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A opção anterior de abordar a televisão brasileira em seu contexto sócio-político- econômico deixou de lado, propositalmente, aspectos a respeito do empreendimento, ora retomados, a fim de demonstrar sua natureza e, especificamente, a relação com a publicidade.

Para tanto, são examinados, como ponto de partida, os critérios subjetivos de televisão (SCORSIM, 2007) e os pré-requisitos para delimitação da natureza de uma emissora televisiva (BUCCI, 2010).

A partir disso, acredita-se ser possível identificar variantes importantes que caracterizam o meio e sua forma de atuação, que dizem respeito, especificamente, ao sistema de concessões, à natureza jurídica do empreendimento, ao modo de gestão e à forma de sustentabilidade/financiamento. Assim, procura-se conhecer as condições internas do meio, tratadas como mais relevantes no contexto de desenvolvimento da comunicação de massa no Brasil (MATTOS, 2002).

Quanto ao sistema de concessões, um retorno ao período de surgimento da televisão mostra que o empreendimento iniciado por Chateaubriand muito se deveu ao seu trânsito pessoal e profissional no campo político. A concessão para funcionamento da emissora pioneira na América Latina, a TV Tupi, é fruto desse estreito relacionamento com as autoridades governamentais. Na época, também receberam concessões a TV Record, de São Paulo, e a TV Jornal do Comércio, de Recife.

Desde o início, as concessões foram estreitamente ligadas à esfera política e quem dela fazia parte9, especialmente até 1988, quando é promulgada a Constituição Federal pós- regime militar. Em 1931, foi expedido o decreto 20.047, o primeiro a tratar exclusivamente das concessões do sistema de radiodifusão, através do qual se estabeleceu que a competência de outorga e controle do espectro cabia ao poder Executivo Federal. Especificamente, era o Presidente da República quem destinava as concessões, em sua maioria, a empresários e amigos próximos, prática mantida inclusive no período militar, no qual eram agraciados os apoiadores do regime (MATTOS, 2002).

A criação do Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei nº 4.117, de 1962) não alterou as ideias centrais do sistema de concessões em vigência, bem como o decreto-lei nº 236, de 1967, que, por sua vez, concentrou ainda mais a função de outorgas e reforçou o caráter nacional da radiodifusão, inserindo artigos do CBT para ratificar a impossibilidade de execução desses serviços por estrangeiros e/ou pessoas jurídicas, além de condicionar a renovação das concessões ao cumprimento de critérios educativos, culturais e outras obrigações legais.

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Uma fonte que demonstra a proximidade entre mídia e política é o site Donos da mídia, que reúne dados públicos e informações fornecidas pelos grupos de mídia para montar um panorama completo da mídia no Brasil, na qual é possível verificar o grande número de veículos de comunicação comandados por políticos de todos os poderes e esferas. Disponível em http://donosdamidia.com.br/. Acesso em 25 jun. 2014.

A Constituição Federal de 1988 trouxe mudanças. O Poder Executivo passou a dividir a competência sobre as outorgas e renovações de concessão, permissão e autorização com o Congresso Nacional, a quem, por sua vez, compete a função de apreciar os atos de outorga e renovação enviados pelo Executivo, bem como decidir sobre uma não renovação. Assim, as concessões saíram das mãos dos militares para as do Congresso Nacional. O Ministro das Comunicações tem papel importante nessa estrutura, cargo ocupado pela primeira vez, no regime democrático, por Antônio Carlos Magalhães, um dos políticos também dono de diversas concessões de radiodifusão no país.

A proximidade da comunicação com a política também permitiu – em meio a uma crise financeira da grande mídia brasileira –, em 2002, a aprovação da lei nº 10.610, que possibilitava a participação estrangeira no capital das empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora de sons e imagens. Pelo contexto da crise, a aprovação ocorreu graças à proximidade entre as duas esferas (da mídia e da política) e ao sistema de reciprocidade comumente em prática.

Mesmo as mudanças mais recentes na legislação, ocorridas em 2012, apenas reforçam a manutenção do sistema de radiodifusão atual e certo privilégio a quem dele faz parte. As determinações aprovadas obrigam o participante de um processo licitatório a comprovar capacidade técnica e financeira, através de pareceres técnicos, bem como elaborar um plano de investimento e apontar a origem dos recursos aplicados. Segundo o Ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, as novas regras buscam “prestigiar quem é do ramo, procurando evitar que pessoas entrem nas licitações simplesmente para especular” (MINISTÉRIO DAS COMUNICAÇÕES, 2014).

