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As diferentes instituições desempenham funções variadas e identificadas pelos indivíduos em uma sociedade. Comumente, reconhece-se: a família (grupo familiar) na função é educar e perpetuar a espécie humana; as empresas agrícolas, comerciais e industriais (grupo econômico) que produzem bens e utilidades para suprir as necessidades do homem; o empresário/operário (grupo profissional), que presta serviços essenciais para conservar, desenvolver e aperfeiçoar a vida social; os governantes (grupo político), que governa e/ou administra as entidades públicas.

Essas instituições constituem a estrutura social, na qual se insere a comunicação de massa, com seu conjunto de meios, que se complementam e desempenham uma totalidade de funções. Gerald ([s/d]) destaca que a função primordial da comunicação relaciona-se ao fornecimento de mensagens sobre a realidade das instituições sociais, de forma a facilitar o controle social. Desde o advento da imprensa, contudo, outras funções específicas foram sendo atribuídas à mídia, a partir das quais seria possível cumprir o papel primordial.

Estudioso reconhecido desde os princípios dos estudos funcionalistas, Harold Lasswell atribuía três funções à comunicação em sociedade: vigilância do entorno; correlação dos componentes da sociedade para responder ao entorno; e transmissão do legado social (ALSINA, 2001). A essas proposições, Charles Wright acrescentaria uma quarta: o entretenimento. Assim, para Wright a comunicação de massa desempenharia atividades vigilância (notícias), correlação em resposta ao ambiente (editoriais, propaganda), transmissão de cultura e diversão. Da classificação de Lasswell, também partiu Wilbur Schramm, sintetizando as funções dos meios em cinco: vigia, conselho, mestre, recreacionista e negociante (PFROMM NETTO, 1972).

Em proposições mais recentes, McQuaill (2003) destaca como principais tarefas dos meios na sociedade: informação, correlação, continuidade, entretenimento e mobilização; já Pfromm Netto (1972) afirma que, convencionalmente, quatro funções têm sido atribuídas aos meios de comunicação: informar, divertir, persuadir e ensinar.

Atualmente, em publicações próprias dos veículos de comunicação15 é comum a definição de três funções centrais: informar, entreter e educar. Essa designação origina-se da evolução da perspectiva que apontava que, desde o princípio, apreciam-se três funções principais: informar, persuadir e divertir. Informar relaciona-se com levar elementos ao conhecimento dos indivíduos, para que possam elaborar juízo sobre determinado assunto; persuadir remete a fornecer argumentos com o intuito de modificar a conduta e a opinião; divertir relaciona-se com proporcionar entretenimento, de forma que o indivíduo tenha um subterfúgio das tensões rotineiras.

Entretanto, a atribuição dessas três funções (informar, persuadir e divertir) sofreu questionamentos de alguns autores. Berlo (2003) aponta que o indivíduo se comunica para influenciar, uma vez que a linguagem possui uma dimensão persuasiva, que, de uma forma ou de outra, não pode ser ignorada. Diante disso, todas as demais funções seriam perpassadas por uma intenção de quem comunica, mesmo que isso não ocorra de forma exclusiva ou de maneira bastante explícita. Lazarsfeld e Merton, apresentados por Cashmore (1999), defendem a existência de outras funções específicas da comunicação, como a atribuição de status e o reforço das normas sociais.

Diante disso, percebe-se que, seja na atualidade, seja no princípio, não há (e não havia) consenso sobre funções, uma vez que existe grande dificuldade em atribuir uma tarefa única ao que é veiculado. Até porque, podem-se reconhecer outras funções igualmente importantes, como incentivar o consumo, buscar desaparecidos, intermediar a solução de conflitos em relacionamentos, auxiliar na procura por empregos, etc. (CASTAÑARES, 1997). De maneira geral, outra compreensão possível para as funções é atribuir aos meios públicos, costumeiramente, a responsabilidade de educar, enquanto os meios privados/comerciais são vistos como fonte de entretenimento. Embora existam entendimentos diversos sobre a questão, há consenso entre as emissoras de televisão de que as funções principais dessa mídia concentram-se nas missões de informar, entreter e educar.

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Como exemplos dessa atribuição, o site institucional do Grupo Globo define o conglomerado como “um grupo de mídia que cria, produz e distribui conteúdos de qualidade que informam, educam e divertem” (GRUPO GLOBO, 2015). Outro exemplo vem do Secretário-Geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, que em comemoração ao Dia Mundial do Rádio afirmou que o “rádio entretém, educa e informa. Ela promove a expressão democrática e influencia idéias” (informação disponível no site do Centro Geral de Informações das Nações Unidas – www.unric.org).

