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2.3 AÇÃO E SUAS OPERAÇÕES

2.3.2 Organização da grade

Outra ação, relativa à promocionalidade diz respeito à própria distribuição na grade de programação, ou seja, compreende ações de colocação do produto em determinada posição, conforme a plataforma que o veicula, e, em relação direta, com os objetivos pretendidos junto ao público telespectador.

A atividade de programação de mídia mostra-se dinâmica e dificilmente suas ações podem ser mensuradas de forma isolada. As técnicas e estratégias empreendidas podem ser organizadas em três nucleações concomitantes: 1) a construção da grade; 2) a do tensionamento com a concorrência; 3) as providências de contraprogramação, em busca da conquista ou manutenção da liderança de audiência (CARDOSO FILHO, 2009, p. 45).

Na continuidade da reflexão, examinam-se as duas últimas nucleações propostas pelo autor para, depois, aprofundar a nucleação relativa à construção da grade.

Programação e contraprogramação são duas faces do embate pela audiência. Uma emissora observa a outra e tenta delinear ações estratégicas a partir de seus pontos fortes e fracos, na tentativa de antecipar a ação do concorrente e, ao mesmo tempo, criar sua imagem e identidade. Diante disso, uma emissora pode investir de forma maciça em um programa e ser combatida pela concorrente com outro de custo menor, centrado em uma proposta criativa, diferenciada, com aceitação similar em termos de audiência. Outra situação é a colocação do programa em determinado espaço da programação, seguindo o chamado teto de audiência, que se resume, basicamente, a conhecer o limite e o objetivo de audiência da emissora em determinado horário.

O tensionamento pela concorrência leva em conta a situação de disputa de mercado entre as empresas midiáticas. Em busca de equilíbrio na audiência, as emissoras organizam a programação com base em fatores como: a) programas líderes, pois esses tendem a repassar alguma ou toda a parcela de audiência para o que o segue; b) períodos de maior e de menor concorrência; c) audiência polarizada entre poucas emissoras, que leva a um confronto direto, quando uma oferece um programa de gênero oposto (contraprogramar), ou o mesmo gênero com tonalização diversa (blunting, neutralizar), ou recorre a formatos complementares que aprofundem uma temática ou, por fim, o apelo a um formato de público inverso ao da emissora concorrente (camas separadas).

Nessa perspectiva, nota-se que a composição da grade de programação de uma emissora televisiva tensiona a condição do canal em relação às concorrentes. No Brasil, a Rede Globo ocupa a posição de emissora líder, seguida por SBT e Record, que disputam entre

si o posto de segunda colocada. As ações de programação, especialmente das emissoras que não detêm a liderança, são tomadas em função de quem lidera, no âmbito geral ou em determinado horário, como forma de acirrar, ao máximo possível, a concorrência.

Outra ação definida a partir da concorrência diz respeito às estratégias de extensão temporal e sequencial dos programas. Em relação ao primeiro ponto (extensão temporal), o término de um programa de uma emissora pode “atrasar” em relação ao início do programa de outra (procedimento de brinding, fazer ponte), na tentativa de evitar o zapping, ou programas de impacto podem ser concentrados em períodos em que a concorrente tiver um lançamento. Quanto ao segundo ponto (extensão sequencial), um programador pode buscar um efeito de aglutinação da audiência, ou seja, agregar mais audiência ao programa líder (bandwagon, comboio) e, consequentemente, obter fidelidade. É um caso típico das telenovelas, em que os telespectadores tendem a assistir aos capítulos desde o início.

Em que pese a relevância das nucleações apontadas (contraprogramação e tensionamento com a concorrência), o interesse, no âmbito deste trabalho, centra-se nas questões relativas à construção da grade. Essas duas nucleações deixam de ser aprofundadas, uma vez que exigiria um esforço de acompanhamento das demais emissoras e suas práticas, o que se entende ser inviável no atual momento, frente ao volume de textos relativos ao lançamento em estudo.

As ações referentes à construção da grade baseiam-se, primordialmente, em dois movimentos que determinam: pilares de sustentação da programação (estruturação horizontal); e fio condutor de ligação entre os programas ao longo do dia (estruturação vertical). A estruturação horizontal está relacionada à definição desses pilares que desempenham um papel de escudo, na medida em que constituem programas básicos que buscam tornar-se a “primeira opção” para o telespectador, em cada faixa horária. Até porque, “a emissora que sai na frente, com o programa líder, sabe que o desenrolar da noite vai depender de manter essa audiência até o final”26

(CONTRERAS; PALACIO, [s.d.], p. 184, tradução livre). A estruturação vertical corresponde à ligação entre os programas que se sucedem diariamente na grade da emissora, com a finalidade de conquistar empatia do público para a sequência ofertada.

Essa mesma organização é apontada por Duarte, ao analisar a Rede Globo, que, na visão da autora,

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“la cadena que arranca com el programa líder sabe que el desarollo de la noche va a depender, em buena medida, de que consiga arrastrar hasta el final a la audiência que tiene assegurado com su programa estelar”.

adota um formato fixo de programação, ou seja, uma grade fixa, tanto na vertical (sequência dos programas no dia), quanto na horizontal (a sequência ao longo dos dias da semana), na qual o horário nobre é preenchido com duas novelas de temática mais leve, encaixadas por telejornais curtos e sintéticos (o jornal local e o Jornal Nacional), uma telenovela de produção nobre e com enredo mais forte, a atual novela das nove e, a partir das 22h, com uma linha que comporta filmes, futebol, seriados e mininovelas produzidos pela emissora e reportagens (Globo repórter), todos apresentados com bastante regularidade de horário e programação. Essa grade vem sendo mantida com pequenas alterações desde 1976, sendo fielmente cumprida pela emissora, exceto aos verões, após as 22h, quando a programação do horário é substituída por minisséries, reprises de filmes e o Big Brother Brasil. A permanência desse padrão tem sido decisiva para a conquista da liderança de audiência (DUARTE, 2013, p. 332).