Esse breve panorama configura a televisão brasileira como um mecanismo a serviço do governo e objeto de lutas e manobras no campo da política para a defesa dos interesses de ora uma, ora outra organização/pessoa. Percebe-se que, mesmo após mais de sessenta anos do surgimento, não há uma distribuição de forma democrática das concessões e uma centralidade, primeiramente, aos interesses sociais.

Quanto à natureza jurídica do empreendimento, as concessões de televisão são feitas para pessoas, ou seja, trata-se de propriedade privada. Embora a legislação mantenha o controle da radiodifusão com o Governo Federal, ocorre a delegação do serviço a um interessado, em um trabalho recíproco e vantajoso para ambos, desde que respeitados os critérios estabelecidos pela legislação que prevê a complementaridade entre os sistemas estatal, público e privado (BRASIL, 2012).

A denominação referida pela Constituição causa confusão quanto à natureza jurídica, uma vez que o Código Brasileiro de Telecomunicações (CBT), anterior à Constituição, distingue apenas serviços de radiodifusão e de radiodifusão exclusivamente para fins educativos, divisão na prática considerou as emissoras como estatais e/ou comerciais. Ao citar o estatal, o público e o privado, como sistemas que devem atuar de forma complementar, a Carta Magna busca corrigir equívocos da origem, do surgimento da televisão no país, essencialmente comercial. Além de considerar a divisão entre estatal e comercial, convencionou-se denominar alguns canais de públicos, especificamente aqueles estatais explorados por entidades originadas em alguma esfera da Administração Pública.

O problema se encontra em como definir a categoria pública de televisão. [...] Quando o Estado brasileiro iniciou, tardiamente, seus serviços, encontrou um sistema comercial consolidado, não se preocupando em formar uma rede única de televisão do campo público. A hipótese de uma TV pública independente do Estado e com controle social, então, nunca esteve em cogitação. Após o início das atividades estatais no campo da radiodifusão, percebeu-se a necessidade de se ter parte das emissoras de televisão sob controle da sociedade e, em 1988, levando em conta o legado estatal já existente, previu-se a separação em três modalidades complementares (NAZARENO, 2007, p. 5).

Diante disso, entende-se que é pertinente diferenciar as emissoras de televisão, estatais, públicas e privadas, por sua natureza jurídica. A emissora estatal refere-se a uma empresa composta como uma sociedade empresarial que tem seu controle direto ou indireto vinculado a uma das esferas do Estado, ou seja, atua sob controle da União, dos Estados, do Distrito Federal ou de um município. A emissora privada caracteriza-se por ser uma propriedade particular, ou seja, atende aos interesses de quem a concebeu, recebeu uma concessão e por ela responde. A emissora pública atua sob responsabilidade de “figuras jurídicas como fundações (regidas pelo direito privado), Oscips (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público) e Ongs (Organizações Não Governamentais)” (BUCCI, 2010, p. 11).

O modo de gestão de uma emissora estatal está diretamente relacionado ao ente governamental responsável por ela, ou seja, à esfera que a emissora pertence, que influencia no sistema de controle. Isso abrange a indicação de gestores e de procedimentos de gestão adotados. Em uma emissora privada, a gestão está atrelada a quem mantém o controle, ou seja, pessoa ou empresa que recebeu o direito de explorar a concessão. Dessa forma, a partir de sua natureza empresarial, que visa ao lucro, a gestão administrativa, financeira e editorial segue os parâmetros estabelecidos em função dos objetivos particulares delimitados. Nas emissoras públicas, o sistema de gestão deve ser independente, “não devendo prestar contas à

vontade política das autoridades ou ao apetite por audiência tão próprio do mercado” (BUCCI, 2010, p. 11). O interesse público deve sobrepor-se a interesses particulares ou pontuais, fato que leva as emissoras dessa natureza a estabelecerem conselhos de gestão com independência e transparência, em uma gestão autônoma.

A forma de financiamento inclui as “fontes geradoras de receita ou de recursos financeiros que viabilizam qualquer iniciativa ou atividade da instituição em questão – desde pagamento de seus colaboradores, aquisição de bens, de conteúdo, de tecnologias, contratação de serviços, treinamentos, etc.” (CURY, 2010, p. 3). No caso do sistema estatal, os recursos são oriundos da esfera governamental à qual a emissora está vinculada.