Na perspectiva empreendida neste trabalho, alia-se a essas três funções uma quarta: promover. Antes de complementar esse raciocínio é interessante observar primeiro a proposta trazida por Beltrão e Quirino – como uma superação da tríade anteriormente apresentada –, que reforça o objetivo básico da comunicação: a promoção de condições para a realização do homem em sociedade. As quatro funções são caracterizadas como:

1. Função informativo/jornalística, através da captação, interpretação e difusão de informações e opiniões sobre fatos, ideias e situações atuais, de interesse e importância para a segurança e orientação de cada indivíduo e da sociedade como tal. 2. Função promocional, através do emprego de métodos e técnicas de persuasão, a fim de levar os diversos estratos da sociedade ao conhecimento e concordância com seu papel na mesma, com vistas ao desempenho social de uma ação econômica e política ordenada e satisfatória para o desenvolvimento e bem-estar pessoal e coletivo. 3. Função educacional, através da transmissão de conhecimentos científicos, artísticos, técnicos e morais, que constituem a herança e o patrimônio cultural da humanidade, a fim de que a evolução e o aperfeiçoamento cultural e social não sofram solução de continuidade. 4. Função lúdica ou de entretenimento, através do oferecimento de recursos diversionais para que o homem preencha seus fazeres, liberte-se das pressões do cotidiano e recupere seu equilíbrio emocional pelo estabelecimento de relações mais íntimas com seu próximo e mais solidárias com seu semelhante, o que lhe permitirá a integração na sociedade, reduzindo sua solidão e frustração (BELTRÃO; QUIRINO, 1986, p. 142-143, grifos dos autores).

Mesmo que se possa concordar com as denominações apresentadas por Beltrão e Quirino (1986), questionam-se suas definições, em relação, sobretudo, à função promocional, que parece estar no cerne das demais funções e sobredeterminá-las, de acordo com as exigências do mercado. No fundo, a função promocional torna-se imperiosa em uma sociedade dominada pela televisão comercial, que precisa, não apenas, trazer uma programação que informe, ensine e eduque a população, mas também garantir a sustentabilidade do seu negócio.

Sabe-se que a televisão brasileira, em virtude de sua origem, modelo de negócio e forma de atuação, tem suas funções comprometidas com o poder e o mercado (DUARTE, 2004), o que dá origem a uma produção que busca, primeiramente, manter a audiência. Diante disso, acentua-se o viés comercial, o que, se não exclui que haja informação, educação e entretenimento, eleva a preponderância de promoção do universo de interesse da emissora. A informação veiculada condiz com as perspectivas dos veículos de comunicação que, ao mesmo tempo, são empresas que disputam mercado entre si, buscam visibilidade, fortalecimento para suas marcas e consumidores para seus produtos.

Enquanto a proposição de Beltrão e Quirino enfatiza a visão social e coletiva, orientada ao bem-estar social, o caráter da função promocional ora abordada relaciona-se com

a estrutura de uma organização com fins lucrativos, que tem na comunicação – em diversas plataformas – um instrumento forte para assegurar sua existência e manutenção no mercado.

Também Melo (2010, p. 93) sustenta que “informação, educação e cultura são itens marginalizados” na programação televisiva, ressaltando a condição do meio televisivo aberto brasileiro como, prioritariamente, um espaço comercial, um instrumento de vendas, um recurso de manutenção do negócio. Essa circunstância faz com que a conveniência seja o primeiro ponto a ser observado por uma empresa televisiva, em que se oferta o que, prioritariamente, beneficia as finanças da empresa.

A importância social atribuída à radiodifusão em países europeus (como Inglaterra, França e Itália), que fez manter o Estado como controlador, a fim de utilizá-la como veículo de educação e cultura, não foi alcançada no Brasil. No país, o modelo americano serviu de base para a construção de uma televisão controlada pela iniciativa privada, que combinou diversão e comercialização, e converteu-se em elemento central de incentivo ao consumo supérfluo (MATTOS, 2010), o que acentua a predomínio da função promocional.

Nesse sentido, entende-se a função promocional como aquela basilar, que sobredetermina e contrai relações de imbricamento com as demais, em linhas tênues, sem uma separação clara e de fácil identificação. Uma emissora de televisão somente apresenta, em sua grade, programas de caráter educativo, por exemplo, se esse for conveniente com seus objetivos e perspectivas. Não se pode esquecer que uma empresa de televisão, de caráter comercial, atua de acordo com lógicas:

econômica, por estar ligada ao desenvolvimento e à permanência de uma empresa no mercado; tecnológica, por ser responsável pela conformação das imagens, qualidade e quantidade de difusão, formas e práticas de consumo; e simbólica, por organizar discursivamente as mensagens midiáticas, considerando as linguagens convocadas e as gramáticas que sobredeterminam sua expressão (CASTRO, 2011, p. 3, grifos do autor).