Na estruturação diária (vertical) são comuns as ações de interferência nas inserções publicitárias, o que significa reduzir o espaço do anunciante entre um programa e outro, ou seja, entre o bloco final de um programa e o inicial do subsequente, e aumentar o número de anúncios nos blocos centrais. Trata-se da técnica de seamlessness (continuidade sem rompimentos), que, nos últimos tempos tem sido frequentemente utilizada pelas emissoras.

Outra ação referente à organização diária da grade diz respeito à progressão da faixa etária dos telespectadores, técnica denominada de aging the demos (envelhecendo os grupos demográficos), que tem como objetivo minimizar as perdas de público cativo, ou seja, visa manter a audiência conquistada com o passar do dia, evitando mudanças bruscas no tom, de um programa a outro. Outra ação relaciona-se com retorno de formatos do mesmo gênero, em que a repetição permite a memorização do tipo de conteúdo oferecido em determinado horário, com duas variações comuns: stripping (extensão de uma faixa), em que uma emissão é programada todos os dias, no mesmo horário; checkboarding (tabuleiro), em que os produtos são diferentes, mas semelhantes no gênero e com retorno semanal.

Outras ações dizem respeito à sequência dos programas em blocos, a partir de três técnicas: a) ponta de lança, na qual programas de melhor rendimento são postos na abertura dos blocos horários, na tentativa de arrastar público para horários menos atrativos; b) hammocking (pendurar como uma rede de balanço), geralmente utilizado em lançamentos, em que um programa fica entre outros dois de grande audiência; c) tent-poling (mastro de amarração), em que um programa forte é antecedido e precedido por programas de menor audiência, na perspectiva de estender sua força aos demais.

As estratégias de programação também levam em conta os conteúdos dos programas veiculados, demonstrando que a programação evoca o próprio mundo da emissora, em citações cruzadas. Incluem-se aqui os procedimentos de autorreferenciação (crossover) e de esticamento (spinoff). O primeiro (autorreferenciação) consiste na apropriação de assuntos de um programa em outros, e que objetiva

reforçar o interesse pelos produtos da emissora, com a fidelização da audiência pelo maior tempo possível; alimentar o acervo de informações de que dispõe o telespectador, facilitando a leitura dos programas, e, em consequência, o prazer na sua fruição; aproveitar conteúdos já em pauta, referenciando-os em horário de menor audiência, equilibrando assim o fluxo de investimentos à previsão de retorno e lucratividade (CARDOSO FILHO, 2009, p. 48).

O esticamento consiste na retomada de personagens, já reconhecidos no meio televisual, e na construção de uma obra, na qual o objetivo central é aproveitar a sua aceitação, canalizando-a para a audiência. Nota-se, frequentemente, o emprego desse procedimento em relação às séries televisivas: quando um personagem alcança boa aceitabilidade pelo público, outros produtos são desenvolvidos com o objetivo de valer-se de sua notoriedade.

Todas as estratégias relativas à programação têm, neste trabalho, uma importância pontual: possibilitam reconhecer as ações de promoção de um programa televisivo, de acordo com os procedimentos de mídia, envolvendo planejamento e inserção dos programas na grade. A partir de critérios como frequência, audiência, circulação, duração, abrangência, tipos de veículos/plataformas, entre outros, os profissionais de mídia elaboram planos de veiculação dos materiais. Essa organização pode revelar as estratégias adotadas pela emissora para promover o produto midiático referência, especialmente em relação aos textos que antecedem e sucedem um ao outro na programação.

Tanto a estruturação horizontal quanto a vertical decorrem de escolhas da emissora em relação aos temas abordados pelos meios de comunicação em cada espaço. A intenção das emissoras é fazer com que esses temas pautem até os assuntos de interação face a face, ou seja, a conversação entre as pessoas fora do ambiente midiático. Diante disso, os esforços de divulgação de um produto midiático têm como objetivo fazer com que tanto a audiência real quanto a audiência virtual tenham o informações semelhantes sobre o programa. Por audiência real entende-se aquela que assiste ao programa e, também, às respectivas peças promocionais; por audiência virtual entende-se aquela parcela de público que assiste apenas às peças promocionais veiculadas em determinados horários pelos profissionais de mídia (ALMEIDA, 2006). A intenção da emissora é fazer com que essas duas audiências, que na realidade constituem a audiência total, tenha o mesmo conhecimento sobre o produto midiático, seja assistindo ao programa, seja assistindo aos materiais de promoção.

As ações de programação de mídia, relativamente à autopromocionalidade, revelam o grau de investimento e a forma que um veículo planeja sua divulgação, pois a inserção de um material promocional no intervalo da telenovela ou do programa jornalístico de maior

audiência do horário nobre possui uma representatividade diferente da veiculação no intervalo da telenovela reprisada às tardes. A inserção de uma notícia de abertura, no portal oficial da emissora na internet, em posição de destaque, diferencia-se daquela em que o internauta precisa rolar a página da web para visualizá-la.

Todas essas ações, seja no ambiente televisivo seja em plataformas digitais, servem para mostrar o grau de envolvimento e o interesse da emissora em construir uma programação que possa de fato atrair o público e torná-lo cativo.