Nas emissoras privadas, os interesses específicos (tanto de pessoa jurídica quanto física) e peculiares de quem a administra determinam a forma de financiamento. As emissoras de televisão privadas, ao qual pertencem as maiores redes do país, adotam o modelo de mídia para o grátis (ANDERSON, 2009), no qual um anunciante subsidia o conteúdo, de modo que o telespectador possa recebê-lo gratuitamente e o veículo alcance sua sustentação. Dessa forma, a publicidade constitui-se na principal fonte de financiamento televisivo brasileiro, que ainda conta com recursos oriundos da venda de seus produtos midiáticos, entre outras possibilidades menos significativas no contexto atual.

O financiamento das emissoras públicas tem como pré-requisito básico a desvinculação tanto de um governo quanto do mercado. Pode vir de fundos específicos, de taxas cobradas de cada domicílio, previstas em lei, de donativos ou de outras contribuições espontâneas, etc.

O que mais conta, aqui, é que a origem do dinheiro não se reflita, nem mesmo indiretamente, na orientação editorial da emissora, para que interesses particulares (partidários, familiares, religiosos, empresariais ou de movimentos sociais mais ou menos organizados) não exerçam pressão sobre a definição da pauta jornalística e da programação em geral (BUCCI, 2010, p. 1).

A partir da abordagem das variantes constitutivas dos sistemas de televisão, cabe pontuar de forma prática a situação das emissoras brasileiras. Na condição de emissora estatal, enquadra-se a TV Cultura, que, por seu caráter educativo, muitas vezes é classificada como pública, fato que também ocorre com outras do setor de radiodifusão, como a Radiobrás, empresa estatal do Poder Executivo, e a TV Câmara, da Câmara dos Deputados. Para Nazareno (2007, p. 5), seriam mais bem denominadas de “emissoras do campo político”. A interferência estatal é determinante para afirmar que não atingem a plenitude de independência para uma emissora pública. A TV Brasil é uma das mais recentes também

pertencentes à categoria estatal. “Sua meta é difundir uma imagem favorável do chefe de Estado e de governo, o que caracteriza comunicação de governo, não comunicação pública” (BUCCI, 2010, p. 14).

Quanto às emissoras públicas, a situação é incipiente. Inicialmente há um contexto que confunde público, estatal e educativo. “No Brasil, não há emissora pública realmente independente. Todas, e elas são muitas e diversas, submetem-se, raramente com elegância, mais raramente ainda com discrição, e no mais das vezes com desfaçatez, às idiossincrasias da autoridade” (BUCCI, 2010, p. 12). Mesmo as emissoras educativas não se encaixam plenamente no enquadramento como emissora pública, o que implicaria, efetivamente, um espaço comunitário, onde se incluem as minorias, sem prezar por um ou outro, e a desvinculação total de dependência do Estado ou de organizações com fins lucrativos e/ou interesses mercadológicos. Realmente há emissoras educativas, porém não na totalidade dos números apresentados no país.

O conceito de emissora pública constitui-se a partir de três pré-requisitos: a natureza jurídica da instituição, que não pode, em nenhuma hipótese, ser propriedade particular; financiamento de caráter público, desvinculado de interesses governamentais ou comerciais; e, por fim, a gestão independente da emissora, sem precisar prestar contas aos interesses das autoridades ou da audiência (BUCCI, 2010).

Embora o trabalho procure distinguir emissora estatal, pública e privada, cabe novamente ressaltar que mesmo as publicações dos órgãos responsáveis pelo setor de radiodifusão no país não se atêm e/ou esclarecem sobre tais nomenclaturas, de forma que inúmeras vezes são mencionadas simplesmente a TV comercial e a TV educativa. O principal exemplo já foi citado: as diferentes nomenclaturas no CBT e na Constituição. Outro exemplo advém da pesquisa “TV aberta: mapeamento”, realizado pela Agência Nacional do Cinema, na qual a expressão “radiodifusão de sons e imagens” é tratada como sinônimo de TV aberta O estudo denomina as emissoras de comerciais e de finalidade educativa e cultural (ANCINE, 2011, p. 4). A mesma denominação é expressa em dados do Setor de Comunicações, do Ministério das Comunicações, que dividem as emissoras de televisão em comercial e educativa.