Na essência, a função promocional atua como um pano de fundo, e, muitas vezes, fica “sutilmente esquecida” (CASTRO, 2012b, p. 80). É assim que, em uma sociedade estruturada a partir de bases econômicas, as organizações midiáticas conseguem sobreviver.

A caracterização da função promocional parte do pressuposto de que a relação da televisão com seus telespectadores é guiada pelas premissas do consumo. A aproximação entre comunicação e consumo evidencia-se na organização de uma emissora de televisão, que prima pela conquista de audiência e manutenção de uma imagem positiva da própria emissora ou de quem ocupa seu espaço. Assim, ressalta-se a forte inter-relação entre promoção e marca, frente à qual, mesmo no encargo de informar, educar ou entreter, uma emissora busca

– como qualquer empresa da mesma natureza – projetar um universo de sucesso, que tem como base um ambiente economicamente viável e lucrativo.

Na perspectiva deste estudo, concebe-se a função promocional como um movimento, que comporta uma dupla direção aparentemente indissociável: a publicização e a projeção.

A publicização diz respeito à ação de divulgar, de propagar, de dar a conhecer, a um público determinado, aspectos positivos e/ou vantagens de qualquer produto, marca, valor ou serviço, através de recursos de ordens diferentes que possam estabelecer vínculo com esse público. [...] Já a projeção diz respeito à ação de lançar para frente, de tornar alguém ou algo conhecido e respeitado por suas atividades, de conferir respeito, credibilidade a produto, pessoa, marca, serviço (CASTRO, 2012b, p. 80). A publicização, na condição de artifício persuasivo, tem como principal objetivo fazer com que os indivíduos entrem em processo de troca com uma marca, ou seja, adquiram produtos, serviços ou se engajem em determinada ação proposta. “Nessa medida, a publicização funciona como mediação entre o interesse de um enunciador (anunciante) e o fortalecimento do consumo, vale dizer, entre a ordem econômica e os valores sociais e culturais que ela, de certa forma, desencadeia” (CASTRO, 2011, p. 2).

A projeção combina os valores da sociedade e os interesses do público. Abraham Maslow, em seu tradicional esquema da pirâmide das necessidades humanas, aponta que, após as necessidades fisiológicas e de segurança, o ser humano busca pertencimento social, estima e autorrealização. Essas necessidades acabam relacionadas à conferência de prestígio proporcionada pelo aparecimento na mídia. “Esse tipo de promoção converte-se em movimento de exaltação, de influência, de poder a tudo que ocupa espaço na mídia. E esses valores, dentro da sociedade moderna, são fundantes e decisivos nas relações entre as pessoas” (CASTRO, 2011, p. 2).

O simples fato de fazer parte do universo midiático proporciona visibilidade, familiaridade, popularidade e distinção, uma vez que esse universo representa, entre as entidades sociais, uma das fontes de maior credibilidade. Só para exemplificar, uma pesquisa do Ministério da Ciência e Tecnologia (2010) demonstra que os jornalistas são a segunda fonte de informação mais confiável (atrás apenas dos médicos) e que a televisão é a primeira opção para obter informação sobre ciência e tecnologia.

Nesse sentido, a função promocional faz superar, inclusive, a perspectiva da televisão como instrumento de vendas, pois “vai além do interesse de compra, tem a ver com aquilo que hoje a televisão representa para o cidadão comum: muito mais que um espaço de divulgação de produtos para venda, ela constitui, indiscutivelmente, um espaço de projeção para tudo que veicula ou para quem nela se mostra” (CASTRO, 2009a, p. 170). Essa condição

não se restringe à televisão, uma vez que as emissoras pertencem a grupos de comunicação com atuação em outros meios. Assim, a prática promocional se alastra para outras plataformas, em estratégias multimeios, cross e transmidiáticas. Quando esse alargamento é desencadeado pela emissora para promover os próprios produtos, a função transforma-se em autopromocionalidade, que nada mais é do que a divulgação e/ou projeção simultânea dos produtos e da emissora.

Quando se fala na perspectiva da transmidialidade, isto é, no conjunto das diferentes plataformas que, eventualmente, podem-se revestir de função promocional, a questão se torna mais complexa. Não se pode esquecer que a instância transmidiática congrega diversas perspectivas: a do anunciante, que busca retorno para seus investimentos; a do publicitário, que tem a televisão e a internet como locais eficazes para alcançar a visibilidade que o cliente busca; a da própria televisão ou portal web, que, na condição de empresa, busca sucesso e, na condição de veículo, procura cumprir com o papel desempenhado na sociedade; o do profissional do meio, que tenta cativar a audiência e também o anunciante, através da mescla do novo e do consagrado; a da audiência (telespectador, internauta), que responde à promessa e aceita a programação oferecida.

