

Frente a isso, a autopromocionalidade ganha relevância por um aspecto principal: deve funcionar como um elemento facilitador da compreensão do programa e responsável por atrair o telespectador. Assim, segue os traços da publicidade: mantém aspectos que reforçam os laços existentes e, ao mesmo tempo, oferece algo novo, através do qual procura cativar, criar sentido para o telespectador por meio da inovação. A essência do promocional, muitas vezes, não é o totalmente novo, mas uma proclamação do novo (CIACO, 2013), mesmo o que já foi utilizado.

A ocupação da programação por ações autopromocionais representa uma organização estratégica que visa atingir o telespectador, em patamares estabelecidos a partir de cada programa, uma vez que “nada é feito à toa ou por acaso. O objetivo, o tempo todo, é criar uma identificação, uma expectativa altamente favorável para a história, visando sempre à conquista de altos índices de audiência, fator prioritário na emissora” (ALMEIDA, 2006, p. 66).

Assim, a abertura de espaços na programação para as ações de autopromoção tornam-se corriqueiras em face da natureza do negócio televisivo e a busca pelo sustento. Há de se levar em conta fatores que contribuem para a situação, como a quantidade de programação diária exibida, os custos de produção, o volume de trabalho empreendido para produzir, etc. Diante disso, recorrer ao próprio universo acaba sendo também uma estratégia de sustentabilidade e facilitação por parte de uma emissora.