Diante disso, torna-se comum empregar o termo televisão como sinônimo de uma categoria. Especificamente, refere-se à TV aberta, comercial, que totaliza 300 emissoras no país, além de possuir ainda 6.334 retransmissoras, enquanto a televisão educativa possui 163

emissoras10. Tais números respaldam também o que ocorre na disputa entra os diferentes tipos de emissoras por audiência e cobertura, entre outros critérios.

As grandes redes de emissoras de televisão comercial dominam o cenário televisivo brasileiro, levando-se em conta critérios de cobertura geográfica (Gráfico 1), de share e de participação na audiência das redes11. Os números demonstram alcance da quase totalidade dos municípios e domicílios brasileiros, especialmente por parte da maior rede, a Globo. Ainda, cabe ressaltar que se nota um detalhamento preciso nos números dessas emissoras privadas, fato que não ocorre com as demais, públicas e estatais, enquadradas como “Outras” ou nem incluídas nessas estatísticas, uma vez que não possuem sinal aberto.

A partir disso, pode-se considerar que a natureza da televisão brasileira é essencialmente privada, também denominada como televisão comercial.

Gráfico 1 – Cobertura geográfica de TV Fonte: Grupo de Mídia São Paulo (2014).

A televisão privada no Brasil, como já referido, é gerida por seus concessionários (pessoa física ou jurídica), ou seja, quem possui o direito de explorar o serviço e, assim, estabelecer o modo de gestão e a forma de financiamento que melhor convier aos seus interesses. Entende-se que justamente a questão do financiamento contribua substancialmente para a compreensão do universo televisivo brasileiro e seus mecanismos de sustentação.

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Dados sobre o Setor de Comunicações, do Ministério das Comunicações, com dados referentes ao mês de maio de 2014, disponíveis em http://www.mc.gov.br/DSCOM/view/Informacoes.php. Acesso em: 07 jul. 2014. 11

Audiência, numa definição breve, é o conjunto de pessoas que estão assistindo a determinado programa televisivo e pode ser calculada por pessoas ou domicílios. Share é a participação de cada emissora em relação ao total de televisores ligados.

Os laços entre a televisão e a publicidade são oriundos da época de implantação da primeira emissora. Antes mesmo da estreia, ocorrida em setembro de 1950,

no dia 4 de julho, em transmissão não oficial, Frei Mojica, ex-galã de cinema, canta alguns hinos religiosos mas sua imagem não ultrapassa os limites do saguão e só pode ser vista nos poucos aparelhos instalados ali mesmo, nos Diários Associados, na Rua 7 de abril, bem no centro da cidade. Essa transmissão, de caráter experimental, já conta com patrocínio – provavelmente o primeiro da história da televisão brasileira – e, o „prestígio‟ corre por conta das goiabadas marca Peixe, muito populares na época (SIMÕES, 1986, p. 22).

Outro fato que reforça essa aproximação é o próprio discurso de Chateaubriand na inauguração da emissora pioneira. De acordo com suas palavras, o empreendimento da televisão só ocorreu pela união dos Diários Associados com a Companhia Antárctica Paulista, a Sul América Seguros de Vida e suas subsidiárias, o Moinho Santista e a organização F. Pignatari, uma vez que o transmissor foi adquirido com recursos por elas investido em publicidade (SIMÕES, 1986).

Nos tempos iniciais, a própria emissora recorre à publicidade na tentativa de consolidar seu empreendimento. No intervalo comercial da inauguração, os seguintes textos foram veiculados:

Televisão, uma nova modalidade do rádio, apenas entrou em seu período de desenvolvimento. Por isso, agora é o tempo indicado para que adquira os conhecimentos de uma carreira brilhante e próspera, numa indústria que não tem semelhante no que diz respeito ao seu rápido desenvolvimento. Talvez não volte a se apresentar em sua vida uma oportunidade semelhante. Se a televisão não chegou ainda ao lugar onde reside, pode ter certeza de que aí chegará mais rapidamente do que supõe. Pense e obre agora mesmo.