Além dessa complexidade, sabe-se que até hoje, a internet, embora já se possa classificá-la como um meio de massa e, ao mesmo tempo, observar a incorporação da própria televisão nesse meio digital, não definiu claramente suas funções (MCQUAILL, 2003).

Não obstante, como a internet, nos últimos tempos, tem desempenhado um papel atuante na sociedade e de interação com o público, veiculando informações, propondo entretenimento e estimulando a educação, acredita-se na possibilidade de reconhecer funções no seu interior. Parece possível também identificar a presença da função promocional nas suas produções, principalmente quando elas resultam de desdobramentos, continuidades, complementações das produções televisuais.

Uma emissora, no desenrolar de uma telenovela, busca continuamente retroalimentar a trama, fornecendo informações paralelas sobre o elenco, antecipando acontecimentos, estimulando diálogos com a recepção, explicitando bastidores, convocando o público para o compartilhamento de conteúdos, e todas essas ações, no fundo, revestem-se de função promocional, pois pretendem divulgar a produção, projetar a trama e conferir visibilidade à emissora e à empresa.

Outro aspecto relevante da produção digital é a preocupação com a busca de atenção, fruto da transformação tecnológica, que proporciona maior facilidade de comunicação de informação e novos veículos para gerá-las e transmiti-las, em um mercado saturado pelo

excesso de mensagens, que faz da atenção uma mercadoria rara (ADLER, 2002). Vive-se hoje um período de transição em que as marcas enfrentam problemas cada vez maiores para chamar a atenção.

Nesse contexto, a conquista da atenção passa pela perspectiva transmidiática, uma vez que o ciberespaço representa novas possibilidades de criação de laços com o público. Na imensidão de informações disponíveis, a televisão transborda para o ambiente digital atrás de atenção para ela própria, e, ao mesmo tempo, acostuma-se e organiza-se para atuar no ciberespaço, ambiente que se mostra mais apropriado à economia da atenção do que à economia monetária.

Todas essas considerações são parte de um processo de busca por sentido, no qual as empresas de mídia adotam uma postura sempre alerta em relação às exigências e transformações que ocorrem no mercado e na sociedade. Os veículos de comunicação recorrem ao gerenciamento do nível de atenção (HERNANDES, 2006). Diante disso, mantêm “investimentos pesados em todos os seus segmentos: desde a busca incessante por novos formatos, até a criação de formas alternativas de contar histórias, passando pela inserção de plataformas diferentes no corpo das tramas narrativas, sempre com a intenção de manter o público cativo” (CASTRO, 2009).

Em síntese, a função promocional pode ser caracterizada como aquela que subsume todo o fazer midiático, sobredeterminando as mensagens de caráter informativo, educativo e de entretenimento, através da qual se desencadeia um processo de busca de atenção, no qual são empregadas diversas plataformas e formatos midiáticos, em favor da sustentabilidade das empresas, o que reforça o empenho das empresas de mídia em obter lucro e a busca de estabilidade econômica.

Toda e qualquer informação trazida a público deve, direta e indiretamente, agradar os dois parceiros do ato comunicativo, consumidor e anunciante. Até porque,

a promoção tem uma peculiaridade a mais: enquanto as demais funções voltam-se predominantemente para a satisfação do receptor (informando, entretendo ou educando esse público), ela possui um caráter duplo, pois favorece igualmente os sujeitos da produção e da recepção (CASTRO, 2009, p. 56).

Nesse ato comunicativo, também se inclui a emissora, como produtor, e o telespectador, como receptor. Todo programa que agrada o público transforma-se em ponto positivo para a emissora e para a empresa de televisão; todo telespectador que obtém espaço na televisão (convidados, autoridades, entrevistados, cidadãos, etc.), ganha visibilidade e

reconhecimento social, o que reforça a ideia de que a aparição na telinha serve para tornar conhecido e atribuir respeitabilidade (CASTRO, 2010).

A recorrência a outras plataformas demonstra a possibilidade de alargar essa força, especialmente por parte da televisão, o meio ainda mais consumido no país. Trata-se de um espalhamento que atinge públicos, tenta mantê-los familiarizados com o universo televisivo, mesmo fora da plataforma de televisão aberta. De maneira geral a função promocional subsume as demais e determina as políticas e as ações das empresas de televisão, as quais se materializam em distintas manifestações, que são os produtos concretos, veiculados em favor de anunciantes externos e das próprias emissoras televisivas.