Você quer ou não quer a televisão? Para tornar a televisão uma realidade no Brasil, um consórcio rádio-jornalístico investiu milhões de cruzeiros! Agora é a sua vez – qual será a sua contribuição para sustentar tão grandioso empreendimento? Do seu apoio dependerá o progresso, em nossa terra, dessa maravilha da ciência eletrônica. Bater palmas e aclamar admirativamente é louvável, mas não basta – seu apoio será efetivo quando você adquirir um televisor. Retrata o mundo em seu lar (SIMÕES, 1986).

Tais anúncios também forma publicados em jornais e revistas, posteriormente à inauguração das emissoras em São Paulo e Rio de Janeiro, na tentativa de mobilizar diversos públicos, com vistas a apoiar e apostar na televisão. Porém, era preciso certo esforço para comprar a ideia, e, principalmente, para comprar aparelhos transmissores. A publicidade encarregava-se de questionar o público sobre a sua postura frente ao novo invento evolucionista.

Nessa época, os anúncios eram, de forma geral, produtos de pouca elaboração, muitas vezes simulando o formato dos cartazes. As garotas-propaganda constituíam-se no diferencial e no apelo mais criativo nos comerciais, com suas aparições ao vivo e sempre cercadas de improvisos, uma vez que era constante a necessidade de contornar imprevistos.

As agências de publicidade estrangeiras e os anunciantes também podem ser citados por contribuírem no desenvolvimento do meio. Em função de sua incipiência, a televisão não conseguia atingir um grande público e, consequentemente, investimentos publicitários. Diante disso, a experiência em outros mercados fez com que agências e anunciantes utilizassem “a televisão brasileira como veículo publicitário, passando a decidir, também, o conteúdo dos programas” (MATTOS, 2002, p. 70), o tipo de programas produzidos e veiculados, além de contratar de forma direta artistas e produtores.

Assim, na primeira fase da televisão, a relação entre emissoras e anunciantes tem peso favorável ao segundo, que aluga o horário, paga as despesas e tem seus interesses atendidos da forma que melhor convier. Trata-se da política de loteamento, uma antítese do conceito de programação (SIMÕES, 1986). Às emissoras restava ceder instalações e equipamentos e, posteriormente, veicular os programas, que, durante as duas primeiras décadas da televisão, muitas vezes eram identificados com o nome do anunciante patrocinador12 e/ou já conhecidos através do rádio.

Essa situação somente começa a ser alterada com a chegada da TV Excelsior, nos anos 60, com a definição de departamentos especializados nas emissoras e o estabelecimento de uma programação, o que já havia sido iniciado pela TV Rio. Assim, os anunciantes passam a veicular seus reclames nos intervalos entre os programas e a apoiar determinado programa, subordinando-se ao que é definido pelas emissoras através de seus departamentos. A estratégia da Excelsior, da qual a programação é apenas uma parte mais evidente, busca alterar o panorama televisivo. A emissora investe na formação de um corpo técnico e de elenco artístico, para garantir sua fatia de mercado, quebrando com o que parecia ser um acordo de cavalheiros que mantinha uma televisão desorganizada e morna (SIMÕES, 1986).

A proposta de mudança da TV Excelsior é continuada pela TV Globo, que, por sua vez, já nasce com uma estrutura profissional. A organização da programação é baseada em critérios de horizontalidade, ou seja, a apresentação reiterada de programas nos mesmos horários, como as novelas e os telejornais, e de verticalidade, da ordem sequencial dos

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No início da década de 50, a televisão exibiu programas que tinham no nome referências ao patrocinador, como: Telenotícias Panair, Repórter Esso, Telejornal Bendix, Reportagem Ducal, Telejornal Pirelli, Gincana Kibon, Sabatina Maisena, Teatrinho Tirol, entre outros.

programas durante o dia. Embora a organização fosse uma forma de romper com imposições dos anunciantes, o modelo de televisão proposto buscava viabilidade nos investimentos publicitários. A concepção pode ser comparada ao modelo americano, que, a partir dos anos 30, já realizava a venda dos espaços para empresas de publicidade, em busca de sustento e rentabilidade (CONTRERAS; PALACIO, [s.d.]).

Na televisão brasileira, a publicidade pode ser dividida em duas fases: “pré e pós- Globo” (KEHL, 1986, p. 218). Diversos são os fatores que permitem chegar a tal conclusão. Primeiramente, as pessoas responsáveis pela concepção da emissora têm origem e proximidade com o campo publicitário e empresarial. Roberto Marinho, o idealizador do empreendimento era jornalista e empresário, embora pouco participasse do cotidiano da